5. CEO
Spencer
Parece que minha boca adormeceu.
Está formigando desde que Tatiana me beijou.
Montada no meu colo daquele jeito, eu só queria arrancar as roupas dela com meus dentes e lavar ela inteira de língua. Só isso que eu queria. É pedir muito?
Aquele perfume doce, aqueles peitos pesados. Meu Deus, que beijo bom.
Curioso é que pra mim, beijo sempre tinha sido aquela coisa que você faz pra chegar no sexo. Tipo a escada que leva pro restaurante... ninguém vai pra uma churrascaria pra ficar sentado no degrau. Mas a porra da Tatiana fazia o degrau ser erótico pra cacete e eu tinha esquecido que a churrascaria existia.
Esfrego meus cabelos.
Trabalhar é difícil hoje.
É bem difícil, porque ela não me ligou e eu estou desesperado pra descobrir se acabou.
Caralho de mulher boa.
Queria morder ela inteira. Queria chupar aquela bocetinha até ela chorar, implorando por mais.
Seis anos.
E puta merda, eu queria ser o primeiro.
Preparo a massa bem devagar antes de começar a cortar as cenouras.
Ela disse que o Marcus era charmoso. Nunca tinha percebido antes, mas não importa, não é? Porque agora ela já percebeu. O Marcus charmoso, em uma idade apropriada, com seu emprego de adulto e promovido por mérito. Devia ter dinheiro suficiente para se mudar para o outro lado do país sem precisar contar os centavos, como eu fiz.
Eu sou bonito - não tanto quanto eu imaginava, como descobri recentemente - mas e o que mais? Preso em um emprego que eu não gosto, sem quaisquer perspectivas, mais de dez anos mais novo e com uma gloriosa conta bancária com dois mil e quinhentos dólares e nada mais.
Não sou inteligente, não sou interessante. Conhecer os filmes que ela gosta foi um golpe de sorte porque não gostei muito de nenhum deles.
Eu, com meus romances baratos, ela com seu wagyu fino.
Não existe ponto de intersecção entre nós dois e é uma pena mesmo que eu esteja interessado porque se ela decidiu que acabou, perdi minha chance.
- Spence? Você tá legal? - Lala me pergunta enquanto espera um prato na cozinha.
- Hm? To, to ótimo. - aceno.
Um beijo.
Um só.
Mas que beijo.
Se eu fechasse os olhos eu conseguia vê-la no meu colo.
Aquele decote bem apetitoso a alcance da minha língua, aquele rabo de cavalo bem apertado de mulher certinha, aquela boca entreaberta com a respiração desesperada.
- Spencer! - Rodolfo precisa de alguma coisa e eu não faço a menor ideia do que é.
Eu quero pegar meu celular. Quero ver se tem alguma ligação dela.
Alguma mensagem.
Nova York, você já me recusou e maltratou demais, está na hora de minha sorte mudar, certo? Por favor? Nova York?
Eu perdia oportunidades em agências para outros mais bonitos e mais preparados do que eu.
Perdia oportunidades em restaurantes para outros cozinheiros mais experientes.
Perder a Tati pro Marcus ia ser um prego a mais do que eu aguentava na minha Cruz.
O tempo até o fim do meu turno parece se arrastar, moribundo.
Perder a Tati.
E desde quando ela foi tua?
Ela é, muito provavelmente, do Marcus.
Está lutando e resistindo, mas você viu como ela derreteu quando falou dele.
Se bobear, era nele que ela estava pensando quando te beijou.
Falta meia hora pra terminar quando eu desisto de esperar e corro para o meu armário só para dar uma olhada rápida no celular e é quase com um ataque do coração que eu vejo sua mensagem brilhando na tela como uma benção de misericórdia.
Prendo a respiração por um segundo porque aquela mensagem pode ser algo tipo: "Spencer, sinto muito, mas não posso mais fazer isso".
"Spencer" ela começa. Meu coração fica batendo na minha garganta.
"Sinto muito" ela continua.
Fecho os olhos. Bato o celular duas vezes na minha testa. Merda.
Encaro a tela do meu celular com desgosto para ler o resto da mensagem que diz "... mas esqueceu sua mochila na minha casa. Trouxe ela comigo para o escritório, quer que eu deixe na sua casa?"
Respiro.
Certo.
Não acabou, então.
Ou talvez tenha acabado mas ela não vai dizer isso em uma mensagem?
Ou talvez ela não ache que precisa dizer qualquer coisa... considerando a origem de nosso arranjo, se ela não precisar mais de mim pode apenas desaparecer, certo?
Engulo em seco.
Eu queria ser confiante pra caralho agora, porque aí eu ia poder ir com calma. Mas insegurança faz a gente sentir a necessidade de agir mais rápido.
Deixar na minha casa significa que a motorista dela deve ir lá deixar, e se for assim eu não vou vê-la.
Preciso saber se acabou.
Preciso saber o que ela está pensando.
Digito depressa:
"Não quero te incomodar. Posso pegar aí, depois do meu turno?"
Talvez seja invasivo.
Talvez seja inapropriado
Talvez ela mande eu me foder. Mas, é claro, com palavras bem polidas porque a Tatiana raramente se agarra a palavras baixas.
Ela demora uns segundos pra responder, mas daria no mesmo se tivesse demorado anos porque eu envelheci meio século esperando ela decidir.
"32 andar, vou deixar seu nome na recepção"
A mensagem seguinte é o endereço.
Técnica.
Nada de troca de carinhos ou provocações.
Ela não é tua namorada, Spencer.
É, eu sei.
Mas...
Bagunço meus cabelos.
Não é minha namorada.
Olho pro relógio de novo.
Vinte e oito minutos pro fim do meu turno.
Vinte e oito.
***************
As portas do elevador se abrem no 32 andar.
Pelas placas no lobby principal, a empresa de Tatiana parece ocupar pelo menos uns três andares.
A recepção é uma mesa triangular de porcelanato branco, com um mosaico grande em aço escovado e fosco. Por trás da recepção, a parede tem um tom metálico de chumbo e é completamente neutra a não ser pelo nome da empresa em relevo iluminado.
Uma das recepcionistas usa um daqueles headsets de telefone, a outra sorri para me receber.
- Senhor Reese? Se puder esperar por um instante, vou verificar se a Senhora Corso já pode recebê-lo.
Um sofá e duas poltronas marrons. Escolho uma das poltronas e me sento.
A gente escuta as histórias sobre essas empresas de tecnologias e meio que fica esperando dar de cara com um escorregador colorido para adultos no saguão de entrada. Se é assim em outros lugares, eu não sei. Mas Tatiana preservou os tons metálicos e sóbrios e se livrou de todo o resto.
Sua recepção é imaculada.
Silenciosa a ponto de me permitir ouvir minha própria respiração.
- Spencer?
- Olá!
Ela tem o cabelo castanho claro na altura dos ombros. Olhos simpáticos cor de mel e um sorriso sóbrio de quem nunca se permite ser mais agradável do que profissional.
- Oi! Tudo bem? - aperta minha mão, com um sorriso - Meu nome é Julia, sou assistente da Tati! Vem comigo! Ela está em reunião, mas eu te deixo na sala dela.
- Eu não queria incomodar! - acrescento enquanto ela me conduz pelos corredores de madeira clara.
- Besteira! Ela já está terminando! Fiquei sabendo que você também vai se juntar a nós no evento beneficente na próxima semana?
Certo.
Bom sinal.
Se ela confirmou com a assistente que eu estou convidado, então talvez...
Ou talvez tenha esquecido de cancelar minha presença.
- É. Acho que sim. - respondo, sem dar muitos detalhes.
Todos os blocos do andar parecem ser divididos por paredes de vidro, e as placas de metal ao lado de cada porta denominam as salas com nomes de constelações. Julia abre um par de portas de vidro e me coloca dentro do que deve ser o escritório da Tati.
A mesa de madeira branca é fina e muito longa.
Tem dois monitores brancos e um laptop em cima da mesa. Um bloco de anotações, algumas canetas e umas poucas coisas decorativas.
As paredes da sala são quase inteiras de vidro, a não ser por um pequeno espaço onde Tatiana colocou uma estante branca e assimétrica para sustentar alguns livros, prêmios, diplomas e ainda mais alguns artigos de decoração.
Uma das laterais da sala tem um vaso imenso que parece ter sido roubado de um museu. Diante de sua mesa, duas poltronas gordas e cinzentas. Julia aponta para uma delas e eu sento.
- Quer alguma coisa? Uma água ou...?
- Não, não. Estou bem. Obrigado.
Ela sorri, acena e se vai.
Eu movo meus ombros, desconfortável, olhando ao redor.
Estou me sentindo severamente atacado pela elegância do ambiente.
Deixa eu explicar meu problema: no nosso segundo encontro, Tatiana me levou para comprar roupas e exagerou. Ela me deu quase um guarda-roupas inteiro. Mas eu ainda ia trabalhar com minha blusa velha do Queen, porque ela é confortável pra caralho. Só que agora eu estou no meio da empresa dela, cercado por classe e luxo, vestindo uma camisa que EU SEI estar furada na barra.
Puxo o pano para baixo, certificando-me que escondi a parte comprometida na cadeira. O tecido ainda é velho e puído, mas é tarde demais para hesitar. Se eu suspeitasse que iria vê-la logo depois do trabalho, teria me vestido melhor. Se eu tivesse conseguido pensar em qualquer coisa que não fosse lambê-la no caminho até aqui, talvez tivesse passado em casa para trocar de roupa.
Mas nenhuma dessas duas inteligências me ocorreu. E aí restou eu aqui sentado com minha burrice e minha camisa furada.
Preciso de poucos segundos para perceber que a sala de reuniões está logo do outro lado do corredor. É fechada, como todo o resto, por paredes de vidro. Consigo ver Tatiana sentada a cabeceira da mesa. Usa uma saia grafite colada naquelas curvas imaculadas e uma blusa branca cheia de botões abertos. Tem a ponta de uma caneta presa entre os dentes. O cabelo amarrado naquele rabo de cavalo cheio que já parece ser sua marca registrada.
Ela é linda, sabe?
Muito.
Gostosa de fazer salivar por toda parte.
Minha boca formiga.
Está sempre formigando enquanto eu tenho sonhos vívidos de como seria enrolar aquele rabo de cavalo todinho na minha mão e comê-la pelo cu.
Será que Tatiana já deu a bunda alguma vez na vida? Se sim, era uma pena que não tenha sido pra mim. Se não, era uma pena pelo desperdício.
A mulher está trabalhando, mas eu só queria que me amarrasse naquela mesa para me dar uma lição. Uns tapas bem dados pra eu aprender a não esquecer minha mochila pra trás. Eu aceitaria tudo de bom grado, se em troca ela me deixasse dar umas mordidas naquelas coxas.
Esfrego meu queixo com raiva.
As pessoas ao redor na mesa devem estar discordando de tudo porque tem pelo menos quatro falando ao mesmo tempo. Tati ergue uma mão e esse gesto é tudo que ela precisa para calar a todos.
Eles devem estar pensando em suas palavras, eu só estou pensando que lamberia cada um daqueles dedos antes de fazê-la enfiá-los em si mesma.
Ela se inclina contra o espaldar da cadeira enquanto fala. Parece tomar decisões rápidas. Mexe casualmente nas mangas.
Eu tiraria sua camisa, primeiro. Ficaria de joelhos pra beijar seus pés.
Eu devia ter chegado mais cedo.
Não sabia que era tão erótico assistir alguém trabalhar.
Acho que ela terminou porque, com poucas palavras, o grupo se desfaz e ela está de volta nas portas de sua sala.
- Spencer!
- Tati! - eu tenho um sorriso imenso no rosto, não sei por quê. Pode ser que ela me dê um fora em oito segundos.
- Boa banda. - aponta para minha camisa com um sorriso assim que levanto para falar com ela.
Droga. Esqueci que estava vestindo essa porcaria furada, de novo.
Essa mulher tem um efeito preocupante sobre minha concentração.
- Gosta?
- Bastante.
- Imaginei que você só gostasse de músicas românticas acústicas. - provoco.
- Está me julgando pela minha playlist? - ela soa ofendida, mas tem uma expressão genuinamente divertida.
- Nunca. Você sabe que eu só te julgo pelo teu gosto pra filmes.
Ela ri.
Tem um sorriso gostoso que me esquenta.
Acho que estamos bem.
- Não precisava ter vindo até aqui! - ela finalmente se aproxima para me cumprimentar e eu beijo sua bochecha. Ela é bem suave. Dá vontade de ficar ali, deslizando o nariz na sua pele o resto do dia. E aquele perfume... Deus me salve.
Vou ficar duro.
Não posso ficar duro.
E se eu ficar duro?
Ela, no entanto, já se afastou e receio que talvez eu não cause nela o mesmo efeito que causa em mim.
- Eu podia mandar alguém te entregar! - ela avisa, abrindo um móvel atrás da sua mesa para pegar minha mochila.
- Não, eu não queria te dar trabalho. Além do mais, eu... - respiro fundo. Ela me observa, clínica. Não está mais vermelha e nervosa. Acho que estamos no seu ambiente e, aqui, ela não se intimida com facilidade. Ótimo pra ela, péssimo pra mim - Eu queria pedir desculpas de novo. Pelo jeito como tudo...
- Spencer. - ela gesticula de um modo bem definitivo. Não é rude, mas também não dá abertura para questionamentos.
Eu me calo porque quero ouvir o que ela vai dizer, mas duas batidas em sua porta de vidro fazem com que ela, assim como eu, cale também. Ela me pede desculpas com um gesto e acena para que a pessoa entre.
O homem usa uma camisa lilás que, pra mim, é de péssimo gosto, tem um bloco de paletas de cores na mão. Não diz uma palavra, apenas ergue a primeira amostra e vai seguindo para as outras a medida que Tatiana autoriza:
- Não. - ela diz - Não. Talvez. Não. Talvez.
Ele separa apenas as duas amostras que receberam um "talvez". Ergue as duas, lado a lado, e espera a decisão final.
Tatiana estreita os olhos por um segundo.
- Essa. - aponta para a da esquerda.
O homem vai embora sem dizer outra palavra.
Ela sorri pra mim e inspira fundo para dizer algo mas é interrompida mais uma vez quando Julia entra na sala:
- O pessoal do comemorativo estourou o orçamento de novo, você precisa assinar a extensão. Eu já estou com o roteiro da viagem, preciso que você autorize antes de enviar pra agência. O Henrik Krause está na linha, ele quer falar com você sobre a nova política de segurança? O pessoal da Coca Cola já está na sala Andrômeda, estão esperando você. E o veterinário ligou, o Bruce já está pronto.
- O Bruce está doente? - preocupe-me.
Ela ergue o indicador com um sorriso divertido:
- Não, ele está bem, só rotina. Eles estouraram o orçamento em quanto? - pergunta pra Julia.
- Cinco mil.
- Autorize mais quinze. Mas diga pra eles que só autorizei os cinco e que estou irritada. Mande o roteiro pro meu email, só vou conseguir ver isso amanhã, diga pra agência esperar a confirmação na segunda. Não vou atender o Henrik, ele vai passar quarenta minutos falando sobre nada. Diga pra ele que estou em reunião, mas marque um horário pra próxima semana, peça pra ele trazer o manual completo que eu verifico ponto por ponto com ele. Pede a Lu pra pegar o Bruce. E avisa pro pessoal da Coca Cola que eu chego lá em cinco minutos.
Julia assente e sai.
- Você não tem muito tempo pra respirar, não é?
- Às vezes fica corrido. - ri.
Ela sustenta meu olhar.
Seu sorriso é lindo.
Não sei escolher qual parte dela eu gosto mais.
Acho que estou sorrindo também.
Ela move o rabo de cavalo, deixando o cabelo cair sobre seu ombro.
Eu vou dizer que ela é linda.
Vou começar a dar em cima dela aqui mesmo porque as palavras estão se enchendo na minha boca.
- Foi bom que você tenha vindo! - diz e eu estou sorrindo porque acho que ela vai dizer que gostou de me ver - Sobre o que aconteceu ontem... - ela volta ao assunto que eu já tinha esquecido que existia e meu sorriso murcha - Não foi culta sua. Aconteceu. Mas não vai acontecer de novo.
Abro a boca mas não sei o que dizer.
Mais uma rejeição.
Mais um tapa.
Merda, Nova York, achei que a gente tinha um acordo.
Eu me encolho.
- Podemos continuar nosso acordo até o fim, se você ainda estiver interessado! Até o dia do leilão e nem um dia a mais. - sorri, comportada - Mas eu... acho que eu estava mais solitária do que me permiti admitir. Mas não quero misturar as coisas.
- Claro, eu entendo. - minha língua parece pesada dentro da boca.
Entendo mesmo?
- Bem... eu não quero te atrapalhar! Obrigado por...
- Chefe? - mais uma batida na porta, mas um gesto para que entre. A mulher baixinha amarrou os longos cabelos escuros em um coque descontraído. Usa uma camisa de filme e uma saia preta. Acho que o código de vestimenta aqui é bem casual, a começar pelo cara que ela contratou em um site de relacionamentos - Você já...
- Não. - Tatiana responde.
- Mas e o...
- Na quarta-feira. Talvez na quinta.
- Tá! Mas tem certeza que...
- Tenho. E Vicky! Diga pra equipe da Anna que se eles continuarem fazendo aquelas modificações sem acrescentar os logs, estão todos demitidos.
Ela ergue o polegar, dando risada, e vai embora.
- Essa é a parte que os livros não mostram. – estou pronto para sair porque já entendi que ela deveria ter uma reunião em cinco minutos e não quero atrasá-la. Eu queria mesmo passar a tarde inteira ali, mas se estou com medo de ser recusado porque fui rápido demais talvez o certo seja lhe dar algum espaço - O tanto que os CEO's trabalham.
- CTO. - ela ri.
- O quê?
- Não sou CEO, sou CTO.
- Nos livros é sempre CEO. - estreito os olhos - Tem certeza que não é isso que você é?
Tati ri muito alto.
Tem uma risada deliciosa.
Uma risada que me deixa morno e faz meu rosto se derreter em um sorriso.
Ela é tão linda.
Eu sei que já disse isso uma porção de vezes. Mas ela é mesmo.
De um jeito óbvio e avassalador.
- Tenho certeza. - promete - CEO são os chefes executivos, cuidam das decisões administrativas. CFO são os chefes financeiros, cuidam dos... números e impostos. - ri - CTO é o chefe de tecnologia.
- Eu achei que a empresa era sua.
- E é. Mas eu sou péssima com finanças ou questões administrativas. Então contratei duas pessoas muito capazes para serem meus CEO e CFO. No dia a dia, eu cuido da parte tecnológica. É o meu produto. O meu bebê. Mas... - dá de ombros - ainda sou a dona. As decisões dos outros dois passam pelo meu crivo e se eu discordar...
- Demite.
- Eu ia dizer "anulo sua decisão". - ri - Mas é... seu jeito também serve.
Ela respira fundo de um jeito diferente e eu sei que meu tempo acabou.
- Sinto não poder te acompanhar até a saída, Spencer. Mas preciso...
- Eu sei, eu sei! Não se preocupa. Eu só queria...
Fico ali de pé.
Só queria o quê?
- Eu posso perguntar quando vou te ver de novo?
Ela encara o vazio e parece estar refletindo sobre coisas demais.
- Não quero te pressionar, eu só... Se ainda vamos fingir que estamos juntos eu acho que... acho que precisamos ficar mais a vontade perto do outro. Principalmente se quer enganar sua melhor amiga.
Ela considera por um instante.
A decisão que toma é rápida, assim como todas as outras.
- Verdade. Faz sentido.
Verifica as horas.
- Você vai voltar pro trabalho?
- Não, meu turno acabou.
- Hm. - espreme os lábios - Se não tiver planos... minha reunião deve durar meia hora. Se quiser esperar, a gente pode ir beber alguma coisa depois. Como amigos. - acrescenta - E eu respondo todas as suas perguntas.
- Todas?
- Todas as que forem relevantes. - promete.
- Eu te espero! - Isso! - A gente vai pra sua casa, ou...
- Não! - responde, rápido demais - Para um bar. Um restaurante. Algum lugar bem público. - acena, nervosa, como se temesse não conseguir se controlar caso tivéssemos privacidade.
- Certo. Certo. Eu posso correr pra casa, pra trocar de roupa!
- E me roubar da chance de fazer graça da sua camisa? Não, senhor.
É aquela troca de sorrisos bem ali.
A troca de provocações.
A troca de tantas coisas que acontecem em um segundo e que a gente chama de "química" porque não há palavra melhor.
- Tudo bem. - concordo - Eu te espero, então.
***************
- MENTIRA! - estou gargalhando.
- É sério! Ela faz isso o tempo todo!
- E ela desapareceu?
- Por três dias! Eu juro por Deus! Eu quase chamei a polícia!
- E por quê não chamou?
- Porque no segundo dia ela respondeu minha mensagem dizendo "estou viva, não sei onde estão minhas roupas, não chama a polícia".
Talvez um dia eu consiga parar de rir, mas não vai ser hoje.
- Eu preciso conhecer essa sua amiga! Ela é meu tipo de gente!
- Engraçado é que se ela tivesse dito apenas "estou viva, não chama a polícia", eu acharia que era o sequestrador.
- Mas o "não sei onde estão minhas roupas"...
- É a CARA da Pamela.
- Ela deve se divertir como pouca gente no mundo. E é dona do Sugar Love? O Eric ia morrer!
- É o seu colega de quarto, não é?
- Hmhum.
- O responsável pelo "oi, linda"? - brinca, referindo-se a primeira mensagem que lhe mandei.
- Exatamente! Não pode me responsabilizar por aquilo! Eu nunca diria aquilo.
- Ah! Eu achei simples e gentil. Só respondi por causa disso. Acho que deveria ter respondido ao seu amigo e não a você, então.
- Respondeu minha mensagem por causa do "oi, linda"? - encaro Tatiana com descrença porque tenho CERTEZA que ela tá me sacaneando.
- Foi profundo e poético.
- Você gostou das minhas fotos sem camisa.
- Foi algo no jeito como ele digitou a vírgula... - segue, tentando me irritar.
- Teria respondido mesmo que eu tivesse só digitado "tchau". - faço uma careta infantil e ela desata a rir.
- Pegou alguma das namoradas do seu primo assim?
- Não acredito que te contei isso!
- E nem pode dizer que estava bêbado porque disse isso antes da primeira cerveja! - ri.
- Olha, eu não me orgulho de roubar as namoradas dele, certo.
- Pareceu orgulhoso quando contou a história!
- Ele era melhor do que eu em tudo! As notas, esportes, todos os professores gostavam mais dele! Nós temos a mesma idade, íamos pro mesmo colégio e ele vivia competindo comigo! Eu não tenho muito a meu favor, sabe? Mas eu sei conquistar uma mulher.
- Ah é? - ergue uma sobrancelha.
- Você vai ver.
Estou começando minha terceira cerveja enquanto Tati termina seu segundo drink. Não posso dizer que nenhum de nós dois está sóbrio e acho que nossa situação ainda vai piorar. Conversar com ela é tão fácil que não ficaria surpreso se da próxima vez que olhasse pro relógio já tivessem se passado três horas.
- Certo, mas já ouvi muitas histórias da Pamela e do seu genuíno amor por uma vida sexual ativa. Agora me conta algumas suas.
Ela engasga no drink.
- Não estou pedindo pra me contar histórias eróticas, Corso! Se acalme!
- Eu sei lá! Todo mundo que eu conheço é inapropriado.
- Nada disso. Você que é certinha demais.
- Não sou certinha.
- É? Qual foi o lugar mais inusitado que já transou?
- Achei que não estava pedindo uma história erótica.
- Pois eu mudei de ideia.
É ela quem faz uma careta infantil, dessa vez.
Mordisca o canudo do seu drink, as bochechas vermelhas. Não consegue me olhar nos olhos.
- Certo. Me conta sobre o Marcus, então.
- UMA BANHEIRA DE HOTEL! - ela anuncia, mudando de assunto e eu estou rindo.
- Não, não! Eu perguntei sobre o Marcus agora.
- Tem certeza? Porque foi HORRÍVEL na banheira!
Ela pede mais um drink e eu vou impedi-la de tomar mais outro depois desse. Ela não parece aguentar muito álcool.
É o meio da semana e o bar não está muito cheio. Nossa mesa fica escondida em um dos cantos mais separados do salão. O máximo de privacidade que se poderia ter no ambiente, mas ainda é público o suficiente para impedir os beijos de sofá que ela prometeu que não se repetiriam.
- Hm... - reflito - Certo, quero ouvir a história, primeiro. Depois o Marcus.
- Não. Tem que escolher.
- Droga! Tá, a banheira! Me conta!
Ela ergue uma sobrancelha, observando-me como fazem os juízes que ainda não decidiram a sentença.
- Achei que éramos amigos. - uso sua palavra contra ela - Amigos conversam sobre essas coisas.
Ela revira os olhos. Parece não acreditar em meu argumento ruim, mas álcool frequentemente basta para nos fazer compartilhar coisas que nunca diríamos sóbrios.
- Era uma banheira de hotel! Eu liguei a hidromassagem e a gente começou a... sabe? Na banheira.
- Muito safada. Quase um pornô.
- Silêncio!
- Sim, senhora!
- Só que hidromassagem é só umas bombas que puxam a água da banheira por um buraco e jogam de volta por outros, certo?
- Certo.
- E aí, sem querer, eu apoiei minha coxa no buraco da sucção e não conseguia soltar de jeito nenhum.
- E gozou presa no buraco?
- Não! A gente teve que parar e desligar a banheira.
Fico esperando mais alguma coisa, mas parece que ela terminou?
- Isso é a tua história? Isso acontece com um monte de gente!
- Está menosprezando minha história!
- Pode ter certeza! Essa é tua pior história?
- É uma boa história!
- Se... sei lá... um cavalo tivesse entrado no quarto de hotel arrastando um casal pelado, eu ia concordar contigo. Mas se machucar na banheira é tão de praxe que nem dá pra contar como uma experiência. É tipo dizer "ah eu fui nesse bar e bebi uma água ótima". Não conta.
- Claro que conta! Sabe qual é o teu problema?
- Eu sou pobre, burro e sem muito talento? - abro um sorriso enorme e ela me encara sem paciência.
- Você é muito jovem.
- Ah! Esse problema!
- Vocês, jovens, acham que sexo só é bom se for diversificado. Lugares diferentes, pessoas diferentes. Acha que isso te torna especialista.
- E não?
- Me diz uma coisa, especialista, qual o máximo de vezes que já ficou com uma mesma mulher?
- Sei lá. - dou de ombro - Três?
Ela ri como se soubesse decorado um segredo que eu nunca ouvi.
- O que foi? - pergunto - Qual o problema?
- O problema é que você não deve fazer a menor ideia de como ler uma mulher. Isso é algo que a gente só aprende quando se demora em uma única pessoa. É o único jeito de aprender a ler nuances.
- Eu sei ler nuances! Fique sabendo que eu nunca termino antes de garantir o orgasmo dela!
- É o que você pensa...
- O que diabos isso quer dizer?
- Como sabe que elas não estão mentindo?
Expiro com desdém.
- Tatiana, me respeita, eu sei a diferença de um orgasmo verdadeiro pra um falso.
- Já começa que orgasmo falso não é orgasmo. - ri - E como você tem certeza? Mulheres são tão diferentes. Elas gozam de jeitos diferentes e mentem de jeitos diferentes também. Se você só ficou uma vez com uma mulher não tem como fazer a distinção.
Mais essa agora.
A única coisa sobre a qual minha autoestima ainda descansava e ela está tentando puxar pra longe.
Fico mastigando as palavras dela. As minhas.
- Eu sei a diferença! - é tudo que digo e ela ri.
Não muito.
Apenas um sorriso comedido.
É ela quem parece estar fervendo em pensamentos agora.
No que está pensando?
- Pergunte.
- O quê? - assusta-se.
- Seja lá o que for que você tá se roendo pra perguntar.
Seu sorriso é tímido, encara-me sapeca e desvia o olhar para a mesa quando diz:
- E você? Qual o lugar mais inusitado que já transou?
- O vão, embaixo da escada, na casa da minha avó.
- Você nem precisou pensar!
- Não é fácil manter uma ereção na casa da sua avó.
Ela está rindo.
- Tive que pensar nas minhas melhores fantasias eróticas e em todos os meus pornôs favoritos.
- É? - ela está rindo tanto que precisou tapar a própria boca - E quais são esses, por acaso?
Qualquer outra mulher e eu sorriria safado ao perguntar "está interessada, han?"
Mas Tatiana, apesar de meus interesses, tinha sido bem clara.
Só amigos.
- Se eu disser "mulheres mais velhas" você vai achar que eu estou te sacaneando?
- Vou. - responde de imediato.
- Certo, então deixa eu pensar no segundo lugar. - levo um tapa no braço - É sério! - prometo - Tem algo muito excitante em ficar com uma mulher mais velha. Mais experiente.
- Claro que tem. - revira os olhos, incrédula diante de minhas palavras porque acha que só as digo em seu benefício.
- Eu gosto daqueles pelo ponto de vista do cara. - digo - Com a mulher pagando um boquete com gosto. Ou duas mulheres.
- Bem simples.
- Sou um cara de poucas pretensões.
- Percebe-se.
- E você?
- Eu o quê? - ela me encara em choque.
- Eu contei o meu, agora você conta o seu.
- Eu não assisto pornô.
Eu não digo uma palavra. Só a encaro enquanto espere que mude a narrativa e diga a verdade.
- É sério! - ela resiste. Eu me inclino para encará-la mais de perto.
Tati respira bem fundo.
- Bem... Talvez tenha um que eu gosto.
- E aí está. Qual é esse um?
Morde o canto do lábio em um princípio de fúria, como se não conseguisse acreditar que me deu tanta liberdade.
- Nós somos AMIGOS!
- Essa desculpa não vai funcionar muitas vezes na mesma noite, Spencer!
- Se a tua melhor amiga quiser detalhes?
- Da nossa suposta vida sexual? Não acho que a Pamela iria ir tão longe a ponto de te perguntar sobre... - mas ela se cala quando seu olhar se perde no vazio, percebendo que Pamela poderia sim ir tão longe. O modo como respira fundo anuncia sua derrota de um modo bem evidente - Não é exatamente um vídeo, é uma coisa que, às vezes, os caras fazem nesses vídeos.
- Que é?
- É só uma besteira.
- E qual é a besteira?
O que Tatiana tem diante de sexo não é vergonha, é só... falta de conforto. É um assunto que ela não tem o habito de abordar e, pelo que tenho percebido, principalmente se for com um homem.
Passa a ponta da língua nos lábios.
Ainda está hesitando.
Considerando.
Me conta.
Por favor, me conta.
- Tá! - decide - Sabe nesses vídeos que a mulher está distraída fazendo algo, normalmente deitada, ou curvada, meio que... - ela demora sem terminar a frase.
- De quatro?
- É, e aí o cara tem acesso fácil a...
Ela se demora de novo, esperando que eu conclua e diga "boceta" por ela. Mas eu só mantenho os sorriso.
- A quê? - pergunto.
- Você sabe. - irrita-se.
- Não sei. Não faço ideia. Vai precisar me dizer.
- Eu te odeio.
- Eu sei. Agora, me conta.
- O cara tem acesso fácil a... intimidade dela.
- INTIMIDADE? Sério? Essa foi a palavra que você escolheu usar?
- E aí ele coloca a mão nela... mesmo por cima da calcinha.
- "Intimidade". Uma mulher adulta. Não acredito. - estou rindo.
- E aí ele faz... carinho bem devagar na... boceta dela. - sussurra as últimas palavras e eu me arrependo de minha brincadeira porque meu sangue congelou - Sem pressa. Ele só... - ela coloca o dedo médio nas costas da minha mão e faz o movimento suave, o raspar de seu dedo na minha pele sugerindo como deveria ser o raspar do meu dedo em sua boceta. Estou salivando. Sentindo minha virilha inteira em chamas enquanto o sangue começa a pulsar, acordando-me para uma tarefa que a publicidade do lugar jamais permitiria. - Bem assim. - murmura, fodendo minha pele com seu dedo.
Ela me solta com ares de quem terminou a explicação e eu quero agarra-la por aquele rabo de cavalo imaculado pra foder sua bunda bem ali.
Acho que é exatamente esse desejo cru e violento que está em meus olhos enquanto ela sorri.
Estou pensando no meu toque no seu grelinho.
Não consigo pensar em outra coisa.
Não sei se algum dia vou conseguir pensar em outra coisa.
- Viu como é fácil? - tem algo brincalhão em seu tom que me faz despertar.
- O... o quê? - gaguejo.
- Viu como é fácil fazer a pessoa pensar em sexo se a gente sabe como ler as nuances?
Filha da...
- Você estava fazendo de propósito? - arregalo os olhos.
O dedo, a escolha das palavras, o tom.
Jesus Cristo me salve.
Ela dá de ombros como se me conduzir tivesse sido a coisa mais fácil do mundo.
Quando abro a boca, é exasperação que escuto em minhas palavras:
- Teu marido era uma anta.
Cada sílaba é um sofrimento. Eu derrubo minha testa na mesa, em genuíno desespero e ela ri enfiando os dedos pelos cabelos, bem ali na altura da minha nuca.
Seu carinho é tão bom que eu seguro sua mão. Olho pra ela, deslizando sua mão para o meu rosto. Deixando que ela me experimente enquanto eu me derreto sob sua atenção.
- Não posso mesmo dar em cima de você? - imploro.
- Não. - ela decide.
- Tá. - aceito, miúdo - Estou tendo que me esforçar um bocado, viu?
- Eu agradeço! - ri.
- Muito. - gemo.
- Spencer. - ralha.
- Tá, tá... Muda de assunto! - imploro - Me conta alguma coisa que você não gosta na cama.
- Ah! Uma amiga, uma vez, ficou com um cara que ela gostava... e ele chamou ela de "tigresa" no meio do sexo. Eu acho isso ridículo!
- Só tigres? Ou qualquer animal da floresta?
- Qualquer animal da floresta! Mas não acho que isso é uma mudança de assunto! Ainda estamos falando de sexo!
Sua mão desce para o meu ombro.
Tati me pergunta sobre minha profissão, sobre o restaurante e as agências.
Eu respondo suas perguntas mas parte de mim queria voltar ao assunto de sexo.
Queria voltar ao beijo do sofá.
Queria voltar a lhe dizer o quanto seu marido é estúpido e o quanto ela é linda.
E, mais que qualquer outra coisa, queria voltar àquele cafuné.
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