42. Sempre seu Nox.

ENQUANTO ISSO, Emeline estava encostada em um canto do salão de baile, apenas observando Graham guiar Olívia em meio a outros casais enquanto dançavam. O sorriso tímido nos lábios da ruiva e os olhos brilhantes do valete revelavam o quanto estavam contentes em estarem juntos, embora nunca admitissem.

Emeline não pôde evitar a risadinha que escapou de seus lábios. Quando sua amiga reconheceria que estava apaixonada?

Como estava sozinha, não queria correr o risco de alguém lhe tirar para dançar, se esgueirou disfarçadamente na direção de uma grande porta de vidro, onde uma grande cortina branca, um pouco transparente, caía sobre ela, tapando a sacada que havia além dela.

Estando finalmente só, Emeline se debruçou sobre a balaustrada da sacada, observando a lua alta no céu, o vento gélido fazia os pelos se eriçarem ligeiramente. Enquanto esfregava os braços expostos, procurando se aquecer um pouco, ela desviou os olhos ligeiramente para dentro novamente, observando os casais rodando enquanto dançavam uma quadrilha.

Quando voltou os olhos para o jardim novamente, se deparou com a figura de Nox em frente a ela, encarando. Involuntariamente soltou um grito e lhe acertou um tapa, o fazendo se desequilibrar e ficar pendurado na balaustrada.

Se recuperando do susto, Emeline tapou a boca com as mãos, mas tratou de ajudar Nox a se equilibrar pelo lado de fora da balaustrada novamente. Quando retomou a postura ele a olhou indignado, mas não escondeu a risada que ecoou de sua garganta.

- O que faz aqui? - Perguntou Emeline, para logo em seguida completar - Se bem que o baile é em sua "homenagem". Mas que bando de hipócritas, não convidaram o homenageado.

Nox apenas deu de ombros e riu novamente, observou o movimento dentro do salão para logo em seguida enfiar a mão dentro do bolso e de lá tirar duas cartas. Uma endereçada a Emeline e outra a Giuseppe.

Emeline pegou as cartas meio receosa e ia abrindo a sua, quando a mão enluvada de Nox pousou sobre a sua e ele balançou a cabeça negativamente, sinalizando que não era aquele o momento para ela ler o conteúdo da carta.

- O conteúdo da carta é tão sério assim que não posso abri-la agora?... descobriu mais alguma coisa? - Quando ele confirmou com a cabeça, Emeline teve de conter a agitação que se apoderou dela, se Nox havia descoberto mais alguma coisa, sem dúvida teria contado na carta. Mal podia esperar para ler o que ele havia escrito - Muito bem, lorde Nox! Sempre soube que era astuto.

Nox riu novamente, fazendo os olhos se estreitarem, naquele dia ele parecia especialmente animado e mais aberto do que os outros dias, e Emeline se questionava se havia um motivo em especial. Por algum motivo se perguntava se o fato de estar com ela o fazia se sentir bem, pois quando ela estava perto de Nox se sentia mais calma, mais segura e mais eufórica também. Embora houvesse todo aquele mistério em volta dele, embora não soubesse nem ao menos sua identidade, se sentia confortável.

- É isso o que o senhor é? Um lorde? Um soldado, talvez?

Ele permaneceu apenas a encarando, com os olhos parecendo um pouco mais escuros pela pouca luz, cruzou os braços, se equilibrando apenas com os pés, e ergueu uma sobrancelha, como se a desafiasse a realmente descobrir quem ele era.

Emeline, no entanto, apenas resmungou e deixou escapar um suspiro, enquanto revirava os olhos.

- Tudo bem, já sei que se quisesse que eu soubesse quem o senhor é, provavelmente já me teria dito. - Desviou os olhos para baixo, pensando consigo mesma até onde iria com aquilo - Obrigada. Por me ajudar e por confiar em mim, nem mesmo sei porque me meti nisso, mas agora não consigo mais sair. Talvez minha curiosidade tenha me levado longe demais... ainda assim me sinto tão viva!

Lentamente ele a puxou para perto e mesmo com a máscara cobrindo o rosto, Emeline sentiu quando ele beijou a testa dela e lhe dirigiu um olhar terno, roçando os dedos levemente sobre a bochecha dela, seus olhos percorriam cada traço do rosto dela, sem se desprenderem, como se quisesse decorar tudo o que via.

- Por que está agindo como se isso fosse uma despedida?

Nox não respondeu, nem esboçou qualquer reação daquela vez, o que fez Emeline desviar os olhos, claramente desconfortável. Quando voltou para Nox, o viu paralisado, olhando algo além dela. Emeline começou a temer o que ou quem fez o olhar dele parecer tão alarmado daquela forma, mudando completamente seu humor de poucos segundos antes. Se virou rapidamente, se deparando com Denis Romano, o primeiro ministro, os encarando com certa curiosidade, ao mesmo tempo que parecia enojado.

Emeline sentiu o coração disparar naquele momento, se virou novamente para Nox, a fim de fazê-lo fugir dali, mas ele já havia desaparecido completamente. Ela soltou um suspiro aliviado, com pelo menos um pouco de sua preocupação se dissipando, mas quando se virou para voltar ao baile, Denis ainda a encarava, dessa vez com um sorriso enigmático, que ela não entendeu naquele momento. Lentamente ele levantou a taça que tinha nas mãos e movimentou levemente a cabeça, como se estivesse a cumprimentando, logo depois continuou seu caminho por entre as pessoas, e Emeline não soube explicar como sabia daquilo, mas algo em seu interior dizia que depois daquilo teria muitos problemas. Estava em um atoleiro.



Giuseppe havia acabado de chegar quando encontrou os olhos perturbados de Emeline, que estava escorada em uma pilastra, procurando se esconder do resto das pessoas que enchiam o salão. Assim, ele se aproximou rapidamente dela, Emeline sequer notou sua aproximação, apenas quando Giuseppe tocou sutilmente seu braço ergueu os olhos para encará-lo.

A única reação que conseguiu esboçar foi abraça-lo apertado, ignorando qualquer um que pudesse passar por ali e os ver. Confuso, Giuseppe olhou ao redor, certificando-se de que, por sorte, ninguém os havia visto, e a empurrou um pouco mais para trás, os escondendo atrás de uma cortina pesada, em tecido verde e dourado.

- Você está bem? - Perguntou ele, a afastando delicadamente e observando cada traço de seu rosto.

Emeline balançou afirmativamente a cabeça e respirou fundo antes de responder:

- Sim, estou.

- Então por que está tão perturbada?

- Nox esteve aqui.

- Aqui? - Proferiu Giuseppe com certa surpresa, arregalando os olhos - Como não o viram?

- Essa é a questão, ele foi visto... o primeiro ministro o viu.

- Ele alertou alguém?

- Não. - Ela balançou a cabeça e olhou para os lados, para depois, impacientemente, começar a bater o pé no chão ao completar - Mas quando ele viu Nox... eu estava junto dele.

Giuseppe precisou de alguns momentos para assimilar o que lhe era dito, involuntariamente os olhos se arregalaram e a boca se abriu ligeiramente, mas nenhuma palavra saía, era como se tivesse se esquecido de como falar. Aquela situação seria um grande problema a se resolver, Denis era uma das pessoas que estava mais empenhado em capturar Nox e ter visto Emeline junto dele poderia acarretar sérias consequências para ela, se fosse associada à figura do cavaleiro. Ao pensar em qualquer hipótese que pudesse lhe acontecer, as mãos de Giuseppe começaram a suar e um certo tremor tomou conta delas, o coração disparou e imediatamente sua mente começou a trabalhar com milhares de ideias, fossem situações que poderiam acontecer, ou até mesmo argumentos que pudessem livrar Emeline de qualquer acusação.

- Tudo bem. - Disse por fim - Primeiro vamos manter a calma, talvez ele não a associe ao Nox.

- Talvez não associe? Ele literalmente me viu conversando com Nox! Não há como escapar disso.

- Há, há sim. Podemos dizer que apenas estava impressionada e que ele apareceu de repente.

- Giuseppe, os relatos disseram que literalmente viram uma mulher junto de Nox, me tornei tão procurada quanto ele. Se o primeiro ministro juntar as peças do quebra-cabeça... E se o senhor Romano ouviu nossa conversa?

Emeline não queria transparecer seu desespero, pela primeira vez na vida estava com medo, se sentia uma idiota de não ter pensado nas consequências, mas em momento algum se mostrou arrependida. Giuseppe, no entanto, se sentia um pouco culpado, talvez ele próprio houvesse arrastado ela para dentro de toda aquela situação e mesmo que não demonstrasse, ele conseguia enxergar a perturbação e o medo dela. Tomando o rosto de Emeline entre suas mãos, ele uniu sua testa a dela e com voz baixa disse:

- Calma. Eu não vou deixar nada te acontecer, vou arranjar alguma solução.

- Não tem que se preocupar em limpar a sujeira que eu mesma fiz.

- Não. Talvez eu tenha um pouco de culpa também. A coloquei no meio dos meus problemas quando lhe contei tudo o que havia descoberto.

Se afastando, Emeline mirou os olhos de Giuseppe e dessa vez sua expressão era dura, não revelava o temor de antes, mas sim uma determinação indestrutível.

- Eu fiz porque quis. E muito antes de decidir te ajudar eu já havia saído atrás de Nox e decidido ajuda-lo também. Então toda essa confusão fui imprudência minha, mas não me arrependo um só segundo, se houver consequências que venham. Eu assumi o risco, eu sabia o tempo todo o que poderia acontecer.

Ainda relutante, ele concordou com a cabeça e passou a mão pelo cabelo, bagunçando os fios, e desviando os olhos por alguns segundos. Por fim, se voltou para ela e proferiu:

- Tudo bem. Por enquanto, aproveitemos o baile e deixemos essa questão para mais tarde. Viu Graham?

- Da última vez que o vi ele estava dançando com Olívia, mas creio que agora já devam ter trocado os pares.

- Vamos voltar para junto deles então e esquecer momentaneamente o que aconteceu.

Emeline concordou com a cabeça e já iam saindo de trás da cortina quando ela puxou Giuseppe de volta e entregou a carta que antes Nox havia deixado com ela. Antes que ele perguntasse algo, quando pegou a carta parecendo confuso, Emeline tomou a frente e explicou:

- Pouco antes de sermos vistos Nox me entregou duas cartas, uma é minha, a outra é sua, mas ele pediu que não lêssemos aqui. Provavelmente não quer que ninguém mais veja.

Giuseppe concordou com a cabeça e enfiou a carta no bolso do fraque, pouco antes de sair dali e deixar Emeline sozinha, esperando o momento certo de também sair dali.

O baile não teve outros contratempos, tampouco foi muito proveitoso para Emeline, não pôde deixar de pensar no que havia acontecido, mesmo que se esforçasse para esquecer. O olhar que o primeiro ministro lançava sobre ela a todo instante a alertava de que talvez ele estivesse tramando algo, principalmente porque na maior parte do tempo ele permaneceu perto de Giuseppe a alertando com apenas um olhar toda vez que tentava se aproximar.

Emeline dançou com poucos cavalheiros e passou a maior parte do tempo recolhida em seu próprio canto. No fim de tudo, se isolou no quarto após a chegada ao palácio, ninguém a questionou por isso, já estava tarde e todos pareciam cansados, ainda assim, a agitação dentro dela não se aquietara. Sentada em sua cama, observando seu quadro incompleto na antessala, Emeline apertava a carta de Nox em suas mãos, decidindo se deveria ler naquele momento ou se deveria tentar dormir e evitar ler palavras que pudessem a deixar mais alarmada.

Por fim, sua curiosidade foi maior, encarou a carta lacrada com cera vermelha e franziu o cenho, estranhando o selo que fora posto ali, duas espadas cruzadas, nenhuma inicial que pudesse identificar a pessoa que escrevera a carta. Se o próprio Nox não tivesse entregado a ela, jamais saberia quem fora o remetente.

Deixou os devaneios de lado e rompeu o lacre, desdobrando o papel e respirando fundo antes de ler as palavras gravadas em uma letra bem marcada.


"Querida senhorita Black, em primeiro lugar, quero começar essa missiva agradecendo por confiar em mim, apesar de todo o mistério acerca de quem realmente sou. Espero que entenda que isto não é somente por meu bem e segurança, mas pelo seu também.

Jamais em meu caminho encontrei alguém que demonstrasse alguma preocupação ou que se mostrasse tão disposta a ajudar, tampouco alguém seria louco de fazê-lo. Não tome por ofensa minhas palavras, lhe rogo, mas há de concordar que não são muitas as pessoas que se dispõem ao perigo de serem pegas somente por acreditar que alguém como eu está apenas tentando tornar essa cidade um lugar mais justo.

No entanto, não escrevi apenas para lhe agradecer, mas para alertá-la e pô-la a par de tudo o que descobri, ou pelo menos alguns fragmentos de um grande enigma. Há algumas noites ouvi dois homens conversando acerca de algumas mercadorias que estavam perto de chegar, as quais a senhorita conseguiu encontrar dias depois. Por ventura, o mapa que deixou comigo ajudou-me a encontrar outros lugares em que outras mercadorias estavam, infelizmente ainda não consegui obter uma forma de alertar as autoridades, dessa forma, espero que o rei acredite em tudo o que relatei na carta em que pedi que o entregasse.

E por falar no rei, peço que não permita que fique sozinho com o primeiro ministro, ele era um dos homens que avistei conversando sobre as mercadorias, é provável que esteja por trás de tudo, o que justifica tantos fatos perdidos, sua influência apaga qualquer rastro que possamos seguir. E é por isso que, com certo pesar, peço que não me procure mais, pois, é aqui que deixamos de colaborar um com o outro. Não estou fazendo desfeita de toda sua ajuda, apenas estou a preservando do mal que nos cerca.

Na última noite que nos encontramos e que se feriu, percebi o quão arriscado é estar junto comigo, e o quão desmazelado fui para com a senhorita, esta luta não é sua, nem deve ser. Então, para seu próprio bem, mantenha-se perto do rei, onde estará segura, prometo terminar isso e não mais atormentá-la. A única coisa que te peço é que fique atenta ao primeiro ministro, sei que é capaz disso. Confio e acredito na senhorita para este bom trabalho.

Obrigado pelo tempo de sua companhia que me proporcionou.

Sempre seu

Nox. "


Emeline já havia terminado de ler a carta, mas seus olhos permaneciam cravados no papel, percorrendo várias e várias vezes as letras ali gravadas, tentando encontrar qualquer vestígio de que talvez pudesse ter lido errado. As mãos tremiam e o coração batia forte dentro do peito. Nox não poderia ter feito aquilo!

Não, ele não poderia continuar sozinho, não poderia tê-la deixado para trás. E se ele precisasse de alguém? E se acabasse se machucando ou pior? E se o capturassem, a quem poderia recorrer?

A verdade era que Emeline buscava algum argumento para poder continuar naquilo porque ela precisava continuar, não porque Nox precisava de ajuda. Ele já fazia isso muito antes de ela sequer pensar em pisar em Vienere, sua presença ou a falta dela não faria diferença para ele, mas para ela... ah, ela sentiria aquilo. Se sentiria presa novamente, se sentiria uma inútil, se sentiria fraca. Mas apesar do sentimento de revolta, sabia que no fim Nox tinha razão, havia se exposto muito e aquela noite fora a prova de sua inconsequência. Denis Romano a havia visto e agora sabendo que ele estava por trás de tudo, não conseguiu se impedir de sentir medo, mais do que já sentira, a angústia cercou seu coração e em partes por saber que Giuseppe estava sempre tão próximo àquele homem e confiava nele.

Se ao menos as palavras de Nox o pudessem convencê-lo...

Rogava aos céus que isso acontecesse.

Quando sentiu uma lágrima rolar sobre a face, a secou rapidamente, notando que suas bochechas já estavam molhadas. Odiava sempre que chorava sem perceber. Limpou o rosto e respirou fundo se pondo de pé, caminhou até a lareira na antessala e ali atirou a carta, ficando bons minutos assistindo o fogo a consumir até que se tornasse meras cinzas. Lhe doía queimar as únicas palavras que Nox lhe dirigira em semanas, mas não poderia correr o risco de alguém descobrir aquela correspondência.

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