Capítulo 04 - Zander
Se eu não estivesse olhando diretamente para Barbara, não teria visto seus ombros enrijecerem de leve antes que um sorriso surgisse em seu rosto. Apesar de parecer feliz com a visita surpresa, noto o quanto seus movimentos se tornam mecânicos quando ela se levanta do chão e caminha até a porta.
Ainda não vi a cara do sujeito que apareceu do nada no apartamento, mas pelo modo como ele passa um braço ao redor da cintura de Barbara, sei que ele se acha no direito de segurá-la assim. E também sei que ele é um idiota. Nada jamais vai me fazer mudar de opinião, porque se ele não percebeu o quanto deixou Barbara desconfortável nos três segundos em que surgiu na porta, ele não a conhece o suficiente para ser bom para ela. Barbara odeia surpresas e odeia chamar atenção.
Tento manter uma postura despreocupada enquanto passo os olhos pelo resto do grupo e encontro olhares que variam de confusos a chocados. Ninguém parece reconhecer o cara. Abby chega a franzir ligeiramente as sobrancelhas para Rock, que está parado ao lado de Barbara como se fosse seu guarda-costas pessoal.
— Eu sei que você disse que iria me ver amanhã, — ele diz com uma voz melosa que me deixa desconfortável. — Eu senti tanto a sua falta que precisei vir te visitar logo. Não consegui esperar mais um dia.
O modo como ele soa me faz soltar uma risadinha que eu espero ter sido baixa, mas ao julgar pelo cutucão que Nicky me dá, acho que não fui muito discreto.
— Cara... — Brad cruza o olhar com o meu e vejo que ele também está se esforçando para não rir.
Na verdade, todos os garotos do grupo estão sofrendo com a vergonha alheia da confissão piegas enquanto as garotas olham apaixonadas para a porta. Se elas soubessem que essa declaração não tem nada de sincera, mas sim foi dita com a intenção de deixar o cara parecer vulnerável para Barbara, elas com certeza não estariam com essas expressões de inveja.
Barbara solta um pequeno suspiro e volta para dentro do apartamento segurando a mão dele e, por mais que eu não queira ver, meus olhos estão colados nos dois.
O cara não é muito mais alto que Barbara, mas tem os ombros largos de atleta e um maxilar definido. Seu rosto é limpo, ressaltando as covinhas nas bochechas e evidenciando o sorriso largo que ele carrega. Observando-o, eu posso dizer que ele é exatamente o filho que minha mãe sempre quis que eu fosse. Ele tem a postura de bom menino completa, desde o cabelo castanho penteado para trás até às roupas de tricô e alfaiataria que estão na moda.
E é claro que ele carrega um buquê de rosas vermelhas na outra mão.
Como era de se esperar, sinto meu estômago embrulhar e o sangue gelar. Eu odeio esse cara.
Odeio as botas de camurça dele.
Odeio as flores que ele carrega.
Odeio que ele tenha feito Barbara sorrir.
Odeio o fato de ser ele segurando a mão de Barbara ao invés de mim.
Deveria ser eu ao lado dela.
— Esse é o Connor, — Barbara o apresenta, me tirando do transe.
Devagar, pisco e encontro Rock olhando diretamente para mim. Ele sabe no que estou pensando, mas antes que faça qualquer coisa eu me levanto.
Barbara me encara e eu me sinto um idiota pelo que estou prestes a fazer, mas eu não consigo evitar. Ver os dois juntos é demais para mim. Ignorando-a, apanho meu casaco e deixo o apartamento, me certificando de bater a porta com um pouco mais de força do que o necessário.
Ao chegar na rua, eu sei exatamente para onde ir.
Não posso ficar sozinho agora, ou a imagem dos dois vai ficar se repetindo no meu cérebro. Na verdade, mesmo que eu esteja cercado por mil pessoas, vai ser difícil não pensar nos dois. Eu acho que nunca mais vou conseguir me esquecer do que acabei de ver.
Olho de relance para o Jeep prateado, mas ao invés de ir para meu carro, sigo reto pela calçada em direção ao campus. O ar gelado contra meu rosto me deixa anestesiado o suficiente para deixar de pensar em Barbara.
Assim que atravesso as portas da Maggie's, finalmente volto a respirar com calma. É engraçado pensar que uma lanchonete cheia de universitários se tornou minha segunda casa, ainda mais quando eu odiava trabalhar na cafeteria da minha cidade justamente por causa da grande quantidade de adolescentes que frequentavam o local. Mas a Maggie's é diferente. Com a decoração vintage, os bancos de vinil e a proprietária que age como se fosse mãe de cada cliente, seria difícil não gostar do lugar.
Atrás do balcão, a dona e homônima, Maggie, levanta a cabeça ao me ver entrando e acena para que eu me aproxime.
— Essa foi a primeira vez em que você entrou e não olhou em volta procurando por alguém. — Ela diz casualmente, porém seus olhos astutos dizem que ela sabe o motivo de eu sempre olhar ao redor quando entro.
Por mais que eu só apareça em turnos que eu sei que Barbara não estará trabalhando, sempre me certifico de que ela não está presente. Todas as vezes em que atravesso as portas eu sinto um misto de ansiedade e tensão, me perguntando o que eu faria se eu a visse servindo as mesas. Entretanto, isso jamais aconteceu, porque desde que ela me pediu espaço há seis meses, eu tenho evitado encontrá-la.
Até hoje.
Pensando novamente sobre o que acabei de presenciar, solto um palavrão baixo que Maggie finge não ouvir e me sento em um dos bancos.
Não sei o que me fez querer encontrar Barbara hoje, mas com certeza foi a pior ideia que já tive.
— Você está precisando disso, — Maggie coloca uma porção de abobrinha frita à minha frente e pisca.
Olho para as tiras do vegetal empanado em dúvida, mas acabo apanhando algumas antes de me voltar para Maggie, que está me analisando.
— Como está a sua vida?
Se qualquer outra pessoa me fizesse essa pergunta, eu ignoraria. Estranhamente, Maggie me questionou do mesmo jeito na primeira vez em que entrei em sua lanchonete e eu me peguei contando praticamente toda a minha vida para a mulher. E depois disso, nossas conversas se tornaram semanais. Ela me lembra meu antigo chefe, Mo Jones. Ele sempre foi um velhinho simpático e perspicaz, daqueles que não precisam falar muito para ganhar a confiança dos outros. Provavelmente foi por isso que ele acabou se tornando meu sócio na cafeteria.
Dou de ombros e volto a encarar Maggie, não consigo falar sobre o que vem me perturbando agora e sei que não vai acreditar em nada que eu diga sobre outros assuntos.
— Minha filha me enviou uma foto da minha neta. Você quer ver? Ela está se tornando uma moça tão bonita! Com certeza não puxou a avó.
Noto que seus olhos ficam um pouco embaçados e sorrio. Sei que Maggie não tem um bom relacionamento com a filha, que fugiu de casa quando era nova e nunca mais retornou. Em uma noite sem movimento do último outono, Maggie acabou revelando que se arrependia por ter sido ausente na vida da filha e que tudo que mais queria era conhecer sua netinha.
— Olha, ela acabou de completar treze anos. — Ela pega o celular do bolso e passa algumas fotos antes de virar a tela para mim.
Tento procurar por alguma semelhança com Maggie na garotinha loira de cabelos cacheados, mas nem mesmo os olhos azuis têm o mesmo formato.
— Ela puxou o pai, — Maggie abruptamente enfia o aparelho no bolso da calça e me dá as costas, encerrando o assunto. — Já volto com sua comida, vai querer o mesmo de sempre?
— Você é a única que acerta meu pedido, — brinco enquanto ela segue para a cozinha.
— Eu sou a única que aceita seu pedido, garoto.
Rindo, apanho alguns guardanapos sobre o balcão e uma caneta. Começo a rabiscar o rosto de uma garota, colocando no desenho toda a inocência e alegria que vi na neta de Maggie. Enquanto desenho, penso na piada de Maggie e me pergunto se algum funcionário já comentou com Barbara sobre mim. É provável que não, mas não consigo deixar de imaginar essa situação.
Maggie começou a me atender porque duas garotas que trabalham na lanchonete sempre ficam vermelhas e nervosas quando me veem. Uma delas chegou a me passar o número de telefone rabiscado em um guardanapo, mas Nicky apareceu logo depois e a garota ficou tão desconcertada achando que era a minha namorada que nunca mais falou comigo. E eu não me incomodei em explicar por que não queria que ela pensasse que poderia ter uma chance comigo.
Se fosse fácil assim me livrar de toda a atenção que venho ganhando, eu seria bem mais feliz. Depois de raspar o cabelo descolorido e tirar os piercings, as pessoas começaram a prestar mais atenção em mim e eu ainda estou tentando me acostumar. Toda vez em que alguém olha em minha direção, minha mãe fica eufórica e diz que nossa família tem uma boa genética, mas tudo que eu queria era que parassem de me olhar.
— Seu pedido está pronto! — Maggie diz ao colocar um prato de hambúrguer e refrigerante à minha frente. Ela olha rapidamente para os traços no guardanapo e sorri. — Você devia tentar ganhar dinheiro com isso aí.
— Desenhar não dá dinheiro, Mags.
— Depende. Se você tiver habilidade, consegue pagar as contas. E até onde eu sei, você não precisa se preocupar com o dinheiro porque já tem um negócio de sucesso na sua cidade.
— Vender café para um monte de estudantes não é considerado um negócio de sucesso.
— Por que é tão difícil te elogiar? — Ela balança a cabeça, divertida. — Mas sobre esses desenhos, eu aceitaria que você fizesse uma arte para eu divulgar a lanchonete. Com certeza iria chamar a atenção dos jovens!
— Pode ser que algum dia eu faça, — dou de ombros, tentando evitar o assunto. Quando eu era mais novo, sonhava em ganhar a vida desenhando, mas o último ano me fez tomar decisões que me afastaram do sonho.
— Esse é o problema! — Ela ergue as mãos como se uma plateia invisível estivesse nos assistindo. — Você precisa parar de pensar nos outros dias e viver agora. Se eu ganhasse uma moeda para cada vez em que você falou que faria algo no futuro, eu já estaria na lista dos bilionários do ano.
Maggie me deixa sozinho com meu desenho e suas palavras.
E então eu finalmente percebo que já passou da hora de deixar de esperar e começar a agir antes que seja tarde demais.
Eu dei tempo suficiente para Barbara pensar sobre nós dois.
Está na hora de provar para ela que eu faço qualquer coisa para ter outra chance de conquistá-la.
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