16. Distração
O objetivo de hoje é não me matar, mas vocês podem ficar bravos com o Gui e a Laura à vontade, eu até apoio.
Poder fugir das fórmulas de física foi a gota d'água para que Laura aceitasse o convite para a festa de aniversário de Jade, ela não sabia quanto tempo levaria até a matéria acabar com sua sanidade. O pai da colega era um médico famoso na região, então ninguém ficou realmente surpreso quando ela anunciou que a festa seria no salão mais caro da cidade - Laura precisara implorar para a empresa responsável meses antes por um desconto para fazer a festa de formatura ali - e toda a turma estava convidada.
A música até de madrugada estava garantida, mas Laura ainda precisava de um vestido novo. Ela e a mãe foram ao shopping no sábado à tarde - o primeiro que Fernanda tinha de folga em meses - e começaram a busca. Primeiro acharam o presente de Jade, uma bolsa de ombro, e então entraram nas lojas de roupas.
-Laurinha, tem certeza que não gostou desse? É uma graça - Fernanda perguntou atrás de Laura, que se olhava no espelho do provador.
-O decote é estranho - ela se virou, fechou a cortina e tirou a peça. Juntou-a com as outras cinco que provara anteriormente e saiu. Agraderam a vendedora e foram para a próxima loja.
Puxando os cabides de um lado para o outro, ela não via nada que realmente gostasse. O fato da mãe ter um estilo completamente diferente do dela também não ajudava, suas sugestões poderiam entrar na lista de peças que Laura nunca usaria. A garota pegou duas peças e andou até o provador.
-Um desses tem que ficar bom, não é possível - murmurou para si mesma.
Ela colocou suas coisas no canto e pegou o celular para verificar se Gui já tinha respondido a mensagem que mandara mais cedo, perguntando se iria na festa. Ela honestamente já esperava a resposta negativa que recebeu e enviou as palavras "por favor" com várias vogais adicionais. Guilherme era sua última esperança, ela tinha certeza que Bart e Cecília desapareceriam na primeira hora de festa. Ela estava começando a se sentir insultada, eles achavam mesmo que ela não sabia do pseudo-namoro deles?
Vestiu o primeiro e considerou levar aquele mesmo para ter tempo de recontar o dinheiro que tinham arrecadado com os pães de mel no dia anterior e fazer contas necessárias para descobrir quantos ainda precisavam vender. Vendo seu reflexo no espelho usando o segundo vestido, ela se surpreendeu. O tecido era azul claro, a saia rodada e um babado cobria a peça de ombro a ombro.
Então ela encarou o próprio rosto, o cabelo bagunçado preso num coque, as olheiras da noite mal dormida em cima dos livros. Teria poucas horas para se arrumar e parecia um trabalho de dias. Ela se sentou no puff e encostou a cabeça na parede e ficou encarando o espelho. Não ir à festa parecia a solução mais fácil, não teria que se preocupar e poderia ir embora.
-Laura? - a mãe dela abriu a cortina de repente. - Estou te chamando faz tempo e... Filha, que cara é essa, tá tudo bem?
-Tá, eu só... não sei se quero ir na festa, mãe.
-Filha... Você passou a noite estudando de novo? Eu já te disse que faz mal - Laura abriu a boca, mas foi interrompida. - E não minta pra mim, é só disso que você e seus amigos falam.
-Eu tô tão cansada - ela disse e sentiu uma lágrima escorrer. Não tinha ideia do porquê de estar chorando.
-Eu sei, meu amor - a mulher se abaixou e limpou o rosto da filha com a mão. - Você precisa ir mais devagar. Estudar é importante, mas não é tudo na vida, precisa se divertir também.
Só essa semana Laura tinha estudado para provas, feito pães de mel, vendido os pães de mel, organizado e dirigido duas reuniões do comitê de formatura, ajudado uma colega de turma a estudar geometria e dado aula para Mel, horas antes, além de cuidar do irmãozinho e seguir seu cronograma de estudos todos os dias. E precisava organizar a próxima reunião para discutir a divisão dos lucros da festa junina para segunda-feira.
Uma noite sem pensar em nada disso não podia fazer mal.
-Acho que você está certa - ela suspirou.
-Vai à festa então? - a mãe perguntou e ela assentiu. - Gostou do vestido?
Laura olhou para o vestido azul que usava, agora meio amassado, e assentiu novamente.
-Então vamos levá-lo - Fernanda ajeitou o cabelo de Laura e saiu do provador, fechando a cortina atrás de si.
Laura entrou no quarto, tirou o tênis e se jogou na cama, tinha resolvido usar os dez minutos antes de começar a se arrumar para convencer Gui a ir à festa. Ele tinha mencionado que Melissa ia a uma festa do pijama, sendo assim não tinha desculpa. A rápida conversa com a mãe no provador a tinha animado e havia uma coisa que ela podia fazer na festa que não tinha nada a ver com estudos.
Ela esperava conseguir conversar com ele durante a festa, queria falar sobre o beijo na festa junina. No domingo eles passaram o dia falando sobre Mel, ele mandando atualizações sobre o clima na casa e ela sobre a pesquisa que estava fazendo sobre guardiões legais e processos judiciais. Na segunda, ele estava quieto durante a aula, por isso Laura o chamou para conversar antes de irem vender pães de mel no intervalo. Ela conseguiu perguntar se ele estava bem e soltar a frase "então... sobre o que aconteceu sábado..." antes do silêncio absoluto que tomou o ambiente antes deles se beijarem pela segunda vez.
Eventualmente eles se lembraram que os doces não se venderiam sozinhos e saíram da sala. Não era como se tivessem ignorado que o beijo acontecera, mas não tinham realmente trocado mais que essas seis palavras sobre o assunto.
Eles não tinham trocado tantas mensagens durante a semana quanto de costume, Guilherme parecia estar sempre ocupado, mas com certeza arrumava tempo quando estavam juntos para escaparem até a sala vazia no terceiro andar durante o intervalo ou atrás da quadra de esportes ou até o quarto dele por alguns minutos enquanto Mel resolvia os problemas de matemática. Não que fosse ruim, mas por mais que encontrar novos lugares para se beijarem fosse divertido, a cabeça dela estava cheia de dúvidas. O que os beijos significavam? Eles eram amigos com benefícios ou algo mais? Por quanto tempo pretendiam continuar com isso?
Algumas dessas perguntas dependiam que metade da resposta viesse de Laura, mas ela mesma não tinha certeza. Por este motivo, precisava falar com ele. E, de fato, tentara tocar no assunto várias vezes, o único problema é que desistira em todas elas e o beijara novamente. Era só que... beijá-lo era tão melhor que discutir.
Mas estava decidida a falar com ele esta noite. Não ficaria a menos de um metro dele até que aquele assunto fosse discutido. Quem sabe assim finalmente saberia exatamente o que responder quando Bart e Ceci perguntassem, esse parecia ser o assunto preferido deles ultimamente.
Ela mandou uma foto fazendo uma cara triste para ele e aguardou a resposta. "Tá bom", dizia a primeira mensagem. "O que você não me pede sorrindo que eu não faço reclamando?". Ela sorriu com a vitória e disse que ia se arrumar.
Laura lavou o cabelo e colocou suas paletas de sombra na cama enquanto o arrumava. Tentou decidir que cores usar, mas resolveu que ligar para Ceci no Skype era mais fácil. A imagem da amiga prontamente apareceu na tela, tinha um lápis atrás da orelha e o cabelo loiro estava bagunçado.
-Nossa, achei que você já estaria quase pronta, Ceci - Laura riu.
Cecília olhou para a tela confusa e pulou da cama quando viu a hora.
-Meu Deus, nem vi o tempo passar. Estava respondendo os exercícios de Biologia. Amiga, eu ainda nem decidi o que vou usar... Espera, vou te ligar do notebook - Cecília começou a correr pelo quarto.
Laura disse que tudo bem e terminou de arrumar a última mecha do cabelo enquanto o MacBook da amiga ligava, o notebook tinha sido presente do pai dela, que trouxera de sua última viagem aos Estados Unidos para ela estudar. A família de Ceci não economizava nos estudos, não precisavam. Enquanto as irmãs gastavam a mesada em roupas da Gucci e sapatos Christian Louboutin, Ceci doava metade do seu dinheiro para a organização da cidade que precisasse mais naquele mês e guardava o resto em sua conta no banco. Então, de vez em quando, seus pais lhe davam presentes caros, já que sabiam que ela não os compraria nem se pudessem lhe dar um cartão de crédito ilimitado.
"Eles não me perguntam como estou, mal falam comigo e só olham na minha cara pra perguntar quando chega o boletim, mas pelo visto sou uma ingrata por não beijar os pés deles cada vez que me dão alguma coisa", Cecília dissera à Laura pelo telefone no dia que seu pai chegou com o presente.
Laura aceitou a solicitação de nova chamada de Ceci, a amiga segurava dois vestidos na frente da câmera, um rosa de alças finas, com tule bordado por cima e um azul escuro que tinha a parte de cima e detalhes da saia bordados com pedrarias douradas. Laura analisou os dois e apontou o da direita.
-O azul - falou. - Agora é minha vez.
Laura segurou três paletas para a amiga ver e esperou.
-A de baixo. E aquele glitter que você comprou quando saímos semana passada - Ceci jogou o vestido na cama.
-Obrigada... Mas como logo você, que ama uma festa, foi se distrair?
-Ai, Lau, eu cheguei da aula de Francês umas duas e meia, assisti uma vídeo aula e tô nos exercícios desde então. E ainda tenho que fazer o trabalho sobre o Apartheid... Vou fazer quando chegar da festa, agora vou me arrumar. Precisa de ajuda com mais alguma coisa?
-Não, pode ir - Laura sorriu.
Elas se despediram e Laura planejou mentalmente o que faria nos 95 minutos que ainda tinha antes de Ceci e Bart virem buscá-la, ele tinha convencido o irmão a emprestar o carro. Ela deu play na música que estava ouvindo antes e pegou os produtos que ia precisar de cima da cama. Ao passo que Harry Styles cantava a letra de Sign Of The Times, a moça tentava decidir simultaneamente que iluminador ia usar e o que ia dizer para Guilherme.
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