Adeus
Helena tentou se espreguiçar, mas foi impedida. Parecia estar em um casulo, com um cheiro amadeirado a circundando. O corpo que a segurava a apertou ainda mais, e inspirou fundo em seu pescoço. Um gemido escapou dos lábios dela.
Não tinha um centímetro do corpo de Max que não estivesse colado ao seu. Os braços dele a circulavam como um elo protetor. As pernas emaranhadas. O rosto dele, afundado no cabelo negro dela. E o pau dele, duro feito rocha, latejava no meio de suas nádegas.
Helena tentou se mexer, puxando seu cabelo de volta.
- Bom dia, Gatinha...
Podia sentir a sua calcinha umedecendo. Ela apertou um pouco as próprias pernas. Pareceu um incentivo para Max encaixar ainda mais seu membro.
- Hum....Max... – Parecia mais uma súplica.
Max começou a soltá-la. E contrário aos desejos femininos, seu corpo pareceu se tornar vazio.
- Foi mal, gatinha. - Max disse. Ela o encarou. Ele sorriu abertamente. Estava a provocando. – Seu cheiro é muito bom.
- Para com isso, Max. Você parece um adolescente recém saído da puberdade. – Ela o julgou, ponderando que o argumento servia para si mesma. Do alto de seus 26 anos todo controle sob si mesma era o mesmo que nada ao lado dele.Ela sentiu a pele de sua bochecha queimar. Os olhos dele pareciam uma nebulosa esverdeada.
- Estou tentando, Helena...
Ela o viu apertar o maxilar.
- Não parece.
- Você nem faz ideia, né...
Ela remexeu as pernas novamente, apertando o próprio sexo. Max praticamente a comeu com os olhos.
- Pare de me torturar, Helena. – Ele se irritou e se levantou – Preciso de uma ducha bem gelada. - Falou antes de sumir do quarto e entrar no banheiro.
Helena continuou sentada por algum tempo, tentando entender o que havia feito. Ela se virou de lado e abraçou o travesseiro de Max. Ao menos a noite que teve entrelaçada ao corpo dele fora deliciosamente bem dormida. Ela soltou um suspiro e voltou a realidade. Aquele seria um dia longo.
Segundo as coordenas que Leandro havia enviado mediante mensagem sobre a despedida do avô , tinha que estar na prainha lá para as dez horas da manhã. O que significava que ainda tinha algumas horas. Então se levantou, e ainda de pijama, foi para a cozinha atrás de uma xícara de café.
Sua casa não parecia mais a mesma com Max ali. Era como se pisasse em ovos. Em um momento se sentia à vontade, e no outro, a tensão era tão grande que parecia quase palpável.
- Helena, vou indo.
Max estava dentro da cozinha. Ela se virou para ele e retornou os olhos para o café que caia da máquina na xícara preta. Quando terminou, ela pegou a xícara e ofereceu a ele.
- Não se acostuma.
Max ergueu as sobrancelhas, aceitando a xícara e assoprando o líquido. O terno negro que usava lhe caia bem. Com certeza, Prada. A gravata verde combinava perfeitamente com seus olhos. Max pareceu gostar do olhar dela, exibia um sorriso tão grande e assustador quanto o gato da Alice no país das maravilhas.
Ele ficou encostado no granito da pia enquanto bebia o café. Assim que terminou, colocou a xícara dentro da máquina de lavar louça e andou até ela. Quando os lábios macios dele tocaram a testa dela, Helena suspirou.
- Tchau, Max.
- Vai ser muito mais difícil do que pensei.
- O quê?
- Viver aqui com você.
- Tem razão, você é um bagunceiro.
- E você é irresistível. - As bochechas dela coraram, e ela se xingou internamente. A expressão travessa se tornou preocupada – Te encontro aqui mais tarde, ok? Deve ser um dia difícil para você.
E era. Hoje era o dia em que finalmente iriam se despedir de Marcelo. Ela temia. Não sabia o que iria sentir, qual seria a sua reação. Até porque, mal tinha chorado. E não sabia se tinha algo a chorar.
Tudo que passara com Marcelo, e a relação difícil deles fora uma coisa em que Helena nunca se demorou muito a ponderar. Mas sabia, o amava. Mesmo depois de tudo o que ele havia feito. O amava demais.
- É, acho que vai ser.
Max apertou o ombro dela. E como se não bastasse seu toque, a abraçou. Helena deu batidinhas nas costas dele.
Depois que Max foi trabalhar, Helena finalmente conseguiu respirar. Lorenzo foi quem ficou triste.
- Tudo bem, carinha. Daqui a pouco ele volta, ok? Enquanto isso eu e você iremos dar uma volta na praia.
A roupa para a despedida era uma incógnita. Usar algo leve e colorido devido ao calor da praia, ou usar algo preto e fúnebre devido à despedida? Colocou um vestido preto com detalhes verdes. Na cabeça, um chapéu preto com abas largas.
Era melhor chegar antes e pensar no que iria querer transmitir à imprensa que estaria presente.
Ao chegar na praia, soltou Lorenzo. Helena imaginou que ele fosse correr e brincar , mas não, ficou todo o tempo andando com ela. Parecia sentir que estava prestes a se despedir de seu verdadeiro dono.
E Marcelo era louco por Lorenzo. Desde quando o Golden nasceu, ele nunca o deixava. Até o levava para o trabalho às vezes. O bichano era tão amado na empresa que tinha um crachá, sendo identificado como assistente do presidente.
Agora, não haveria mais nada disso. E ela não sabia o que fazer quando ele se desse conta que Marcelo jamais voltaria, e tudo que restaria seriam as boas lembranças dos dois. Por outro lado, parecia que não teria trabalho algum, o modo lamurioso como Lorenzo andava com a cabeça peluda baixa, já falava por si só.
Fazia muito tempo desde que esteve em qualquer praia, quem dirá naquela que vinha muitas vezes para observar Marcelo surfando. Hoje era as cinzas dele que surfariam até desaparecem de vista.
Ficou sentada na praia, com Lorenzo deitado ao seu lado, observando os surfistas correrem até a água, gritando e sorrindo para vida. Seus pés afundaram na areia, como se a recebesse e confortasse.
O barulho do mar preenchia seus ouvidos, mudando o som conforme o vento soprava. Helena sentia o sol e o calor que já lhe queimava os braços e pernas.
Mas nada seria pior do que estava por vir.
A praia ficava cada vez mais cheia. Em grande parte, de repórteres, que para seu alívio, respeitaram o momento dela, dando alguns cliques de longe.
Ela olhou o relógio de pulso e começou a respirar com um pouco mais de dificuldade. Era péssima em lidar com a ansiedade e o medo.
Uma mão tocou seu ombro. Ela posicionou a própria mão sob os olhos para afastar a claridade do sol enquanto olhava para a pessoa. O perfume cítrico do seu irmão a atingiu primeiro depois que ele sentou ao seu lado.
Ambos não sabiam o que dizer. Leandro colocou o jarro de ferro que continha as cinzas na sua frente e olhou para Helena.
- Não consigo parar de pensar que estou levando-o nos meus braços... nunca... nunca foi tão difícil segurar um objeto...
As lágrimas do irmão caíram em disparada. Tentou dizer para Leandro que não chorasse. Mas o nó em sua garganta lhe dizia que se tentasse falar, choraria junto. Então engoliu em seco e tentou em vão segurar as lágrimas quentes do irmão. Os próprios olhos já marejando.
Mas já era tarde demais.
Quando os olhos arderam, o soluço veio junto. As bochechas tremiam, então ela reprimiu os lábios enquanto sentia uma lágrima cair.
Abraçou Leandro. Queria dizer que entendia. Que, apesar de tudo, ela sentiria tanto falta de Marcelo que causaria um buraco permanente em seu peito. Mas nada saia de seus lábios.
Dentro do abraço do irmão, ela abriu os olhos e viu o Tio. Glauco foi até o mar, molhando os pés. Depois Pâmela veio e segurou a mão dele. Ela finalmente pôde ver os dois tios e irmãos se abraçando. O choro da tia era tão alto que ainda que de longe era possível ouvir.
Os gêmeos, filhos de sua tia, Markus e Daniel olhavam da calçada junto do pai. Por causa da pouca idade, 4 anos, não tinham conhecido Marcelo o bastante para saber que mesmo o avô sendo um tremendo filho da mãe, todos os amavam, ainda que de seus modos.
Helena limpou as próprias lágrimas e tentou conter o choro, que lutava dentro dela para vir à tona com mais força. Quando levantou a cabeça e olhou a sua volta, o viu.
Max andava até eles com flores brancas na mão, a claridade do sol reluzia em seus óculos Ray-ban estilo aviador. Leandro seguiu o olhar da irmã para ver o que ela observava.
- Ai cristo! Eu não tenho nada a ver com isso – Leandro disse levantado as mãos em sinal de rendição.– Vou deixar vocês se falarem. - Ele disse antes de se distanciar com o jarro crematório na mão. Quando Max estava perto o bastante, ela indagou:
- Veio fazer oferenda para Iemanjá?
Ela limpou os olhos com o verso da mão enquanto se levantava, balançando a sua roupa para sair os grãos de areia. Max tentou conter o riso, mas um sorriso ainda conseguiu brotar. Lorenzo finalmente se levantou de seu buraco na areia para cumprimentar Max.
Helena não entendeu o porquê de Max estar ali, já que tinham concordado de se verem mais tarde. Mas de alguma maneira, parecia certo aquele encontro naquele momento.
- Acho que você é a única pessoa que consegue fazer piadas em um momento como esse, gatinha.
- Você não precisava estar aqui.
- Eu sei, mas eu quero estar.
Quando Helena percebeu, os braços dele já a circundavam. Max observou a hesitação dela, mas de alguma forma, a cumplicidade de dividir aquele momento com alguém era reconfortante. Então ela devolveu o abraço.
Outras pessoas chegavam a todo momento, até que quase toda a orla da praia estivesse lotada. Alguns conhecidos, outros jamais vistos por ela, mas cheio de celebridades, jornalistas e curiosos.
Leandro foi até o centro de todos, chamando atenção para o que viria a seguir. Helena viu quando emissoras de Tv chegavam mais perto, filmando e entrevistando pessoas. Entretanto, todas as câmeras e microfones se viraram para ver o que Leandro teria a dizer.
- Eu... eu não sei o que dizer, a não ser que este é o momento mais difícil pelo qual eu já passei na minha vida... Marcelo era um amigo, pai e avô... me ensinou como o mundo funciona, me educou e deu amor. Eu sou eternamente grato por ele ter acolhido a mim e minha irmã quando nossos pais faleceram em um acidente de carro... – Leandro dizia no meio das pessoas, o jarro com as cinzas do avô apertado contra o peitoral. Suas palavras soavam como uma conversa com o próprio avô, e fechando os olhos era quase possível imaginar ele olhando o neto com carinho.
Helena puxou todo o ar que conseguiu para conter o choro. Uma de suas mãos foi acolhida por outra. Ela olhou para o lado e viu Gabi. A amiga sorriu e a abraçou forte.
Agora era Glauco quem estava ao centro, segurando o jarro crematório. Ele limpou o rosto com a mão antes de começar.
- ...Eu gostaria de ser metade do homem que meu pai foi. Agora, consigo ver a quantidade de momentos desperdiçados ao longo de nossa vida. Podíamos ter tentado mais...e talvez até brigado mais. – Glauco revelou, algumas pessoas riram. Não era segredo para ninguém que Glauco tinha um péssimo relacionamento com Marcelo – Mas é tarde demais. Então tudo que eu posso falar, é... obrigado. Pai, sinto muito por dizer isso só agora, mas... eu...te amo... - Ele falou as últimas duas palavras num estampido, quando o choro veio forte e ele tentou contê-lo com as próprias mãos.
O rímel preto de Pâmela escorria por sua face pálida. O marido dela a afagava, mas todos podiam ver como a filha de Marcelo estava despedaçada. Ainda que a tia fosse um megera, Helena teve pena. Depois de Glauco, Patrício, o melhor amigo de Marcelo fez o discurso, e ainda depois dele, os outros tantos amigos que ele tinha acumulado em sua vida. Helena não se moveu.
As palavras de Glauco não saiam de sua mente, nem as tantas lembranças que a bombardeavam, uma após a outra. Em um momento ela via o avô sorrindo, no outro era destroçada, lembrando o momento de sua expulsão da empresa.
Max se posicionou atrás de Helena, massageando os ombros dela. Até Ryan discursou, e quando perguntaram se Helena discursaria, Max recusou em seu nome, dizendo que ela não estava em condições. Helena apertou a mão dele em um agradecimento silencioso. Tinha a impressão de que se tentasse falar de Marcelo, desmoronaria.
De todos os mais próximos, nem Helena nem Pâmela discursaram.
Chegado o momento de soltar as cinzas no mar, Patrício foi até a beira das águas junto com Glauco e Leandro. O melhor amigo do avô abriu a tampa do pote, deixando as cinzas cair, fazendo um caminho preto sob as ondas. Leandro chorava de soluçar com Gabi o abraçando.
Sentindo o avô indo embora, as lágrimas de Helena eram como dois rios, que transbordavam e devastavam tudo que encontravam pela frente. Quando Max a abraçou de novo, ela despencou de vez, sentindo o desespero da saudade a assombrar.
Ficar sem falar com alguém que se ama é destroçador. Agora, a morte os havia separado. Para sempre. E nem o maior dos orgulhos poderia tampar o buraco que a culpa fazia em seu peito.
A sirene da ambulância sobressaltou a todos. Helena observou quando o marido de Pâmela corria com ela desacordada em seu colo. Glauco tentava fechar os olhinhos das duas crianças que berravam assustados pela mãe.
Então percebeu, a culpa acometia a todos na morte, lembrando que a vida era para ser vivida sem reservas, sem medo, sem orgulho. Nada de ruim acontecido em vida pode explicar a sensação de não ter feito o bastante quando se poderia fazer.
Ela retribuiu com mais vontade o abraço de Max.
Olá corações. Ta aí o 3 cap da semana. Estou pensando em postar 3 vezes por semana. O que acham? 2 ou 3 ?
Até semana que vem, e não se esqueçam, curtidas e comentários são muito bem-vindos. <3
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