OVER AGAIN


No meio da viagem Valerie olhou para o caderno digital, estava escrito em tela cheia "OVER AGAIN" em letreiros negros em um fundo dourado, finalmente estava voltando para casa, "OVER AGAIN" deveria ser o ponto zero, o lugar de onde partiu, sua casa, sentia a coisa mais horrível do mundo, parecia estar em uma corda cósmica, uma extensão deformando o espaço-tempo por completo, era como estar em um mundo subvertido, porém a sensação de voltar para casa fazia com que suportasse aquela dor que parecia desintegrar seus átomos constituintes de sua matéria.

Estava tonta e enjoada, e olhando em volta de si estava mais uma vez no passado de Arley, no mesmo lugar com o air car estacionado, mas a experiência agora era outra, parecia estar em um jogo, poderia ser uma realidade virtual e nada mais, sua mãe adorava dizer que não passamos de uma grande simulação do universo interligados e impulsionados por redes neurais eletroquímicas, era uma neurologista respeitada, embora muito reservada e neutra com suas teorias.

-Pelo visto consegui trazê-la novamente, eu tinha feito os cálculos errados, por isso você foi parar no vácuo, peço perdão por colocar sua vida em risco, sua avó e aquelas contas sempre me pegaram [...]

-Espere! Como me fez voltar ao tempo? Os guardiões dos "Táquions" não podem usá-los, isso é vetado. E o que é você? Alguma inteligência artificial forte? Como sua memória e seu corpo permanecem se já está morto?-Indagou Valerie Weiss interrompendo as falas do homem que supostamente seria seu avô paterno.

Um silêncio tomou conta do local, Valerie estava um pouco mole, e viu ali aquele homem chorar, abaixou-se diante da garota para abraçá-la, que por sua vez resolveu tocar as lágrimas, queria ter certeza de que eram reais, os óculos do avô caiu no chão, uma velha agenda parecia estar repleta de contas, incluindo o cálculo do mais famoso E=m.c², em que E era a Energia, "m" a massa do corpo e "C" a constante de velocidade da luz, tudo parecia um mistério sem fim, enquanto isso o tempo lá fora corria, não sabia quanto tempo tinha se passado, como o Relógio do Juízo Final já se aproximava da meia noite, talvez o restante da sua família já nem exista mais, e ela estava presa naquela cadeia de portais sem saber de nada. Frustrada tentou enfiar a cabeça no tablet, mas não era possível ser sugada novamente pelo Touchscreen.

-Os "Táquions" ou partículas antimatéria não são a única forma de viajar no tempo, e aliás um dia não passaram de erro científico, o conhecimento é algo muito amplo, e teorias não são verdades absolutas, portanto por mais que o prefixo "a" em Biologia costume ser uma negação, isso nem sempre é verdade, pode ser um "7" da escala de pH para um Agnóstico. É possível distorcer o espaço-tempo, a geometria Euclidiana não se demonstra absoluta para grandes dimensões, então entramos nos quantas, embora uma viagem no tempo exija energia infinita, sabemos que um quantum é suficiente para impulsionar partículas subatômicas, logo nada como uma transformação de massa e energia em módulos negativos para deformar a quarta dimensão e trazê-la de volta ao passado, com isso a coloquei em cordas cósmicas desdobrando o espaço-tempo até esse passado, e penso que isso resolverá seu problema para ir embora, no entanto em módulo progressivo.-Disse Donald como se a menina fosse sua orientada de doutorado.

-Isso explica a dor terrível que senti para voltar até esse mundo! Mas você ainda não me disse o que é tudo isso, não me explicou como alguém já falecido pode estar projetado em minha frente com matéria em três dimensões, com consciência contínua, e muito menos qual é o objetivo disso tudo.-Falou a menina chorando e tentando retirar a IA de seu corpo.

Donald pegou a garota no colo e saiu em direção ao maquinário de viagem "Anos-Luz", era a mesma caminhada, as mesmas pessoas gritando por uma cura, e o mesmo olhar de culpa.

-Eu poderia dizer que sou o fruto da arrogância humana, filho do ego, mas eu quero que a senhorita chegue ao nível mais alto da academia, se não ao mínimo PhD. Assim como muitos daqueles que recebem altas titulações acadêmicas deixam-se levar pelo alto egocentrismo, isso ocorreu comigo, quando comecei era apenas um entusiasta apaixonado, mas conforme se aumenta o conhecimento a sensação de poder é cada vez maior, assim também aumentei os riscos dos meus experimentos, depois que o "biótico" se alastrou entre o povo a crença no conhecimento teve seu decaimento, não só em Arley.

Sua avó sempre me deixou claro que as melhores memórias que deixamos estão com aqueles que conviveram conosco, mas eu insisti que queria ter minha memória estabelecida em energias cósmicas por redes neurais eletroquímicas, de alguma forma as ondas continuam, assim como minhas memórias. - falou o homem para a garotinha que já tinha retirado o dispositivo de IA do corpo e ouvia tudo em silêncio com o coração acelerado.

-Lhe compreendo, no entanto acredito que titulações não sejam o suficiente para tornar uma pessoa arrogante por si, no entanto assim como o senhor creio que a Ciência deva ser uma reta aberta para inúmeras possibilidades. Vejo que já estamos chegando na hora de adentrar ao portal mais uma vez, no entanto me seria adorável partir para casa sem a dúvida do que é tudo isso aqui!-disse Valerie olhando para ele com as pupilas dos olhos dilatados e aguardando por respostas.

-Como eu te disse no instante anterior, eu e sua avó desbravamos a linha do espaço–tempo, embora seja uma simulação que beira ao virtual, conseguimos com a inteligência artificial com base em dados antigos de uma brasileira que simulou buracos negros com IA em séculos passados, e por meio dessa tecnologia antiga criamos estrelas de Neutrons e um Buraco Negro e seus horizontes de vento na curvatura do espaço-tempo por meio de juntas de partículas, que assim como eu são meras energias constituídas em matéria para abrigar o nosso povo quando chegada a hora da virada do Relógio do Juízo Final, e aqueles que chegassem na última fase poderia mudar o passado, o futuro, e portanto o presente, e devemos isso a você que chegou até aqui e agora parte para a fase em que cabe a você transformar o mundo das ideias do povo, adeus Valerie.-disse ele colocando ela na vala que a transportaria mais uma vez pelo espaço-tempo, a dor era terrível, não sabia como não tinha toda a sua matéria desintegrada, mas agora acreditava que poderia chegar em casa de alguma forma.

Agora estava mais uma vez em seu quarto, no entanto agora era tudo diferente, parecia uma cabine de controle, a casa estava super silenciosa, se estava diante de um Buraco Negro, era preciso saber quantos anos tinham se passado aqui na Terra, embora o tempo seja relativo, era doloroso imaginar a partida de seus pais, de seu povo como um todo, mas de fato ela nada poderia fazer, porém uma coisa era certa, estavam em guerra, aquela cabine de controle não era normal.

-Fico feliz com sua volta, Valerie! Chegou em tempo do ritual de passagem, imaginei que tivesse atravessado o portal da realidade da distorção do espaço-tempo, e com isso fez uma viagem pela quarta dimensão, mas papai sabia que chegaria hoje. -disse o pai dela com um jaleco preto apropriado ao seu tamanho em mãos e com a mesma voz tranquila de sempre.

-Será o ritual do crematório do corpo da vovó?-Questionou Valerie com um semblante inexpressivo para o pai que tinha seus cabelos negros arrumados como se fosse para uma defesa de doutorado.

-Não! Isso foi há quatro anos, hoje você já está com 11 anos, é chegada a sua hora de fazer a jura mediante a Ciência, hoje também torno-me PhD em Astrofísica, as cinzas de minha mãe estão em um memorial. -disse ele com um sorriso no rosto entregando as novas roupas da cerimônia para a filha.

-E onde está a mamãe?-perguntou a menina dando falta dela.

-Depois veremos a mamãe, vá se arrumar!-Ordenou o pai demonstrando desapontamento com aquele questionamento, como contaria para a filha sobre a mãe era um mistério ainda, seria doloroso.

Valerie era obediente, não queria desapontar o pai, dando falta do cor-de-rosa de seu quarto retirou-se dali de imediato, de mãos dadas com o pai seguiram para o saguão sendo levados por guardas costas, os homens usavam branco e as mulheres preto, aquilo poderia indicar um retrocesso para a humanidade. Após a cerimônia de titulação de seu pai em Astrofísica era chegada a hora de sua jura de amor eterno pela Ciência, mas aparentemente teria de ler um papel, não seria espontâneo como sua avó lhe ensinou um dia.

-"Juro solenemente amor eterno para e pela Ciência, com isso juro respeito e devoção para com todas as Ciências, buscando sempre a verdade, e o cumprimento com as ordens e os métodos empíricos que levam às descobertas científicas e da verdade absoluta. Assim como aqueles que aceitam as revelações têm uma história, aceito que a Ciência tem sua história e um lugar, portanto juro dedicar toda a minha vida independente das circunstâncias mediante a Ciência e somente para ela em serviço de um povo sem olhar a quem". - Disse Valerie acrescentando a parte "do serviço ao povo" estranhando a jura que não costumava ser daquela forma.

A plateia ficou em silêncio, nervoso seu pai garantiu que a filha tinha aprendido com a mãe, como tinha acabado de regressar não pudera saber o que teria de fazer, sendo assim o pai da garota a fez realizar novamente a jura, dessa vez de joelhos e sem acrescentar nenhuma outra palavra ao juramento sagrado daquela cátedra. Após a realização, aplausos e rosas sem acúleos foram direcionados para a pequena agora discípula da Cátedra e nova guardiã da tese dos "Táquions", Valerie Weiss, igualmente tinha uma vaga garantida no curso de Ciências Naturais, englobando a Física, a Matemática, a Química e a Biologia, era preciso continuar o legado de sua família.

As pessoas ali não usava mais roupas coloridas, pareciam estar em um campo de batalha, talvez uma grande batalha da Ciência, os portões não estavam mais abertos, todos eram fechados e controlados por máquinas, ela também sentiu falta das plantas, mas foi quando ouviu um grande estrondo e todos correram é que compreendeu tudo.

-A mamãe morreu na guerra que ocorre agora?-perguntou a garotinha triste ao pai pegando em sua mão direita enquanto seguiam para seus aposentos.

-Não! Sua mãe passou para o outro lado, agora ela está ao lado dos tiranos, e trabalha para provar que nada aqui é real, grande parte da Ciência hoje é para o governo, compreendo sua repugnância mediante o juramento, mas compreenda que se não sentiu então não jurou a verdade, lembre-se disso. -disse ele pegando seu pequeno ser no colo e avançando para os seus aposentos.

-Então a mamãe agora faz parte daquele grupo radical "anti-ciência", que não crê na verdade empírica?-perguntou ela desapontada.

-Não crer em algo não significa ser "anti" algo, embora sejamos ateus referentes a existência de uma deidade, mas cremos nas energias que formulam o Universo, e não somos contra aqueles que cultuam outras formas de existir o mundo, mas sim, ela se juntou aos que desejam o fim das cátedras acadêmicas, não querer frequentar algo é diferente de querer destruir algo ou alguém que não tem culpa dos seus problemas interiores, e isso é ruim. Você é livre para amá-la, e mesmo sendo nossa filha é livre para escolher sua jornada pelo Universo. -disse o astrofísico colocando a filha na cama e fechando a porta.

-A culpa é toda do vovô Donald, não é? Foi por conta dele que a crença na verdade científica começou a cair em Arley e no mundo? Ele é o culpado por espalhar o "biótico" pelo planeta um pouco antes da minha chegada, não é?-perguntou a pequena cientista ao seu pai e guia.

Respirando fundo Sirius abraçou a filha, fechou seu jaleco indicando que era daquela forma que deveria se portar com segurança em um laboratório, e prosseguiu dizendo: -Na Ciência, assim como não podemos creditar apenas uma pessoa por um belo feito à humanidade, também não podemos culpar uma única pessoa por tudo que deu errado em uma pesquisa, embora seja meu pai, mas aqui mantenho minha jura pela verdade. As pessoas estavam ficando doentes cerebralmente, logo ele achou que manipular um "biótico" capaz de parasitar e estimular o sistema neuronal do povo resolveria o grande problema da humanidade que as fazem perderem o brilho no olhar, mas sua equipe não teve muito cuidado com a segurança, sem saber que tinha em mãos uma bactéria letal, de rápida reprodução embutida no seu parasita recém descoberto, então isso alastrou-se pelos arredores, até tornar-se global, ele foi uma das primeiras vítimas de sua própria engenhoca, bastou uma placa de Petri partir, foram dias de luta contra a própria descoberta em seu corpo, eu estava lá quando foi chegada a hora final, é por isso que prefiro desbravar os cálculos à vida, mas ele tentou, o povo exigia dele a cura para tudo aquilo, mas ele partiu antes que sua equipe conseguisse reverter tudo aquilo [...]

-Mas como isso poderia levar um povo a não crer mais nas Universidades, na Ciência, hoje estamos na Era da Informação Complexa, tudo é interligado, abandonados a Era Contemporânea?!-Disse a menina interrompendo o pai.

-Ter muitas informações não significa filtrá-las, ou ter conhecimento consolidado, é mais importante ser profundo em uma única área a conhecer apenas migalhas de tudo. A briga do povo em Arley e pelo mundo não está apenas na descrença na Ciência, e no desejo do fechamento das Cátedras Acadêmicas, o Relógio avisava de forma neutra, a causalidade também está naqueles que desejam a tirania, e dos governos que desejam somente a si no poder, e a melhor forma de controlar um povo é domando sua visão e lhe colocando um cabresto para uma única direção, é fácil ter soldados a seu favor quando você é a única fonte de conhecer o mundo ao redor deles, é como estar no Mito da Caverna, portanto a tirania tem distorcido informações afastando o povo da busca pelo conhecimento, e direcionando o povo pela busca do conforto e da servidão em prol de seus interesses de poder absoluto. -disse Sirius olhando nas profundezas dos olhos inocentes.

-Então precisamos abrir novamente a mente do povo, é a única forma de libertá-los, é preciso que sejam autônomos e não autômatos como aqueles que vivem como máquinas de guerra, é preciso mostrar que é preciso respeitar as inúmeras formas de conhecer a existência. -disse ela olhando o pai, que por sua vez assentiu positivamente, abraçando-a para reduzir os impactos dos grandes estrondos que vinham lá de fora, era preciso solucionar tudo aquilo pela paz mundial. 

2448 palavras 

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