O início-2

29 de abril de 1920

Mansão Kibutsuji

No momento em que ele te viu, soube que não a deixaria ir.

Você se assemelhava a um pássaro engaiolado e ferido, uma pintura distorcida e representada pela teor Infernal da humanidade, aquela parte que não é contada e mal vista, mas por muitos glamourizada e procurada.

Seus olhos fixos na janelas enquanto a chuva escorria pelo vidro e chão da enorme varanda do quarto ao qual estava denunciando seu leve temor em nunca mais sair dali por mais calmo e tranquilo que fosse, a todo momento não conseguiu parar de pensar que fariam algo com você.
Vivia pelo medo e com ele em proteção e o cheiro de cigarro empesteando o ambiente enquanto ainda sentada na cama evidenciava a falta de importância e o desespero mudo e por um momento sentiu-se observada. Não desviou o olhar para a porta ou sequer se atentou a sensação de familiaridade rápida que percorreu seu corpo, a questão é que em todo esse tempo de hospedagem contra a vontade você era visitada pelas mesmas pessoas que lhe diziam que poderia andar por toda a mansão e jardim desde que não adentrasse nos aposentos do "rei" ou tentasse ir embora.

A mulher de fios extremamente longos para uma época em que todas escondiam o tamanho do cabelo para se adequar a moda. Além do cabelo extenso, os lábios dela sempre tingidos de vermelho e os olhos castanhos e delineados destacavam os olhos bem puxados aos quais você só viu uma única vez devido a franja e o outro vez o outra vinha ao seu encontro era um homem alto de aparência incomum, utilizava trajes japoneses padrões em tom de roxo e preto no hakama, mas os cabelos... Nunca viu um homem com fios tão longos.

E agora era ele quem te observava na porta, com dois dedos curvados bateu na madeira chamando sua atenção.

-- Se troque. O mestre quer vê-la. -- E assim deixou o ambiente fechando a porta. Você levantou calma, o robe de ceda e plumagem resvalava em seu corpo, deixou a ponteira no cinzeiro e seguiu até o closet ajeitando a sobrepele que usava por baixo a cinta liga já presa a meia lisa, calçou os saltos e por fim pôs o vestido azul escuro solto de tamanho mediano, além de segurar o chapéu nas mãos, seus cabelos já estavam presos respeitando a norma da época e não demorou a caminhar até a porta e tocar a maçaneta, sendo recepcionada por ele, aqueles mesmos olhos que você um dia salvou.

-- Venha. -- Ele não disse mais nada antes de caminhar pelo amplo corredor até chegarem no mezanino que daria acesso as escadas de mármore esculpido e você sentia o suor em suas palmas tensas imaginando os mais diversos cenários de punição, fora o perfume entorpecente e amadeirado que parecia deixar-lhe zonza contribuindo para suas memórias possivelmente cruéis. Não acreditava na bondade dos abonados, pois tudo o que recebeu dessa classe feriu seu corpo, sua alma e sua mente, também se recusava a crer que existia uma homem bom e mesmo que ele tenha te mantido ali por todo esse tempo e tenha recebido os mais diversos cuidados com os quais nunca sonhou, entendia que uma hora teria que despertar e que a conta logo viria.

-- Sua estadia em minha casa foi boa?

-- A melhor que já tive em toda a minha vida. Obrigada.

Ele te guiou até o escritório e adentraram, de pé o observou se aproximar da cadeira presidencial e dali te olhar, com a destra indicou que deveria sentar e você o fez.

-- Sn Nethuns... -- Por um momento prendeu sua atenção, afinal gostou de como seu nome foi pronunciado sem escárnio, mas achou extremamente desconfortável o fato dele saber.
O homem deslizou um envelope na mesa em sua direção.

-- Isso deve cobrir os dias que não trabalhou.

O pacote era gordo e você concluiu que ali havia muito dinheiro e entenda, não era por sua moral que recusaria e sim pelo medo do que o ocorreria depois.

-- Senhor Kibutsuji. -- Você apertou o traje entre os dedos desviando o olhar e os orbes vermelhos densos recaíram sobre si. Tão linda e doce em sua repressão, aquela era a primeira vez que ele ouvia sua voz cem por cento consciente chamando por seu nome. -- Eu não o salvei pelo dinheiro.

Muzan sorriu de lado.

-- Pode não ser, mas aceite e não se preocupe será levada para o bordel ainda hoje.

Se levantou e você emitiu o semblante de desespero. Óbvio que ele notou, mas não diria nada.

༺══༻

A casa de Lótus era simplesmente o maior e o melhor dentre todos os bordéis da cidade da luz vermelha, altamente caro lidava com estrelas, políticos, samurais e gente que tivesse dinheiro para frequentar não importando o quão inescrupulosa fosse, desde que a carteira estivesse recheada.
E após um longo período de guerras o local colhia os frutos, recebendo dólares que valiam bem mais que Ienes e seriam trocados em breve. Você foi levada por Kokushibo e Nakime, os mesmos que te receberam e os únicos com quem teve contato na mansão. O castanho parou o carro e desceu.

-- Fique aqui. -- Ordenou e foi só olhar para aqueles orbes escuros que teve a certeza de que não desobedeceria.

Kokushibo adentrou o local que pelo horário não estava aberto, seguiu até o primeiro salão onde um piano de calda ficava sobre um suntuoso palco de madeira na sua borda o acabamento de tecido vermelho cetim com dourado em puxadores boleados.

-- Não estamos abert...-- As palavras da dona - vulgo cafetina - morreram ao vê-lo de frente, a saliva tornou-se difícil de engolir e ainda assim sorriu como se nada tivesse acontecido.

-- Em que posso servi-lo senhor? -- Fez uma curta reverência.

O castanho apenas enfiou a mão no bolso e tirou um punhado de dinheiro colocou sobre a mesa e olhou nos olhos da mulher que não tinha mais do que quarenta anos.

-- Fará exatamente o que eu mandar ou essa espelunca virá a baixo. -- A mulher simplesmente assentiu enquanto o homem detalhava cada ato.

No carro você batia os pés de maneira inconstante enquanto Nakime prendia a franja e desviava os orbes puxados em sua direção.

-- Pare com isso, vai desgastar seus sapatos á toa. -- Você a encarou e ela respirou fundo abrindo o compartimento do carro pegando uma caixa de madeira branca com o símbolo dos Kibutsuji e te entregando.

Você abriu se deparando com uma pistola.

-- Não gosto de ver mulheres a mercê dos homens, então se precisar atire sem hesitar. -- Você fechou e devolveu.

-- Não posso, serei castigada. -- Desviou o olhar se recordando de uma das muitas vezes que ocorreu. Nakime novamente colocou a pistola em suas mãos te olhando tranquilamente.

-- Nesse caso atire para matar. Rápido esconda na cinta. -- Sussurrou enquanto Kokushibo se aproximava e você o fez.

-- Desça, estão ao seu aguardo. -- A voz firme te deixou um pouco acuada, entretanto obedeceu sem saber que sua vida estava prestes a mudar para sempre.

[...]

De volta a mansão Muzan se preparava para mais um acerto de contas, vestindo a camisa branca e notando a marca do ferimento cicatrizado em seu peito. Fazia tempo que não era alvejado daquele jeito e se ocorreu significava que estava na hora de relembrar ao seus adversários quem era o dono de todo o submundo do crime.

Batidas soaram a porta preenchendo o ambiente e ele logo outorgou que adentrassem.

-- Senhor, desculpe pelo incomodo mas, a dama não levou os vestidos que a senhora Nakime comprou. -- Tal afirmação deixou o líder intrigado. No mesmo momento ele parou de abotoar a camisa deixando a empregada extremamente envergonhada antes de seguir até o quarto em que você ficou hospedada, ele puxou uma das peças que havia usado e levou até o rosto, fungando e absorvendo seu cheiro entorpecente.

O Kibutsuji guardou um pequeno lenço seu no bolso e sorriu de forma maligna, Muzan nunca foi conhecido por ser um bom homem, pelo contrário. Era dado como o próprio rei demônio andando entre meros mortais devido a sua natureza extremamente violenta e cruel, um homem que não se importava e até mesmo adorava finalizar cada um de seus inimigos com as próprias mãos, sempre foi esguio de se pegar devido a alta proteção que construiu ao seu redor, cercado de criminosos que o obedeciam com um mero estalar de dedos.

Sentir a vida se esvaindo dos corpos daqueles que um dia tentaram se opor, era um prazer único e inigualável, se recordou da mulher que matou recentemente:

Em uma madrugada fria durante o último dia de fevereiro, quando descobriu onde o Tsugikuni se escondia nas folgas, uma casa comum num distrito pacato de Shinjiku ele não encontrou o rival, mas a mulher que suplicou pela vida até ter uma bala enfiada na cabeça e para Muzan a satisfação vinha em saber que Yoriichi sofreria pelo resto da vida por suas escolhas. Para ele isso era o suficiente, mas algo estava deixando-o estressado, por que não parava de pensar em você? Um pequeno passarinho enjaulado que ansiava por liberdade.

A resposta é simples, Sn Nethuns não desejava riquezas, luxos ou qualquer outra bem material com que ele tanto comprava seus aliados.
Durante sua estadia naquela casa se preocupou em perguntar como o homem que salvou estava e só por esse motivo ele soube que precisava saber mais de você e movido por uma curiosidade ímpia foi que mandou Akaza um dos seus confiáveis levantar um relatório a seu respeito, descobrindo assim seu passado e presente, podendo moldar seu futuro.

O encontro de olhares que tiveram no momento que o salvou fez com que pensasse em você, como uma possível ferramenta, colhendo informações e as passando, entretanto mudou de ideia ao recordar que Daki e Gyutaro executavam tal trabalho escondidos no distrito, mas no fundo só queria algo para passar o tédio de ser simplesmente incomparável em todos os aspectos. Então por que não um brinquedo quebrado que ele poderia remontar quantas vezes fossem necessárias? E essa sensação de não ter controle sobre um única vida ao qual cruzou seu caminho de maneira tão abrangente o deixava instável.

Ansioso ao ponto de causar um verdadeiro caos.

-- SAYA MANDEM PREPARAR MEU CARRO! -- O homem deixou o quarto com uma fisionomia nada agradável, foi até o escritório abrindo um armário de madeira que ficava ao lado da janela sorrindo abertamente enquanto observava os próprios pertences. A escolha foi simples, um colt 1908 pocket Hammerless de um dos lados do coldre e do outro um colt Police positive calibre 38 e nas mãos sorriu antes de acender o cigarro e tragar: a Thompson submarine gun já estava a espera.

Muzan Kibutsuji havia decidido dar um fim na base dezesseis do kisatsutai, um dos inúmeros grupos de elite que surgiram para tentar matá-lo...

O carro estava pronto assim como todos os outros, um ataque dos doze kizuki era impossível de ser segurado e chegava a causar medo ver os três carros pretos passarem pelas ruas que conheciam sua marca e as estradas silenciosas, logo denunciariam o fogo que se alastraria por toda Tóquio.

༺══༻

Você choramingava no quarto enquanto apertavam o seu espartilho.

-- Por favor Surya eu não aguento mais. -- Pediu tremendo pareciam que seus ossos iam quebrar a qualquer momento enquanto abraça a pilastra de madeira.

-- Sinto muito Sn, a senhora Hina está abalada e mandou que você ficasse impecável. -- A porta do quarto foi aberta e viu quando passaram a puxar suas roupas do armário.

-- Hei espera o que estão fazendo? -- As meninas sumiram sem te responder.

-- Não se preocupe estão levando para um local mais adequado.

Isso despertou sua curiosidade.

-- Ah pelo jeito você não entendeu. Parabéns Sn, você será uma cortesã de alto nível a partir de agora e hoje é o seu treinamento.

Você olhou para o chão e uma lágrima escorreu por seu rosto se lembrando de sua mãe e do fato de que não queria nada daquilo apenas a liberdade.

-- Não ficou feliz? Muitas de nós almejam isso.

-- É claro que fiquei! -- Mentiu. Havia lembranças demais de sua mãe em sua mente fora a certeza de que teria o mesmo fim.

-- Excelente! A partir de hoje vou ser sua acompanhante e te ajudar com tudo o que precisar! Então vamos por uma maquiagem nesse rosto e esconder essas marcas. -- Se referiu as cicatrizes de suas costas já que devido as suas tentativas de fuga de anos anteriores foi punida.

-- Claro, será que poderei comer um mochi depois? -- Você sussurrou.

-- Terá o que quiser a partir de hoje será que não entende?

"Menos a minha liberdade." Foi o pensamento que lhe ocorreu.

-- Venha, vou ajuda-la a ensaiar -- Sua mão foi puxada até a banqueta enquanto a maquiagem foi feita e após um belo vestido deslizou por seu corpo, seus cabelos foram penteados e amarrados de maneira tradicional para ornar com a composição.

Surya jamais diria, entretanto, você foi o seu melhor trabalho e digamos que não era difícil quando se tem a sua beleza estrangeira, afinal o diferencial sempre atraiu os melhores clientes para o Lótus.

[...]


Muzan sentia os pingos de sangue em sua face, puxando o seu lenço e limpando o rosto depois encarando o tecido perfumado e sujo que em sua concepção ficou ainda mais belo se remetendo a você. Sorrindo o recolocou no bolso.

-- Kokushibo assuma. -- Ordenou assistindo o fogo se alastrar pela construção a fumaça dos corpos carbonizados subindo aos céus e ao olhar para o lado viu Douma sorrindo.

-- O que faço com ela? -- Nos braços do loiro uma mulher de longos cabelos castanhos e vestes da milícia residia.

-- Faça o que bem entender. -- Um pesado sobretudo foi posto nas costas do Kibutsuji que acendeu um charuto e entregou a submarine gun ao confiável. -- Vamos Akaza.

E assim partiu deixando para trás seus luas como eram conhecido enquanto se afastava da recente chacina. As luvas foram deixadas no banco e as pernas cruzadas enquanto bebia um bom whisky.

-- Vamos ao lótus e depois está de folga. Mande Enmu vir ao meu encontro pela amanhã.

Akaza jamais contrariaria a ordem de seu superior entretanto não conseguia parar de pensar no que seu líder faria em um clube benquisto, uma vez que conhecia os prazeres cruéis de seu mestre, contudo Muzan sorria, havia encontrado seu mais novo brinquedo.

Espero que não tenha ficado confuso de compreender, conforme for se aproximando do fim os caps vão ficando maiores e a propósito, o texto está pré-revisado.

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