Capítulo 21 - A Visita (PARTE 2)
Uma das melhores coisas de se estar com o Maurício era que nós não precisávamos ficar nos agarrando pelos corredores para dizer que estávamos juntos. Isso evitava transtornos e uma bela advertência, então eu considerava isso uma coisa boa.
Rayane, ao me ver de mãos dadas com Maurício, não me atacou como teria feito antigamente. Na verdade, ela sempre nos cumprimentava pelos corredores. Apesar de saber que ela ainda se sentia um pouco triste, eu tinha a sensação de que ela já estava se recuperando.
As semanas se passaram e eu não tive mais notícias dos meus amigos em Klímpf e do meu perseguidor. Enquanto essas coisas não preocupavam a minha mente, eu tentava monitorar de forma sutil o relacionamento de Emily e Peter. Eles pareciam bem. Se desentendiam como todo casal normal, mas logo faziam as pazes, o que me fazia aproveitar mais do que devia aquela vida provisória que eu tinha assumido através do trabalho.
A missão de Anlyn parecia ir bem também. Em paralelo a isso, ela dissera para o cara do Tinder que ainda não se sentia pronta para um relacionamento sério.
As férias de inverno chegaram rapidamente, mas o inverno do Rio de Janeiro não era tão rigoroso quanto o dos Estados Unidos, por exemplo. Enquanto meus amigos ficavam agasalhados dos pés a cabeça, eu raramente usava casaco.
Durante as férias, Hahue fez pouco contato comigo. A cada vez que ele retornava, parecia ter envelhecido dez anos. Ele fugia de um lado para o outro, lutava pela sua sobrevivência com algumas Almas Atormentadas e monitorava o aparelho de Slahat, que ainda piscava.
Quanto a mim, prometi que daria um fim ao meu relacionamento com Maurício, mas a cada vez que eu pensava em fazer isso, uma dor aguda e muito forte se apossava do meu coração, me impedindo de dar continuidade ao que eu sabia que precisava fazer.
As aulas voltaram num ritmo animado, meu namoro permanecia bem, mas às vezes eu sentia que Mauricio e meus amigos ficavam cada vez mais incomodados com a minha vida pessoal e misteriosa. Eles percebiam que eu ficava sem jeito de falar sobre alguns assuntos, e apesar de parecerem entender, eu sabia que eles se sentiam chateados por eu não falar tanto sobre mim quanto eles falavam.
— Eu odeio essas máquinas de refrigerante. — Emily bateu na máquina e a sacudiu, mas o refrigerante continuou travado lá em cima. — Devolva meu dinheiro, sua maldita!
— Acho que você não vai conseguir nenhum dos dois.
— Ah se vou! — Ela puxou o fio da tomada e o recolocou novamente. A máquina ligou de novo, o metal rodou e a latinha caiu. Ela deu um sorriso satisfeito e pegou a lata no mesmo instante.
— Isso foi impressionante.
— O sinal já vai tocar. — Maurício avisou, parando em nossa frente junto com Peter.
Rayane, que passava por ali com suas amigas, me deu um sorriso. Ela já tinha desmentido os boatos e a escola voltou a ser o lugar quase normal de sempre.
— Ainda acho estranho que a Rayane fale com você. — comentou Emily enquanto nos dirigíamos para a sala de aula.
— Eu não acho. A Lyra esteve com ela em um momento crítico da sua vida. Se ela não agisse desse jeito, eu ia estranhar mais. — Peter respondeu, e Maurício concordou com o amigo.
— Bom, pelo menos tudo se resolveu.
Nem tudo. Pensei em dizer, mas preferi guardar aquele pensamento só para mim.
Um parque de diversões chegara à cidade hoje, e Anlyn dissera que estava louca para ir. Eu só soube que este parque estava na cidade porque Emily comentou comigo na hora da saída, e porque Maurício tinha me chamado para ir com ele hoje.
Obviamente, eu nunca fui a um parque de diversões, mas não queria demonstrar isso para Maurício se não ele poderia me achar ainda mais estranha (se é que ele já não achava, já que eu não falava muito sobre mim).
O caminho até o parque teve que ser feito de ônibus. Algumas crianças acompanhadas de seus pais também estavam no coletivo, provavelmente indo para o mesmo destino que nós.
O ônibus nos deixou bem em frente ao local onde o parque estava instalado. As crianças desceram com seus pais e eu as segui junto com Maurício tentando conter as expressões de surpresa que surgiam na minha face toda a vez que eu via um brinquedo diferente.
Eu nunca tinha visto uma montanha russa de perto, então eu realmente fiquei impressionada com as manobras radicais que ela fazia. Tinha também um carrossel de bichinhos fofinhos e os carrinhos bate-bate.
— Quer ir na roda gigante?
— Quero ir naquele primeiro. — apontei com a cabeça para os carrinhos. Parecia ser divertido. Maurício sorriu para mim.
— Boa escolha.
Fomos direto para a fila comprar as fichas para os brinquedos. Eu disse a ele que queria pagar pelas minhas fichas e Maurício não se opôs. Compramos dez fichas cada e entramos na fila dos carrinhos.
Escolhi um carrinho oposto ao de Maurício e observei o volante e os pedais enquanto colocava o cinto.
— Eu vou atrás de você, Lyra.
— Duvido que você consiga me pegar!
Acelerei com tudo o que consegui, batendo na traseira do carrinho de uma menina. O impacto fez meu corpo tombar um pouco para a frente, mas o cinto me protegeu. Maurício teve dificuldades para me alcançar, pois os carrinhos batiam nele a quase todo momento.
Olhei para trás e soltei uma gargalhada debochada quando o vi próximo a mim. Girei o volante com agilidade e bati com força em sua traseira.
— Isso vai ter volta, Lyra.
— Eu estou esperando! — Bati nele mais uma vez, fazendo Maurício se indignar com a minha habilidade.
Maurício girou o volante com tudo em minha direção, e quando parecia que ele iria encostar em mim, o tempo acabou.
Levantei os braços para cima em comemoração.
— Lyra um, Maurício ZERO! — Eu gritei ao mesmo tempo em que saía do carrinho. Maurício me puxou pelo braço e ficou me fazendo cócegas enquanto eu me contorcia.
— Você teve sorte, só isso. — Ele fingiu que estava irritado. Segurei seu braço e seguimos para os outros brinquedos.
— Esse é o melhor cachorro quente que eu já comi! — Dei uma mordida no cachorro quente e o molho junto com ketchup escorreu, sujando o canto da minha boca.
— Você está com a boca toda suja! — Maurício apontou para o meu rosto dando risada ao mesmo tempo em que o molho escorria pelo canto da minha boca, sujando meu pescoço, colo e minha blusa, causando um acesso de risos ainda maior em Maurício, que quase se engasgou com a sua comida.
Constrangida, levantei o pão e o resto do molho escorreu por onde o plástico não protegia, terminando de sujar a minha blusa. Uma mancha vermelha e enorme de ketchup completou toda a minha sujeira. Maurício ao meu lado não sabia se me ajudava a me limpar ou se chorava de tanto rir.
— Você tá pior que criança comendo.
— Cala a boca! — Peguei um punhado de guardanapos e esfreguei onde estava sujo, mas não adiantou muita coisa.
Quando terminamos de comer eu tentei me limpar do jeito que era possível devido aos recursos escassos que tínhamos. Nós gastamos todas as fichas nos brinquedos. O dia fora tão divertido que eu nem tinha visto a hora passar.
O parque ficava próximo a uma praia. Nós caminhamos um pouco até acharmos um banquinho de concreto para sentar. Ficamos imersos em um silêncio tranquilo, onde uma ideia totalmente aleatória me ocorreu.
— Vou fazer um teste vocacional.
— Boa! Tá com internet aí?
— Sim. — Desbloqueei o celular e entrei na internet para procurar o teste vocacional. Maurício me ajudou a procurar um teste confiável para começarmos.
As perguntas eram mais difíceis do que eu esperava, e envolviam coisas que eu não tinha muito o hábito de fazer, mas as respondi com o máximo de sinceridade que consegui. Eu não sou uma terráquea, e isso não me ajudava muito na hora de responder as perguntas.
— Uau, são opções interessantes. — Maurício disse, olhando para o resultado do teste.
— Assistente social, Ciências Biológicas... — Tirei print da tela de resultados para poder pesquisar as profissões que não conhecia direito mais tarde. — Acho que eu faria uma dessas faculdades.
— Você vai se sair bem no que você escolher, tenho certeza disso. — A convicção com a qual ele disse aquilo me deixou triste. Eu nunca faria faculdade porque não pertenço a este lugar.
— O que houve? — Maurício notou a tristeza em meu olhar, mas eu sacudi a cabeça e desviei o rosto para que ele não visse minha expressão desolada.
— Não é nada.
— Lyra, eu gosto muito de você. — Aquela afirmação fez meu coração acelerar ainda mais. — Talvez você pense que estou indo muito rápido ou algo assim, mas eu queria muito que você fosse a minha namorada. Mas se não quiser, tudo bem, quem sou eu para querer te obrigar a...
— Eu aceito ser a sua namorada. — A resposta veio antes mesmo que eu conseguisse impedir. Eu tinha plena consciência de que eu não podia me envolver mais do que já estava envolvida, mas era mais forte do que eu.
Maurício sorriu, transbordando felicidade. Ele me pegou no colo e me rodou enquanto gritava aos quatro ventos que eu era a sua namorada. Eu não conseguia parar de sorrir.
Ele começou a distribuir beijos por todo o meu rosto. Nós entrelaçamos nossos dedos e caminhamos juntos para o ponto de ônibus.
Me despedi de Maurício a contragosto na porta de casa. Ele era a pessoa mais doce e carinhosa que eu já tinha conhecido. Fiquei observando meu namorado se afastar com um sorriso no rosto.
Entrei em casa e estranhei o fato de que ouvi outra voz além da de Anlyn. Segui na direção das vozes e me assustei ao ver Anlyn conversando com uma pessoa de manto preto que estava de costas para mim. Aquela pessoa só podia ser o meu perseguidor.
— O que você quer? — Eu sentia meu corpo tremer de medo. A pessoa abaixou o capuz que cobria a sua cabeça, revelando que era uma mulher por conta de sua trança grisalha. A mulher se virou para mim.
— Muito prazer, menina. Eu me chamo Dellyn.
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