Curti, e agora?
A tarde ensolarada lá fora fazia do presente dia perfeito para uma praia ou piscina, porém Joyce não podia se dar a este luxo, precisava estudar para o vestibular que ocorrerá no próximo final de semana. Ela abaixa a cabeça em cima dos livros lamentando não ter nascido herdeira, as coisas seriam tão mais fáceis. Entediada fecha os livros e desliga o computador, depois de 1:30h de estudos era hora de fazer uma pausa. Ela refaz o coque nos cabelos lisos loiros, enquanto caminha até a cozinha, abre a geladeira e sorri satisfeita ao ver o pote de sorvete de baunilha, seu preferido, lhe esperando. De volta ao quarto, senta na cama apoiando o pote na perna. Enquanto coloca colheres generosas de sorvete na boca com a mão esquerda, com a direita rola o feed da rede social. Num dado momento aparece-lhe um anúncio de um aplicativo de namoro, chamado "Par Perfeito". - ri soprado. Não fazia o tipo que acreditava nessas coisas, mesmo assim após o vídeo de apresentação do app rolar, pensa em verificar como funciona. Além disso, não tinha nada de bom para fazer, a não ser olhar para as paredes de seu quarto. Clica em baixar.
- Vamos ver qualé a desse app - diz a si mesma
Após uns segundos o aplicativo é baixado e instalado. Ela preenche as informações obrigatórias que consistia em idade, gênero e preferência, bem essa última era fácil, homens, e assim Joyce tornou-se a Burguesinha57, e estava pronta para encontrar seu "Par Perfeito".
Não colocou fotos suas, claro. Deus a livre de algum colega ou amigo seu ver seu rosto num aplicativo de namoro, seria motivo de chacota na certa. Por esse motivo, optou por uma foto fofa de uma bonequinha que encontrou no site de buscar. O aplicativo funcionava da seguinte forma: Se Joyce curtisse a foto de um pretendente e ele curtisse a dela... Tcharam, um casal perfeito. Abriram-se a oportunidade deles conversarem no chat e na melhor das hipóteses, pessoalmente.
Para falar verdade, os flertes de Joyce dificilmente acontecem por redes sociais ou aplicativos do tipo. Costumava flertar sempre com caras que já conhecia ou que algum de seus amigos conhece, seja em festas, cursinhos ou outro ambiente. Dessa forma, usar aplicativo de namoro era algo novo.
Na página inicial, apareceram várias sugestões de garotos/homens apareceram à disposição dela. Agora, era só escolher e curtir aquele que mais lhe agradava. Joyce vai rolando o feed observando a variedade de fotos e perfis, alguns tinham foto dos olhos, outros dos lábios, poucos do rosto e em maior quantidade do abdômen. Esses eram os campeões. Continuou vendo as fotos distraidamente ao mesmo tempo que devorava o delicioso pote de sorvete ao seu lado, porém ao esticar as pernas que começava a formigar por permanecerem na mesma posição, o celular escorregou de sua mão e ao tentar pegá-lo rapidamente, acabou curtindo sem querer a foto de um usuário chamado Daddy . Ao perceber a merda que tinha feito, deixo o pote de sorvete de lado para tentar consertar o erro. Sendo assim, clico várias vezes na tela tentando desfazer uma curtida, mas foi em vão, as curtidas não saiam.
- Que Merda e agora? o que faço? - fala a si mesma desesperada
Não queria chamar atenção de ninguém, principalmente, de um cara que se intitulava "daddy" Odiava esse tipinho. Sem ter o que fazer, resolveu sair do aplicativo e se manter invisível, mas não havia mais como, ele havia anotado. O telefone sinaliza uma mensagem. Ela liga o aparelho.
- Gostou do que viu? - Pergunta, e em seguida manda um emoji de diabinho.
"Droga" - resmunga
Por um momento, ela cogitou não responder, mas antes que pudesse bloqueá-lo, chegou outra mensagem.
- Não vai responder? Está com medo? - E mais uma vez adicionou um emoji de diabinho, o que a fez revirar os olhos.
- Não! - Por fim resolveu responder - Desculpe-me. Só cliquei errado.
- Clicou errado? É um novo tipo de cantada ou a Burguesinha57 está se fazendo de difícil?
Bom, neste momento ela poderia ignorar e deixar a conversa de lado, mas era tarde demais, ele já havia conseguido tirá-la do sério. Sem contar que, de certa forma, aquela conversa era o que estava a tirando do tédio. Sendo assim, respondeu.
- Não, cidadão. Não estou me fazendo difícil ...
Ainda estava digitando quando ele mandou outra mensagem.
- Então quer dizer que você é fácil?
Fiquei sem palavras e senti as minhas bochechas esquentarem, confesso. O cara rebatia tudo, ou talvez, eu fosse muito lerda mesmo.
- Quero dizer que você me interpretou mal ... - Digito um pouco trêmula.
- Então, explique-se.
Suspiro aliviada e enfim ...
Depois de explicar, automaticamente, se ela se desse conta, a conversa começou a fluir naturalmente, em poucos minutos esqueceu que estava num aplicativo de namoro e conversa como se houvesse encontrado o cara mais legal do universo. Diferente dos outros caras que conheceu pela internet, ele não falava sobre putaria e ou nada do tipo, era uma conversa agradável sobre coisas aleatórias; música, filmes; infância. E foi por esse diferencial que passaram toda tarde e boa parte da noite conversando. Fazia tempo que Joyce não ficava tão imersiva numa conversa, parecia ter retornado ao início da adolescência sorrindo a toa, toda boba.
Conversa vai, conversa vem e descobriram que moravam próximos e, assim, ele propôs que se encontrassem. A princípio Joyce não gostou da ideia, vai fosse um psicopata ou um serial killer como nos filmes ou noticiários da TV. Pensou por alguns minutos e analisou, no pior das hipóteses poderia se tornar estatística como garota desaparecida, ou na melhor delas poderia conhecer alguém realmente interessante. Então, colocou na balança e por fim, decidiu aceitar. Com tanto, que acontecesse num lugar movimentado.
- No shopping Central? Em frente à loja Giraffas? - Perguntou incerta.
- Pode ser. - Ele concorda para a minha surpresa, talvez não fosse um psicopata, afinal...
Antes de dormir, contou tudo para Vanessa que, como era de se esperar, achou loucura. Joyce revirou os olhos do sermão da amiga, desligou o aparelho ignorando suas mensagens e ficou pensativa imaginando como seria o encontro, até que adormeceu.
No dia seguinte, acordou com um misto de animação e ansiedade. Como ele será? Gordo? magro? alto? baixo? - pensava enquanto tomava banho. - E se ele for um velho, nerd de 35 anos que mora com a mãe?
- Meu Deus - apoia a cabeça nas mãos pensando na possibilidade - Mas talvez não seja - volta a ser otimista.
- Mãe, estou saindo. - avisa após sair do banho arrumada
- Onde vai?
- No shopping com uma amiga - sai de casa antes que a mãe faça mais perguntas.
Em frente a casa, compartilha sua localização em tempo real com Vanessa, vai que desse errado.
Depois de vinte minutos dentro do ônibus, finalmente chegou no shopping. Sentiu um frio na barriga, tantas pessoas, tantos homens passando por lá e para cá, podia ser qualquer um, né? O telefone sinaliza que chegou mensagem.
"Já estou no Shopping"
Ela sente o nervosismo batendo na porta, coração disparado. Não podia dar para trás agora. Respira fundo, toma coragem e caminha em direção a escada rolante, antes que colocasse o pé, esbarra em Otávio, amigo do seu amigo Wallace.
Ela não o conhecia de fato, só sabia seu nome, e que ele era riquinho, filho de empresários. Certa vez até o encontrou no bar do avô de Wallace, mas não conversaram, só se cumprimentaram. Além disso, ambos eram mais jovens tinham entre 16 e 17 anos. Ele tinha cabelos compridos com franja estilo Justin Bieber, olhos amendoados e um rosto de menino. Agora, seus cabelos estavam compridos até o ombro, sem franja. Quanto a seu rosto já não era de mais de um adolescente, e sim de um rapaz crescido.
Com o esbarro, o olhar deles se encontra por cerca de 3 segundos. E antes dela tropeçar em meus próprios pés, ele de pronto segura seu braço com firmeza, a impedindo de cair. Ela sorri nervosa pensando o quanto é desastrada e desvia o olhar do rosto dele, antes que o mesmo notasse suas bochechas começando a esquentar.
- Está bem? - Ele pergunta sorrindo, evidenciando as covinhas.
- T-Tô - Ele a solta - obrigada - força um sorriso simpático
Deixando-a de pé, sobe alguns degraus a sua frente, pega o celular e se encosta casualmente no corrimão da escada. Mais embaixo, Joyce não deixa de notar na postura dele, nas vestimentas (calça jeans e camisa vermelha, nada de especial) nas tatuagens no braço, os cabelos loiros... a boca - Ele umedece os lábios
"Han? Que merda é essa?" - se repreendeu Joyce desviando o olhar.
Seu telefone vibra, ela olha o visor, era uma mensagem de daddy.
"Já estou na frente da loja"
O nervosismo volta, Ela aperta o aparelho celular enquanto respira fundo. Saindo das escadas rolantes caminha até a loja. Chegando próximo a ela, vê Otávio em pé encostado no parapeito. Acha estranho. Mesmo assim, vai até lá. Assim que Otávio a vê se aproxima também estranha. Ela para próximo, olha para baixo parecendo procurar alguém. Ele a observa por alguns instantes antes de perguntar:
- O que faz aqui? - Pergunta com os braços cruzados relaxado
- Aqui é um shopping, né? - Diz a loira virando-se para ele, que percebe a beleza e a delicadeza do rosto dela.
- É que se tem vários lugares para se estar... sem ser no girafas - aponta para a logo da loja
- Estou esperando uma pessoa - Se diz por vencida ignorando ele e mandando mensagem para o tal de Daddy, ao enviar, e o remetente receber, o celular de Otávio sinaliza.
Ela o olha estranhando tamanha coincidência. Desconfiado, pega o aparelho do bolso.
"Já estou aqui. Cadê você?" - Burguesinha57
"Estou aqui, não estou te vendo." - Daddy
O celular dela apita, ela confere.
- Burguesia57? - Ele pergunta surpreso com um sorriso travesso
- Daddy? - pergunta ela. Ele ri como se não houvesse amanhã. Enquanto isso, ela leva as mãos no rosto não acreditando no que estava acontecendo.
- Mano do céu, como? - diz controlando o riso - Aplicativo é realmente uma piada
- Sim! E por visto nós somos os palhaços - se vira para ir embora, quando ele a para segurando delicadamente em seu braço fazendo-a virar-se para ele.
Nunca tinha ficado tão próxima de Otávio ao ponto de perceber que ele é maior que ela, seus lhos são castanhos amendoados e sua fragrância, amadeirada.
- Pra onde vai?
- Embora.
- Por que?
- Não sei... É estranho.
- Por que Burguesinha57? - brinca. Ela dá um tapa nele fazendo-o se afastar. - estou brincando - levanta as mãos em sinal de rendição - Acho que é um desperdício você ir embora. - Cruza as mãos em frente ao corpo como um bom menino - Nossas conversas foram agradáveis, merecemos um quase date.
Joyce poderia mentir para qualquer um que não tinha a mínima intenção de passar a manhã com Otávio, mas não podia mentir para si mesmo. No fundo, concordava com ele e não queria deixar o momento passar. Ele tinha razão, as conversas tinham sido muito legais para fingir não ter importância.
- Tudo bem. E o que faremos?
- Filme?! Deixo você escolher entre a Barbie e Oppenheimer.
- O que quer assistir?
- Oppenheimer.
Ao olhar para o lado, Joyce vê o cartaz do filme "os três mosqueteiros".
- Os três mosqueteiros - aponta sorrindo - Bem melhor e mais emocionante. - sai andando na frente dele em direção a bilheteria.
- Humm. Alexandre Dumas. Gosto de filmes de aventura. Dois bilhetes, por favor. - pede no balcão - um pote de pipoca, refrigerante, quer mais alguma coisa?
- Não.
O telefone de Joyce vibra, era Vanessa mandando mensagem perguntando se estava tudo bem. Ela se afasta dele para responder a amiga, que sim. Julgando seu tom de voz estava feliz. Otávio se aproxima com um sorriso no rosto balançando os ingressos na mão direita enquanto que na esquerda segura o balde de pipoca, o que me faz sorrir inconscientemente.
Eles entram no cinema, sentam na poltrona do meio. Na sessão não tinha muitas pessoas, o que a fez ficar um pouco tímida e apreensiva por estar no escuro com um quase estranho. Os trailers começam. Por um momento passa por sua mente o que Wallace e Vanessa diriam se vissem os dois ali, será que zoariam como pré -adolescentes chatos? O filme começa e com o passar do tempo o gelo entre eles começa a ser quebrado, deixando transparecer um clima de amizade ou talvez um flerte sutil. Em alguns momentos, durante o filme, ambos se olhavam de forma discreta, sutil, até que suas mãos se tocaram de leve quando pegaram a pipoca ao mesmo tempo fazendo seus olhos se encontrarem e o coração disparar levemente. Neste instante, o mundo pareceu parar por alguns segundos, até que uma cena de uma bomba de canhão chama a atenção deles, tirando-os do transe.
O filme terminou, caminharam para fora da sala. Na praça de alimentação, Joyce estava prestes a se despedir quando ele a convidou para almoçar. Desta vez ela realmente pensou em recusar, se não havia o interesse de algo a mais, por que continuar com um "encontro"? por que estava sendo legal?
- humm. Não sei se é uma boa ideia.
- Qual o problema? são 12:45 - olha o celular - e duvido que aquela pipoca tenha tirado sua fome.
De fato, ela estava com fome, assim como ele. E pensar no tempo que iria esperar o ônibus, o trânsito para poder chegar em casa... Almoçar não era tão má ideia. Eles sentam numa mesa, pedem seus respectivos pratos. Enquanto esperam conversam sobre os planos futuros, profissão. Durante todo o tempo que passou com Otávio conversando sobre temas diversos, ficou encantada por um rapaz na posição dele, filhos de empresários, riquinho, não fazer parte do time dos babacas mauricinhos. Pelo contrário, possuía uma bagagem de conhecimento admirável.
- Nunca tinha conhecido um garoto que gostasse de artes.
- Arte clássica. Sou apaixonado por museus de obras de arte.. As pinturas clássicas são maravilhosas, e as esculturas magníficas. Acredito que minha maior ambição seja visitar o museu de Louvre em Paris.
- Fantástico.
- Gosta de museus, obras de artes?
- É uma realidade distante da minha. Nunca fui a um.
- O quê? - pergunta surpreso
- O que posso fazer? A cultura em nosso país não é incentivada e nem acessível para todos. - ele concorda
Quando terminaram de almoçar, ele pagou mesmo ela insistindo para pagar sua parte. Disse que adoraria tomar um sorvete ou milk shake e aí ela poderia pagar. Ela concordou. Em frente ao shopping era hora de se despedirem.
- Obrigada por esta manhã - diz Joyce com um sorriso sincero
- Obrigado por ter ficado essa manhã. - Ele sorri de volta com seu olhar penetrante e um pouco travesso.
Ela sente um frio na barriga e desvia o olhar.
- Bom, então ... Tchau? - Ele estendeu a mão incerto.
- Tchau. - Apertei a mão dele com firmeza.
Ele sorriu novamente antes de ir embora. Enquanto Otávio se afastava, Joyce ficou parada em frente ao shopping observando-o e pensando se em algum dia terão a chance de um novo reencontro.
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