Sentiu dor ao bater as costas na ponta da pedra mergulhada no poço, o impacto a fez perder o ar e ofegar enquanto mergulhava na água escura a fazendo perder a consciência por um momento.

Acordou se debatendo devido ao fato de não conseguir respirar, Helena se debatia tentando encontrar algum apoio, as pedras estavam escorregadias demais, ela tentava se agarrar e sentia a sujeira penetrar nas unhas enquanto arranhava furiosamente as pedras e parede do poço.

Em algum momento conseguiu emergir, pelo menos erguer a cabeça o suficiente para respirar ofegando forte, não tinha engolido água, talvez o golpe que a fez perder o fôlego e consciência a ajudou.

De repente parou de se mover, congelando onde estava, a água batendo em seu queixo, ela tremia mais de medo do que de frio, devagar olhou para cima, estava com medo dele estar lá olhando para ela, esperando. Mas quando olhou não tinha ninguém, somente o céu com nuvens escuras que aparecia entre as árvores e parte da estrutura da estufa destruída.

Tentou pensar, olhou ao redor, procurando por algo para ajudar a erguê-la do poço, encontrou raízes que desciam até o fundo, como cipós, elas estavam do outro lado do pedaço de pedra, Helena tentou se acalmar e ir com calma para não escorregar, chegou as raízes as agarrando respirando fundo.

Quando ia começar a escalar sentiu um frio súbito e congelou novamente, segurou a respiração em expectativa, aquele era o mesmo frio que sentia quando David estava por perto, fechou os olhos agarrada as raízes rezando para ser David e não o outro.

A expectativa da espera a estava matando de ansiedade, o frio estava se intensificando, seus dentes batiam mesmo ela estando com a boca fortemente fechado.

"Helena?"

Ouviu uma voz fraca chamar, a voz de David.

"Aqui embaixo!"

Ela conseguiu gritar, olhou para cima, David apareceu, tinha os olhos arregalados em espanto.

"Droga, você está bem?"

Ela suspirou se agarrando as raízes.

"Sim, eu acho que sim."

"Eu não... não consigo..."

David encarava as próprias mãos com um olhar intenso, ele olhou lamentando para Helena, que entendeu que ele queria muito ajuda-la, mas ele não podia, David não tinha um corpo sólido para isso.

"Tudo bem, eu consigo, não é muito alto."

David assentiu, mesmo parecendo contrariado. Helena juntou todas as suas forças para a escalada, que não foi nada fácil, a usar os braços para se erguer, sentiu uma dor terrível nas costas onde tinha batido na queda.

Helena se arrastou para fora do poço caindo no chão ao sair, sua respiração estava descompassada, ela se sentia exaurida, David agachou a sua frente.

"Tudo bem? Você consegue andar?"

"Só me dê um minuto."

Ficou descansando no chão por mais alguns minutos antes de se recompor e levantar se escorando na borda do poço.

"Já vai anoitecer, precisamos ir, não sei o que pode acontecer, se ele... se ele voltar."

Helena assentiu, pegou a mochila que estava caída ao lado do poço, quando David desapareceu ela a deixou cair, sempre usava só um lado da alça então a mochila escorregou de seu ombro, se estivesse com ela, talvez não tivesse se machucado na queda, isso a lembrou das broncas que Dan sempre dava, dizendo para ela usar as duas alças.

Infelizmente, aquele não foi o único erro que Helena cometeu naquele dia, e temia, não ser o último.

***

Se deixou chorar, debaixo da água quente que envolvia seu corpo, Helena se deixou chorar, nunca antes sentira tanto medo, exceto talvez, no dia da morte da mãe. Ela demorou para sair do banho, saiu do box para se enrolar na toalha, antes olhou no espelho o estado de suas costas, tinha um hematoma feio quase no meio, do tamanho de uma mão.

O machucado estava avermelhado ainda, um pouco arranhado e muito dolorido, sabia que sentiria dor pelas próximas duas semanas pelo menos, enquanto o hematoma iria de vermelho para roxo, de roxo para verde, e depois com sorte, sua pele estaria bem novamente.

Pegou uma pomada e tentou dobrar o braço direito para passar no hematoma, mas não conseguiu, seu braço não se movia bem, ainda estava muito dolorido, desistiu, deixando a pomada de lado e se enrolando na toalha para ir a seu quarto se trocar.

Quando estava finalmente vestida, com o cabelo seco e um pouco recomposta, Helena o chamou baixinho.

"David?"

Ele apareceu a sua frente, tinha a cabeça baixa, um olhar sombrio que a assustou, Helena não conseguiu falar, somente esperou.

"Eu... eu sinto muito Helena. Fui um tolo em pedir sua ajuda e a colocar em perigo, em atrai-lo até você, não vou mais exigir que você se machuque por mim."

Helena não estava entendendo onde ele queria chegar. David sorriu.

"Sou grato por tê-la conhecido, queria que tivesse feito isso antes, seriamos bons amigos, mas agora... agora eu tenho que ir. Obrigada Helena, por ter sido meu fio de esperança."

Ele sorriu, um sorriso de despedida, Helena arregalou os olhos para protestar, mas não a tempo, David já havia desaparecido com um último sussurro.

"Adeus Helena."

Ela não conseguia acreditar no que estava acontecendo.

"David? David, volte! Por favor, David..."

Ofegou, sentiu como se algo a estivesse abandonando, como se sua alma tivesse deixando o corpo.

"A ligação."

Disse em quase um sussurro, ele havia cortado a ligação, Helena podia sentir, como se algo estivesse faltando, como se quem precisasse da ligação fosse ela e não ele, como se fosse Helena que precisasse de David e não o contrário.

Pela segunda vez naquele dia, Helena se encolheu em sua cama e se deixou chorar.

***

Tinha sentido o doce gosto do medo, isso o preencheu de uma forma revigorante, a garota, seu olhar em pânico, seu coração pulsando tão rápido devido a adrenalina, ele sentia tudo, para ele aquilo era como uma droga e ele era viciado.

Tão viciado que era paciente, consumia aos poucos, não tinha pressa em injetar tudo de uma vez, ia saboreando cada partícula do medo que causava, da dor, do desespero.

Sorriu consigo mesmo, estava apenas começando, aquele seria o jogo mais divertido e elaborado de todos, a sua verdadeira obra prima, e nunca pensou que o faria depois da morte, havia recompensas após a morte afinal, e ele aproveitaria muito o presente que recebera.