36 - Senti sua falta

Devo ler pelo menos umas quatro vezes o documento que não para de balançar nas minhas mãos trêmulas.

Basicamente o julgamento do garoto que bateu no nosso carro será daqui há alguns dias e fui intimada para testemunhar contra ele.

Meu corpo inteiro se arrepia com um mal pressentimento, no entanto, minha decisão está tomada antes mesmo de me dar conta.

— O que tenho que fazer? Só aparecer no dia ou devo enviar alguma carta para o juiz ou algo assim? -Murmuro sem deixar de olhar para o papel.

— Violet, você não precisa... nós podemos dar um jeito de... -Mamãe sussurra segurando minhas mãos e cometo o erro de olhar para ela pois acabo encontrando uma preocupação latente nos seus olhos castanhos similares aos meus.

— Não mãe, é o meu dever testemunhar contra esse cara, além de que o próprio documento diz que se eu não aparecer posso até ser presa. -Contesto lendo as últimas linhas que indicam exatamente o que acabei de afirmar.

— Ayden, faça alguma coisa pelo amor de Deus! -Ela se levanta e caminha até o meu pai que me observa em silêncio.

— Me desculpe, amor, mas essa é uma decisão que só Violet pode tomar. Ela já é uma adulta. -Sua voz soa mais sombria do que o normal e sei bem que ele está tão preocupado quanto minha mãe, talvez até mais. Ayden Cross já passou por tudo isso e sabe como funciona, mesmo estando do outro lado do processo.

— Obrigada papai, eu realmente tenho que fazer isso. Preciso que olhar nos olhos daquele maldito e ver se pelo menos ele se arrepende de algo. -Murmuro sentindo meu sangue ferver com a raiva contida.

Minha mãe está tão nervosa, que sequer percebe quando meu pai enlaça seu corpo com os braços e a aperta contra ele.

— Se está disposta a ir até essa audiência, então iremos com você. -Diz sem deixar de me olhar por um segundo.

— Mamãe...

— Nada de mamãe, nós vamos e pronto! -Pela primeira vez na vida ela fala com uma autoridade até então desconhecida para mim.

— Não posso deixar que façam isso. Como papai mesmo disse, já sou uma adulta. Não quero que vocês se exponham a esse tipo de situações... principalmente o meu pai. -Sussurro a última parte sabendo que ele me escutou alto e claro.

Sei desde que era praticamente uma criança, que papai teve uma adolescência complicada e precisou passar pelo mesmo processo de ir a julgamentos, estar em contato com a polícia entre outras coisas e não quero que ele reviva tudo isso apenas por querer me acompanhar.

Só precisarei entrar naquele juizado, dar o meu testemunho e sair como entrei: com a dignidade intacta por saber que fiz a minha parte.

Os dois se sentam no sofá um de cada lado e me abraçam apertado, me apoiando independentemente do que eu decida fazer, como sempre.

Sei que ambos prefeririam ir junto comigo e não permitir isso fará com que eles passem o dia inteiro preocupados, mas eu não consigo fazer algo assim com eles. Não quero sequer que cheguem perto daquele lugar e desenterrem lembranças que devem ficar no passado, onde elas pertencem.

— Tudo bem, seu pai tem razão. Mas se no dia acontecer algo, qualquer coisa, você liga para nós que vamos te buscar, ok? -Mamãe pede e concordo sabendo que só assim ela ficará tranquila.

Me sinto culpada por colocá-los nesse dilema, contudo, às vezes precisamos tomar esse tipo de decisões para evitar que algo pior aconteça.

No dia da audiência, irei com a cabeça erguida, direi tudo o que tenho para falar e assistirei o garoto pagar por seus atos. É o que ele merece no final das contas.

Jantamos algo leve e depois de ver um filme qualquer na televisão, vou para o meu quarto, tomo um banho, escovo os dentes e coloco uma roupa confortável antes de me deitar na cama. Aproveito que já estou aqui para dormir na companhia dos meus pais, mesmo sabendo que terei que levantar bem mais cedo para ir para a faculdade amanhã.

Benjamin até o momento não deu notícias, uma preocupação a mais para a enorme pilha dentro do meu peito.

O que diabos está acontecendo?

Espero pelo menos uma meia hora e nada do garoto.

Minhas pálpebras pesam e estou quase dormindo quando meu telefone começa a tocar em cima da mesa de cabeceira então atendo-o sem nem conferir quem é.

— Olá Violet, como está? Sei que já é tarde e... -A voz do outro lado da linha não parece nada com a que estou acostumada a escutar e me sento rapidamente ficando alerta no mesmo instante.

— Ben, finalmente! O que aconteceu? Por que não me ligou o dia todo? Fiquei preocupada. -Reclamo com o coração batendo a mil.

— Me desculpe por isso, meu amor, estive tão ocupado hoje, meu celular ficou sem bateria e...

— Ok, pode ir parando por aí. Eu liguei para a sua mãe e ela me disse que onde você estava não podiam usar o telefone e agora você me vem com essa balela de que acabou a bateria. Não ouse mentir para mim, Benjamin.

O silêncio que segue é ensurdecedor.

Nenhum dos dois diz nada por um bom tempo e posso escutar até mesmo o barulho da sua respiração acelerada.

— Eu... gostaria de conversar sobre isso pessoalmente com você, Vi. Estou perto do seu apartamento. -A sugestão me pega por surpresa. Pensei que ele tentaria me distrair ou diria para esperar até amanhã e confesso que mesmo querendo saber tudo sobre o seu sumiço, ainda assim sinto medo da resposta.

— Estou nos meus pais, Ben. -Explico anestesiada por toda essa tensão.

— Oh... nesse caso, chego aí em uns dez ou quinze minutos.

— Tudo bem, te espero na portaria. -Encerro a ligação sem sequer me despedir, afinal de contas, vamos nos encontrar daqui há pouco.

Me levanto lentamente da cama, coloco um moletom por cima do pijama, pego meu celular e chaves e desço até o portão do edifício.

Como prometido, Benjamin não demora para chegar e estaciona do outro lado da rua abrindo a porta e caminhando até parar na minha frente.

— Quer ir até a pracinha? -Oferece apontando com a cabeça para o lugar há alguns metros de distância que está deserto por conta do horário .

Concordo friamente e dou passos na direção da pequena praça iluminada apenas pela luz tênue de alguns postes.

Me sento em um dos vários bancos e espero que ele faça o mesmo antes de começar a falar.

Sua mão resgata a minha que estava escondida dentro do bolso da blusa de moletom e ele enrosca os dedos nos meus me fazendo sentir um frio na barriga.

Por mais que não queira admitir, sua proximidade provoca sensações em mim que ainda não consigo controlar. E tudo ficou ainda mais intenso depois que transamos. É como se por mais que minha mente esteja brava com ele, meu corpo traidor não resiste à tentação.

Seus olhos me analisam por completo e posso ver o medo estampado nas íris castanhas.

— Bem, não tenho todo o tempo do mundo. Quando quiser começar a falar, sou toda ouvidos. -Resmungo e vejo-o engolir em seco.

— Ok... hã antes de mais nada, eu quero que saiba que não menti. Meu celular realmente ficou sem bateria, Vi. Acabei de colocá-lo para carregar no carro porque saí agora do... -coça a garganta nervoso — do tribunal de justiça. -Revela e levanto uma sobrancelha confundida.

— O que fazia nesse lugar? Aconteceu algo?

Meu coração palpita acelerado com o pensamento de que ele possa estar em problemas outra vez.

— Entendo que esteja chateada comigo e com razão, mas gostaria de não falar sobre isso no momento. Passei o dia inteiro com o meu pai resolvendo várias coisas e como não se pode usar o celular lá dentro, eu o deixei em mudo e não percebi quando acabou a bateria. Me desculpe, ok? Não quis te deixar preocupada. -As palavras deixam seus lábios como balas de metralhadora e não sei o que sentir. A única certeza que tenho, é que estou ficando sem paciência.

— Não entendo o motivo de tanto segredo, Ben. Sabe que eu jamais vou te julgar, e-eu realmente me preocupei com você.

Eu sei meu amor... eu sei. É só que, tenho medo de que você não queira mais me ver quando souber a verdade. -Revela com a voz tão baixa que quase não o escuto direito.

— Acho que essa decisão quem deve tomar sou eu. -Censuro. — Não faça isso com você mesmo, Benjamin. Não faça isso com a gente. Meus pais viveram quase a mesma coisa e por pouco não se separaram permanentemente. Não quero que isso se repita. -Digo com firmeza ao mesmo tempo em que acaricio seu rosto angulado.

— Prometo que vou te contar tudo quando eu resolver o problema de hoje, só me dê um tempo por favor. -Pede desesperado e nego com a cabeça.

— Eu posso te dar todo o tempo do mundo, Benjamin, mas não te garanto que quando você finalmente resolva se abrir, eu vá estar aqui para escutar. - Me afasto alguns centímetros do seu corpo e ele suspira desanimado.

Não dizemos nada por vários minutos, cada um preso nos próprios pensamentos, reféns dos demônios internos e temerosos de que ao deixá-los sair, algo realmente catastrófico possa acontecer.

— Acho... acho melhor eu ir embora. Está tarde e amanhã temos aula.

A frase me golpeia de supetão e sinto um gosto amargo na boca.

Não quero que ele vá ainda, não o vi durante o dia inteiro e embora esteja irritada com todo esse mistério, sei que preciso dele comigo, me apoiando com aquela maldita intimação.

— Não precisa ir agora. -As palavras ressoam no ambiente antes mesmo que eu possa controlar minha mente. — Ainda estou chateada com você, mas preciso te contar algo. -Murmuro segurando sua mão e apoiando-a em cima das minhas pernas que se arrepiam com o contato.

— Posso pelo menos te beijar antes? -Ele diz com um sorriso triste e balanço suavemente a cabeça para cima e para baixo.

No momento em que seus lábios encostam nos meus, uma explosão se forma dentro de mim e meu coração que já estava galopante, bate ainda mais descontrolado.

De repente estamos abraçados e suas mãos percorrem todo o meu corpo me fazendo arrepiar desejando estar no meu apartamento, dentro do meu quarto e de preferência sem nenhuma roupa nos atrapalhando.

Matamos a saudade um do outro por um bom tempo, até que nos separamos ofegantes e sorrio passando o dedo no seu lábio inchado.

— Senti tanto sua falta hoje... -Ele diz com o nariz no meu pescoço, inalando profundamente o meu perfume adocicado.

— Eu também, mas por favor, não faça mais isso. -Ralho suspirando e gemendo sem querer.

— Prometo que não vai mais acontecer. -Afirma sem deixar de beijar minha pele sensível. — O que queria me contar? -A pergunta acaba me tirando dessa distração e me obrigo a afastá-lo para que possa lhe dizer tudo sem perder o foco.

— Eu fui intimada para testemunhar contra o cara que bateu no nosso carro. -Solto tudo de uma vez e ao contrário do que imaginei, Benjamin não expressa nenhuma surpresa com a notícia. 

NOTA DO AUTOR

Não mores, vcs não estão alucinando kkkk 
Postei mais cedo hoje pq não vou ter tempo de tarde! 
Como já puderam perceber, daqui pra frente é só ladeira abaixo então preparem os 

lencinhos pq vcs vão precisar kkkkkkk 
Espero que tenham gostado, 
não se esqueçam de votar e comentar, 
Nos vemos na sexta! 

Amo vcs, 😍
Bjinhossss BF 💜💜💜

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