〖 Ouvindo sofrimento marinho



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"Durante muitos anos, a caça à baleia-azul foi intensa, levando a espécie quase à extinção.
Em 1966, a Comissão Baleeira Internacional (CIB) passou a proteger essa espécie, e sua caça
foi cessada nos anos de 1970.
Atualmente, é crime."

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Inquieto. Dedos ansiosos batucando contra a mesa espaçosa e fria do laboratório. Desse jeito que eu me encontrava nesse exato momento.

Depois do episódio da baleia-azul morta na praia, tive que seguir com minha rotina de trabalho normalmente. Por mais que fosse mais que compreensível minha mente estar nisso, afinal, era meu trabalho. De alguma forma, era como se fosse completamente coerente se eu ficasse ali paralisado com isso, sem conseguir fazer mais nada.

Porém não, mesmo que a situação e a ansiedade de ter acesso ao corpo morto tomasse conta da minha mente em muitos momentos, eu consegui me disciplinar e dar uma olhada em alguns casos de violação ambiental marinha. Especialmente a do aquário de Wellington, capital do país. Situação que Charlie e Elena estão lutando bravamente para resgatar alguns animais que residem lá por possíveis maus tratos, e que essa semana teremos a inspeção aqui em Ocean Care para provar a coerência da causa.

Estava tentando me envolver mais nas situações já existentes de Ocean Care para conseguir me integrar em tudo, especialmente pelo fato de ter chego a somente três dias. Mesmo que minha pesquisa sobre as baleias fosse de suma importância, eu queria ser útil em outros pontos do cargo também.

O relógio marcava quase cinco horas da tarde, minha parceira de trabalho Charlie estava do outro lado da mesa do laboratório e o silêncio da espera pairava no ar. Eu gosto do fato de mesmo nos conhecendo a pouco tempo, o silêncio não se tornar constrangedor. Porém nesse momento, estava tenso. Eu provavelmente devo ter suspirado umas cinco ou seis vezes desde o episódio de horas atrás. Aquilo não saia da minha cabeça.

— Torturante, não é? Essa sensação de aguardar autorização para continuarmos nosso trabalho. — repentinamente, a voz de Charlie soou se direcionando à mim e eu devolvi meu olhar. — Compartilho disso também.

Apenas fechei os olhos por um momento e assenti, largando um pouco daqueles papéis de casos que eu conferia, tentando me distrair.

— Quero confirmar de uma vez por todas o que vi. Depois dessa análise, sei que vou ter o que preciso para uma denúncia. — compartilhei o que vagava pela minha mente, ajustando meus óculos que estavam escorregando do meu rosto. — Aquilo não foi encalhamento, Charlie. Mas quero ter certeza.

Ela me fitou por um instante e assentiu algumas vezes, após isso pude vê-la alongando um pouco suas costas. Ficar muito tempo sentados, resulta nisso.

— Eu acredito em você, Jimin. Sei do que o ser humano é capaz. — a loira respondeu — Por mais que Nova Zelândia seja um dos países atualmente mais protetores da população marinha, de verdade... Não acho improvável.

Por um lado, eu ficava grato pela parceria dela. Mas não estava satisfeito, digo, eu queria muito mostrar para ela. Afinal, tudo o que eu vi com Jungkook foi muito vago e sem uma análise completa, então eu queria muito que nos liberassem o corpo.

E como se o destino tivesse ficado com um pouquinho mais de pena de mim por tantas horas de agonia, repentinamente a manda-chuva Elena adentrou o laboratório com sua típica prancheta em mãos.

— Liberaram, gente. Chegou. — a gerente da Ocean Care nos informou, e imediatamente eu e a Charlie nos entreolhamos e ficamos agitados, mais do que satisfeitos. — Preparado para fazer a parte nojenta, Jimin? Vai ser a primeira vez que te veremos fazer isso.

— Eu estava mais que ansioso pra isso.

A pressa para ter minhas respostas era tão grande, que em um curto período de tempo, eu e Charlie já estávamos em uma sala super reservada e ampla para a autópsia do corpo da baleia. E não estávamos sozinhos, após ser informado da situação, Doutor Anthony se fez presente para nos ajudar.

Por questões de segurança, o primeiro tratamento necessário já tinha sido feito antes de nos disponibilizarem o corpo. Logo, ela não estava inteira, e sim aberta e com certos órgãos perigosos de explosão já tratados e separados.

Mesmo que dessa forma, suas partes estavam perfeitamente intocáveis para o que a gente precisava, que era analisar se tinha mais machucados e que tipo seriam.

Sei que parece uma parte nojenta do trabalho, um serviço que eu deveria odiar por preferir a baleia viva. E a última parte até que era verdade, mas não. Eu não tinha o mínimo nojo dessa parte da profissão. Simplesmente porque eu vejo como se a morte dela não pudesse ser em vão! Infelizmente, ela já se foi independente da forma que tenha sido.

Então todas as vezes, principalmente na época da universidade, que tive que ter atividades práticas com o corpo dos animais marinhos, eu fui me acostumando e aprendendo bem mais. De alguma forma até apreciando essa parte do serviço.

Se o estudo desse corpo puder salvar e cuidar de mil outras baleias, então eu deveria fazer com gosto! Mas especialmente, fazer com atenção para não tornar essa autópsia permitida inútil.

— Preparados? Que parte querem analisar? — já trajado com o casaco especial branco de laboratório, luvas amarelas e óculos de proteção assim como nós, Doutor Anthony nos questionou antes de iniciar qualquer coisa.

— Se me permitirem, quero ficar com a parte superior. Era a parte mais difícil de verificar quando estive perto do corpo, na praia. — pedi gentilmente, e Anthony logo me respondeu um "Claro! Fique à vontade" e apontou para a bancada de metal em que estava essa parte. Logo me direcionei até lá.

— E você, Charlie? — apesar de agora estar concentrado no que eu tanto esperava fazer, meus ouvidos bons sem intenção escutaram a intenção do doutor com Charlie atrás de mim. — Pode escolher. O que sobrar, eu analiso para vocês.

— Valeu, Anthony. Vou analisar inferior, a parte debaixo dela. — ela pediu, e eu pude ouvir seus passos — Se você avistar qualquer machucado estranho, verifique. Como te passamos, pode não ser um machucado consequente de baques por encalhamento.

— Estou realmente curioso sobre o que vocês estão desconfiados. — Anthony disse com um tom de curiosidade, e enquanto isso eu não estava à toa. Já estava em mãos utilizando os equipamentos disponíveis e verificando alguns pontos daquela parte superior da baleia, cerrando meus olhos para não deixar passar nada — Se a caça às baleias realmente está sendo feita por aqui, temos um grande problema em torno do nosso trabalho.

— Vou tentar focar nos pontos onde parece mais fácil acertar uma baleia, em uma situação como essa... — Charlie murmurou suficientemente alto — Tô tentando pensar da mesma forma que um infeliz desses, infelizmente.

— Não precisamos de muito pra isso. Já achei algo. — e no meio da análise, eu declarei em voz alta depois de devorar com os olhos em pouco tempo o corpo que tinha. E bom, próximo de onde a baleia respirava, avistei nitidamente mais um machucado no pobre animal.

O veterinário Anthony se aproximou de mim junto com Charlie, e pegando uma mini lanterna para focar na ferida, dei espaço para ele observar melhor. Estava muito ansioso, principalmente pelo fato de que tinha mais uma ferida no corpo da baleia, justamente no lugar onde eu imaginei que pudesse estar mais machucado desde o momento da praia.

Eu estava fodidamente certo, e isso que me deixava mais ansioso sobre toda aquela situação. Especialmente quando Anthony afasta sua ferramenta e nega com a cabeça algumas vezes.

— A forma que o machucado é feito na pele. É nítido que seja algo pontudo, algo com a intenção de ferir. — e o homem moreno continuou: — Pode até ser partes de pedras afiadas, porém olhem... A profundidade da ferida, teria que ser pedras muito pontiagudas e com formatos laterais na beira da praia. Dificilmente tem isso.

— Oitenta por cento dessa probabilidade então seria arpão, e armas brancas do tipo. Certo, Anthony? — resumindo o que ele estava nos mostrando, abrindo mais aquela ferida profunda para conferirmos, eu questionei ansioso.

— Eu diria que até mais que oitenta por cento. — ele me respondeu, aparentemente super dentro das minhas acusações. — É, Jimin, a baleia nitidamente foi machucada. Você está certo.

Cerrei os lábios espontaneamente, sabendo que em meu rosto, transparecia de forma nítida uma feição de revolta que me corroía internamente também. Eu não precisei nem de cinco minutos, e confirmei o meu ponto. E agora, eu estava agitado, e não iria apenas falar "ok" e cruzar os braços.

— Charlie, eu quero levar esse caso pra polícia ambiental local. — eu declarei para a minha parceira de trabalho, que logo me fitou. — Sei que já temos outros casos, mas perdão, isso é um grande crime. E casos como esses nunca são demais.

— Não se preocupa, Jimin. Eu concordo com você. — assentiu algumas vezes, colocando uma mecha solta de seu cabelo atrás da orelha, agora com uma expressão inconformada para outro ponto qualquer. — Eu não acredito que isso vem acontecido... Logo aqui em Auckland, o investimento em proteção marinha. E repente... Isso. — trocou olhares com Anthony, que apenas se aproximou para tocar no ombro dela como uma forma de consolação. — Será que isso tem acontecido há mais tempo que algumas semanas?

— Eu não sei, só sei que precisamos denunciar isso agora. Sem mais demoras. — eu simplesmente declarei, confiante e firme. — Anthony, você pode tirar foto dos machucados do corpo de forma bem nítida e mandar para Charlie? Vou atrás de Jungkook, e vamos até a delegacia mais próxima pedir para falar com a polícia marinha.

— Claro. Eu tiro e já envio — o veterinário se mostrou prestativo e logo retirou uma das luvas para ir atrás de seu celular e fazer sua parte.

— Vou pegar a chave do meu carro. Encontro você e Jungkooo lá fora. — Charlie logo avisou, tirando suas luvas, assim eu assenti e não perdi mais tempo. Corri para fora daquela sala procurando de forma agoniada uma figura em específico.

Não queria contar com a sorte de lhe encontrar de primeira ou não naquele ambiente enorme que era Ocean Care, então assim que avistei de longe o cuidador Stewart caminhando com umas mangueiras enroladas em seus braços, dei passos longos e rápido em sua direção, até o moreno de cabelos longos e castanhos me notar e sorrir em minha direção.

— Biólogo Jimin! Que bom revê-lo. — Stewart me cumprimentou, mas em seguida franziu o cenho e apontou em minha direção, constatando algo: — Mas não parece estar em um bom momento, me soa apressado. O que houve?

— Olá, Stewart. Então, talvez eu logo possa parar e te explicar exatamente qual a razão da minha pressa... — dei uma risada meio nervosa, enquanto coçava minha nuca. — Mas agora, você viu o cuidador Jungkook por aí? Eu preciso muito falar com ele.

— Ah, claro. — ele franziu rapidamente o cenho meio confuso mas foi super simpático e prestativo apontando para uma direção em específico. — Pelo que eu tinha visto, ele ainda deve estar em uma das piscinas isoladas cuidando de um filhote que foi achado perdido da mãe. É no corredor três, na parte dos alojamentos ao ar livre. — indicou detalhado, e claro que logo lhe lancei um sorrisinho rápido agradecido.

— Muito obrigado, Stewart. Bom serviço! — me direcionei para o local que foi indicado.

Sim, a minha pressa era extremamente particular. Extremamente movido pela chateação que eu estava sentindo naquele momento, afinal, se eu fosse em passos rápidos ou em passos lentos... Não faria grandes diferenças. Mas eu queria chegar logo ao meu destino, e estar falando com autoridades o mais rápido possível porque isso é além da pesquisa de um biólogo que chegou no país para estudar sobre baleias. Isso era um crime, e esses animais estavam sendo mortos por algo proibido há anos. Como eu poderia não ter senso de urgência, trabalhando com o que eu trabalho? É isso que eu faço!

Para mim, essa pressa era o mínimo que eu poderia fazer para estar lá de fato por eles, e não apenas dizer que faço isso e pronto. Algo estava acontecendo, e a investigação precisava começar para já, precisávamos de suporte.

— Jungkook... — entrei na terceira ala de piscina isolada, dessa vez já confiante em achar o cuidador pelo fato de ser a última em que eu procurava. E meus passos acelerados deram uma diminuída assim que adentrei, principalmente pela cena terrivelmente... muito terrivelmente...

Fofa que vi.

Droga! Que merda é essa em um momento tão dramático como esse?

O cuidador Jungkook estava sentado na beira da pequena piscina, e meus olhos brilharam quando o vi segurando e ensinando a nadar um filhote de foca, branquinho e peludinho. Não, não mesmo! Filhote de foca era muito para o meu pobre psicológico que queria tanto se manter sério agora.

As baleias deveriam sentir vergonha de mim. Porque eu fui nocauteado por essa coisinha branca e peluda, e isso me tornava o maior dos fracotes nesse exato momento. Eu estava derretido.

Quando parei de fitar o pequeno animal por uns instantes, percebi o moreno me encarando e sorrindo de canto, provavelmente achando divertido a forma que aquele animalzinho tirou toda a minha postura.

— Uma graça, não? — me questionou, e com seus pés mergulhados na água e corpo acomodado na beira, ele segurava a bolinha branca com as duas mãos, a ensinando a manter-se ali. — Ela está quase aprendendo. Ainda me parece um pouco insegura e tímida pra fazer sozinha, principalmente sem a figura da mãe. Mas está confortável aqui, eu sinto.

— Se essa coisinha é uma graça? — apontei para a criatura pequena que me referia, enquanto me aproximava mais, lentamente. Até ri por um instante sozinho. — Graça não é nem o começo, cuidador. O que você está segurando é uma ofensa contra o momento, simplesmente isso. Eu vou até tirar meus óculos para não fraquejar... — e de fato fiz isso, retirei minha armação escura do meu rosto e aproveitei para limpar as lentes, enquanto negava com a cabeça.

Tenho certeza que escutei sua risada, até porque enxergar sem os óculos com o grau de miopia e astigmatismo que tenho, seria bem improvável.

— Ofensa seria você não olhar pra ela. — ele retrucou. — Mas por que seria uma ofensa contra o momento mesmo?

— Acabei de sair da autópsia do corpo morto da baleia. — informei de uma vez, pondo meus óculos limpos novamente em meu rosto, mas por enquanto evitando olhar para a fofura nos braços de Jungkook. O que ajudou a me trazer seriedade, é a expressão dele ficando serena e me dando a devida atenção. — Era aquilo mesmo, e eu quero denunciar. Precisamos saber que a polícia ambiental está com a gente, até para ajudá-los em qualquer investigação que vai iniciar. Preciso que você vá comigo até lá porque estávamos juntos na praia, qualquer coisa, eu falo com Elena. É por uma causa de trabalho, ela com certeza não se importaria...

— Claro, Jimin. Claro que ajudo. Digo... — ele pensou se levantava ou não, segurando firme o bebê foca que ainda não sabia nadar. — Você quer ir agora?

— Sim, por favor... Se você puder. Desculpe interromper a aula de natação desse bebê. — fiz uma expressão pidona, não porque queria atrapalhar sua rotina com os animais. Sei que ele tinha seus afazeres, mas eu realmente não queria prolongar aquela denúncia nem mais um segundo, nem que eu tivesse que ajudar Jeon a dar banho nos bichos depois.

— Certo. Vou só deixar essa amiguinha com Stewart. — ele avisou, não tardando em colocar-se de pé. Eu apenas assenti agradecido e me retirei, pedindo para ele me encontrar na entrada principal de Ocean Care, onde estaria esperando com Charlie para irmos.

O caminho não foi demorado, eu sei que não. Porém a sensação que eu tinha era que estava preso na linda camionete moderna e branca de Charlie por um longo tempo, até finalmente chegarmos na delegacia mais próxima.

— Jimin, antes de entrar, é bom já te atualizar algumas coisas... — antes de nós três adentrarmos, a loira parou em minha frente e iniciou, após um suspiro exausto e prolongado: — Eu já enchi muito o saco desse delegado solicitando a policial ambiental. E ele é osso duro de roer.

— Está insinuando que ele vai dificultar minha vida? — arqueei a sobrancelha em sua direção, tentando resumir o que ela queria transmitir.

— Basicamente. — assentiu, com uma expressão de quem também odiava essa chata realidade. E eu apenas lanço meu olhar para o cuidador Jungkook ao meu lado, que tinha as mãos nos bolsos do seu jeans e deu os ombros, com os lábios franzidos.

— Ele não é um dos mais fáceis. — o moreno confirmou a história da loira.

Não me interessava que ele não era um dos mais fáceis. Ué, eu queria falar com a policia ambiental, não com o delegado da área.

— Bom, eu também não sou um dos mais fáceis. — foi tudo o que consegui dizer e adentrei, ainda conseguindo flagrar as duas expressões surpresas atrás de mim. Não tinha o que se surpreender com minha atitude, só estava fazendo o óbvio. É o básico, e eu vou cobrar o básico.

— Policial Josh, boa tarde. — Jungkook cumprimentou a primeira figura uniformizada que encontramos assim que estávamos dentro da delegacia. O homem negro fardado de azul estava com as mãos nos bolsos, e se aproximou de nós três. Estava olhando tanto ao redor, que demorei uns segundos para me situar que Jungkook parecia familiarizado com ele.

— E aí, Jeon. Como vai? — com um aperto de mão simpático e sorrisos, eles se cumprimentaram. — Charlie, quanto tempo! Qual a boa que você manda hoje?

— E aí, Josh. — eles apertaram as mãos, também familiarizados. — Não é uma das melhores, na verdade. O ser humano não é muito fã de estar em uma delegacia, em geral. — brincou, tentando dar uma amenizada no clima.

— Bom, tenho que concordar. — ele deu os ombros, até seu olhar finalmente cair em mim e me analisar por um momento. — Figura nova na área.

— Esse é Jimin, novo biólogo californiano de Ocean Care. — quem me apresentou foi Jungkook, aparecendo de forma acolhedora ao meu lado e colocando o braço sutilmente ao redor de meu pescoço. Estava com os braços cruzados e tudo o que consegui fazer foi acenar e dar um sorrisinho sem jeito. — Mal chegou, e já tem uma denúncia a fazer.

Eu cheguei aqui com muita adrenalina para fazer uma amizade literalmente na entrada, mas esse policial parecia gente boa.

— Eita! O homem é brabo mesmo! — Policial Josh exclamou, impressionado. — Já sei então que querem falar com o Delegado Steve. — ele subtendeu.

— Sim, por favor. — eu não fazia ideia quem diabos era Steve, mas se referindo nele como delegado, isso era o que importava e sim. Seria com ele mesmo que iríamos falar.

— Pode dizer que estamos aqui, e que é com urgência? — Charlie se aproximou e pediu para o homem fardado.

— Beleza, já volto. E prazer, Jimin. Bem-vindo à Auckland.

— Obrigado... — e após o meu sorriso tímido, ele se retirou para fazer o que avisou que iria. — Espero que não demore... — murmurei para mim mesmo, mas sei que os dois próximos escutaram e compartilham da mesma pressa.

— Espero que hoje seja um dos dias em que ele não tenha brigado com a mulher dele. — Charlie pediu para os céus suficientemente alto, e com isso já subtendi que esse tal delegado devia sofrer de algum tipo de TPM masculina.

Era só o que me faltava... Mas vamos lá.

— Podem entrar. — e enfim foi permitido acesso para a sala do homem, depois de exatos dez minutos contados no relógio que ficamos esperando.

Quando adentrei a sala que fomos direcionados, logo avistei mexendo em seu celular um homem de cabelos levemente grisalhos, porém com uma aparência até que suficientemente conservada. Eu estipularia em torno de quarenta e poucos anos para ele, e tenho quase certeza que estou certo.

De qualquer forma, ao ver nossas figuras em sua sala, ele finalmente tirou sua atenção da tela de seu telefone. E dentre nós três, nitidamente focou mais em mim por provavelmente nunca ter me visto antes.

— A previsão do tempo diz que amanhã também não será tão frio, assim como hoje. Tsc! Essa história eu já ouvi antes, em dias frios de doer os dedos. — ele negou algumas vezes, deixando o celular no canto. E com as mãos juntas, em cima da sua mesa, enfim questionou: — Enfim, o que a Ocean Care quer de mim através da presença de vocês?

— Delegado Steve, estamos desconfiando de um crime. Queremos abrir uma investigação ambiental. — quem falou foi Charlie, e aquilo fez o homem arquear uma de suas sobrancelhas.

— O que estaria acontecendo exatamente?

— Caça às baleias, delegado. — acabei por contar, atraindo sua atenção a mim. — Especialmente as azuis. Desconfiamos já estar acontecendo há um tempo, mas hoje achamos em um caso de encalhamento, um corpo machucado.

— Certo. Qual é seu nome, por gentileza? — ele me questionou.

— Jimin. Jimin Parker, sou o novo biólogo da Ocean Care que está atuando junto com Charlie, delegado. Fui transferido da Califórnia.

— Certo. Biólogo Jimin, um grande prazer. Bom, vamos lá, é um seguinte... Não sei se já acompanhou muitos casos de encalhamento, mas aqui na Nova Zelândia é extremamente comum o corpo encalhado se machucar em praias cheio de pedras. Não é à coisa mais estranha do mundo o corpo encalhado estar com feridas. — ele tentou me explicar, pacientemente. Porém eu senti como se aquele delegado estivesse explicando o ABC para uma criança de dez anos.

Eu ainda seguiria um ritmo para essa conversa, então enquanto ele me dava suas explicações inúteis, eu apenas sorria fraco e com uma pequena carga de falsidade. Falsidade não! Na verdade, eu chamaria de tentativa de ser educado e deixar aquela conversa ainda leve.

— Obrigado pela explicação, Delegado... Steve, certo? Mas sim, já acompanhei muitos casos de encalhamento na Califórnia e fora, também ajudei a tratar corpos. Apesar da cara de bebê, tenho vinte e seis anos e desses vinte e seis anos, quase dez só de envolvimento com a área. — contei educadamente, e nem me liguei em ver a cara de Jungkook e Charlie para checar se estavam me achando mal educado ou não, tudo o que importava para mim, era a expressão de bunda que o delegado fazia para mim. — O que estou querendo dizer é que, não, não eram feridas de baques em pedras. Jungkook estava lá comigo e Charlie participou da autópsia do corpo junto comigo, eles podem confirmar o que estou dizendo. — fitei eles, pedindo ajuda com o olhar.

— É isso mesmo, Delegado Steve. — Jungkook foi o primeiro a me ajudar, complementando e fazendo a sua parte. — Eu e o biólogo Jimin vimos o corpo na praia, e ela tinha feridas muito suspeitas. Não se parecia com o que já vi tantas vezes com as tragédias naturais, acompanhei por muito tempo os pescadores locais. Sei reconhecer.

Apenas assenti algumas vezes, tornando a olhar para o homem como quem diz "Está ouvindo?" com os olhos confiantes.

— E na autópsia analisamos. Não são apenas pancadas, algo perfurou em mais de um local o corpo da baleia. — Charlie continuou, também confirmando as coisas que eu disse. — O veterinário da Ocean Care estava junto conosco, só por via de dúvidas.

— Entendo. — o delegado encostou na parte de trás da sua cadeira, tentando entrar no nosso raciocínio.

— Viu, delegado? Precisamos falar com a policial ambiental. Você pode solicitar algum representante? Precisamos abrir essa investigação o mais rápido possível. — eu tornei a dizer, finalmente achando que tínhamos dito o suficiente para irmos para a parte que importa.

Infelizmente, eu estava redondamente enganado.

— 'Peraí, 'peraí... ele franziu o cenho, e suspirou profundamente. — Vamos com calma, beleza? Pra começar, chamar a policia ambiental significa pedir para algum atuante vir aqui, com hora marcada para a falar do assunto. E digo mais, uma investigação não se abre assim tão facilmente... Precisa de provas o suficiente. — Steve disse, e de repente fez uma expressão como se estivesse procurando algo. — Cadê as provas?

— Temos fotos das feridas. Podemos apresentar a autópsia. — eu respondi.

— Então vocês estão me dizendo que para abrir uma grande investigação dessas, vocês tem somente algumas fotos da autópsia? Pelo amor de Deus, gente. O que vocês têm aí pra apresentar, a polícia ambiental pode solicitar o corpo do animal e ver por si só! É uma denúncia muito grave pra essa pobreza nas provas. — ele explicou, parecendo cansado só de pensar no trabalho que seria solicitar parceiros para essa grande investigação. — Precisam apresentar mais provas.

— Delegado, isso é sério. — eu insisti, fechando os olhos por um instante e tentando ao máximo não perder a paciência. — Se isso realmente tiver acontecendo, é um crime e está destruindo todo o trabalho em que nós nos dedicamos todos os dias. Não podemos ignorar algo tão estranho como isso, ou simplesmente fingir que não vimos os ferimentos na baleia! Isso tudo só porque foi tudo o que achamos até agora? Não podemos ignorar! — senti repentinamente a mão de alguém pousar em meu ombro, e nessa euforia toda eu nem tive cabeça para checar quem seria. Porém eu sabia que era Jungkook pelo tamanho das mãos, que são bem diferentes das delicadas de Charlie.

— Senhor Parker, há quanto tempo você chegou mesmo no país? — e mesmo com tudo o que eu disse, esse foi o questionamento do delegado para mim, enquanto batucava sua mesa com os dedos.

— Hoje é meu terceiro dia aqui, delegado. Mas por que isso é relevante de repente? — retruquei.

— Ah, chegou praticamente ontem. Entendo. — não fiz nem questão de esconder minha expressão indignada com a ironia que senti em sua voz. — Bom, então vou lhe explicar uma coisa como boa vindas, Senhor Parker. Diferente da Califórnia, aqui no nosso país, a dedicação na proteção desses bichos é altíssima. Então se o senhor enxerga o ato de caça às baleias como um crime sendo de fora, saiba que aqui nosso cuidado é triplicado. Consegue entender? — seu sorriso falso e de quem queria se livrar de mim o mais rápido possível foi super transparente.

Se a qualquer momento ele bocejasse com alguma fala minha, eu não me surpreenderia. E eu só não digo que faria o mesmo com as falas dele, porque tudo o que ele dizia me despertava vontade de gritar de ódio. E não bocejar.

— Delegado Steve, não tem a mínima importância o tempo em que ele chegou aqui. Isso não influencia no conhecimento dele. — Jungkook então tomou voz naquela situação, com um tom um tanto defensivo porém explicando com toda paciência do mundo, enquanto gesticulava com a mão como quem pedisse para pegar mais leve. — Ele reconheceu algo que não vimos e que todos iam deixar passar batido, provavelmente.

— Tem literalmente anos em que não temos um caso de caça às baleias, porque sempre que acontecia, o caso era muito bem tratado pela polícia e quem praticava tinha altas consequências com a polícia ambiental. — Steve apontou tal fato, como quem explicava algo simples de se compreender. — As leis de proteção amedrontaram bastante por aqui.

— Não é porque não tem esse tipo de caso há anos e quando vocês descobrem, tratam muito bem as consequências, que a possibilidade deixa de existir, delegado. — eu contrapus, deixando transparecer o quando estou inconformado. — As baleias continuam fornecendo materiais valiosos para lucros clandestinos, como o óleo que produzem e até mesmo a sua fartura de carne pra vendas. Não é simplesmente à toa que as pessoas um dia começaram a caçar baleias!

— Isso pode estar acontecendo há um tempinho, Delegado Steve. — Charlie falou, com uma expressão decepcionada para o homem. — Sei que você não gosta de perder tempo, mas não podemos ignorar algo tão grotesco assim só porque não temos milhares de provas nos bolsos. Antes encalhava muitas baleias-pilotos por ficarem mais à margem do mar, e repentinamente de umas semanas pra cá, a baleia que mais tem fartura de material pelo tamanho começa a ser ameaçada. Estranho, não?

— Uma baleia ameaçada de extinção, lembrando. — eu complementei, com minha expressão de ódio. — A espécie marinha que menos precisa de descaso nesse momento, e sim de proteção! Eu não vim pro país para fazer uma pesquisa sobre elas à toa.

— Ah, uma pesquisa. Agora faz sentido. — Steve assentiu e riu, e minha expressão se tornou confusa nesse exato momento. — Senhor Parker, desculpa ter que atrasar um pouco mais sua pesquisa de estudo apenas pra lhe fazer seguir protocolos devidos, mas você precisa trazer mais provas pra abrir um caso de extrema importância como esses. Será que consegue captar o que eu tô dizendo?

Ah, não.

— Por acaso está insinuando que só estou incomodado por causa da minha pesquisa de estudos, e que estou inventando uma caça às baleias só pra escrever sobre isso?! — agora eu tinha saído completamente do meu personagem que tinha classe, tinha certeza que meu rosto estava vermelho de raiva. Certeza pelo fato de sentir as mãos grandes de Jungkook me segurando pelo braço e singelamente minha cintura, como se fosse me impedir de pular naquele delegadinho de merda.

Se eu não estou enforcando ele agora, é porque eu ainda tenho senso e porque passar o resto da noite na cadeia iria atrapalhar os meus planos! Se eu quisesse, ele estaria ferrado!

— Senhor Parker, se recomponha. Não estou falando nada disso. — ele me retrucou, sonso. — Só estou dizendo que entendo que isso faz parte do seu trabalho.

— Não foi o que deu a entender, sinceramente! — calmo eu não estava mais, definitivamente.

— Jimin, calma. Eu resolvo isso! — Charlie se aproximou e falou para mim, logo virando para o homem: — Delegado, você não está entendendo muito bem as coisas. Não perderíamos nosso tempo aqui para criar situações! Se viemos, é porque achamos que isso de fato pode estar acontecendo.

— Estou aqui porque sou o biólogo, não o investigador. Eu preciso das autoridades! Eu preciso que eles façam a parte deles na investigação, enquanto eu forneço toda a ajuda necessária como biólogo marinho. — eu esclarecia, firme. — Não é tão simples assim?!

Ele me olhou por um momento como se eu fosse um louco, e isso me irritou profundamente.

— Isso é mais do que possível. É só você trazer fatos mais concretos pra apresentar como documento de provas, que a policial ambiental com certeza vai fornecer para você todo o apoio necessário, Parker. — e sorriu cínico.

Eu parecia uma panela de pressão prestes à explodir.

— Policial Josh, por favor acompanhar Senhor Parker e companhia até a porta da delegacia. — eu nem tinha visto que Josh estava ali no fundo, acompanhando tudo. Só percebi quando ele foi se aproximando, infelizmente era seu trabalho e eu senti que ele não queria me expulsar. — Terminamos por hoje.

— Jimin, nós daremos um jeito nisso. Melhor irmos. — ouvi Charlie sussurrar ao meu lado, enquanto via Jungkook ainda segurar o meu braço gentilmente.

Mesmo querendo explodir aquele lugar pela raiva, apenas respirei fundo e me soltei de Jungkook só para me aproximar do delegado. Coloquei minha mão em sua mesa, e falei firmemente antes que eu fosse expulso de uma vez:

— Eu vou voltar, delegado. Você não se livrou de mim e definitivamente não será a última vez que vai ouvir sobre esse caso. Eu vou fazer ter uma investigação sobre isso, e você vai saber que estou certo.

— Bem-vindo à Auckland, Jimin. Mal posso esperar pra ver seus materiais decentes de provas reunimos na minha mesa, aí sim você estará seguindo protocolos.

— E quero que saiba, que o fato de não acontecer caça há anos, só torna o momento ainda mais perfeito para fazer o crime e faturar, em época de zero desconfiança. Justamente porque vocês acham que é tão improvável, que não dão atenção. Olha você aí! Ignorando o fato. — apontei o que estava acontecendo nesse exato momento.

— Eu vou dar a devida atenção quando você trouxer provas o suficiente para me dar segurança de que a polícia não vai estar perdendo tempo com algum achismo seu, Parker. — ele veio novamente com essa história. — Até lá, boa coleta e boa pesquisa.

— Eu jogaria minha pesquisa no lixo se isso significasse você dar devida importância para uma coisa tão séria quanto essa.

E depois de cuspir o que estava sentindo olhando no fundo de seus olhos, não esperei ser expulso novamente, simplesmente me retirei daquela delegacia em passos firmes.

Para um lugar que presava tanto pelos animais marinhos, eu nunca vi tanto descaso na minha vida. É o que dizem... A confiança em demasia é onde tem mais problemas. E quem disse essa frase, na verdade fui eu, estou dizendo agora.

Eles dizem: Proteção marinha alta, mas está acontecendo bem debaixo dos narizes preguiçosos deles.

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Eu não achei que o acontecimento de mais cedo fosse me afetar tanto quando a raiva amenizasse um pouco, mas afetou. Na volta para Ocean Care, eu só lembro de frases vagas de Jungkook e Charlie sobre o que tinha acontecido.

Lembro de dizerem que o delegado Steve sempre dificultou o trabalho dos outros para facilitar o seu, que no último caso de Charlie ela teve que ter um trabalhão em trazer provas pra conseguir passar por ele até chegar na policia ambiental, que iríamos dar um jeito de passar por ele, que acreditavam em mim... Dentre outras coisas que eu não lembro muito por estar com a cabeça na lua.

Eu e Charlie chegamos a passar a situação para Elena, que ficou sem paciência só de mencionar o nome do Delegado Steve. Descobri que eles já se relacionaram há longos anos atrás, antes mesmo dele casar com a atual esposa dele.

— Iremos resolver isso, Jimin. Não se preocupe. Mesmo que não tenhamos mais provas, tentarei falar com aquele idiota. — Elena me garantiu, especialmente depois que mostramos o resultado da autópsia para ela.

Nisso, o relógio marcava oficialmente quase oito horas da noite e meu terceiro dia de trabalho já estava finalizado. Porém, eu de longe me sentia vitorioso. A sensação era muito contrária, principalmente depois do episódio da delegacia.

Eu poderia dizer que me sentia perdido, mas não. Eu sabia exatamente o que precisava ser feito, e a incompetência profissional dos outros não iria atrasar o meu trabalho tão dedicado. Eu só precisava tomar um ar e me situar qual poderia ser meu próximo passo.

Por isso, eu estava próximo aos barcos atracados, sentado na beira do local, em uma parte suficientemente alta para os meus pés descalços não encostarem naquela água do mar que devia estar super gelada. Estava sentindo o equilíbrio do meu corpo ao estar com casacos suficientemente quentes.

Ainda havia indignação e chateação dentro de mim, mas eu posso dizer que me encontrava mais calmo. Principalmente ao ter uma vista linda da imensa lua surgindo através do oceano. Até sorri.

Aproveitei a calma do ambiente para olhar com atenção aquelas águas profundas, e sentia meu coração se encher de esperança toda vez que alguns pontos específicos do mar se movimentavam de longe, me fazendo ter certeza que tinham vidas ali. Na tranquilidade de sua casa, sem a interrupção do homem pelo menos naquele instante.

Gosto de pensar que desde o primeiro segundo fui recebido bem por eles, na minha primeira noite em que escolhi navegar no mar e tive o privilégio de ver aquela cauda linda e mágica daquela misteriosa amiga marinha. Esses momentos de paz, me faziam ter certeza do porquê eu fazia o que fazia.

Que vista linda. — o susto me fez dar um breve pulinho, até olhar para trás e ver ali em pé a figura do cuidador Jungkook me olhando com os braços cruzados. Até ri e coloquei a mão no peito. Meu Deus, ele apareceu do nada...

— Ah, é... A vista é muito linda mesmo. — entreolhei a visão noturna do mar e o moreno, tentando disfarçar meu susto e flagra de estar refletindo sozinho. Sempre ficamos um pouco constrangidos quando alguém nos vê em nossos momentos profundos.

— Sabe, você faz parte dela... — sua voz foi se aproximando, e assim que ouvi aquilo, eu fechei os olhos e deixei escapar uma risada. Neguei com a cabeça.

— Olha, te conheço há três dias mas por uma estranha razão, eu sabia que você ia falar isso. Você foi bem previsível. — informei o moreno, que agora estava em pé ao meu lado, com as mãos apoiadas nos quadris.

— Mas você faz parte da minha vista, ué. — ele riu fraco e deu os ombros. — Posso te fazer companhia?

— Deve. Isso se não for atrapalhar seu descanso depois desse dia cheio, pra ser sincero, não faço ideia porque ainda não estou em casa descansando. — respondi enquanto o observava sentar-se ao meu lado, apoiando os braços para atrás e apreciando a noite marinha de Auckland junto comigo.

— Mas observar esse mar tão lindo pela noite também é uma forma de recarregar as energias. Boa escolha, doutor. — fitei o seu rosto a tempo de vê-lo lançar um sorrisinho para mim. — E não se preocupe, meu barco com certeza me espera o tempo que for necessário.

Apenas assenti algumas vezes e tornei a olhar à diante. Me senti até um estraga prazer quando o sorriso que eu quis dar pareceu muito cabisbaixo, porque não é como se tivesse sido um dos melhores dias e eu definitivamente só estou aqui há três.

E Jungkook notou isso. Eu sei.

— As vezes parece que a polícia não ajuda, não é? — e sua voz soou em meus ouvidos, atraindo minha atenção novamente para o seu rosto malditamente compreensivo. Compreensivo no nível de me fazer soltar um suspiro e me deixar suficiente confortável em dizer tudo o que estava em meu peito:

— Nesse momento, não está ajudando em nada. — neguei com a cabeça, sem esconder a decepção que habitava em mim. — Não imaginei que eu teria como problema o fato de outros profissionais não fazerem a parte deles. Quer dizer, o delegado não levar minha denúncia à sério. Afinal de contas, o que mostramos foi tão menosprezado que não chegamos nem a falar com a polícia ambiental, que são os verdadeiros profissionais. — precisei dar uma risada seca da minha própria desgraça. A vida é engraçada.

— Sei que passa longe de servir de consolo em uma situação tão estressante quanto essa, mas quero que saiba que não foi só com você. Todos os casos da Charlie, ele sempre dificultava a vida dela ao máximo como te falamos no carro. Mas sabe como é, provar maus tratos é mais fácil do que provas de um crime tão grande e aparentemente discreto como essa caça às baleias. — Jungkook começou. — Estou dizendo isso só porque você é um profissional incrível, Jimin. Admiro muito isso, e seja lá as palavras idiotas que Steve usou, só quero que saiba disso.

Olhando para o seu rosto, eu não resisti em dar um pequeno sorriso por achar fofinho a forma que ele estava preocupado com minha autoestima profissional. Eu estava pouco me fodendo para as dúvidas daquele delegado, sei da minha carga profissional e dos meus anos dedicados, mas era legal ele tentando me consolar.

— Obrigado mesmo, Jungkook. Mas não se preocupe, a forma que ele duvidou da minha competência entrou por um ouvido, e saiu pelo outro. — até dei os ombros. — Mas sabe, mesmo me considerando uma pessoa muito profissional... Você me fez lembrar que eu simplesmente odiei a forma que ele achou que escrever minha pesquisa passava por cima do meu sentimento pelas baleias. Eu literalmente só faço o que faço pelo meu amor por esses animais, esse cara não sabe o que fala!

— Steve sempre foi assim. Ele acha que ser profissional é sempre seguir protocolos ao pé da letra, até quando eles não entram na situação. — o cuidador negou com a cabeça, provavelmente lembrando de todas as vezes que aquele delegado já agiu assim. — Espero que isso também saia da sua cabeça, até porque, tudo o que torna o trabalho dele mais fácil... Ele faz. Acredite.

— Eu chamo isso de preguiçoso. — ouvi sua risada.

— E eu concordo com você.

Suspirei profundamente.

— Bom, só sei que não vou desistir de provar o que tenho certeza que está acontecendo. — deixei minha postura o mais confiante possível, enquanto recebia o olhar dele. — Não importa se vão olhar para mim como se eu tivesse chego ontem, e já quisesse sentar na janelinha. Eu sento mesmo! — Ora! Eu vou ser útil na janelinha, então por que não sentar? — Eu não estou nem aí que me olhem feio por ser insistente na minha desconfiança, se isso salvá-las no final das contas, eu estou perfeitamente bem com isso. Eu estou aqui pra isso, não estou?

Acabei de fazer um enorme discurso, desabafando tudo o que estava em meu coração e quando viro para o lado, tudo o que vi foi Jungkook ainda me encarando com um sorriso fraco, mas não falando nada. Ele não vai dizer nada não? Algo como "Certíssimo! É isso mesmo!" ou também poderia ser "Vai fundo! Você tem que ir mesmo, você é muito necessário!"

Está bem, não precisa falar necessariamente a parte do necessário, mas se quisesse... Eu ficaria todo besta e isso ajudaria muito na minha confiança.

Quer dizer, eu não preciso da confiança de ninguém! Eu estou suficientemente confiante sozinho.

Mas alguém bem que poderia realmente ficar do meu lado, não é...?

— Você vai me deixar falando sozinho mesmo, cuidador? Isso sequer é educado. — precisei cobrar reações, só pra eu não ficar tão constrangido aqui, mexendo nervosamente na minha gola. — Só queria dizer que não importo se internamente você me ache um escandaloso por causa desse episódio todo. E-eu tenho propósitos e uma boa intuição. Vou segui-los até o fim, tá bem?

E ao ficar sem receber uma resposta, eu novamente lhe encarei, dessa vez um tanto encabulado principalmente ao ver que aquele sorriso de canto daquele cuidador permanece ali em sua feição.

— Está me achando engraçado?

— Não. — deu os ombros. — Eu só tô aqui pensando o quanto eu poderia passar o resto da noite te vendo discursar confiante e decidido desse jeito. Sabe, é um tanto inspirador, biólogo Parker.

Se há segundos atrás, era ele quem estava sem palavras enquanto me via cuspir tudo o que pensava, agora, sou eu quem fiquei sem palavras por causa de uma mísera frase dele.

Droga, não tive para onde fugir... Fiquei sem jeito.

Resto da noite é tempo demais... — depois de passar uns instantes procurando palavras, foi isso que consegui murmurar para ele, desviando meu olhar envergonhado. Eu sempre tinha as palavras na ponta da língua, e por isso tive que ser rápido no raciocínio.

— Tem razão, mas não é o suficiente levando em consideração a causa. — Jungkook respondeu, refletindo por um momento enquanto olhava para aquele horizonte do mar banhado pela lua. — De verdade, Jimin, eu acredito em você. Queria deixar bem claro isso, e não te acho louco nem nada do tipo. Se ser louco é exercer sua profissão de forma tão bonita como você faz, então por favor, continue sendo louco. Vou acobertar sua insanidade sempre, se esse for o caso.

Eu não sei porque me senti internamente tão emocionado com o que ele falou. Não posso dizer que sou do tipo de pessoa movida à apoios, mas nunca poderia ser falso, quem não gosta? Quem não ama ouvir que não está sozinho em tal situação? Que não está sendo descredibilizado por absolutamente todos?

E melhor, quem não gostaria de ter o conforto de saber que alguém não te acha louco sobre seus achismos? Posso não conhecer o cuidador Jungkook por um longo tempo ainda, mas se tem algo que me deixa bem em sua presença, é ele desde o primeiro minuto ter me feito sentir-me bem aqui. Mesmo diante à problemas e uma briga tão feia quanto essa.

E não menosprezando meu desenvolvimento pessoal com meus outros colegas de trabalho. Charlie, em especial, até então tem sido a parceira que sempre sonhei. Apaixonada pelo o que faz, uma mulher forte e com postura, fala o que pensa e corre atrás.

Mas... Jungkook faz eu me sentir como se eu não tivesse me mudado há apenas poucos dias. É tão difícil pertencer a um lugar em tão pouco tempo, e eu definitivamente ainda não sei se pertenço à Auckland, mas o cuidador Jeon me faz sentir como se... tivesse a possibilidade. Como se aqui pudesse ser minha casa também, de alguma maneira.

— Eu não sei o que te falar, levando em consideração que eu sou só um cara que chegou no país à pouco tempo. Seria muito mais conveniente pra você me deixar brigar sozinho nessa situação, apenas fazer sua parte, quem sabe... — eu disse.

— Mas aí eu estaria sendo um profissional hipócrita. Você não acha? — sua expressão de dúvida era apenas para dar o ar de estranhamento, eu tinha certeza que ele concordava com o que estava falando. E inevitavelmente, eu também.

— Tem razão. — me rendi, rindo fraco. — Não é por nada não mas, admito que no fundo te acharia um péssimo profissional se você não se importasse com tudo isso. Então... obrigado. Obrigado mesmo, Jungkook.

— Jimin, do que serviria todo o meu esforço diário por esses animais? — ele me questionou, sereno. — Sei que eu podia tranquilamente fazer meu serviço só por sobrevivência, só pra me sustentar. Mas... — negou algumas vezes com a cabeça, parecendo muito certo do que dizia. — Não. Definitivamente não. Não vivo para a Ocean Care à toa. E por isso, te apoiar é o mínimo. Não agradeça por isso.

Sem conseguir me conter, eu estava sorrindo fraco pelo meu coração preenchido de gratidão. Ele dizia que me admirava, mas um profissional como ele, é de se admirar também.

— Então eu vou te agradecer por outra coisa... Obrigado, Jungkook. Por cuidar deles com tanto amor. Já tenho um novo hobby favorito desde que cheguei aqui...

— Ah, é? E qual é? — arqueou a sobrancelha.

— Te ver com eles. É uma graça, admito. — e ele riu daquilo. — Você gosta de me ver brigando igual um louco, e eu gosto de te ver com eles. Estamos quites com esses gostos peculiares.

— Fico feliz de te entreter bem, então. — o moreno deu os ombros, olhando para mim e sorrindo despojadamente. — Quando eu tô sem ideia de como agradar, aquelas gracinhas são minha arma secreta, consegue entender?

— Ahh, é? Que bom saber que você usa os animais pra ficar agradando os outros por aí. É bom conversarmos disso qualquer hora, viu cuidador! — lhe retruquei, um tanto implicante. Ele é meio ousadinho as vezes, não é?

Desde que Jungkook me deu a entender em uma conversa no quiosque que também se atrai por homens, eu comecei a ficar atento em algumas coisas que ele diz para mim. Isso me deixa um pouco sem jeito e suando frio, porque caramba, só de pensar em alguém flertando comigo e sendo do meu trabalho (algo que eu sempre priorizei e levo muito à serio), me deixa sem saber muito o que pensar e fazer.

Eu prefiro continuar me fazendo de desentendido por enquanto, até ficar mais escancarado as intenções desse homem. Sei lá... Não sei muito o que pensar, e prefiro também ainda não misturar muito as coisas. Mas abrir mão de sua companhia? Também não.

— Você está sendo muito radical comigo, biólogo Parker. Não tenho culpa de ficar uma graça cuidando deles, e quem disse primeiro foi você. — deu os ombros, se fazendo de louco na minha concepção.  — Inclusive lembrei de algo agora que você disse na delegacia, enquanto você colocava Steve no lugar dele.

— O quê?

— A sua idade. Você contou sua idade, vinte e seis anos. — ele parecia relembrar em voz alta para si mesmo, olhando o horizonte e rindo fraco sozinho. Aquele me despertou a curiosidade. — E mesmo com essa confiança toda e essa carga cheia de experiências e estudos, você ainda é mais novo que eu.

Certo, isso me interessou. Arqueei a sobrancelha na hora e questionei:

— Conta. Qual a sua idade?

— Vinte e oito, quase vinte e nove.

— Olha só... — balbuciei, impressionado. Aquele cuidador era mais velho que eu, e eu não sei o porquê estava tão surpreso em saber sua idade. Na real, ele tinha cara disso mesmo, eu quem estou particularmente impressionado por falarmos de um assunto tão pequeno mas interessante como esse.

Para quem passou anos quebrando cabeça com estudos e mais estudos, estar sentado aqui e discutindo sobre idades, me faz pensar que é o nível de papo que eu queria ter mais vezes também.

— Com essa idade, você com certeza também tem boas histórias pra contar pra mim. — eu deduzi.

— Nada envolvendo grandes estudos e grandes faculdades como você, mas... — assentiu algumas vezes. — Sempre tem, né?

— A história não precisa ter grandes faculdades no meio para ser interessante. Então qualquer hora, eu vou adorar ouvir... — deixei claro, e ele sorriu torto em minha direção.

— Digo o mesmo. Você com certeza não é um livro, então, tenho certeza que tem muito à se conhecer sobre você que não envolve necessariamente sua ficha acadêmica. Não estou certo?

— Bom... — eu acabei rindo, pensativo. — Tem, se esse lado te interessa tanto. Mas já vou adiantando, minha vida acadêmica é muito mais interessante que minha vida pessoal... Eu como pessoa, posso ser considerado até sem graça, de alguma forma.

O que eu falei, definitivamente é a maior verdade sobre mim. Nada na minha vida, seja gostos, relacionamentos, experiências ou hobbies, em minha concepção é tão interessante quanto o meu profissional. Nos outros sentidos, me acho bem sem sal. Mas é a minha opinião, apenas.

— Duvido. — Jungkook imediatamente falou. — Se você fosse tão sem graça assim, eu não estaria tão interessado em saber mais sobre você só de te olhar. Mas tranquilo... — deu os ombros e deixou claro: — Eu aprecio processos naturais... Como hoje, quando descobri sua idade. Espero que assuntos assim surjam mais vezes entre nós, Jimin.

Bom... De verdade?

— Eu também espero, Jungkook. Não sou muito de envolver meu pessoal no meu profissional mas... — cocei a nuca. — Por uma estranha razão, sinto que vamos ter mais momentos como esse consequentemente.

— Mal posso esperar.

Eu também amava processos de relações naturais, e acho que sempre fui assim. Desenvolver um tipo de relacionamento diário com as pessoas através pequenos gestos, e saber que nível aquela interação deve ser através de mínimas atitudes, foi algo que sempre gostei de fazer.

Talvez fosse por isso que eu gostasse tanto de conversar com Jungkook.

E bom, agora mais que tudo, eu não estava sozinho em uma briga que eu já tinha a plena certeza que seria feia. Eu tenho confiança sobre o fato que está acontecendo um esquema ilegal que mata baleias-azuis, e isso me entristece muito! Por isso, não importa o quão difícil seja, eu vou provar que isso está acontecendo bem debaixo do nariz das autoridades do país.

Precisei apenas de um tempo para me recompor, mas depois desse diálogo leve com o cuidador Jeon, eu iria organizar minhas ideias e botar para cima disso! Autoridades, podem esperar por mim. E seja lá quem for esse grupo de criminosos que tem feito isso com essas criaturas inocentes, eu vou expor e descobrir tudo o que está acontecendo.

Isso é uma promessa.


[N/A];

Delegado Steve
Delegado oficial do departamento de Auckland.

#RisadinhaDoOceano 🦭

Obrigada quem está acompanhando essa obra! ❤️Ela está sendo muito gostosa de desenvolver.

PS: eu disse no twitter que o Risadinha iria voltar nesse capítulo, mas é porque eu não imaginei que ele daria 8mil palavras e pensei que encaixaria mais algumas cenas. Mas no próximo, definitivamente esse personagem fofo voltará com mais gracinhas!

Vocês acham que o Doutor Parker vai
conseguir logo ajuda das autoridades
nessa sua grande desconfiança? 🧐

Até o próximo capítulo! 🦭

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