🌻VINTE E QUATRO🌻

  

Emma

 Ouvir os gêmeos discutindo sobre dirigir ou não dirigir, e Eliza vasculhando mais doces na cozinha, me deixou enjoada.

Eu ainda estava encharcada, e toda aquela chuva, sujeira em minhas roupas e machucados estavam me dando agonia. Eu podia vomitar no carpete naquele momento, se não fosse pela discussão dos gêmeos ter acabado.

— Tomamos uma decisão! — Chris saiu do mini-bar e correu para a sala, na qual eu estava sentada.

 Nathan saiu por trás de Chris e tomou as chaves de sua mão, que balançavam feito um chocalho, e resmungou:

 — Eu tomei a decisão! — Ele repousou sua mão no meu ombro. — Não vamos dirigir um carro, Chris está louco. — E lançou um olhar de repreensão para Chris, que retribuiu com raiva:

 — Tem uma idéia melhor?! Nosso melhor amigo está em algum lugar por aí e estamos parados sem fazer nada! A Emma está quase vomitando no sofá! — Apontou para mim. — E Eliza tá lambendo o lado de fora de um vidro de jujubas!

 — Isso não significa que podemos roubar o carro do papai e sair dirigindo por aí sem carteira de motorista! E a Jasmine?! Ela nem sabe de nada do que tá acontecendo! — Nathan respirou fundo e tirou do bolso seu celular, e começou a deslizar o dedo na tela com raiva. — Eu vou ligar para o papai pedindo para que ele nos ajude, e depois eu vou ligar para a Jasmine e contar o que tá acontecendo. Ponto final!

 Enquanto Chris bufava e se jogava no sofá, eu me levantei e fui até a cozinha, com o objetivo de achar um pano, molhá-lo com o máximo de álcool em gel ou qualquer outra coisa que tenha um cheiro bom, e limpar os machucados.

 Bom, esse era meu objetivo até ver Eliza enfiando duas jujubas no nariz.

 — Eliza! — Corri até ela tirei as jujubas. Ela tentou pegar mais algumas dentro do vidro enquanto eu jogava as jujubas sujas de meleca no lixo, mas eu cheguei a tempo e dei um tapa em sua mão, fechando o pote logo em seguida.

 Podia ouvir Nathan falando com alguém no telefone, mas não distingui se era com o pai ou com a Jasmine.

 Comecei a abrir as gavetas a procura de panos, e achei uma toalha vermelha no armário embaixo da pia. Agora só faltava um líquido.

 Enquanto eu vasculhava, Chris percebeu o que eu estava fazendo, e se levantou do sofá, indo até a cozinha.

 — Aqui, é um sabão líquido misturado com algumas coisas que eu não sei o que é. Enfim, nossa mãe usa pra limpar machucados. — Ele por fim, respondeu, retirando de dentro do armário um frasco com um líquido espesso e rosado dentro.

— Obrigada. Eliza, vem aqui! — Me virei de costas para limpar as feridas da Eliza, mas ela tinha se sentado no chão com as pernas pro ar encostadas no balcão.

— Será que as nuvens são feitas de algodão, e os produtores de algodão doce só colocam açúcar, enrolam num cone de plástico e vendem? — Ela disse, reflexiva.

Respirei fundo, e me sentei no chão ao lado dela, enquanto abria o frasco e derramava o líquido rosa na toalha.

— Que merda de noite, só queria um banho agora. — Murmurei, olhando para Chris que se sentava ao meu lado. — Tá me dando agonia ver Eliza toda suja, e mais agonia ainda de saber que a mesma sujeira está em mim também! Além disso o Log... — Mas não deu tempo de eu terminar de falar e Eliza me interrompeu:

— Eu já comi algodão com açúcar uma vez.

 Chris deu uma risada, e começou a me acalmar:

— Emma, você tem que ficar calma. Eu sei que é mais fácil falar do que fazer! — Ele completou rapidamente, pois fiz uma cara feia pra ele. — Mas lembre-se, você está aqui, toda suja, meio molhada pela chuva e com machucados, por uma pessoa! O Logan, seu namorado, talvez a única pessoa que você já conheceu na sua vida que te ajudou a amenizar o seu TOC. Olha só toda a sua evolução! Eu tenho certeza de  que a Emma do passado estaria tendo um ataque e se debatendo no chão se estivesse toda suja assim. Já agora, você está apenas reclamando e emburrada. — Ele se aproximou de mim, e com os dedos indicadores de cada mão, fez um sorriso nos meus lábios, os levantando para cima.

Admito que quando ele tirou os dedos de lá, minha boca ainda continuou com um sorriso.

 — Você tem razão. Eu posso fazer esse esforço pelo Logan. — Me virei de costas novamente e fiquei de frente para Eliza.

 Escutei Chris se levantar, e ele colocou uma de suas mãos no meu ombro, dizendo:

 — Você já está fazendo.

 Ele saiu para a sala, na qual eu continuava a ouvir Nathan falando com alguém no telefone, só que dessa vez mais calmo.

 Chris tem um poder magnífico de reconfortar as pessoas. Admiro essa habilidade nele.

 Comecei a tatear o chão a procura do frasco, mas quando eu olhei para as mãos de Eliza, TCHARAM! ele misteriosamente estava lá.

 Mas não foi isso que me deixou mais preocupada. Foi que Eliza estava com um fio de líquido rosa preso no canto da boca.

  Sério, o que esse tombo fez com a Eliza?! Ah, nem sei porque me pergunto mais, nem deve ter sido o tombo, e sim a loucura dela mesmo.

 — Eliza!! O que...O QUE?! — Arranco o frasco de suas mãos, e começo a limpar suas feridas sem paciência.

 — Queria ver se tinha gosto de iogurte! — Ela respondeu na defensiva.

   Bufei e continuei limpando. Ela vai me agradecer depois com um estoque de chicletes sabor cereja!

 Quando estava terminando de limpar o joelho de Eliza, Nathan vai até a cozinha e se senta em cima do balcão.

 — Bom, meu pai disse que já está vindo pra cá. Vamos guiá-lo com o rastreador. — Ele explicou antes que eu perguntasse. — Jasmine disse que está muito preocupada com o Logan, mas está na casa da tia com os pais, que fica do outro lado da cidade, então não tem como a gente buscar ela. Por outro lado, podemos mandar mensagens para ela enquanto enfrentamos essa terrível e grande jor...

 — Tá, tá. Já acabou com o drama? — Chris se jogou no irmão, na qual saiu de cima do balcão com a cara fechada.

— Só estava tentando aliviar o clima.

 Concordei com a cabeça com o que Nathan havia falado. Não sobre aliviar o clima, e sim sobre o pai deles estar vindo.

 Não tinha como aliviar o clima, muito menos me aliviar.

  Passado trinta minutos, uma luz se reflete na janela da sala, na qual eu estava sentada no sofá batucando os dedos em uma almofada.

 Eu havia me limpado o máximo que pude, mas minha vontade era pedir aos gêmeos se eu poderia tomar banho ali mesmo. Mas ficaria um pouco desconfortável, tanto pra eles como para mim também.

 Ouvi a porta do carro bater, e a sombra de um homem alto se produzir no piso, a seguir do barulho da porta abrindo.

 O pai do Nathan e do Chris era alto, e assim que ele fechou a porta, pude notar uma tatuagem em seu antebraço esquerdo: um totem na qual havia um cervo, um lobo, um corvo e uma borboleta azul no topo.

 Ele tinha os cabelos de um tom castanho bem claro, e seus olhos eram igualmente da cor do cabelo, na qual se encontrava todo despenteado. Em seu rosto havia uma barba mal feita, e suas roupas estavam amarrotadas, principalmente a blusa vermelha xadrez que ele vestia por cima de uma camiseta preta de uma banda de rock que eu desconheço totalmente.

 Ele tinha um aspecto pacífico, e pude comprovar isso assim que ele gargalhou, dizendo:

— O que vocês aprontaram dessa vez hein? — Então seu olhar se dirigiu a Eliza, que estava apoiada no balcão do mini bar, parecendo uma bêbada que queria tomar mais uma dose. — Eliza bebeu shampoo de cachorro pensando que era achocolatado de novo?

 Mas Eliza apenas sorriu e afundou sua cara no balcão novamente.

 — Pai! Eu já te expliquei o que houve por telefone! — Nathan saiu detrás do sofá e colocou suas duas mãos nos meus ombros. Os gêmeos gostam de tocar em ombros, inacreditável. — O Logan desapareceu, e nós tivemos a ideia de achar ele através do rastreador que você deu para nós meses atrás.

 — Ah sim, eu sei. Deixe-me antes conhecer a amiga de vocês. Emma não é? — Ele sorriu e esticou o braço com a tatuagem para mim.

 — Sim, olá. — Eu apertei sua mão.

 — Okay, okay. Bom, me chame de Brody. Não precisa me chamar de senhor, nem de tio, que coisa brega. — Ele riu mais alto ainda, e eu sorri. — Tá bom, vamos lá, sem enrolação. Todos entrando no carro!

 Sem demora, ele tirou as chaves do carro do bolso dele (que talvez era a original, e a do gancho de chaves era uma cópia), girou no dedo indicador e abriu a porta dando passagem para todos saírem da casa.

 Tive que puxar a Eliza e empurrá-la, na qual veio uma pergunta do Brody:

 — A Eliza tá bem? Parece grogue. — Então ele olhou para nós quatro — Vocês drogaram ela? Sem me chamar?!

 Nathan riu e Chris soltou uma risada tão alta quanto a do pai.

 — Brincadeira, eu jamais drogaria alguém. Bom, não o impediria de tomar uma, ou outra, é claro. Sabe, os pais de hoje em dia são tão chatos, na minha época eu bebia todo o tipo de coisa que você pode imaginar, eu já bebi até... — Brody continuou falando sobre a adolescência dele, se dirigindo toda a conversa a mim, enquanto abria as portas do carro.

 Era um SUV, daqueles perfeitos para acampar, o que me fez a fazer uma pergunta espontaneamente, cortando Brody de falar que já beijou o melhor amigo dele enquanto estava bêbado com dezessete anos:

 — Vocês acampam muito? — Enquanto perguntei, fui entrando no carro, no banco de trás, com Chris e Eliza depois de mim.

 — Ah sim! Todo feriado costumamos tirar um tempo para fazer uma viagem, e normalmente essas viagens são acampamentos. Emma, não se importe com toda essa tranqueira aí no porta-malas e no último banco. Parte dela é coisas de acampamento e minha velha guitarra. — Ele respondeu, se acomodando no banco do motorista enquanto Nathan se sentava ao seu lado e mexia no celular com rapidez.

— Você tinha uma banda? — Perguntei.

 — Papai? Sim! Ele arrasava, e ainda arrasa quando pedimos pra ele tocar um pouco. — Chris falou. — Ele apelidou a guitarra de Cherry: arrasadora de ouvidos.

— É, isso aí. Minha banda se chamava Bright Red. Foi lá que eu conheci a mãe deles, sabia? Foi num verão na qual... — E continuou mais uma longa história, enquanto já dirigia o carro pelas ruas.

As histórias do Brody eram legais, e admito que me fizeram rir várias vezes, afastando um pouco o meu nervosismo. Parecia que estávamos em uma viagem em família.

 Chris já tinha acessado o rastreador minutos atrás, e Nathan estava digitando sem parar, falando com Jasmine sobre toda a situação. Já Eliza, dormia tranquilamente no meu ombro.

 Já estávamos na metade do caminho onde o rastreador estava localizando Logan, e uma onda de medo começou a bater dentro de mim.

Eu não faço idéia de onde ele poderia estar.

 Meu estômago tornou a embrulhar, e o gosto de bile começou a subir pela garganta. Mas antes que eu pudesse dizer alguma coisa, Eliza se remexeu do meu lado e acordou. Ela estava quieta, e olhei para seu rosto, que começou a ficar em um tom alaranjado, e depois vermelho.

 Ela ia vomitar.

 — Para o carro! — Gritei para Brody, que freou imediatamente.

 Abri a porta do carro no mesmo momento em que Eliza caiu no chão de asfalto e vomitou um estranho líquido rosa bebê, e...

 Não tive tempo de reparar no restante do vômito da Eliza, pois saltei do carro, e curvei meu corpo, apoiando as mãos nos meus joelhos, vomitando também.

 Eu podia sentir qualquer coisa naquele momento, até ter um ataque, mas nada me ocorreu a mente a não ser que estávamos perdendo tempo.

Um flash de luz veio as minhas costas, e quando me virei, pude ver Chris tirando uma foto com o celular, dizendo animado:

— Primeira foto da Eliza e da Emma vomitando juntas! — E mudando a câmera para tirar uma selfie, fez uma pose e bateu a foto.

 Resmunguei um palavrão e fiz uma careta, limpando a minha boca com a manga da blusa.

   Se estaria sujo de vômito? Que se dane. Eu já estava horrível, e nem por isso tive um ataque. Talvez essas consultas e os remédios estavam ajudando, ou talvez, bom, tenha sido o Logan esse tempo todo.

 Logan. Precisamos ir achá-lo.

Respirei fundo agarrando Eliza pelo pulso, que me olhava feito uma boba com a boca aberta, e aos questionários de todos que estavam no carro, entrei novamente e me sentei no banco.

 Depois de muitas perguntas de todos preocupados se eu estava bem ou não, o carro ficou em silêncio pela primeira vez.

 Eliza parecia estar voltando ao normal, pois suas pupilas antes dilatadas, agora se encontravam normais, e olhava ao redor, como se estivesse observando um monumento interessante, tipo um cocô de dinossauro fossilizado. Ri internamente com esse pensamento. Seria uma coisa que com certeza interessaria Eliza.

 Comecei a notar, inesperadamente, que o céu (antes alaranjado e denso), agora estava começando a ficar escuro, tal como pequenas estrelas começaram a surgir em alguns pontos pelo céu.

 O ar continuava frio, e o carro por mais aconchegante que fosse, eu não conseguia descansar nem por um minuto.

 Seria um clima perfeito para fazermos uma viagem juntos, jogando, comendo (e quem sabe eu me deixaria levar por um pouco de bebida), se Logan não tivesse desaparecido.

 Depois de alguns minutos, Brody respirou fundo, e a personalidade divertida e calma que ele tinha, mudou repentinamente para uma voz fria, tão fria quanto o frio que fazia lá fora:

 — Chegamos.

 O carro começou a desacelerar, só que eu  ainda não conseguia enxergar onde estávamos.

 Mas quando minha visão se acostumou com a claridade do local, que por sinal era bem iluminado, eu pude ver o que estava escrito na enorme placa indicando o nome do estabelecimento. E nesse momento, meu coração acelerou tão rapidamente que eu achava que poderia desmaiar.

Estávamos em um hospital.



    Capítulo 24 concluído ✔
   Capítulo 25 ⬇️
  

  

  

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