࣪✶ entrando pela janela
o que antes eram só migalhas... nesse capítulo virou o pão inteiro. de nada!
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Quando Tessa abriu os olhos, encontrou-se em um lugar completamente diferente do seu quarto. A escuridão era densa e impenetrável, e o ambiente parecia um galpão abandonado. O ar estava gelado e carregado de uma sensação opressiva. Ela tentou se orientar, mas o frio do piso sob seus pés descalços a fazia hesitar.
Apenas a sensação de partículas flutuantes e a dificuldade em respirar confirmavam a localização peculiar. Ela avançou lentamente, cada passo ecoando no silêncio absoluto. De repente, o silêncio foi quebrado por uma série de pequenos barulhos frenéticos: centenas de ratos saíram das sombras e passaram correndo por ela. Tessa estremeceu e se levantou na ponta dos pés, observando-os com os olhos arregalados enquanto eles a ignoravam completamente.
O tumulto dos ratos cessou tão rapidamente quanto começara, e um grito desesperado de um homem ressoou na escuridão, congelando Tessa em seu lugar. Antes que pudesse reagir, uma força invisível e opressiva envolveu seu pescoço, erguendo-a do chão. Tentáculos que não pareciam humanos se enrolaram em torno dela, pressionando com força cruel. O pânico tomou conta de Tessa, e ela tentou gritar, mas o som se perdeu na escuridão.
No instante seguinte, ela acordou em sua cama, ofegante e com o coração disparado. A sensação de sufocamento ainda a acompanhava, e suas mãos tremiam ao se fixarem em seu pescoço, como se o aperto invisível ainda estivesse lá. O relógio ao lado da cama marcava 02:30 AM, e ela sabia que seria mais uma noite apenas com 2 horas de sono.
Ela respirou profundamente, tentando acalmar o ritmo acelerado de seu coração e os respingos de medo. Com as mãos ainda tremendo, passou o rosto com força, tentando afastar a sensação de pânico que parecia ter se aninhado em sua mente. O que antes eram pesadelos inquietantes agora se transformaram em tormentos brutais e persistentes, interrompendo seu descanso e deixando-a à beira de um colapso.
Tessa se levantou lentamente, seus olhos se ajustando à penumbra do quarto. O pensamento dos sonhos repetitivos a inquietava. Não era apenas a natureza dos sonhos que a perturbava, mas o fato de que eles pareciam estar ficando cada vez mais reais, mais cruéis. Havia algo de profundamente perturbador sobre essas visões, e a sensação de que algo estava prestes a acontecer a acompanhava mesmo quando estava acordada.
Ela se dirigiu ao banheiro, determinada a se recompor. O reflexo assustado que a encarava no espelho parecia questionar sua sanidade. Tessa se esforçou para afastar as memórias perturbadoras do sonho, mas a visão de seus próprios olhos assombrados continuava a desafiá-la a confrontar o que estava realmente acontecendo.
Ela ligou a torneira e lavou o rosto com água fria, sentindo a sensação gelada que a fazia voltar à realidade.
Tessa acreditava que a intensidade dos sonhos estava diretamente relacionada à sua recente compreensão do mundo invertido. Para ela, parecia como se sua mente estivesse lhe pregando uma peça, misturando seus medos e inseguranças mais profundos em uma trama de terror quase palpável. Cada noite, os pesadelos se repetiam, o que tornava impossível dormir mais de três horas seguidas.
O pesadelo da noite anterior ainda pairava sobre ela. A sensação de ser sufocada por algo não humano, de ser observada por uma força invisível, a fazia se perguntar se esses sonhos não eram apenas parte de sua mente atormentada, mas talvez sinais de algo mais sinistro. O medo e a angústia que sentia eram reais e implacáveis, e a dificuldade para encontrar uma explicação plausível a deixava ainda mais perturbada.
Ela se apoiou na pia e respirou profundamente, tentando recuperar a compostura antes de voltar para o quarto e se deitar em sua cama. As horas seguintes foram um tormento; Tessa rolava de um lado para o outro, tentando em vão encontrar uma posição confortável. A ideia de enfrentar mais um pesadelo a assombrava, tornando impossível relaxar.
Finalmente, o som irritante do despertador a acordou. Ela suspirou pesado e se levantou, ainda exausta. Ao se olhar no espelho do banheiro, quase se assustou com a aparência cansada e as olheiras profundas. A sensação de cansaço era palpável, e a imagem refletida não fazia justiça ao esforço que ela estava tentando fazer para se manter de pé.
Ela tomou um banho frio, o gelo da água ajudando a clarear sua mente um pouco. Com o cabelo preso em um rabo de cavalo baixo, ela colocou uma blusa do uniforme amarelo do cinema e um short preto de cintura alta, com as barras dobradas e um cinto preto com furos prata dentro da bolsa. Em seguida, vestiu uma blusa preta, um short leve também preto e seus all stars vermelhos surrados, colocando por último a joelheira de compressão no joelho direito.
Pegou os fones de ouvido, ajustou a fita com algumas das suas músicas favoritas e saiu de casa antes de qualquer um acordar. A manhã ainda estava silenciosa quando ela saiu, e o ar fresco a ajudou a despertar um pouco.
Com os fones no ouvido e a música começando a tocar, Tessa começou a se alongar antes de iniciar sua corrida matinal. A atividade física tinha sido recomendada pelo médico para ajudar com seu joelho, mas ela, teimosa como sempre, havia optado por não seguir exatamente as instruções. A corrida matinal tinha se tornado seu ritual diário, uma forma de manter a mente ocupada e o corpo em movimento.
Ela corria com intensidade, quase ignorando os sinais de seu corpo e as recomendações médicas. A rota incluía uma volta pela cidade e uma corrida até o shopping, onde começava seu turno mais tarde. O esforço era extremo, mas até agora, não havia consequências graves — pelo menos, nenhuma que ela estivesse disposta a admitir.
Enquanto corria, a música no fundo ajudava a afastar as imagens perturbadoras dos pesadelos, mesmo que temporariamente. O movimento constante e o ritmo acelerado davam a Tessa uma sensação de controle, uma forma de enfrentar seus medos e continuar em frente, apesar de tudo o que estava acontecendo.
Depois de completar a volta na cidade e correr até o shopping, que ainda estava praticamente vazio, Tessa respirou profundamente, tentando recuperar o fôlego antes de entrar no prédio. Ela caminhou até o cinema, abriu a grade, e rapidamente a fechou de volta assim que entrou.
Assim que entrou ela apenas largou a sua bolsa e foi organizar algumas coisas. Depois, retirou os fones e seguiu até o banheiro dos funcionários, onde havia alguns chuveiros. Após uma ducha rápida para se livrar do suor, vestiu o uniforme do cinema.
Mas assim que ela saiu do banheiro, viu as portas já abertas, e escutou o barulho da pipoqueira ligada. Ela pensou ser o Sr. Smith, seu colega, um senhor barrigudo e com uma barba enorme, mas ela estranhou, afinal ele sempre chegava tarde.
Ela ergueu as sobrancelhas surpresa ao ver o Wes, o gerente, atrás do balcão. Ele tinha seus 24 anos no máximo, e ela já tinha conversado com ele o suficiente, mas ele raramente ia ao cinema.
— Bom dia, Tessa. — Ele desejou, e ela caminhou até o balcão.
— Bom dia. Veio ver como está o meu trabalho duro? — Ela perguntou em um tom meio divertido.
— Hoje não. — Ele respondeu no mesmo tom. — Só vim recepcionar e orientar nosso novo funcionário.
Ela franziu a testa ao escuta-lo.
— Novo funcionário?
O barulho do balde com o esfregão sendo arrastado chamou a atenção dela, então ela se virou e viu um garoto com o uniforme do cinema, bermuda jeans escura e um all star branco bem surrado.
— Ele.
— Opa. — Ele exclamou, largando o esfregão e se aproximando da garota. — Eu sou o Christian, muito prazer.
— Tessa. Prazer. — Ela respondeu, tentando soar simpática, mas não estava de bom humor por causa do sono.
— Christian veio de Nova York com a família. — Wes contou.
— Sinto muito em saber disso. — A Sinclair ironizou, olhando para o garoto, que riu soprado. Ele parecia encantado com a garota a sua frente, e mal conseguia disfarçar.
— Ele já trabalhou em alguns cinemas e tem experiência como projecionista. — Wes contou e Tessa ergueu as sobrancelhas assentindo, mesmo não dando a mínima. — Ele veio na hora certa, considerando o que aconteceu com o Sr. Smith.
Ela franziu a testa e direcionou o seu olhar ao gerente.
— O que aconteceu com o Sr. Smith?
— Ah, ele caiu no chuveiro e fraturou a bacia. — Ela fez uma careta ao escuta-lo. — Mas ele está bem. Tá de licença por alguns meses. Sem choro, o Christian vai te fazer companhia.
Ele disse em um tom divertido e a garota forçou um sorriso fechado.
— Bom, eu preciso ir. Eu resumi um pouco pra ele, mas sei que você vai entrar em detalhes. — Ele saiu de trás do balcão e segurou os ombros do mais novo. — Está em excelentes mãos.
{ . . . }
Christian seguia a garota dentro da sala vazia de cinema, varrendo algumas pipocas que estavam no chão enquanto ela caminhava e tentava se lembrar de tudo.
— A gente se reveza entre encher as prateleiras de doces, limpar as máquinas de pipoca, refrigerante e a minha tarefa preferida: Limpar o banheiro. — Ela explicava apontando para os dedos enquanto segurava a plaqueta com uma lista. Ela ironizou o último enquanto ele juntava os lixos e colocava no saco. — Quando você termina as suas tarefas, anota as suas iniciais e a hora.
— Igual no inc. — Ela concordou, fazendo um som em concordância. — Ah, e você pode me passar o seu telefone?
Ela estranhou um pouco, franzindo brevemente a testa. É sério? Tão atirado assim?
— Só pra se eu precisar mudar de turno. Wes disse que você ia ser minha supervisora direta, mas se não estiver de boa. — Ela negou com a cabeça.
— Não, tudo bem. Só demorei um pouco pra raciocinar. — Tessa brincou e tirou a tampa da caneta em sua mão, estendendo a outra mão pra ele. Ele estendeu a dele pra ela, que a pegou e escreveu o número do telefone do seu quarto na palma da mão dele.
— Ele disse também que você adora filmes de terror. — Ele comentou, mudando de assunto. — E que fez um. Eu também fiz! É... Eu não sou diretor, sou mais dos efeitos especiais, criação de máscaras, próteses... Quanto mais sangue melhor.
Ele brincou e ela riu.
— Eu concordo plenamente. Legal. Eu vou me lembrar disso no meu próximo filme. — Ela assentiu, sorrindo. — Qual é o seu clássico favorito?
Ela perguntou antes de sair andando e ele a seguiu, começando um longo papo que durou algumas horas enquanto eles trabalhavam.
{ . . . }
⠀⠀࣪✶ Tessa Sinclair
O papo com Christian estava fluindo de forma surpreendente, e foi só por isso que eu não estava caindo de sono naquele exato momento. Conversar com alguém que curtia as mesmas coisas que eu era um alívio bem-vindo. Ele era bem legal, e nosso gosto em comum por filmes de terror e rock ajudava a manter meu humor elevado, apesar da exaustão.
Ergui a cabeça para olhar o relógio.
— Tá na hora do meu intervalo. — Comentei, esticando os braços para espantar o cansaço. — Eu geralmente passo ele na sorveteria onde uns amigos trabalham, mas se você não se sentir pronto pra ficar sozinho por um tempo, eu posso ficar, sem problemas.
— Ah, tá suave. Não esquenta com isso, pode ir. — Christian respondeu, confiante. Assenti de leve, agradecendo mentalmente. A última coisa que eu queria era passar meu intervalo ali.
Trocamos mais algumas palavras antes de eu deixar a sala e seguir pelo corredor até o Scoops Ahoy. Como já era costume, nem me dei ao trabalho de bater.
Um sorriso enorme cresceu em meu rosto ao ver minha criança favorita, digo... O Dustin, sentado junto com a Robin.
— Henderson! — Gritei, chamando a atenção dele, que se levantou com um sorriso no rosto. — Não sabia que você já tinha voltado.
Ele caminhou até mim, e eu o abracei apertado, sentindo-o retribuir.
— Você também tá trabalhando aqui? Legal.
— No cinema. Bem legal, né? — Me separei dele, ainda sorrindo. — Como foi no acampamento de nerds?
— Foi ótimo. Principalmente porque eu conheci o amor da minha vida. — Ele respondeu, com uma naturalidade que quase me fez engasgar.
— Amor da sua vida? — Perguntei, incrédula.
— Minha namorada. — Ele disse como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.
— Sua namorada? — Repeti, ainda surpresa. Ele assentiu com entusiasmo enquanto eu me sentava no balcão, encostando as costas na janela que dava para o outro lado. — E ela sabe que é sua namorada?
— Claro que sabe, Tess! O nome dela é Suzie, ela é um gênio. É muito linda. Dá de 10 a 0 na Phoebe Cates.
Encarei-o desconfiada, mas logo sorri, satisfeita por ele.
— Fico feliz com isso, Dustin.
Só então reparei que a Robin não tinha dito nada desde que eu entrei. Ela estava debruçada sobre a mesa, com um fone de ouvido em um ouvido e um dicionário aberto à sua frente, parecendo muito concentrada.
— Okay... A Robin não falou nada até agora. Isso sim é estranho.
Olhei para o quadro da Robin, onde estava escrito quantas vezes o Steve levou um fora de uma garota, e que agora continha todo o alfabeto russo.
— Ah... Droga. Que merda cê já tá aprontando, Dustin? — Franzi a testa, cruzando os braços. Vi a Robin tirar o fone e encarar o Dustin por alguns segundos.
— Ontem eu estava tentando falar com a Suzie e acabei interceptando uma comunicação secreta dos russos. Agora estamos tentando traduzir, pra sermos heróis americanos. — Dustin explicou com simplicidade, o que, estranhamente, me deixou aliviada. Pelo menos dessa vez ele não tinha pego um sapo mutante para criar.
— Uh, heróis americanos? Curti. Eu quero ajudar.
— Sério? Pensei que você fosse achar idiotice. — Robin comentou, finalmente participando da conversa.
— E eu acho. Exatamente por isso quero ajudar. Além do mais, eu falo russo. — Os dois arregalaram os olhos e se entreolharam antes de me encarar.
— Porque não começou com isso?! — Dustin indagou, incrédulo.
— Vocês não perguntaram. — Respondi com ironia, mas logo senti meu corpo inclinar para trás quando a janela foi aberta. Duas mãos firmes se apoiaram nas minhas costas para evitar que eu caísse.
— Você já tá aqui? Acho que cê não curte muito trabalhar, né? — Steve ironizou, e eu encostei minhas costas no batente da janela, sorrindo.
— O que posso dizer? Tem coisa melhor pra se fazer no intervalo do que me entupir de sorvete, meu amigo marinheiro? — Respondi no mesmo tom.
— Você vem aqui tomar sorvete todos os dias? — Dustin perguntou, e eu assenti. Notei ele encarar o Steve com um olhar malicioso, o que me fez franzir a testa. Esses dois eram realmente estranhos.
— Deve gastar todo o seu salário aqui. — Dustin continuou.
— Nenhum centavo. Tudo na conta do rei Steve aqui. — Dei dois tapinhas na bochecha do Steve ao dizer "rei Steve". — Enfim. Bocó, me vê um milkshake de baunilha, temos uma mensagem russa pra traduzir e muito trabalho pela frente.
— Você vai ajudar eles? Como? — Perguntou Steve, com um tom de deboche.
— Traduzindo a mensagem, ué. — Respondi, simplista.
— Você entende russo, por acaso? — Ele perguntou num tom divertido, mas franziu a testa quando eu assenti. — Pera, é sério? Desde quando?
— Aprendi na Califórnia. Diferente daqui, no verão a gente começa um curso, aprende uma nova língua... Não tem essa de lidar com problemas com... Cachorros. — Dei um leve ênfase na palavra "cachorros", e tanto Steve quanto Dustin entenderam o que eu queria dizer. — Tudo bem, vamo' nessa. Me mostrem o que conseguiram até agora.
Steve revirou os olhos com um sorriso fraco no final, mas já estava preparando o milkshake. Enquanto isso, Robin e Dustin organizavam o material que tinham conseguido até agora.
{ . . . }
— Você não se sente mal fazendo o garoto novo trabalhar sozinho? — Robin perguntou, mudando um pouco de assunto e eu apertei o botão para pausar a fita.
— Nah. Eu disse pra ele que era uma emergência, só não especifiquei. — Dei de ombros. — O coitado do Sr. Smith me deixava sozinha o tempo todo, ele aguenta.
Ela riu soprado e eu coloquei mais uma vez pra tocar a fita. Estávamos tentando descobrir as últimas palavras, eu estava demorando um pouco pra associar e traduzir cada uma das palavras, provavelmente pelo sono, e agora já estávamos quase no fim do expediente.
— Esse final... Eu não sei. Bom, eu sei, mas não acho que seja isso. — Expliquei, olhando rapidamente pro Dustin.
— O que?
— Azul encontra o amarelo no oeste. É isso, eu tenho certeza, só não faz sentido. — Depois de dizer, comecei a explicar calmamente, e a Robin me ajudou, e nós confirmamos que era isso mesmo.
— Então é isso. — Dustin afirmou, olhando o quadro.
Me inclinei na janela e a abriu, colocando metade do corpo pra fora.
— Steve. Conseguimos. — Informei e apontei com a cabeça pra cá, então ele terminou rapidamente de atender o último cliente e veio apressado pra onde estávamos. Paramos os quatro em frente ao quadro e começamos a ler em voz alta. — A semana é longa. O gato prateado come quando o azul encontra amarelo no oeste.
O Steve nos encarou meio cético, e depois disso saímos dali, apagando as luzes da sorveteria.
— Gente, não dá. — Steve começou, puxando a grade e batendo o cadeado. — Não pode ser isso.
— Mas é isso. — Robin afirmou e eu assenti.
— Sinceramente? Eu achei ótimo. — Dustin afirmou enquanto começávamos a caminhar.
— Como isso é ótimo? Sério. — Steve riu incrédulo. — Lá se vão os heróis americanos. Isso nem faz sentido!
— Faz sentido sim! — Dustin retrucou. — É muito específico, é óbvio que é um código.
— Como assim, um código? — Steve perguntou.
— Um código super secreto de espião!
— Tá forçando a barra, hein?
— Na verdade, eu não sei. — Comecei, olhando pro chão.
— Cê' vai entrar nessa também? — Steve perguntou e eu pressionei os lábios um no outro.
— Eu não sei, mas só uma hipótese. Vamos pensar na possibilidade de ser mesmo um transmissão secreta russa, sim? O que você pensou que iam dizer? Disparem ogiva ao meio dia? — Perguntei com ironia e o Dustin e a Robin concordaram. — A minha tradução tá certa. Eu tenho certeza, então... "O gato prateado come", porque alguém falaria assim se não fosse pra esconder o significado da mensagem?
— Exato!
— E porque iam tentar esconder o que significa a mensagem se ela não for confidencial? — Robin adicionou.
— Exato! — Dustin concordou mais uma vez, e o Steve imitou ele.
— Então... Isso confirma sua suspeita. — Olhei pro mais novo.
— Russos malignos.
— Eu não acredito que eu vou concordar com esse pirralho estranho, mas, é, com certeza russos malignos. — Robin disse em um tom divertido.
— E como a gente desvenda?
— A gente pode traduzir o resto e torcer pra achar um padrão.
— Padrão? Talvez "gato prateado" seja um lugar.
— Ou uma pessoa.
— Ou uma arma.
— A gente precisa de um super gênio pra resolver, mas... Cadê o Steve? — Nos viramos pra ver, e ele estava em frente a um daqueles cavalinhos que colocamos uma moeda pra ele andar, e ele estava revirando os bolsos do short azul. — Ei, Steve. O que que cê tá fazendo?
— Uma moeda. Eu quero... Tem uma moeda aí?
Ri soprado e nos aproximamos dele.
— Você não tá velho demais pra isso? — Provoquei, franzindo a testa minimamente.
— Uma moeda! — Joguei a moeda nele, que derrubou e se abaixou pra pegar rapidamente, a colocando no cavalinho.
— Quer ajuda pra subir, Stevezinho? — Provoquei e o Dustin riu, mas escutei o Steve fazendo um "Shh!"
— Da pra calarem a boca e ouvirem?
— Ai, caramba! A música. — Dustin tirou a mochila das costas e se ajoelhou no chão, revirando a mochila. — A música!
Ele colocou a gravação pra tocar, e franzi a testa ao perceber que era a mesma música do cavalinho.
— Eu não tô entendendo. — Robin afirmou.
— É a mesma música da gravação!
— Talvez tenha um cavalo desses na Rússia. — Robin argumentou.
— "Indiana Flyer?" Eu acho... Eu acho que não. Esse código não veio da Rússia. Veio daqui.
{ . . . }
Já era por volta de uma e pouco da manhã e eu estava longe de tentar dormir. Eu sabia o que aconteceria se eu tentasse, então resolvi manter minha mente ocupada.
O que não foi muito difícil, considerando que depois do que fizemos com a mensagem russa hoje, e as minhas conversas com o Christian, eu tive uma nova ideia pra um curta, e agora estava colocando tudo no papel.
O barulho de algumas batidas leves na janela chamaram a minha atenção, então franzi a testa e olhei pro lado, vendo o Steve ali.
Retirei os papéis do meu colo e caminhei apressada até a janela, apoiando os joelhos no banco que tinha em frente a janela e a abri.
— Você ficou maluco, Steve? Ta fazendo o que aqui? Que susto, porra! — Sai do banco e dei espaço pra ele entrar o mais rápido possível, torcendo pra que ninguém tenha visto ou escutado. — Como você conseguiu subir? Não tem nada ali embaixo.
Ele começou a entrar, e se atrapalhou no banco, quase caindo e levando minhas coisas com ele, mas conseguiu se manter de pé e fechou a janela.
— Um ninja nunca revela seus segredos. Vim trazer uma coisa que você esqueceu no meu carro. — Parecia uma desculpa esfarrapada, eu franzi minimamente a testa e o encarei desconfiada.
— E porque não deixou pra me entregar amanhã?
— Porque eu tava entediado, então resolvi vir aqui e descobrir que tipo de nerdice você está fazendo. — Ele disse em um tom de ironia e começou a olhar ao redor do meu quarto. — Isso aqui mudou muito. Acho que eu gostava mais quando era azul claro e tinha menos pôsteres de zumbis e caras de máscaras. Ah, e cabeludos esquisitos com guitarras.
— O Brian May? — Franzi a testa, me sentando na cama. — Ele não é esquisito, tá legal? É maravilhoso. Lindo.
— Se você gosta de caras que parecem poodles... — Ele fez uma pausa e eu revirei os olhos.
— Eu vou te empurrar da janela. — Ameacei, mas estava sorrindo, e ele ergueu as mãos em rendição antes de se aproximar de mim e se jogar na minha cama.
— Faz tempo que eu não venho aqui.
— É, e mesmo com o tempo você ainda não criou o costume de entrar pela porta. — Ironizei, olhando pra ele.
— O que posso dizer? Prefiro uma entrada triunfal. — Ele ergueu os ombros com indiferença e chegou mais perto de mim, revirando os bolsos da calça que vestia e jogando uma pulseira rosa, cheia de berloques e uns pingentes enormes em mim.
Franzi a testa brevemente.
— Steve, isso não é meu.
— Não?
— Não.
— Ah. Deve ser da Robin, então. — Ele deu de ombros e eu ri soprado com a possibilidade. — Não, esquece. Acho mais fácil ser do Dustin. Ou de alguma garota que possa ter esquecido no meu carro.
Ele disse com uma seriedade, que foi impossível não rir. Escondi o rosto com as mãos, sem parar de rir, tentando não fazer barulho demais.
— Aí? Ei, ei! Qual é a graça? Ta tendo um colapso nervoso ou o que?
— Não, é só que... Aí, deus. — Retirei as mãos do rosto, me recuperando da crise de risos e limpando uma lágrima que escorria. — Faz tanto tempo que uma mulher sem ser a Robin e eu não entra no seu carro, que se bobear essa pulseira é até da Nancy.
— Eu te odeio. É sério, eu deveria arrumar uns amigos melhores. — Ele se apoiou pra trás e eu ri fraco, me apoiando pra trás nos cotovelos, ficando mais próxima dele.
— Você não tem. As crianças não contam. — O provoquei e ele estreitou os olhos, inclinando a cabeça do lado e sorrindo fechado em ironia.
— Vou fingir que você não está me humilhando. Tava fazendo o que até eu chegar? Cê tava fazendo aquela cara que você faz quando tá concentrada. Bom, ou quando tá lendo sem óculos. — Pressionei levemente os lábios um no outro e me inclinei pra frente, pegando o rascunho da nova ideia de roteiro.
— É só uma ideia idiota. Coloquei no papel pra não esquecer... Mas não é nada demais.
— Uma ideia pra um novo filme? — Ele perguntou e eu assenti. — Posso ver?
Entreguei os papéis pra ele e o vi se sentar até ficar ao meu lado. Ele leu o resumo e depois o começo do rascunho do roteiro. Pra minha surpresa, ele parecia mesmo interessado.
Mordi minimamente o lábio inferior, não conseguindo deixar de me sentir nervosa. Tinha grandes chances de ter ficado horrível.
— E então? — Perguntei com a ansiedade me atingindo na boca do estômago. Vi ele erguer o olhar.
— Sinceramente? Eu achei perfeito.
— É?
— É. Você sabe, eu não quero ser puxa saco, mas eu realmente não sei onde você guarda essas ideias. Eu fico impressionado, é sério. — Desviei o olhar, com um sorrisinho. Coloquei o cabelo pra trás da orelha, e continuei sentindo o olhar dele em mim. — Só não esquece da gente quando ficar rica e famosa. O Dustin e eu vamos ser os primeiros a ver os seus filmes aqui em Hawkins, enquanto você vai estar em Hollywood, sei lá. Bem longe daqui e desses lances com russos e democães.
Soltei um riso fraco, vendo o sorrisinho nos lábios dele.
— Não esquenta, Harrington. Impossível esquecer o meu primeiro ator principal. — Afirmei, e só então percebi o quão perto estávamos um do outro.
Meu coração acelerou. Foi involuntário, mas eu quase esqueci como respirar. Ele chegou com o rosto mais perto do meu, e eu fiz o mesmo, desviando meu olhar para os lábios dele, mas voltei aos olhos.
Estávamos tão perto, nossas bocas a centímetros de distância. Quando ia fechar os olhos, o barulho da porta da frente batendo e a voz do Lucas e do Mike nos assustou, e praticamente viramos bombas.
Nos afastamos de uma vez, cada um em um lado do quarto. Cocei a nuca nervosamente.
— Acho melhor eu ir. — Ele falou apressado, gaguejando um pouco.
— É, acho que é sim. — Afirmei nervosa, ainda com a mão na nuca, sentindo meu rosto esquentar.
— Te vejo amanhã. — Steve afirmou, meio desconfortável e caminhou apressado até a janela, começando a levantar ela, mas ele não conseguia. Gesticulei que ele tinha que levantar o pedaço de madeira, mas ele conseguiu meio desengonçado e pulou a janela.
Respirei fundo, fechando a janela. Passei as mãos pelo rosto e me joguei na cama, tentando raciocinar o que tinha acabado de acontecer.
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