TRINTA E SEIS


2014

Desde aquela noite na casa de Mark, eu praticamente me mudei para o apartamento de Ben. Ele havia se mudado da cobertura dos pais para um apartamento menor, no mesmo prédio. O que podia ser visto como bom e ruim ao mesmo tempo.

Era bom porque Lyanna estava sempre presente, fosse para levar o jantar ou para nos socorrer caso precisássemos. E ruim porque Lyanna, e principalmente Alicia, estavam sempre presentes.

A decisão da mudança definitiva aconteceu algumas semanas depois, quando percebemos que eu passava mais tempo lá do que no apartamento do Mark e não havia muito sentido em eu continuar, oficialmente, dormindo no sofá da casa do meu melhor amigo por muito mais tempo.

A maior certeza que eu tinha era de que não queria voltar para casa. A última vez que eu havia ido lá, Donna já tinha organizado todas as coisas de meu pai, encaixotado a maioria e encaminhado para um centro de doações. Eu só pedi para que ela deixasse alguns objetos pessoais que tinham algum significado para mim, como seus livros, suas coleções de gravatas e relógios e mais algumas outras coisas que não faziam muito sentido para qualquer pessoa aleatória.

Minha convivência com Ben era muito fácil. Via de regra, nós saíamos de manhã para correr, como sempre fizemos, voltávamos juntos para tomar café da manhã na casa de sua mãe e cada um ia para o seu escritório. Às vezes, ele ia almoçar comigo ou me buscar no final da tarde.

Para muitos, podia parecer uma vida chata e monótona. Mas funcionava para Ben e, principalmente, funcionava para mim.

Talvez no mundo exista pessoas que precisam de aventura e momentos de alta adrenalina. Mas também exista aquelas que se satisfazem com o máximo de pacatez possível.

Ben, inclusive, sugeriu que mudássemos para uma cidade mais calma, que se adequasse mais ao estilo de vida que pretendíamos levar. Mas Nova York era minha única dose necessária de emoção. Eu sentia que pertencia a cada cantinho da cidade que morei durante minha vida inteira.

Estávamos no começo do inverno e a neve começava a se acumular nas ruas e no único vaso de planta da nossa varanda – uma planta que eu não sabia o nome, mas que estava em casa desde que eu me entendia por gente e insistia em não morrer, por mais que eu a negligenciasse todo o tempo.

- Você quer que eu pegue um casaco? – Ben me abraçou por trás enquanto eu me olhava no espelho.

Eu estava com um vestido Michelle Johnson tão comprido que chegava a formar uma caudinha em torno dos meus pés, mesmo eu estando com a sandália mais alta que encontrei e consegui andar. Ele era de um azul quase preto, de alças e busto bordados com predaria sobre um tecido transparente, formando uma flor na altura da cintura. Nas costas, ele tinha uma abertura em V que formava um decote até onde começava a saia de crepe.

Já Ben, estava com um terno preto, colete cinza e uma gravata prateada. Bem básico, mas ainda assim muito bonito.

- Será que eu aguento até chegar no hotel? Se bem que lá vai ter onde deixar... Você pega aquele sobretudo preto, por favor?

Quando Ben se afastou, eu dei mais uma olhada para meu reflexo. Com tudo o que aconteceu, eu perdi alguns quilos, o suficiente para os ossos do meu colo se sobressaírem e o vestido ficar um pouco mais largo no quadril.

Mas o que realmente importava é que eu estava me sentindo bem, a roupa era linda e a festa seria incrível.

Eu tinha me dado o dia de folga e confiado a festa aos cuidados de Flora e Maeve. Era um dia que eu definitivamente queria aproveitar.

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A grande surpresa da noite era que quem celebraria a cerimônia seria o pai de Mark, que havia tirado a licença especial poucos dias antes.

- O casamento é um acontecimento na vida de qualquer pessoa. – Ele falou. – E não importa se é uma coisinha simples no cartório da cidade ou se é em uma festa linda como essa. Mas mais do que uma assinatura em um papel, o casamento é um contrato informal, assinado ilusoriamente pelos noivos. Hoje, Mark e Jonathan não estão apenas oficializando sua união, mas estão assumindo um compromisso um com o outro de amor, respeito, lealdade e cumplicidade.

Na primeira fileira, eu podia ver tia Mary tentando conter as lágrimas.

- Eu tenho o maior orgulho do mundo de poder estar aqui hoje. Eu tenho também o privilégio de ver de perto o carinho e companheirismo que esses dois têm um pelo outro há tanto tempo. E faz um bem danado saber que, hoje, eles podem oficializar essa união há tanto constatada.

Ao meu lado, Belle estava deslumbrante em um vestido um tom abaixo do meu, que eu duvidava que a deixasse respirar um pouco mais fundo.

- Mark, eu tirei a sorte grande quando te concebi como meu filho. Você é muito mais do que um dia eu sonhei. Você é um cara esforçado, dedicado, determinado. Eu me orgulho muito do homem e do profissional que você se tornou, e espero que você se lembre disso todos os dias. Eu te amo, meu filho. – E então ele se virou para Jon. – E você, meu querido, como eu fico feliz de saber que você é oficialmente parte da nossa família! A partir de hoje, Jon, você também é meu filho e eu e Mary te protegeremos com unhas e dentes a qualquer um que tente te fazer mal.

Apesar de estar acostumada, era difícil conter as lágrimas quando era meu melhor amigo quem estava no altar.

- Mark, é de sua livre e espontânea vontade casar-se com Jonathan?

- Sim. – Ele respondeu com a voz rouca. Se eu bem o conhecia, ele não daria o braço a torcer enquanto estivesse cercado de tantas pessoas.

- Jonathan, é de sua livre e espontânea vontade casar-se com Mark?

- Sim. – Já Jon não fazia a menor questão de esconder a emoção em sua voz.

- Então, por favor, unam as mãos direitas e repitam comigo. Eu...

- Eu, Mark Wellington, te recebo como meu companheiro, Jonathan Hernandez... – Mark começou.

- Eu, Jonathan Hernandez, te recebo como meu companheiro, Mark Wellington...

- E te prometo ser fiel.

- Te amar e respeitar.

- Na alegria e na tristeza.

- Na saúde e na doença.

- Na riqueza e na pobreza.

- Por todos os dias da nossa vida. – Eles responderam juntos.

Nessa hora, entrou a priminha de Jon, uma menininha loirinha, vestida em um vestido de princesa azul claro. Ela tinha uma pequena almofada prateada com as duas alianças.

- Com o poder que me foi confiado pelos noivos, eu, em nome de todos aqui presentes, amigos e parentes, abençoo essas alianças como o símbolo de amor, respeito, carinho e união de vocês. E também desejo, com todo o meu coração, que a felicidade de hoje perdure até o último dia das suas vidas.

Mark pegou uma das alianças na almofada e talvez eu tenha sido a única que reparei que ele, o advogado impassível, estava tremendo.

- Jonathan, recebe esta aliança como sinal do meu amor e da minha fidelidade. Em nome da nossa história, do passado, futuro e presente. – Ele disse.

- Mark, recebe esta aliança como sinal do meu amor e da minha fidelidade. Em nome do que construímos, e ainda vamos construir. – Jon terminou.

- Meu Pai, meu Deus, eu peço a ti que também abençoe esses dois à minha frente, para que a vida deles seja mais leve daqui para frente; que todo o preconceito e energia negativa se converta em momentos de alegria, porque nós não somos ninguém para julgar os outros; que o Senhor nos conceda a paz aos noivos, e a todos aqui presentes física e espiritualmente.

Dei uma rápida olhada em Mark e vi que ele ainda tentava conter as lágrimas, apesar de seus olhos estarem marejados.

- É com uma imensa felicidade que eu os considero oficialmente casados, perante seus amigos e familiares. Que somente o amor os persiga até o fim de suas vidas.

Então Mark puxou Jon para um abraço e eles trocaram um beijo cheio de carinho.

Eu fiquei tão feliz de vê-los realizar um sonho, que não consegui mais segurar lágrimas. Logo depois da cerimônia, eles tiraram algumas fotos enquanto os convidados se deslocavam para o lugar da recepção e eu pude finalmente cumprimentá-los.

Belle, ao meu lado, também se esforçava para se recompor.

- Liz! – Mark deu um grito quando me viu e me rodopiou no ar. – Até agora está tudo incrível, obrigado!

- Não tem nem o que agradecer. – Beijei seu rosto. – Minha melhor recompensa é ver vocês felizes desse jeito!

De verdade, era um sentimento tão bom impregnado no ar que ninguém ousava sequer tirar o sorriso do rosto.

- Olha só o que vocês fizeram! – Belle reclamou, fingindo estar chateada. – Devo ter borrado toda a minha maquiagem!

- Que nada, Belle! Você está linda como sempre. – Jon falou, levantando Belle do chão para dar um abraço nela.

Mas, em algum momento, Ben me apontou com o olhar quem estava esperando por mim. No fundo do salão, onde Lionel esperava pela minha amiga, eu pude ver Gabriel.

Ele me olhava com os ombros baixos e estava definitivamente mais introvertido do que sua versão normal. Ele e o irmão haviam sido incluídos na lista de convidados logo pouco depois de chegarem em Nova York, mas eu não esperava que eles fossem aparecer, ou pelo menos que Gabriel fosse vir.

- Você está linda. – Ele disse quando eu me aproximei. – Eu te devo um pedido de desculpas pela forma como eu agi da última vez que nos vimos.

- Imagina. – Sorri. - Você estava com a emoção aflorada. Eu entendo. E, aliás, você não foi injusto.

- Eu desejo que você e o Benjamin acertem todas as pontas e sejam felizes.

- Obrigada. Eu também desejo que você encontre alguém que te faça feliz.

Estávamos um grupo muito seleto de pessoas na antessala ao lado da recepção. Éramos eu, Ben, Mark, Jon, Belle, Lionel, Gabriel, uma prima de Jon chamada Julia, outro casal de padrinhos e os pais de Mark.

Um garçom trouxe as taças de champagne e nos deixou sozinhos novamente.

- Eu queria dizer uma coisa! – Belle gritou antes do brinde. – Eu sou muito grata a todos vocês por fazerem parte dessa minha vida doida. – Ela riu. – Jon, você já era do grupo, mas seja bem-vindo de novo às nossas vidas. Eu amo muito vocês!

Como se pudessem antever meus movimentos, todos se viraram para mim, como se já esperassem que eu falaria alguma coisa.

- Bom, vocês sabem que eu não nego um discurso. - Ri. - E vocês devem imaginar como é importante pra mim estar aqui agora, presenciando esse momento tão aguardado por todos nós. Jon, você precisa saber que eu, como melhor amiga de Mark, deveria te ameaçar e te forçar a ser o melhor marido do mundo para o Mark. Mas, eu sei que você nunca faria nada diferente disso e eu te amo por isso. - E então me virei para um Mark agora choroso. - E você, ai meu Deus, o que posso falar de você? Você é o cara mais sensato e carinhoso que eu já conheci em toda a minha vida. Você é o melhor amigo, aquele que sempre esteve disposto a abrir a porta de casa e me oferecer o sofá e um ombro amigo. Você sempre acreditou em mim e respeitou minhas decisões. E eu sou tão grata por isso! Eu te amo demais! E espero, do mundo do coração, que vocês se complementem e se descubram diariamente.

- Eu também queria falar uma coisa. – Jon reuniu coragem para falar. – Desde quando eu conheci cada um de vocês, sabia que teriam um lugar especial no meu coração. Primeiro foi o Mark, que eu vi de cara que era o amor da minha vida. Depois Liz e Belle, que me receberam com a maior alegria do mundo. Fiquem sabendo que eu nunca vou esquecer aquele dia no Rockefeller. E todos os que estão aqui, obrigado por me acolherem na família e na vida de vocês.

E, como eu estava de frente para a porta, fui a primeira a ver quando um casal mais velho parou antes de entrar no ambiente. Ela tinha o mesmo tom de pele mais moreno de Jon e estava lutando para conter as lágrimas. Ele era bem alto, grande em todos os sentidos, e segurava os ombros da esposa de forma protetora.

Mark foi o segundo a notar e gentilmente virou Jon para a direção que nós olhávamos.

Ninguém precisava me falar quem eles eram. No fundo do meu coração, eu estava esperando que eles aparecessem desde o começo da cerimônia.

- Mãe? – Ele perguntou. – Pai?

E então correu para os braços dos pais, onde chorou por algum tempo. Pelas minhas inúmeras conversas com Mark, eu sabia bem que ele nunca tinha superado o distanciamento da família mais próxima. Ele tinha, claro, contato com tios, tias, mas ele sentia muito a falta dos pais.

- Ah Jonathan! – Foi a mãe de Jon quem falou. – Nós sentimos muito! Nós te amamos, meu filho!

E, ouvindo os três se reconciliarem, nós os oferecemos nosso brinde. 


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HELLO!

Esse é o meu capítulo preferido de todo o livro! É uma cena que eu tinha certeza que aconteceria desde que o Mark surgiu na minha cabeça e é um assunto que fechou o primeiro e o último capítulo do livro, não sei se vocês lembram.

Mas eu não sabia se seria no meio ou no final.

Eu cheguei a pensar em terminar com o casamento da Liz, afinal, ela vive de organizar casamentos, precisava do dela, né?

Mas não. Sabem aquele ditado "em casa de ferreiro, espeto de pau"?

A Liz e o Ben funcionam dessa forma. Quando ele a propôs, eles surtaram, e em time que está ganhando não se mexe, certo? (Sorry, eu amo ditados hahaha)

E, no mais, Mark e Jon merecem esse detaque no final, por tudo que fizeram pela Liz desde sempre. Essa história não é só da Liz. É principalmente dela, do Mark e da Belle. É a história de amor dos três, a romântica incontestável, o da relação saudável e duradoura e a maluquinha que ainda está em busca de um amor (mas até quando?).

E os pais do Jon aparecerem no final aconteceu porque toda forma de amor é válida, e eu não podia deixar que eles fossem tomados pelo preconceito. Por mais tarde que eles tenham dado o braço a torcer, sempre há tempo pra voltar atrás e se permitir amar o próximo. 

Espero que tenham gostado!

E sexta tem o epílogo :(


OBS: mas vocês acharam que se veriam livres de mim?

Ainda essa semana, passo aqui pra anunciar o próximo projeto aqui do wattpad <3


Um beijo, amo vocês <3

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