Derick
O Conquistador
Os jardins da conquista eram os maiores e os mais bonitos que Derick já havia visto.
Há quase uma hora ele e os enviados do Dominante trotavam pela imensa extensão arborizada, e somente agora o grupo conseguia ver ao longe as grandes portas que anunciavam a bonita entrada do lugar.
Alguns dias haviam se passado desde que assassinara Soren Davenport, e a promessa de que o levariam ao castelo no dia seguinte não passou nem perto de ser cumprida.
Mas o fato não fora de todo ruim, aquilo lhe deu mais tempo para analisar melhor o conteúdo da carta e também ensaiar seu novo personagem, o pomposo emissário bérniff.
Jack e Solon, os homens que haviam sido enviados para levarem Soren Davenport ao castelo, nada notaram de diferente nele, mas aquilo não surpreendia, já que os dois haviam chegado bêbados e se distraíram com facilidade de sua missão. Os homens foram o caminho todo pedindo desculpas pelo ocorrido, e suplicavam que Derick não contasse nada a Benaffar Binn.
Os pobres soldados saíam de uma guarda contínua de quarenta e oito horas quando foram enviados pelo tal Binn para receber Soren, e a única forma que encontraram de ficar aguardando no cais sem que a monotonia os vencesse, foi esvaziar algumas garrafas de água-rubra.
Não fosse a oportuna "intervenção" de Derick aquela noite, os homens poderiam perder as cabeças com tamanho descaso em uma missão.
Entretanto, o beymutita dissera que os perdoava, e até lhes permitiu que se divertissem nas noites subsequentes antes de o levarem até ali aquele dia, o que acabou gerando uma boa vontade dos soldados para com ele.
Quando enfim uma mensagem chegou trazendo a notícia de que o Dominante havia retornado de sua caçada, eles logo trataram de cumprir suas missões, e agora o grupo chegava aos portões de Nêmenas K'leut. Ao vê-los se aproximar, dois cavaleiros montados e que portavam grandes lanças, os escoltaram pelo restante do trajeto, até que enfim desceram em frente às grandes portas do castelo.
Ao adentrar o lugar, uma atmosfera de suntuosidade os engoliu por completo.
A arquitetura era simplesmente magnífica; o chão, de tão reluzente, parecia o reflexo de um alvo rio em um dia ensolarado, as imensas e largas colunas laterais foram pintadas de um dourado quase tão reluzente quanto o chão, e o teto branco ovalado sustentava um monstruoso lustre central com diversos apêndices que detinham suas próprias luminárias.
As incontáveis vidraças laterais em diversas cores tinham um bonito acabamento triangular, bem incomum para os padrões valantarianos, mas ainda assim pareciam se encaixar com perfeição àquele lugar.
Enquanto avançava deslumbrado com tanta beleza, Derick deparou-se em ambos os lados do salão com pelo menos uma dúzia de armaduras antigas, mas esplendorosamente límpidas e muito bem cuidadas.
Entre cada espaçamento dos vitrais havia expositores com tampas de vidro contendo armas, que iam desde espadas comuns a imensas lanças rústicas com cabos de madeira bem rudimentares. Notava-se que eram armas bem antigas, mas muito bem conservadas.
Derick notou que ali havia respeito com a história e com quem havia portado aquelas armas, pois abaixo de cada um dos expositores pôde ler as dedicatórias a todos os que as empunharam um dia, ainda que estivesse escrito em truskini.
Depois de ler as inscrições, ficava claro para o beymutita que ele passava pela antiga história dos Dustin, os últimos detentores do castelo e outrora respeitados governantes de Beruhim.
Derick não fazia ideia do por que Nêmenas K'leut manteria tudo intacto e muito limpo desde sua conquista, décadas atrás. Não parecia normal alguém manter viva as memórias de antigos rivais.
Apesar do beymutita ser um membro da família real e estar em Beruhim antes que ela sucumbisse a Nêmenas K'leut, há quarenta anos, apenas o viu naquela oportunidade, pois o homem nunca comparecia às reuniões a que era convocado, apenas mandava em seu lugar seus porta-vozes, então não poderia fazer qualquer juízo antes de vê-lo novamente.
Enquanto andava, seus olhos outra vez começavam a devorar todo o lugar, mas logo eles foram puxados para o mordomo, que já começava a estufar o peito para falar:
— Porrr aqui senhorrr Davenporrrt, o Dominante o aguarrrda! — O mordomo olhou para os dois homens que acompanhavam o beymutita. — Vocês já podem retornarrr às suas funções.
Derick assentiu silenciosamente aos homens que o acompanharam até ali, e eles retribuíram o gesto, para logo em seguida partirem em silêncio.
O beymutita quase não conseguiu entender o que o mordomo falava, pois tinha um sotaque muito engraçado e carregado, evidenciando que não era beruíta, então apenas o seguiu deduzindo que o devia acompanhar.
Derick Lancaster, assim como todos os Brunne, tinha uma aparência bem mais jovem do que aparentava. Facilmente lhe dariam a idade de um homem com menos de trinta anos, apesar de recém ter completado cinquenta e quatro. E em sua já longa vida, conhecera muitos outros castelos em diferentes lugares de Valanthar e até fora dele, mas o fato era que não havia como não se impressionar com o monstruoso castelo da Conquista. Nem mesmo quando o antigo castelo Brunne ainda se erguia pedra sobre pedra assemelhava-se a ele. Nêmenas K'leut tinha mania de grandeza, era algo que o beymutita aprendera naquele momento.
Quando o homem conquistou Beruhim, quarenta anos atrás, manteve o antigo castelo, mas o ampliou em larga escala, construindo praticamente um novo ao redor dele, tornando-o o mais belo e mais bem fortificado em toda Valanthar; algo que ele ouvira da boca de seu próprio irmão, o rei, e agora comprovava à olhos nus.
Suas muralhas eram incomparáveis de tão largas e altas, nas ameias não se podia contar quantas guaritas existiam, e a cada cinquenta metros no topo havia uma cabeça de leão feita de pedra de mármore. Abaixo, na entrada principal, as maiores portas que Derick já tinha visto, e eram necessários muitos homens somente para girar as alavancas que as moviam. Fora das muralhas um largo fosso complementava a segurança do fortificado lugar.
A localização do castelo também era de muito privilégio. Cravado no Alto da Conquista, a mais alta colina beruíta, era agraciado por uma excelente visão panorâmica, que proporcionava total ciência do que se passava na cidade abaixo de si, desde o porto até as Florestas Perdidas.
Beruhim situava-se em um gigantesco território, dividido principalmente entre praias, planícies e colinas, assim como Bérniff, porém, muito maior, e ainda assim, dizia-se que o castelo da conquista podia ser visto de qualquer lugar em Beruhim; Derick esperava poder comprovar tais afirmações.
— Fique perrrto de mim, senhorrr Davenporrrt.
Derick manteve-se em silêncio e apenas seguiu o mordomo.
Os passos do beymutita e do esnobe homem se misturavam no mármore espelhado, rajado por dezenas de manchinhas brancas que lhe davam um requinte ainda maior.
Eles caminharam solenes, firmes, indo em direção ao lugar onde supostamente encontrariam o grande Nêmenas K'leut.
Como era de se esperar, o salão pessoal do conquistador não era menos suntuoso que o grande salão comum, apenas um pouco menor que o outro; pois esse era oval e muito alto. As abóbadas centrais eram belíssimas e continham dezenas de gravuras de homens lutando com grandes lanças.
No centro do salão havia uma imponente cadeira de mármore branco ladeada por duas estátuas de homens com armaduras leves e que empunhavam lanças maiores que eles.
Derick deduziu que eram imagens do outrora jovem Nêmenas K'leut. O homem fazia questão de espalhá-las por todo o lugar. O Beymutita achou que seria recebido ali, mas logo percebeu que não.
— Continue perrrto de mim, senhorrr Davenporrrt!
Derick já estava se acostumando a ser trazido de volta à realidade pela engomada voz do mordomo.
O homem era uma coisinha miúda, meio atarracada, com grandes sobrancelhas proeminentes que destoavam em muito de seu rosto ligeiramente suave e com bochechas rosadas. Derick não tinha certeza, mas desconfiava que a brancura excessiva contida na pele dele era um tipo de pó comumente usados por damas da corte e por algumas mulheres das casas de prazer. Mas aquilo não o desagradou, pois fora o jeito esnobe que o homem fazia questão de sustentar, exalava um ótimo odor e se vestia de comum acordo com o personagem que exibia com tanto afinco.
— Entrrramos à dirrreita, senhorrr Davenporrrt.
Derick quase não o ouviu. Estava hipnotizado por tamanha grandiosidade do lugar. Conhecia todos os territórios dentro de Valanthar, mas por algum motivo ainda não havia retornado a Beruhim depois de quarenta anos, e estava arrependido de não ter feito antes.
Andando pela cidade, notou que onde quer que passasse existia vida, assim como um dia existiu em Beymuth.
Crianças brincavam alegres pelas ruas, belas mulheres sorriam enquanto caminhavam, como se fossem constantemente felizes ali, não avistou muitos mendigos e não observou nenhum roubo.
Para onde quer que olhasse via os esvoaçantes mantos negros patrulhando para lá e para cá, dando ao menos a impressão de que havia muita segurança ali. Estranhamente sentia uma sensação de paz, algo que nunca mais sentira em sua própria cidade depois da Unificação.
Um repentino pensamento de culpa invadiu sua mente, pois de certa forma ele estava ali para acabar com aquela paz.
Os dois homens continuaram caminhando e entraram em outro corredor à direita. Subiram alguns degraus e chegaram à uma sala com colunas brancas por todo lado.
Nas paredes, imensas pinturas de batalhas as adornavam, e em cada uma delas, K'leut, o conquistador.
Derick notou que no final da sala havia uma comprida mesa de madeira escura, sobre a qual muitos homens se debruçavam, parecendo que discutiam algum assunto com certa rispidez.
Derick e o mordomo pararam a uma certa distância e esperaram.
A discussão continuava acalorada, quando o beymutita notou um homem com uma bonita túnica marrom atada por um cinto prateado no centro da mesa, ele apenas ouvia tudo em silêncio. Era alto, por volta dos sessenta anos, tinha cabelo e barba longa e muito brancos, além de uma calvície não muito avançada.
Não se conseguia ver a boca por detrás da hirsuta barba, o que lhe dava uma expressão austera e feroz. Seu olhar era expressivo e cruel, mas seus olhos azuis celeste atenuavam um pouco o aspecto. Derick não tinha dúvida, aquele era Nêmenas k'leut.
O homem ouviu a discussão por mais algum tempo, até que levantou o braço esquerdo, e sem emitir um único som fez todos se calarem. Depois olhou diretamente para Derick. O mordomo se aproximou um pouco mais e anunciou:
— Sorrren Davenporrrt... emissárrrio de Bérrrniff!
Todos os que estavam à mesa se viraram e olharam em silêncio.
Derick pôde sentir o peso de cada olhar sobre si.
Um outro homem, talvez uns dez anos mais novo que K'leut, muito bem vestido com um lustroso sobretudo preto e com botas e ombreiras de aço, perguntou:
— É este?
Todos olharam para o conquistador como se esperassem uma resposta, mas ele apenas olhava para Derick.
O Beymutita ficou incomodado com o olhar fixo do homem, mas manteve a postura e firmeza de quem tinha sangue Brunne nas veias.
— Aparentemente sim... — Ele disse em tom baixo, com sua voz grave e potente, que combinava perfeitamente com o restante de sua silhueta.
Então todos foram saindo em silêncio, permanecendo apenas K'leut e o garboso homem com sobretudo preto.
Enquanto passavam por Derick, os homens que estavam à mesa lançavam lhe olhares sombrios, e assim que se foram, Nêmenas K'leut falou:
— Então aquele bode velho não teve coragem de vir pessoalmente?
Derick deu um passo à frente.
— Agradeço por me receber, senhor Dominante, mas temo que a longa viagem seria muito desgastante ao meu senhor... ele já é avançado em idade, como bem sabes.
K'leut liberou um som grave e monocórdio, que a Derick pareceu uma gargalhada.
— Velho? Ele tem a mesma idade que eu! Você chama de desgaste? Eu chamo de covardia!
E ele tinha razão. Talvez Ermeneu Dovant fosse um ou dois anos mais velho que K'leut, mas o homem sentado à frente de Derick, apesar da idade parecia um grande urso, e ao que tudo indicava, ele bem podia ser.
Era feito de músculos e atitude, ao passo que Ermeneu Dovant não passava de um homem molenga e com pelo menos o dobro do peso que deveria ter, pelo que bem se lembrava.
O homem com sobretudo preto colocou a mão no ombro do Dominante.
— Tenha calma, Nêmenas... o rapaz é apenas um emissário. — K'leut fungou. — Meu jovem... — Continuou o elegante homem — perdoe o mau gênio de nosso amado Dominante. Estávamos exatamente discutindo o assunto acerca de Ermeneu Dovant. Assunto esse que, suponho que o tenha trazido aqui... E já que veio para isso, nos elucide com suas informações.
Derick havia lido e relido a carta inúmeras vezes, mas na noite anterior relutara contra a ideia de entregá-la, pois isso implicaria em revelar o seu real conteúdo, mas por fim decidira ele mesmo anunciar, falando somente coisas que queria que o Dominante ouvisse. Contudo, apesar de ter ensaiado diversas vezes e saber o que tinha que falar, ali, na frente do Dominante e daquele seu intrigante amigo, temeu cometer erros, mas ainda assim encheu os pulmões e falou:
— Assim diz meu Dominante:
"A hora chegou! Os Noutmander encontraram seu fim com a morte de Mikar. Já aguardei tempo demais! Meu exército está pronto. Agiremos com ou sem você! Estou mandando alguém de confiança com a questão. Envie sua resposta com o retorno dele o mais breve possível. Ermeneu Dovant, Dominante de Bérniff."
Depois de ouvirem tudo, os dois homens se olharam em silêncio, até que K'leut falou:
— Enfim uma atitude de coragem daquele saco de merda. Realmente não esperava por isso. Diga-me senhor Davenport, quantos homens há no exército Bérniff?
Derick pensou um pouco sobre a perigosa pergunta antes de responder.
— Não tenho tais informações, meu senhor, apenas fui enviado para entregar a mensagem.
O Dominante se levantou.
— É o que você é, Soren Davenport? Apenas um entregador de mensagens?
Aquela indagação deixou Derick apreensivo, mas ele não titubeou.
— Fiel, meu senhor, é o que sou, e cumpro minhas missões a qualquer custo!
O Dominante e o outro homem se encararam por um momento, até que Nêmenas falou:
— Perdoe minha falta de traquejo social, Soren Davenport, ainda não lhe apresentei formalmente meu amigo... Este é Benaffar Binn, meu braço direito em todos os assuntos que dizem respeito a Beruhim.
O elegante homem com sobretudo preto sorriu, e Derick lhe deitou uma longa olhada, não podendo deixar de notar que assim como K'leut, ele também era forte e dono de uma tênue calvície, como o próprio Dominante. Porém, seus cabelos, ao contrário dos de seu senhor, eram curtos e negros como a noite, mas cuidadosamente escovados para trás. A barba torneando queixo quadrado era no mesmo tom dos cabelos, contudo, ele a aparava bem curta e desenhada. Seus olhos eram azuis iguais aos de K'leut, mas diferente do conquistador, os seus transmitiam malícia e furor ao mesmo tempo. Derick estava muito surpreso por nunca ter ouvido falar dele, já que era perceptível que o homem tinha grande influência sobre o próprio Dominante.
— Discutiremos o assunto e em dois dias mandaremos buscá-lo onde está hospedado. — disse K'leut, tirando Derick de sua longa análise sobre Binn. — Permaneça no lugar em que lhe arranjamos e esteja pronto quando eu o chamar. — Depois de falar, o homem virou-se e saiu da sala. Benaffar Binn encarou Derick por mais alguns segundos e depois seguiu atrás do Dominante.
O Beymutita os fitou até sumirem, e em seguida acompanhou o mordomo por outra saída. O Brunne não entendeu muito bem o que aconteceu ali. Ainda não tinha certeza se seria possível uma aliança entre os dois territórios, como Dovant havia proposto na carta. De fato alguma negociação já ocorria entre eles há algum tempo, Derick havia notado, e havia chegado à conclusão que se algo assim acontecesse, talvez o fato ajudasse na causa de Rikkar de Brunne, seu sobrinho.
Quando leu o conteúdo contido na carta, na mesma noite em que a obteve, pensou na melhor forma de tirar proveito em prol da Ordem com as informações, mas a verdade é que ainda não sabia como fazer aquilo até aquele momento. Contudo, ela ao menos servira para o colocar dentro do castelo, dando-lhe a oportunidade para procurar pela espada Régia, e sem dúvida aquilo era um bom começo.
Com certeza Derick queria os Noutmander destruídos, mas o que isso acarretaria a Beymuth só o futuro diria. A verdade era que tudo não passava de uma grande aposta naquele momento.
Ele não tinha dúvida que encontrar a espada era um bom ponto de partida para Rikkar, mas uma possível guerra entre os territórios, sobretudo uma que não os envolvesse, poderia gerar mais frutos que uma arma antiga.
A verdadeira carta de Dovant em geral dizia que ele queria formar uma aliança com K'leut para destruir Mikar II, mas ele omitiu o fato de que além disso, Ermeneu Dovant também queria se tornar ele próprio o rei de toda Valanthar, e a mensagem nada mais era do que um pedido de apoio.
Assim que leu o conteúdo, Derick achou melhor mudar o rumo do jogo ocultando a carta e transmitindo a mensagem que ele mesmo queria passar, em alto e bom som.
Talvez se realmente acontecesse uma guerra Inter territorial, e ele conseguisse levar a espada de volta à Ordem, conseguiriam erguer um levante e lutar contra o que restasse de ambos os lados. As possibilidades eram muitas e os resultados incertos, mas uma decisão tinha de ser tomada.
Estava claro que Ermeneu Dovant queria uma aliança com K'leut, mas se o conquistador também a queria, Isso ele já não tinha certeza.
Aparentemente os fortes rumores de guerra estavam se tornando verdadeiros. A data para que se completasse dez anos da unificação estava próxima, e muitos diziam que naquele ano Mikar seria anunciado como novo rei, mas o homem havia morrido sem ninguém esperar, e agora todos pareciam querer preencher a lacuna deixada pela sua morte. Ao que tudo indicava, as alianças já haviam começado: Léssia com Kimuth, e no que dependesse dele, Beruhim com Bérniff.
Se todos se matassem e restasse apenas uma parcela dos exércitos, seria o cenário ideal para que Rikkar surgisse como o salvador, restaurando a ordem como o rei de direito.
Restava saber como ficaria a Ordem em meio a tudo isso. Os soldados com certeza eram valentes e se preparavam há muitos anos, mas ainda assim seriam apenas uma pulga no calcanhar de qualquer lado que viesse a ganhar a guerra.
Ele ficou curioso de como seria a reação de K'leut se tivesse entregue a carta em sua íntegra. Talvez mandasse sua cabeça de volta a Bérniff como resposta a Dovant. Teria de ser cuidadoso no lugar em que estava. O homem que acabara de rever depois de tantos anos não parecia ser do tipo compreensível nem paciente. Todos sabiam quem era Nêmenas K'leut: o jovem que com pouco mais que vinte anos destituiu do poder o tirano Malthan Dustin, o antigo governante que conduzia Beruhim com crueldade.
Na ocasião, o rei Erandir de Brunne já organizava uma ofensiva para derrubar os tiranos, mas então o jovem Nêmenas K'leut, na época um simples soldado beruíta, juntou três mil homens, e de uma forma inexplicável conseguiu em um único dia aniquilar as forças do tirano.
Não se sabe ao certo se o que ele fez foi por amor a sua cidade ou se apenas aproveitou uma oportunidade com o intuito de crescer, mas o fato era que, quando as tropas Brunistas chegaram em Beruhim, encontraram os três mil homens no portão, e o notável Nêmenas K'leut à frente deles com a cabeça do rei tirano nas mãos.
O rei Erandir sorriu incrédulo, e de imediato tornou-o o novo governante de Beruhim, Ignorando por completo a linhagem Dustin. Alguns não acharam correta a decisão do rei brunista, mas ninguém o contestou, afinal de contas, ele era o rei.
Desde então, Nêmenas K'leut tem sido um ótimo governante para Beruhim, mas isso não o impediu de estar lá no dia da unificação e trair àqueles que o ajudaram a estar onde ele estava agora.
Derick o odiava tanto quanto os outros, mas tinha que jogar àquele jogo até poder tirar o melhor proveito dele.
O que estava por vir era totalmente desconhecido e teria que esperar para ver o que aconteceria, mas uma coisa era certa, não podia recuar, devia isso a seu sobrinho e a Beymuth.
Algumas horas depois, quando a noite havia caído, ele enfim retornou à casa que o Dominante havia providenciado para o verdadeiro emissário.
Chegando lá, entrou, caminhou até uma das muitas poltronas e se sentou.
Como se seus olhos tivessem criado vontade própria, foram puxados em direção a tábua que arrancou para enterrar o cadáver de Soren Davenport.
Por um breve momento sentiu um arrepio, uma sensação ruim de que algo daria errado. Foi então que pensou em escrever uma carta à Ordem contando os avanços de sua missão, no entanto apenas acabou dormindo, e pela manhã desistiu da ideia, pois sabia que sua história em Beruhim não estava nem perto do fim.
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