Capítulo 9

No sábado de tarde quando Micaela descansava em seu quarto, seu celular tocou e ela relutou um pouco em atender ao ver o nome no identificador, no entanto resolveu que seria melhor não deixar a pessoa esperando.

-- O que quer, Nicolas? – Perguntou ríspida.

-- Eu.... Preciso de você! – Sua voz soou estranha e pesada do outro lado.

Ela franziu o cenho com aquela súbita mudança de comportamento.

-- Você está bem?

-- ....

-- Nicolas? Aconteceu algo?

Novamente ele não respondeu, apenas respirava pesado do outro lado, como se o mundo estivesse pressionando seu peito. Ele poderia muito bem estar fingindo algo, mas a preocupação dela falara mais alto. De qualquer forma cumpriria seu papel de ajudar, se ele estivesse agindo de má fé, essa seria a primeira e última vez que estenderia a mão para ajudar.

-- Tudo bem. Me espera e já chego aí. – Disse ela desligando o telefone.

A verdade é que Micaela nem mesmo sabia porque tinha dito aquilo. Por um impulso dissera que iria vê-lo e agora teria de cumprir a promessa. Sabia que Nicolas era exigente, portanto ficaria hospedado no melhor hotel da cidade. 

Saiu de casa e foi direto para o hotel e acertou em cheio o local. Logo que recepcionista ligou para avisar que Micaela estava lá, Nicolas deu autorização para ela subir. Chegando lá, encontrou um Nicolas totalmente diferente da noite anterior, parecia mais nervoso, mais.... Necessitado. Ao vê-la sob o batente da porta ele se agarrou a ela, abraçando-a com força. Parecia um menino que buscava consolo na mãe.

-- Não me deixa.... – Sussurrava – Por favor, não me deixa. Não vá embora.... Preciso que fique.

Micaela estranhou mais ainda aquela atitude e constatou que algo estava muito errado, se afastando dele com certa dificuldade, pois ele relutava em solta-la, ela perguntou:

-- Você está bem? O que aconteceu?

Ele apenas a olhava, com os olhos marejados como se suplicasse algo, a respiração ainda pesada, e.... Então Micaela notou.... Ele estava um pouco corado. Colocou a mão sobre sua testa e sentiu queimar.

-- Meu Deus, Nicolas! Você está queimando de febre! Tira isso! – Ela tirou o paletó dele e por baixo toda a camisa estava molhada de suor.

O empurrou para dentro do quarto e por um momento ficou impressionada com o local. Uma cama enorme estava disposta na parede oposta à porta, perto das grandes janelas com cortina cor creme. As paredes trabalhadas em uma cor amarelada e os lustres ali davam ao local um ar mais sofisticado. Ao lado direito do quarto uma porta dava acesso à suíte e na outra extremidade uma outra porta levava ao quarto contíguo.

Levou-o em direção à cama, tirou as cobertas e deitou-o. Por fim tirou até mesmo a camisa dele, deixando-o apenas com as calças. Olhou novamente aquela cicatriz nas costas e ficou mais curiosa, achava que estava delirando quando a viu pela primeira vez que entrou no quarto, afinal naquele dia ela não era exatamente uma pessoa lúcida, não reparara no quarto e muito menos sabia como parara ali. Mas resolveu logo esquecer aquele assunto, não era uma boa lembrança e Nicolas não estava nada bem. Não era hora para perguntas, e provavelmente ele não saberia responder.

Quando o cobriu e ameaçou sair de perto ele agarrou seu pulso e voltou a dizer:

-- Você não vai sair daqui. Por favor, não me deixa.

-- Eu não vou deixar, só vou chamar o médico.

-- Não.

-- Nicolas, você está doente. – Tirando devagar o punho da mão dele acrescentou – Eu já volto.

Atravessou o quarto, fechou a porta e pegou o telefone, discou o número da recepção e pediu para que chamassem um médico. Logo depois voltou para perto de Nicolas e se sentou ao lado dele em um poltrona para esperar que o médico chegasse.

-- Po-pode fechar a janela? – Pediu ele – Está frio.

Ela atendeu a seu pedido e ele se enrolou ainda mais nas cobertas. Seu corpo todo tremia descontroladamente enquanto permanecia de olhos fechados e com o suor escorrendo pelas têmporas.

Em pouco tempo o médico chegou, o examinou e receitou alguns medicamentos.

-- Se a febre não ceder aconselho que o leve para o hospital. – Disse antes de ir embora.

Pouco depois o mordomo de Nicolas, Marcos, chegou e se assustou com a cena que encontrou.

-- Santo Deus! O que aconteceu?

-- Ele está com febre muito alta, o médio receitou alguns medicamentos e vou pedir para algum empregado do hotel ir buscar. Precisamos cortar a febre ou vamos ter que leva-lo para o hospital.

-- Deixa que eu mesmo vou buscar. Me dê a receita, vou e volto bem rápido.

Ela lhe deu a receita e em pouco tempo, como havia prometido, Marcos estava de volta.

-- Precisa que eu lhe ajude, senhorita? Posso fazer algo?

-- Não, obrigada. Você já me ajudou bastante buscando os remédios. Eu cuido dele.

-- Se precisar pode me chamar, vou estar no quarto ao lado.

-- Eu chamarei, obrigada.

Depois de estarem sozinhos novamente ela deu-lhe o antitérmico e pediu para que trouxessem um chá. Abaixou um pouco as cobertas e colocou uma toalha pequena e úmida em sua testa para secar as gotas de suor que escorriam. Sentindo mais frio e ainda de olhos fechados ele puxou as cobertas novamente. Micaela tentou detê-lo, mas ele grunhiu em contradição.

-- Nicolas, por favor! Você está muito quente, ficar com essas cobertas só vai aumentar sua temperatura!

A resposta dele foi gemer e virar as costas para ela, colocando os lençóis em cima dos ombros. Ela suspirou cansada e sem saber o que fazer. Quando o chá chegou ela teve alguma dificuldade em acordá-lo. Sentou-o na cama e amparou seu pescoço para que não pendesse para trás. Ele não tinha controle sobre o próprio corpo e a todo tempo ameaçava cair na cama outra vez. Devagar ela virava o líquido quente em sua boca e vez ou outra secava as gotas que caíam para fora. Em momento algum ele abriu os olhos, como se as pálpebras pesassem e fosse impossível abri-las.

-- Vamos, só mais um pouco. – Ela insistiu.

Os olhos de Nicolas se tornaram um pequeno risco e ela pode ter um pequeno vislumbre daquelas írises castanhas, estavam perdidas em algum lugar, olhavam sem na verdade ver nada. Ele fechou os olhos novamente e virou o rosto em sentido contrário à xícara.

-- Tudo bem. Vou te deixar em paz, então.

Deitou-o novamente e o observou cair em um sono tão pesado que nem mesmo o maior dos estrondos o acordaria. Sua respiração estava pesada e ele dormia como uma criança que brincara o dia todo. Havia parado de tremer e agora estava sereno em seu sono. A noite caiu e Micaela nem mesmo percebeu que havia dormido na poltrona, só se deu conta do que havia adormecido quando escutou o estrondo do relâmpago. Olhou pela janela e viu que uma tempestade caía lá fora, provavelmente não sairia dali aquela noite. Se levantou e fechou as pesadas cortinas, e só então percebeu outro barulho. Um som estranho, como um grunhido desesperado. Virou-se e viu Nicolas virando de um lado para o outro na cama, inquieto e com as mãos agarradas nos lençóis de forma tão forte que os nós brancos dos dedos apareciam. Os olhos apertados como se não quisesse visualizar o que estava acontecendo, um chiado saía de seu peito e a respiração antes pesada agora se acelerava.

-- Não.... – Gemia – Agora não. Agora não.... – Sua voz aumentava gradativamente.

Correndo para ele Micaela se sentou na beirada da cama e procurava acalmá-lo acariciando seus braços.

-- Nicolas. Eu estou aqui. Calma, calma.... Vamos acorde, é só um pesadelo.

Ao ouvir a voz dela ele se debateu mais ainda, e ela percebeu que aquilo não era um simples pesadelo, estava delirando.

-- Per favore... – Clamava ele – Per favore....Non lasciarmi.... Ho bisogno di te..
( Por favor. Não me deixe. Eu preciso de você).

-- Nicolas!... O que eu faço? Isso é italiano! Maldita hora que não terminei minhas aulas!

Rapidamente ela molhou a toalha com água fria e colocou na testa dele novamente, esperando baixar a temperatura. Não queria ter que leva-lo para o hospital, isso iria ser um caos, mas se ele não melhorasse....

Começou a afagar seus cabelos e continuar falando com ele quase num sussurro.

-- Shhhhhh. Calma, eu não vou a lugar nenhum. Eu estou aqui.

Aos poucos ele foi se acalmando, assim como a tempestade que caía. Logo ela não passava de uma chuva um pouco forte e ele alguém extremamente exausto.

Depois de tirar a toalha de sua testa, Micaela viu que os cabelos molhados estavam colados à testa suada. Levantou a mão para tirá-lo dali, mas quando entrou em contado com a pele dele levou um susto ao ver ele agarrar seu pulso e segurá-lo com força.

Olhou para ele assustada e viu que dormia da mesma forma que antes, porém a força implicada no pulso dela era descomunal.

-- Nicolas, me solta. – Falou baixo. E quando ele não respondeu tentou novamente – Nicolas, está me ouvindo?

Tentou se levantar devagar e girar a mão para tirá-la dali, mas ao fazer isso ele a puxou com força, a fazendo cair em cima dele. Ela soltou um grito abafado e o mordomo apareceu na porta.

-- Algum problema?

-- Não, não. Eu cuido disso. Ele só está delirando um pouco, mas eu dou conta. – Respondeu ela ainda em cima dele.

-- Tem certeza?

-- Claro, pode ir.

Ele se retirou e ela tentou se mexer novamente, o que foi uma péssima ideia, pois os braços de Nicolas a envolveram em um abraço forte mantendo-a ali sem nenhuma ação.

Tentou se soltar de novo, mas ele só a apertou mais, não a deixando sair de cima dele. Estava um pouco quente ainda e em um sono pesado. Não podia controlar suas ações.

-- Tudo bem. – Tranquilizou ela – Eu não vou sair daqui. Pode me soltar.

Ele gemeu, parecendo discordar, mas não a soltou. Vendo que não tinha outra opção ela girou o corpo e se deitou de frente para ele ainda em seus braços, assim ficou olhando-o enquanto dormia e acariciando seus cabelos.

-- Eu estou aqui.

Logo caiu no sono também, envolta pelo calor que emanava do corpo dele.

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