Capítulo 16 - A Família
A época de provas estava se aproximando, o que foi suficiente para aumentar a minha lista de preocupações. Eu e meus amigos entregamos todos os nossos trabalhos, só faltava terminar um, que era justamente o que eu tinha começado a fazer com o Maurício.
Ficamos de finalizar o trabalho em sua casa.
Peter e Emily assumiram seu relacionamento publicamente, o que deixou Eduardo furioso. Ela tivera uma conversa franca com seu antigo ficante, mas Eduardo não aceitou bem a notícia de que seria trocado por alguém que ele desprezava. Eles não tinham prometido exclusividade, mas isso não foi o suficiente para aplacar o ego ferido dele.
Enquanto ninguém prestava atenção ao que acontecia ao redor, eu observava tudo e todos, o que me fez notar que Rayane, Eduardo e Carlos não tinham se desgrudado desde que a festa aconteceu. Eu não gostava nada daquele trio e minha intuição me alertava de que eles estavam tramando alguma e que o alvo seria exatamente o meu grupo.
Sacudi a cabeça para espantar aqueles pensamentos enquanto aguardava Maurício atender a porta.
— Seja bem vinda, querida. — Uma senhora de olhos cansados e sorriso simpático abriu a porta para mim. Ela devia ser a avó de Maurício. A abracei e ela envolveu meu corpo em um abraço aconchegante.
— Muito obrigada, eu sou a Lyra.
— Eu sou Ana, a avó do Maurício. — Ela se curvou para frente como se fosse me contar um segredo — Pode dizer, estou mais para irmã mais velha, ne?
Eu gargalhei, acenando de forma positiva com a cabeça enquanto Ana me dava espaço para passar.
Uma mulher alta e de cabelos negros apareceu na sala junto com Maurício.
— Olá, querida. Eu sou Eliete, a mãe desse ser aqui. — Ela empurrou o filho de brincadeira. Ele riu e cambaleou para o lado. Olhei de um para o outro, me sentindo chocada em como os dois eram parecidos. Eles tinham os mesmos olhos, o mesmo cabelo e o mesmo sorriso. Eliete também veio me abraçar.
— Eu sou Lyra.
— E eu sou a garota mais linda dessa casa, mais conhecida como Manuela. — A irmã mais nova de Maurício apareceu de surpresa no recinto. Ela tinha alguns traços parecidos com o do irmão também. Nós nos cumprimentamos enquanto Eliete me oferecia um copo de água bem gelado.
Maurício me levou pelo corredor até seu quarto para podermos fazer o trabalho.
— Quero que trabalhem com a porta aberta, mocinho. — avisou Eliete do começo do corredor que tínhamos acabado de passar.
— Tá bom, mãe. — respondeu, revirando os olhos.
A casa de Maurício era pequena e aconchegante. O seu quarto trazia o mesmo ar de simplicidade que o resto da casa. Tinha uma cama de solteiro no canto forrada com um lençol azul claro, uma escrivaninha com um notebook em cima e vários livros empilhados ao lado. No canto esquerdo, havia um violão encostado na parede e vários pôsteres de bandas e cantores estavam colados pelas paredes, além de um gato preto que começou a se esfregar em minhas pernas quando me viu. Me abaixei para afagar suas orelhas.
— Impressionante, o Thanos não chega perto de nenhuma visita além do Peter. — Maurício se abaixou também, observando como seu gatinho tinha se identificado comigo. Ele ronronava enquanto eu fazia carinho no topo de sua cabeça.
— Ele é um fofo. E aí, você está bem?
Maurício afagou seu gato junto comigo. Nossas mãos se tocaram por alguns segundos, o que foi o suficiente para que eu me assustasse com a eletricidade. Ele também sentiu, pois se afastou ao mesmo tempo que eu.
— Por incrível que pareça, eu me sinto ótimo. Se eu soubesse que iria me sentir aliviado desse jeito eu teria feito isso antes. Me sinto livre como nunca me senti. — Meu amigo abriu um sorriso para mim. Notei que seus olhos brilhavam. Ele realmente parecia em paz.
— Estou muito feliz por você.
— Eu bloqueei a Rayane em todas as redes sociais. Parece que ela entendeu o recado, pois parou de me procurar até no colégio.
— Isso é bom, talvez ela esteja tentando mudar. — Eu não contava muito com isso, mas tinha esperanças de que ela pudesse cair em si. Claro que a julgar pelo fato de que suas novas companhias não são as melhores pessoas do mundo, eu achava difícil que isso fosse acontecer tão cedo.
Nós não comentamos mais sobre o assunto afinal, nós tínhamos um trabalho a fazer. Como faltava pouca coisa, não demorou para terminarmos tudo. Tinha dado mais de dez folhas, mas valeu o sacrifício.
— Está com fome?
Eu tinha almoçado, mas já era quase 17h e meu estômago já começara a protestar. Fiquei com vergonha de dizer que estava com fome.
— Vem, minha mãe já deve ter preparado um lanche para nós. — Ele me puxou pela mão para fora de seu quarto quando notou que eu estava com vergonha.
Dito e feito, quando chegamos à cozinha, a mãe de Maurício retirava uma bandeja do forno que cheirava muito bem. A sua avó a ajudava pondo a mesa.
— Vocês querem ajuda? — Eu perguntei, observando a movimentação na cozinha.
— Não, querida. Sente-se. — Eliete pediu, me dando um sorriso amável. Aquele sorriso me fez pensar em como seria bom se eu tivesse uma família.
Até hoje não entendo o porquê do Amor ter me feito tão sozinha. A maioria das Almas que eu conhecia tinha uma família, mas eu não tinha ninguém. Aquilo me entristeceu de repente, mas eu tentei o máximo possível disfarçar para que Maurício e sua família não percebessem.
— Oba, vai ter cachorro quente de forno! — Manuela comemorou, encarando a travessa que Eliete tinha posto em cima da pia. Ela agora colocava os pães todos com cuidado em cima de uma bandeja bem bonita.
— Só porque tem visita hoje. — provocou Maurício, recebendo um tapa de sua mãe na nuca.
— Ai! — Ele reclamou, pondo a mão na nuca. Eliete o ignorou.
Manuela se sentou em minha frente, colocando as duas mãos em cima da mesa e me encarando de forma furtiva.
— Você e o meu irmão estão se pegando?
— Manuela! — exclamou Eliete, horrorizada.
— Eu quero saber também. — disse Ana, olhando-me com concentração.
— Mãe! — exclamou Eliete novamente assim que percebeu o quanto eu tinha ficado constrangida com a pergunta.
— Nós somos só amigos, parem com isso. — Maurício interviu, olhando feio para sua irmã mais nova.
— Pelo menos ela é mais bonita e simpática do que a Rayane. — Manuela se sacudiu na cadeira como se estivesse arrepiada — Aquela garota tem sérios problemas.
— Manuela... — Eliete advertiu, encarando a filha de modo severo.
— Vai dizer que é mentira? — Ana perguntou, colocando as duas mãos na cintura e apoiando sua neta. — Sejamos francos, ninguém nessa casa gostava dessa menina. Entrava muda, saía calada, nunca conversava com a gente e ainda queria proibir meu menino de sair conosco.
— Essa aí foi tarde! — completou Manuela, gesticulando de forma dramática.
Eliete suspirou, colocando a bandeja com a comida na mesa. Uma fumaça leve saía dos pães e um cheiro muito bom fez meu estômago se apertar.
— Tudo bem, eu não gostava dela, mas não aprovo que vocês deixem a Lyra constrangida desse jeito se não ela nunca mais vai querer vir aqui de novo. — Eliete sorriu enquanto afagava meus ombros e foi impossível não retribuir aquele sorriso. Eu me senti acolhida quando fui até a casa de Emily, mas ali no meio da família de Maurício era quase como se eu fosse fizesse parte da família dele.
— O que você fez com a sua sobrancelha e seus cílios? — Manuela me encarava fixamente de novo. Percebi que ela gostava muito de fazer isso comigo. Mais uma vez fiquei envergonhada com a atenção que eu recebia.
— Ah... — encolhi meus ombros, torcendo para que não me achassem uma aberração — É que eles nasceram assim.
— Nossa, eu nunca tinha visto algo desse tipo.
Para a minha sorte, todos se serviram da comida e esqueceram o assunto. Enchi meu copo de refrigerante e comecei a comer sem deixar de elogiar a comida de Eliete, pois realmente estava tudo muito saboroso. Temi que eles fizessem mais alguma pergunta sobre a minha genética, pois eu certamente não saberia como responder.
Não tiveram mais momentos constrangedores enquanto comíamos e ninguém mais perguntou sobre eu e Maurício. Esse era um outro assunto que me deixava extremamente nervosa, apesar de ser por um motivo diferente.
Me despedi da família de Maurício com abraços e beijos no rosto. As três pareciam ter gostado de mim do mesmo jeito que eu tinha gostado delas.
Apesar dos meus protestos, não consegui convencer Maurício a me deixar voltar sozinha para casa. Ele alegou que era perigoso andar sozinha por aquelas bandas agora que já havia escurecido e pegou sua bicicleta para me levar. Eu não morava tão longe da casa dele, mas a pé o trajeto até a minha casa dava uns bons 15 minutos aproximadamente.
A movimentação nas ruas tinha aumentado, pois muita gente voltava da escola ou do trabalho naquele horário, o que fazia as ruas ficarem lotadas de veículos e as calçadas de pedestres. Maurício pedalava rápido, fazendo um vento gelado e gostoso correr pelo meu corpo inteiro.
— A sua família é legal.
— Elas são bem doidas, isso sim. — Ele disse isso de um jeito carinhoso — Mas elas gostaram tanto de você quanto o Thanos.
— O Thanos é muito lindo. — Me lembrei de sua carinha fofa e pidona quando afaguei sua cabeça. Também lembrei do momento em que nossas mãos se tocaram. Um arrepio tocou minha espinha com a lembrança.
— Pronto, está entregue. — Maurício freou a bicicleta em frente à minha casa. Desci da garupa e lhe dei um beijo no rosto.
— Obrigada pela carona.
— Não é nenhum carro de luxo, mas dá pro gasto. — Ele deu uma leve risada enquanto olhava para a sua bicicleta. Ela era simples, mas muito bem cuidada.
— E quem disse que eu ligo pra luxo?
— Até amanhã, Lyra. — Ele se abaixou para beijar a minha testa.
— Até amanhã.
Entrei em casa flutuando ao perceber que ainda sentia o calor dos lábios de Maurício sobre a minha testa. Que droga, eu realmente estou apaixonada por ele.
O que eu vou fazer agora?
Encostei minha coluna na porta fechada e fui deslizando até chegar ao chão, me sentindo perdida pela primeira vez em semanas. Bati a cabeça na porta e fechei os olhos, pensando no que eu poderia fazer para neutralizar o que eu sentia.
Assustei-me ao ouvir um barulho agudo que vinha do andar de cima e corri, pois claramente era de lá que vinha o som. Abri a porta do meu quarto com as mãos trêmulas, notando que o barulho vinha do comunicador que estava em cima da minha cama.
— Hahue, é você? Está tudo bem?
— Lyra, o plano deu certo. — disse Hahue baixinho com o rosto grudado na tela — Slahat foi capturado.
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