Capítulo 27 - Tormenta
Ficou longe, não se aproximaria por um tempo, queria ver o que iria acontecer se ficasse longe dela.
O tempo era difícil de se calcular, aquela forma tinha suas desvantagens, quando estava conectado a ela, tudo pareceu voltar, os sentidos, as sensações, a compreensão do plano terrestre, tudo, mas agora que estava longe, essa compreensão voltava a ficar embaçada.
Era como se visse o mundo através de um vidro fosco e isso o estava atormentando, sentia que talvez se não se mexesse, se não fizesse algo, logo sumiria e não queria deixar isso acontecer.
***
Ela ofegava, tinha corrido muito atrás do rapaz, ele parecia ter sumido na multidão, se afastou dos corredores indo em direção ao pátio e refeitórios, parou olhando ao redor, procurando, não havia mais ninguém, todos já tinham entrado dentro de suas salas.
Continuou procurando, correu até as escadas afastadas dos fundos que iam dar na caixa d'água, quando chegou perto, viu um deslumbre de pés que subiam pelas escadas, Helena correu atrás dele, tinha uma ideia do que ele queria fazer.
Tinha cogitado isso em suas suspeitas, em como o assassino matava agora em sua forma fantasma, quando o viu daquela vez ele não empurrou ou pareceu fazer nada para Daniela se jogar na rua daquela forma, ele só pareceu falar com ela, então Helena suspeitou que ele influenciava as pessoas assim, as incentivando a cometer suicídio.
Talvez diferente dos filmes e tudo mais, ele naquela forma, não poderia machucar ninguém fisicamente, somente influenciar suas decisões e faze-los se machucar sozinhos.
Pensou em tudo isso enquanto corria pelas escadas, não era o tipo que praticava exercícios físicos, então aquela pequena corrida já estava cansando demais. Quase sem fôlego, chegou ao telhado.
Tinha um pequeno espaço que dava para andar, entre a beirada e as telhas, o rapaz tinha seguido esse pequeno corredor de concreto e estava indo até a borda esquerda, estava há uns 10 metros de distância de Helena, quase chegando na beirada.
Ela correu enquanto gritava.
"Espere por favor! Não faz isso!"
O rapaz não parou de andar, mas virou-se para encarar Helena, seus olhos pareciam perdidos em dor e agonia e ao mesmo tempo pareciam vazios, sua expressão era como um pedido de socorro.
Sentiu uma brisa gélida anormal e atrás do rapaz uma sombra começava tomar forma, Helena arregalou os olhos...
***
Cinco dias, havia passado cinco dias que Marcos seguia pelo mesmo caminho todos os dias, todos os dias seguia o caminho que David fazia para voltar da escola, depois refazia o caminho ao entardecer, perto da hora em que David devia ter desaparecido, ele refazia o caminho sempre observando, procurando algo que o fizesse descobrir o que havia acontecido com David.
Ele não podia simplesmente aceitar aquilo, aceitar a situação, assim que perceberam que David não voltaria, os pais de David o levaram para casa e seguiram para informar seu desaparecimento.
Aquilo tudo não parecia real, sua mente não conseguia processar o que tinha acontecido, para ele era como se David fosse mandar uma mensagem a qualquer momento pedindo desculpas pelo atraso e que era um idiota em fazer Marcos esperar assim, mas isso não aconteceu.
Aquela noite não conseguiu dormir, não conseguia desligar a sua mente, ela estava chacoalhando e balançando como um barco em alto mar que estava sendo atormentando por uma tempestade.
A qualquer momento sentia que iria afundar.
Sua mente estava em um estado tão perturbado nos primeiros dias que não se lembrou, mas depois de continuar a seguir o caminho de David, no quinto dia ele percebeu algo, parou de repente em frente a casa de David e olhou para todos os lados na rua.
Olhou a hora, vários carros estavam estacionados para pegar as crianças do primário na frente da escola. Marcos sempre se ligou em carros, então revisou mentalmente todos os carros ali parados, observou todos que estavam parados agora, e observou também quem dirigia.
Todos os carros que estavam ali eram praticamente novos, todos dos últimos 5 anos pelo menos, todos os pais que dirigiam e esperavam estavam na casa dos 40 anos, talvez, era estranho, mas não tinham avós aparentes.
Marcos pensou um pouco mais, se lembrando de cada palavra, cada palavra que agora parecia uma afirmação obvia demais, como se quisesse ficar acima de qualquer suspeita e soubesse dizer exatamente o que fariam as outras pessoas aceitarem, aquele homem, em todos esses dias Marcos não o viu sequer uma vez, nem seu carro.
Se lembrou da semana retrasada, depois deles terem ajudado aquele homem, lembrou de Bruno fazendo piadas com Marcos e enchendo David dizendo se ele não tinha visto o cara para pegar o número e passar para Marcos, David não caia nas provocações de Bruno e pedia para parar de irritar Marcos, mas ele admitiu que o via com certa frequência em seu bairro.
Um homem que eles nunca tinham visto antes daquele dia, e que depois daquele dia, somente David dizia ter visto.
Correu para o mercado, tinha mais uma coisa que tinha de confirmar e torcia para conseguir.
Chegando no mercado, foi até a caixa, quase sem esperanças perguntou.
"Oi, desculpa perguntar, mas você viu por aqui esses dias um cara com um carro antigo, talvez com uns quarenta anos, boa aparência, ahh olhos verdes..."
"Tá falando do bonitão do escort? Você o conhece? Minha amiga tava doida para pegar o número, eu não cheguei a ver ele, estava de férias e voltei agora, mas tem quase uma semana que ela tá me enchendo dizendo que ele nunca mais apareceu."
Marcos arregalou os olhos, ele tinha acertado, não estava acreditando.
"Sim, esse mesmo, então tem quase uma semana que ninguém vê ele por aqui?"
"É, ela disse que ele tinha se mudado para cá para cuidar da avó doente, e que estava procurando emprego, por isso estava andando muito por aqui, sério, ela ficou tão obcecada que perguntou da vida toda do cara, mas não vou julgar, é muito difícil encontrar um cara naquela idade solteiro e sem filhos..."
Marcos saiu correndo sem dizer mais nada, as histórias... eram totalmente diferentes, ele contava a história que fosse conveniente para o momento, agora Marcos sabia, nunca agradeceu tanto por seu pai ser um retrógado preconceituoso que obrigava o filho a ter esse hobby por carros, para ele ser mais homem, por que agora Marcos se lembrava exatamente de cada detalhe, placa, cor, tudo, ele saberia dar uma descrição completa para a polícia, inclusive a descrição completa do homem que agora ele sabia, tinha levado seu melhor amigo.
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