41. Mortos são mortos

NA SEMANA que se seguiu se encontraram escondidos praticamente todos os dias, não haviam conversado sobre como seria a partir daquele dia, e particularmente se sentiam um pouco reticentes em conversar. Depois da descoberta das salas subterrâneas, Giuseppe pediu ajuda da segurança nacional para que as investigações fossem mais profundas, mas tudo o que encontraram foram depósitos vazios, todas as passagens para as salas subterrâneas aparentemente não existiam, e Giuseppe sequer podia atestar, afinal Emeline deixara a planta das docas com Nox.

Frustrado, ele buscou outros meios, pedindo que fosse intensificada as buscas pelos homens que haviam atacado Emeline e que ela dera a descrição. No entanto, o mais perto que chegaram deles foi quando encontraram os corpos boiando no rio.

Giuseppe passou a semana toda irritado com aquilo, toda e qualquer brecha que as autoridades encontraram pareciam não dar em lugar algum, tentavam a todo custo esconder os fatos da população, o que a seu ver não estava nada certo, mas alguma informação sempre se espalhava, causando medo. Para piorar a situação, Denis insistiu em prosseguir com o baile e precisaram enfrentar críticas, alguns até apoiaram, outros pareceram receosos. O fato era que Giuseppe só desejava que aquele pesadelo acabasse, e na noite do baile, pouco antes de todos partirem para o salão que havia sido preparado, ele acabou recebendo a visita de Henry. O velho homem parecia até entusiasmado, o que provocou certa curiosidade no mais novo, aquele senhor não costumava frequentar muitos bailes.

— Vejo que aprovou a ideia do baile, senhor Galaretto. – Disse Giuseppe, indicando a poltrona a sua frente, na sala particular.

— De fato. Foi a decisão mais acertada, majestade. – Respondeu o homem, se acomodando – Espero que assim as coisas se acalmem.

— Ainda me parece insensato. Um baile não irá resolver, apenas distrair as pessoas.

— Mas está havendo um progresso, não?

— Se por progresso o senhor quer dizer galpões vazios e corpos no rio... então estamos em um grande progresso.

Giuseppe bufou contrariado e passou a mão pelos cabelos escuros, os tirando do lugar e bagunçando os fios que Graham havia arrumado para o baile.

— Ainda não é o fim, se nada deu certo é porque ainda não acabou.... Achou as salas subterrâneas, não é mesmo? – Inquiriu Henry, inclinando o corpo para frente, parecendo curioso.

— Pessoalmente não. Encontrei uma planta das docas escondida no retrato de meu pai, mas entreguei a... um amigo. E essa pessoa encontrou as salas. No entanto, quando pedi para investigarem, as passagens já não estavam lá. Esconderam tudo.

Henry abriu um sorriso conspirador e permaneceu alguns segundos encarando Giuseppe, fazendo o mais jovem estranhar aquele comportamento do homem. Apoiando ambas as mãos na bengala, o senhor se aproximou mais e com um sussurro, disse:

— O senhor o viu.

— A quem se refere?

— Nox Nocture. Sua hesitação mostrou-me isso, me pareceu desconfortável em admitir.

Novamente Giuseppe expirou, desviando os olhos tomou uma grande quantidade de ar, respondendo:

— O que eu vi, senhor Galeretto... foi um homem de carne e osso.

— Ele sempre irá aparecer como alguém de carne e osso, majestade. Tenho certeza que a intenção dele não é assustar.

— Ele está fazendo um péssimo trabalho então.

— Lembre-se do que eu disse, quando os espíritos se revoltam, é o sangue dos vivos que escorre.

Giuseppe se calou por mais alguns segundos, torcendo os lábios em contradição, evitando falar qualquer coisa que ofendesse Henry. Ainda continuava ponderando todas as possibilidades em sua mente, uma das questões era tão antiga que atormentava seus pensamentos por anos e quando Henry mencionou que Ettore sabia das salas subterrâneas e inclusive tinha algumas joias traficadas, teve certeza do que já desconfiava.

Resolvendo aproveitar aquela situação, voltou os olhos negros para Henry e com seriedade, perguntou:

— Meu pai tinha uma amante, Henry?

O velho homem piscou aturdido com a mudança repentina de assunto e por um momento se perguntou se o jovem à sua frente estava brincando, no entanto, a expressão de Giuseppe revelava apenas austeridade e certa expectativa pela resposta.

Pigarreando para dispersar o constrangimento, Henry respondeu:

— Bem... essa pergunta é um tanto quanto inusitada, majestade, não entendo que relação tem com tudo o que estamos falando...

— Aparentemente nenhuma, é apenas uma questão antiga que carrego. Sei que conheceu bem meu pai, por isso fiz a pergunta. Sei também que é o único que será sincero comigo... pelo menos é o que espero.

— Agradeço a confiança que deposita em mim.

— Então, por favor, responda-me. Meu pai tinha uma amante?

Henry desviou os olhos e, de repente, pareceu ter adquirido certa atenção pelo chão sob seus pés, não ousava encarar Giuseppe, que permanecia encarando o homem, sem se importar em como parecia um obcecado.

— Eu receio que já saiba a resposta, majestade.

— Quero uma confirmação.

— Não gosto muito de falar sobre os mortos.

— Mortos são mortos, não ouvem, não falam e nem se irritam. Estão mortos. - Ao perceber como tinha sido rude, Giuseppe relaxou e com a voz mais branda, completou – Me desculpe, não pretendia ser rude, apenas preciso de uma resposta.

O senhor de cabelos brancos suspirou e balançando a cabeça, confirmou:

— Não era muito íntimo de seu pai, majestade, mas estava perto o suficiente para saber que existia uma dama.

— Sabe quem é? Se era para ela que iam as joias?

— Isso não poderei confirmar, nunca soube quem era.

— Entendo.

Giuseppe abaixou a cabeça e por alguns segundos se permitiu sentir uma fúria sem tamanho, não sabia porque se sentia daquela forma, já era de se esperar que seu pai tivesse aquele tipo de atitude, ainda assim, não conseguia se impedir de sentir a raiva queimar por dentro. No entanto, alguma pequena esperança começou a borbulhar dentro de si, se encontrasse essa tal mulher, poderia conversar com ela, talvez ela soubesse dos planos de Ettore, talvez soubesse quem ele havia contratado para matar Cassandra e se descobrisse quem foram os responsáveis...

Teve os pensamentos interrompidos, quando a voz de Henry ecoou novamente:

— Majestade, se sente bem?

— O quê? - Perguntou, parecendo um pouco surpreso de que o homem continuasse ali.

— Perguntei se estava bem, está um pouco pálido.

— Ah... estou bem sim, só estava divagando. - Batendo as mãos nas pernas, se pôs de pé e disfarçando todo e qualquer sentimento, direcionou um sorriso para Henry e completou – Vamos? O baile já deve ter começado.

— Claro, claro. Só preciso chamar minha carruagem e já irei.

— Deixe disso, Henry, irá comigo na minha carruagem.

— Oh, não. Não quero incomodar, majestade, isso já é indevido demais. Além disso, deve querer levar suas convidadas.

— De forma alguma, o senhor é meu convidado hoje. Ademais, as damas já foram para o baile, pedi para meu valete acompanhá-las.

Henry deliberou por alguns segundos, ainda reticente em aceitar, por fim, abriu um sorriso e balançou a cabeça concordando e se pôs de pé prontamente, respondendo:

— Nesse caso, será uma honra majestade.

Giuseppe sorriu contente e dando leves tapinhas no ombro de Henry o guiou para fora do escritório. 

"Capítulo um pouco menor hoje para preparar vocês! Semana que vem teremos um pouquinho de tensão! Obrigada por lerem até aqui. Beijos e até a próxima!

Rafa."

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