× capítulo 06 ×

Seonghwa às vezes duvidava que tivesse algum senso de autopreservação principalmente quando aceitava os planos de Yeosang sem questionar mais ou pensar melhor porque não tinham tempo para se aprofundar melhor.

Ele já estava mais que acostumado com o dom de Yeosang de descobrir o que as pessoas mais se esforçavam para esconder e Seonghwa sempre acabava se enfiando em uma situação que podia dar certo ou podia dar muito errado. Assim, ali estava ele vestido de encanador na frente do apartamento de luxo onde morava uma mulher, Somin, que escondia de seu marido que o filho não era dele, morava com o marido e o filho.

A porta foi aberta por um homem grande que ocupava boa parte do espaço e impedia que Seonghwa visse o interior sem ter que ficar nas pontas dos pés, e ele preferiu não dar motivos para ele ficar alerta antes do tempo, considerando que nem tinha encontrado com Somin ainda.

— Quem é você? — perguntou, a voz pesada com desconfiança enquanto Seonghwa abaixava o boné que usava pela aba.

— Ninguém importante — respondeu —, mas eu imagino que sua patroa, Somin, vai gostar de falar comigo se quiser manter algumas coisas debaixo do tapete.

O homem esboçou insegurança, mas pareceu decidir que Seonghwa falava a verdade ao permitir que ele entrasse, o escoltando pelo apartamento luxuoso em tons neutros até uma porta pesada de madeira nobre.

— Lee? Tem algo errado? — perguntou a mulher, sentada em sua cadeira enquanto um notebook e alguns papéis descansavam sobre a mesa de vidro. Usava um vestido rosa e um óculos, sua armação escondida pelos fios longos e castanhos que caíam ordenadamente sobre seus ombros. Somin, que tirou os olhos dos papéis quando o guarda-costas não respondeu. — Quem é esse?

— Eu não sei, mas ele parece saber mais do que deveria — Lee respondeu, incerto.

— Ah é? — perguntou Somin, arqueando a sobrancelha. — Quem é você, rapaz?

Seonghwa colocou uma expressão vazia no rosto antes de responder.

— Quem eu sou não importa, o que importa é o que eu sei.

Somin cruzou as pernas sob a mesa e franziu a testa.

— E o que você sabe? Ou melhor, acha que sabe.

— Seu marido e seu filho não sabem que não têm nenhuma relação biológica um com o outro, sabem? — Seonghwa assistiu as expressões passando pelo rosto de Somin conforme as palavras faziam sentido para ela, a arrogância se transformando em choque, depois em insegurança e medo. — Não foi algo difícil de descobrir — contou — uma pessoa fez o teste de DNA, imagino que pra confirmar suspeitas, e tudo isso ficou salvo em um banco de dados, não foi difícil descobrir o seu segredo quando o nome do seu marido está em todas as notícias como um dos médicos envolvidos nas pesquisas sobre a Doença da Pétala. Bom, eu fiquei um pouco chocado quando o nome que aparece no exame de DNA como pai do seu filho não é o dele. — O sarcasmo estava tão presente em sua voz que Seonghwa mal a reconheceu, Yeosang se mantendo calado em seu fone enquanto ele falava para não confundí-lo. — Veja bem, eu não sou fofoqueiro, não gosto de espalhar informações que não me dizem respeito, mas você entende que todos nós precisamos pagar as contas, não é?

Somin ficou alguns segundos em silêncio, processando tudo que tinha escutado, antes de começar a rir cada vez mais alto. Seonghwa se obrigou a manter a confusão longe de seu rosto, se mantendo inexpressivo.

— Ah,você me assustou por um minuto. Quer dizer, uma coisa dessas vindo à tona poderia me causar muitos problemas — disse depois de controlar a risada —, mas agora vejo que não tenho com o que me preocupar. Eu não tenho que gastar dinheiro nenhum pra te manter de boca fechada se você estiver morto.

Para Lee, as instruções foram claras porque assim que sua patroa terminou de falar ele já estava se deslocando de seu canto na parede para se aproximar de Seonghwa e acertá-lo com um soco que ele não conseguiria evitar se Yeosang não tivesse gritado "cuidado" em seu ouvido, assistindo tudo por uma câmera de um dos prédios ao lado. Seonghwa desviou, entrando em guarda e retornando alguns dos socos enquanto Somin assistia tudo com um olhar de desinteresse.

Seonghwa pensou em planos de fuga, mas suas opções eram limitadas. Ele e Lee trocavam golpes e a porta estava em suas costas, mesmo assim, ela não era útil porque mesmo que Seonghwa conseguisse se livrar do guarda-costas rápido o suficiente para passar pela porta, ainda precisaria ser mais rápido do que ele ao descer dois lances de escadas e chegar até sua moto. Era arriscado demais. Seonghwa olhou ao redor e percebeu que toda a parede do escritório era feita de vidro e uma ideia começou a se formar em sua mente.

— Hyung, não! — falou Yeosang, parecendo desesperado.

Mas Seonghwa já tinha tomado sua decisão e deu um golpe mais forte em Lee para desequilibra-lo antes de correr em direção a Somin como se fosse atacá-la, desviando no último segundo para se jogar contra a parede de vidro, fechando os olhos com força enquanto sentia alguns cacos se alojando em sua pele através das roupas.

Teoricamente, não era uma queda grande, dois andares, 5 metros e Seonghwa já tinha aprendido a cair do jeito certo há muito tempo. Mesmo assim, era a primeira vez que ele se jogava de uma parede de vidro e os cacos se alojaram em sua carne mais profundamente enquanto ele rolava para amortecer a queda. Ele não sentiu nada conforme se apressava até sua moto, sabendo que era a adrenalina falando mais alto que a dor, largando o boné pelo caminho e descartando o macacão cinza, ficando apenas com suas roupas casuais enquanto colocava seu capacete e montava sua moto, se colocando no caminho para casa, onde ele sabia que Yeosang já se preparava para tratar os ferimentos.

⸻ 〤 ⸻

Seonghwa sentia seu corpo dolorido quando finalmente chegou em seu apartamento, tendo dificuldades para subir as escadas, sentindo os cacos de vidro se afundarem ainda mais em seu corpo enquanto ele avançava. Cansado, ele se obrigou a continuar até abrir a porta do apartamento, onde Yeosang já o esperava, passando o braço de Seonghwa por seu pescoço e o ajudando a chegar até o sofá para poder tratar seus ferimentos.

O kit de primeiros socorros já esperava por ele quando ele sentou e Seonghwa tirou suas roupas, soltando alguns gemidos e arfares de dor enquanto expunha seus ferimentos, vendo um olhar preocupado no rosto de Yeosang enquanto ele avaliava os estragos.

Ele o ajudou a tirar os cacos e a limpar e enfaixar os cortes enquanto Seonghwa o direcionava no que fazer. Seonghwa sentia-se cada vez mais cansado, mas se obrigou a ficar acordado enquanto Yeosang cuidava dele, segurando sons de dor para que ele não se desconcentrasse no que fazia. Seonghwa podia estar acostumado a trabalhar com pessoas gemendo de dor ao seu lado, mas Yeosang não estava.

— Dorme aqui por agora, pra descansar um pouco pelo menos — disse Yeosang depois que os dois acabaram de enfaixá-lo, pegando o pote com os cacos e levando até a cozinha.

Quando voltou para a sala, Yeosang trazia roupas limpas, que ele ajudou Seonghwa a vestir, e um travesseiro, ajudando-o a deitar o mais confortável possível, mesmo que a queimação dos cortes sob as roupas queimassem.

— Obrigado — agradeceu, começando a sentir o sono reivindicá-lo.

Yeosang deu um sorriso pequeno.

— Não por isso, hyung. Descansa.

E Seonghwa o fez.

⸻ 〤 ⸻

Seonghwa não sabia quanto tempo tinha passado dormindo quando acordou com o som de Yeosang digitando violentamente ao seu lado, indicador claro de que algo estava errado. Todo o setup de Yeosang foi construído com todo sangue, suor e lágrimas dos dois, lutando para ter equipamentos melhores e mais duradouros e isso significava que Yeosang cuidava dele da melhor forma que podia, menos quando estava com raiva ou estressado, que era quando acabava descontando pelo menos um pouco de sua frustração ao digitar.

— Sangie? — chamou, assustando Yeosang levemente, que virou a cadeira para olhar para Seonghwa ainda deitado no sofá.

— Desculpa te acordar, hyung, foi sem querer — falou, realmente parecendo um pouco culpado.

Seonghwa se levantou e se aproximou do amigo, colocando uma mão em seu ombro.

— Não se preocupa, foi até bom eu acordar. Se eu dormisse mais um pouquinho nesse sofá, amanhã a minha coluna ia estar pedindo socorro — disse, mesmo voltando a se deitar, colocando a cabeça nas pernas de Yeosang no espaço que o notebook não estava ocupando.

— Muito fácil colocar a culpa no sofá quando é o peso da idade que 'ttá acabando com a sua coluna — provocou Yeosang, recebendo um beliscão como repreenda. — Brincadeira, hyung, você tá conservado.

Seonghwa revirou os olhos.

— Deixando a minha idade de lado — começou —, o que você tá fazendo?

Um sorriso maldoso, raramente visto, cresceu nos lábios de Yeosang.

— Aquela mocreia vai pagar por cada caco que eu tive que tirar de você — respondeu, voltando a se virar para a tela de seu computador. — A gente tentou fazer do jeito fácil, ela não quis o acordo e ainda te fez se tacar de uma parede de vidro, eu espero que ela e aquele guarda-costas meia boca dela estejam preparados.

Seonghwa quase sentiu pena da dupla, mas o momento de compaixão passou rápido quando ele foi até a cozinha pegar um copo de água e sentiu seu corpo dolorido. Eles se divertiram mais do que o normal naquela noite desmascarando Somin para o marido.

⸻ 〤 ⸻

Dois dias se passaram desde a reunião e um desde o dia em que Seonghwa achou que se jogar de uma parede de vidro era uma boa ideia e ele tem sentido as consequências disso desde então. Seus cortes não eram profundos, mas eram numerosos e limpar com álcool era um processo demorado e ele o repetia pelo menos duas vezes por dia para garantir que não infeccionaria, sabendo que eles não teriam os medicamentos necessários para lidar com isso. Seonghwa percebeu alguns hematomas em seu corpo, resultado do impacto da queda, que já começavam a mudar de cor, mostrando sua melhora.

Seonghwa terminava de se arrumar enquanto Yeosang mexia em seu computador, de costas para ele e claramente emburrado. Yeosang não queria que ele fosse trabalhar com os ferimentos tão recentes, mas ele não podia fazer nada quanto a isso. Eles já tinham uma dívida enorme que, em teoria nem era deles, não podiam se dar ao luxo de contar só com um roubo que não tinha garantia nenhuma de dar certo. Se desse errado, eles precisariam de cada centavo que pudessem juntar.

Com isso em mente, se obrigou a pegar seu celular e sair, deixando o amigo chateado para trás, mas sem muito que pudesse fazer para mudar isso.

Ao chegar onde estacionou sua moto, Seonghwa percebeu que ela não estava jogada de qualquer jeito, como a deixou quando chegou em seu desespero para chegar logo em casa e imaginava que Yeosang deve ter descido para arrumá-la enquanto ele dormia, fazendo um sorriso pequeno aparecer em seus lábios enquanto subia em sua moto, colocando o capacete e aproximando a tatuagem em seu pulso no painel pouco acima do tanque de combustível, funcionando como a chave e fazendo o motor ligar.

Seonghwa saiu um pouco mais cedo do que estava acostumado para ter tempo para conversar com Jongho antes de precisar ir para o estúdio e estaria mentindo se dissesse que não estava nervoso. Uma coisa era fazer negócio com uma pessoa para permitir que ela deixasse a moto na sua oficina, outra era oferecer um lugar em uma equipe para um roubo que podia dar muito errado. Seonghwa sabia que Jongho no mínimo desconfiava que ele não andava tão na lei assim porque ele sabia que sua moto não tinha registro, então Seonghwa sabia que não seria nenhum choque para ele. Ainda assim, nada garantiria que Jongho não o entregaria em troca de dinheiro ou outras coisas, considerando que recursos eram muito limitados e poucas pessoas tinham automóveis.

A oficina estava exatamente como sempre: era maior que uma garagem, cabia tranquilamente três carros, mas era escura e com pouca iluminação natural. Seonghwa estacionou sua moto no lugar de sempre e esperou, sabendo que Jongho sabia que ele estava ali, mas achava que ele iria embora depois de deixar a moto como sempre fazia. Ao perceber que não foi o que aconteceu, Jongho saiu debaixo de um dos carros vestindo um macacão jeans pesado e sujo com a parte superior amarrada em sua cintura, uma regata preta era a única coisa que cobria seu abdômen. Seus braços e rosto tinham algumas manchas de graxa, mas Seonghwa não se incomodou antes de esticar o braço para ajudá-lo a levantar. Jongho aceitou a ajuda e se pôs de frente a Seonghwa, uma expressão de curiosidade firme em seu rosto.

— Okay, isso não é normal — comentou, saindo de perto de Seonghwa para avaliar a moto onde ele estacionou. — O que tem de errado com ela?

Seonghwa o seguiu.

— Não tem nada de errado com ela, mas eu queria falar com você — começou. — É uma proposta, na verdade.

Jongho se afastou na moto, voltando para perto do carro em que estava antes e se apoiando sobre o capô, cruzando os calcanhares e se fazendo confortável.

— Sou todo ouvidos — disse, cruzando os braços na frente do peito.

Seonghwa respirou fundo e se pôs a explicar o plano.

⸻ 〤 ⸻

Hongjoong não sabia o que estava fazendo naquele prédio pela segunda vez na mesma semana mas, considerando que tinha pouco o que fazer até aquele momento, considerou um bom sinal. Mingi estava logo atrás dele conforme os dois avançavam pelos andares e corredores que já estavam se tornando familiares. A porta do apartamento se abriu antes que eles precisassem bater e Yeosang apareceu com Bola de Neve ao lado.

Yeosang os convidou para entrar e os levou até a sala onde Seonghwa parecia ter acabado de acordar e Hongjoong se obrigou a desviar o olhar do homem que ainda mostrava sinais de sono, mas acordou totalmente ao ver ele e Mingi de pé em sua sala, abrindo espaço para eles no sofá depois de cumprimentá-los com um aceno de cabeça.

Os dois mal se acomodaram antes de Yeosang se levantar novamente, abrindo a porta para um rapaz que não parecia mais alto que Hongjoong, seu corpo forte coberto por uma jardineira jeans e seu cabelo preto bagunçado, caindo sobre a testa e um pouco sobre os olhos. Ele tinha uma boca pequena e suas bochechas pareciam macias da visão de Hongjoong, que balançou a cabeça, se desfazendo desse tipo de pensamento. O rapaz entrou e sorriu ladino quando seu olhar encontrou com o de Seonghwa com familiaridade antes de se sentar na cadeira no canto do cômodo.

— Pessoal, esse é o Jongho, o mecânico que eu comentei — Seonghwa apontou para o rapaz, Jongho. — Jongho, esses são Yeosang, que você já conhece, Mingi e Hongjoong.

Hongjoong não se incomodou de ter sua identidade revelada, todos já tinham concordado com isso de antemão.

Jongho não fez mais do que dar um aceno rápido antes de ir direto ao assunto.

— Então, Seonghwa me disse que vocês precisam de um mecânico pra um roubo, mas não me deu muitos detalhes — falou. — Seria bom ter uma ideia geral de onde eu tô me metendo.

Hongjoong fez o favor de explicar tudo com o máximo de detalhes que podia enquanto os demais, com exceção de Jongho, adicionavam informações que ele deixava passar. Quando acabou de falar, dizendo que não tinham muitas informações sobre o item a ser roubado em si, Yeosang o interrompeu.

— Na verdade — começou —, eu consegui descobrir um pouco mais.

Isso atraiu a atenção de todos enquanto Yeosang colocava a planta mais detalhada para que Jongho desse uma olhada em seu computador.

— O Cromer é um chip. Eu não sei o que exatamente a Starship tá tentando esconder com tanto afinco, mas eu vi mais algumas medidas de segurança em algumas salas, como leitores de íris e digital. Ainda não descobri onde ele está escondido também, pode ser em uma das exibições, pode ser em uma sala escondida — explicou. — Tô tentando conseguir acesso às câmeras, mas acho que eles colocaram um hacker como eu pra codificar, então pode levar mais tempo pra eu descobrir como passar.

— Eu posso ajudar com as portas, mas não posso fazer nada pelos leitores — Jongho concluiu, depois de estudar a planta por algum tempo. — Imagino que vocês tenham alguma experiência invadindo lugares com esse tipo de estrutura. — Hongjoong, Seonghwa e Mingi se entreolharam e Jongho suspirou. — Acho que eu imaginei errado. Como vocês pretendem passar por tudo isso e se enfiar em um lugar desses?

Hongjoong quase se sentiu constrangido por não pensar nisso antes.

— Sinceramente? A gente só chegou até as portas mecânicas, ninguém pensou no que fazer depois disso ou como chegar até elas em primeiro lugar.

Seonghwa se levantou do sofá para ficar ao lado de Yeosang, como Hongjoong já percebeu que ele fazia com frequência.

— Eu também não. Os lugares que eu preciso invadir costumam ser menores e eu quase nunca preciso lidar com um espaço grande.

Yeosang olhou para o grupo antes de suspirar também.

— Bom, isso é um problema — falou o óbvio.

Jongho respirou fundo, antes de se afastar da tela do computador.

— Quão dispostos vocês estão em procurar por mais pessoas? — perguntou. — Eu conheço dois ladrões que saberiam se virar nessa situação, porém eles não trabalham separados. Se quiserem um, vão ter que aceitar o outro também, sem choro.

Hongjoong sabia que eles não tinham opções, era isso ou ficar presos nesse beco sem saída esperando uma resposta cair do céu.

— O pagamento é o suficiente pra dividir com mais gente e nós não temos outra saída — verbalizou. — Para sua surpresa, Seonghwa foi a primeira pessoa a concordar com ele, seguido por Mingi e Yeosang. — Então tá decidido. Você acha que eles vão topar entrar em um plano desses?

Jongho pensou por um tempo antes de responder.

— Se estiverem juntos, eles meio que topam qualquer coisa.

Seonghwa sorriu.

— Que bom, então, porque parece que você precisa abrir mão de um parafuso ou dois pra se enfiar nessa loucura.

Hongjoong não verbalizou, mas concordava com ele.

⸻ 〤 ⸻

A lua cheia iluminava o céu enquanto Hongjoong terminava de se arrumar, prendendo as últimas tiras de seu traje preto que seria o mais perto de uma camuflagem que ele teria naquela noite. Com as roupas, luvas e coturnos pretos, a única parte visível seriam seus olhos, mas ele os esconderia da forma que pudesse com um capuz, determinado a não facilitar de forma nenhuma o trabalho de quem tivesse que prendê-lo caso fosse descoberto invadindo a casa alheia.

O trabalho da noite era simples, um homem o contratou para cobrar o amigo que lhe devia dinheiro, coisa simples e dinheiro fácil. Normalmente, Mingi seria a pessoa certa a se contratar para um trabalho desses, com sua altura e voz grave, ele deixava a maioria das pessoas com medo sem nem precisar se esforçar, mas ele se recusava a usar seus atributos físicos para esse tipo de trabalho, então Hongjoong o faria, usando alguns de seus truques na manga. Não era necessário ter uma aparência intimidadora para fazer medo, era só se fingir de maluco, nada causaria mais medo do que alguém que você não sabe como iria reagir.

Hongjoong estava quase pronto para sair quando seu telefone tocou com um número desconhecido.

— Aurora falando — atendeu.

— Olá, Aurora — Hongjoong demorou um pouco para reconhecer a voz. Era o contratante do roubo. — Me diga como estão os avanços.

Hongjoong explicou, mas não tudo. Contou sobre a equipe que estava montando, mas não mencionou o nome de ninguém, contou sobre a planta e algumas das medidas de segurança que eles conseguiram identificar, assim como um rascunho de plano para passar por elas. O contratante não gostou da falta de detalhes.

— Vocês estão muito devagar, eu não tenho todo o tempo do mundo — reclamou. — Vocês precisam se apressar.

Hongjoong revirou os olhos.

— Você que escolheu não nos dar informação nenhuma sobre nada. Nem sobre o quê, nem sobre de onde estamos roubando, isso significa que nós temos que descobrir por conta própria. O que significa que, sim, nós vamos levar mais tempo. — Hongjoong percebeu que o contratante se preparou para retrucar, então se apressou em continuar — Além disso, não dar um prazo também foi escolha sua. Se você está com pressa, o problema é seu, nós vamos fazer no nosso tempo se você quiser um trabalho bem feito que não vá acabar com a sua reputação no esgoto no futuro.

A raiva do homem do outro lado da linha era quase palpável, mas Hongjoong não se importava, eles estavam fazendo o melhor que dava com as informações limitadas.

— Só sejam rápidos — disse o contratante antes de desligar sem dar tempo para que Hongjoong respondesse.

Sem tempo para se importar com isso naquele momento, Hongjoong pegou seu equipamento e saiu de casa.

⸻ 〤 ⸻

Seonghwa não podia dizer que não estava ansioso com essa reunião, considerando que ou eles recrutavam esses ladrões, ou o plano ia todo por água abaixo. Como o grupo estava ficando grande demais para caber no apartamento pequeno de Seonghwa e Yeosang, eles decidiram por se encontrar no Dreamcatcher e Seonghwa tinha Yeosang em sua garupa depois de muito tempo sem levá-lo a lugar nenhum, considerando que ele só saía de casa quando era extremamente necessário, principalmente quando se tratava de trabalho, já que ele não podia carregar seu equipamento completo.

O Dreamcatcher não era longe de moto e os dois foram os primeiros a chegar no bar, consideravelmente vazio pelo horário e por ser meio de semana, a maioria das pessoas não tinham tempo nem dinheiro para gastar bebendo. Siyeon se encontrava limpando o balcão e sorriu para eles ao notar a entrada dos dois.

— Yeosang! Quanto tempo! — cumprimentou com um sorriso enorme, que fez Yeosang corar levemente.

— Bom te ver, noona — Yeosang respondeu, se sentando no balcão.

Seonghwa seguiu o exemplo e se sentou também.

— Eu também vim, noona — provocou.

Siyeon revirou os olhos, mas sorriu carinhosamente para ele.

— A sua cara eu já vejo com frequência, mas não é todo dia que eu vejo nosso querido Yeosang no meu bar.

— Vou passar um tempo sem vir aqui pra ver se sou bem recebido desse jeito também — Seonghwa falou, fingindo uma expressão triste enquanto levava uma mão até o peito.

— Deixa de drama que comigo isso não cola — retrucou. — Não que eu esteja reclamando, mas o que vocês estão fazendo aqui? Deve ser importante se até Yeosang saiu da batcaverna.

Seonghwa e Yeosang se entreolharam por alguns segundos antes de contar para Siyeon tudo que estava acontecendo e como eles chegaram na situação que estavam. Ela escutou tudo com atenção enquanto eles explicavam e ficou genuinamente chocada com tudo que aconteceu na vida deles nos últimos tempos.

— Uou! — exclamou —, vocês com certeza tiveram muito o que lidar. — Siyeon suspirou. — Sinto muito pelo seu pai, Hwa, pelo dano que ele tá causando mesmo depois de morto. Eu ajudaria com dinheiro, se pudesse, mas só manter esse lugar de pé já é quase mais do que eu consigo dar conta.

Siyeon era filha de uma das amigas da madrinha de Seonghwa e os dois cresceram juntos, de forma que ela viu tudo que Seonghwa passou desde sempre e sempre o ajudou da forma que podia. Seonghwa sabia que podia confiar nela e por isso sabia também que o Dreamcatcher era um dos lugares mais seguros para ele.

— Eu sei, noona, não se preocupe. A gente vai dar um jeito — disse com um sorriso pequeno, mas genuíno.

— Se precisarem de algum lugar pra se reunir, o Dreamcatcher estará sempre aberto e se houver algo que eu possa ajudar, por favor, me avise — falou, segurando a mão de Seonghwa e Yeosang sobre o balcão.

— Relaxa, noona, vão precisar de muito mais do que isso pra nos derrubar — Yeosang concluiu, apertando a mão de Siyeon de volta.

— Eu sei. Vocês podem se tornar uma pedra no sapato de qualquer um se estiverem motivados o suficiente.

Os três continuaram conversando sobre banalidades enquanto esperavam pelos demais, Siyeon falando sobre o andamento do bar enquanto Seonghwa contava sobre um cliente que pediu para tatuar uma pimenta no dedo indicador para servir como chave para sua despensa e estava no meio de sua fala quando Hongjoong e Mingi entraram no Dreamcatcher, olhando ao redor até encontraram Seonghwa e Yeosang sentados no balcão. Os dois foram até eles andando lado a lado pelo bar vazio enquanto Siyeon se despedia dos dois que chegaram primeiro, dizendo que daria espaço a eles para conversarem.

— Parece que a gente sempre acaba de volta a esse lugar — Hongjoong comentou e Seonghwa percebeu que estava sentado no mesmo banco que se sentou quando o procurou pela primeira vez e quando se reuniram para se tornar uma equipe pela primeira vez. — Você parece gostar muito daqui — observou, por fim.

— Eu tenho motivos pra me sentir seguro aqui — Seonghwa respondeu, lançando um sorriso pequeno para Siyeon, que não sabiam do que eles falavam, mas retribuiu mesmo assim. — Que tal escolher uma mesa pra esperar pelos outros?

— Acho uma boa, vai facilitar na hora de conversar — Mingi concordou e se afastou, dando espaço para que Seonghwa e Yeosang pudessem se levantar de seus respectivos bancos.

Hongjoong os liderou até a mesa que, Seonghwa percebeu, ele se sentou da primeira vez que ele o notou aqui e quase riu. Aparentemente, os dois eram criaturas de hábitos.

O quarteto passou algum tempo em um silêncio desconfortável até que Jongho chegasse acompanhado de mais dois rapazes: um mais à direita, com olhos finos e maxilar bem marcado, seu torso era marcado por músculos pela camiseta verde que usava, assim como uma calça folgada que cobria suas pernas, o outro, à esquerda, Seonghwa o reconhecia, percebeu, era Foxy, que os encarava com a mesma desconfiança de quando se encontraram pela primeira vez, seguindo atrás de Jongho e ao lado do rapaz que Seonghwa não conhecia.

Os três se aproximaram da mesa em que eles estavam apressadamente e passos largos, ainda que o homem à direita parecesse mancar para manter o ritmo. Seonghwa descobriu que não era o único com a memória em dia porque Foxy logo o olhou de cima a baixo e exclamou:

— Você!

Seonghwa fechou os olhos com força, sabendo que teriam que lidar com aquilo antes de qualquer coisa. Ao abrir, Yeosang prendia uma risada enquanto Jongho, Hongjoong, Mingi e o rapaz que ele ainda não conhecia olhavam de Foxy para Seonghwa com expressões que iam de curiosidade a desconfiança.

— Vocês... se conhecem? — Jongho perguntou arqueando a sobrancelha.

Seonghwa suspirou.

— Conhecer não é bem a palavra. A gente já se esbarrou aí pela vida — respondeu sem dar muita atenção. — Haerin e Yujin?

Foxy pareceu aumentar a guarda ainda mais.

— O que você quer com eles? Eles não te devem nada — retrucou imediatamente.

Seonghwa precisou se segurar para não revirar os olhos.

— Eu nunca disse que deviam, só quero saber como eles estão, principalmente Haerin. O corte e o pulso melhoraram?

— Não é da sua conta — disse Foxy.

— É da minha conta sim! Eu que tratei a garota e eu quero saber como ela está — Seonghwa se exaltou levemente.

Sua declaração gerou um "mas eu achei que você fosse tatuador!" de Jongho e um "então era você!" do garoto que Seonghwa não conhecia, tornando o espaço em um pandemônio de expressões confusas e prestações de contas até Hongjoong elevar a voz e atrair a atenção de todos.

— Dá pra ver que tem algum mal entendido rolando aqui, então ou vocês se acertam, ou o plano vai falhar antes de começar — falou, tirando os fios dos olhos. — Vocês que chegaram agora, sentem e vamos resolver isso. Civilizadamente.

Foxy bufou, mas obedeceu e se sentou, seguido por Jongho e o rapaz que os acompanhava. Eles ficaram em silêncio por um tempo, Seonghwa e Foxy se encarando como se os segredos de cada um fossem surgir do absoluto nada enquanto pareciam brigar para ver quem conseguiria ficar com os olhos abertos por mais tempo sem piscar. Seonghwa reconhecia a infantilidade da situação, mas isso não quer dizer que ele estava disposto a perder.

— Então... — Mingi começou — você é o quê? Médico?

Seonghwa suspirou, mas desviou o olhar de Foxy enquanto respondia.

— Eu sou tatuador.

— Então que história é essa de tratar não-sei-quem? — Jongho perguntou, cruzando os braços na frente do peito.

— Eu tenho o básico de conhecimento sobre alguns tratamentos, então às vezes as pessoas me procuram pra ajudar com coisas mais superficiais — explicou. — Haerin e Yujin foram duas dessas pessoas. Depois que eu tratei Haerin, eu acompanhei os dois até onde eles ficam e ele — apontou para Foxy com o queixo — cismou que eu fiz alguma coisa ruim com eles.

— Woo? — o rapaz desconhecido perguntou, esperando por uma explicação.

— Haerin e Yujin passaram boa parte do dia sumidos e quando apareceram foi com um homem estranho do lado e machucados — retrucou Foxy, quase como uma criança mimada — o que vocês esperavam de mim? Confiança na palavra de uma pessoa que eu nunca vi na vida?

Yeosang, parecendo finalmente entender de onde esse conflito estava vindo, colocou as mãos cruzadas sobre a mesa.

— Seonghwa hyung nunca faria mal a ninguém que não fosse obrigado a isso e com certeza não a crianças — falou em defesa dele. — Eu tenho as imagens das câmeras do estúdio e da rua do dia em que eles foram pedir a ajuda do hyung, posso enviar pra você e mostrar que essa sua desconfiança é sem motivo.

Foxy ficou pensativo por um tempo, mas acabou aceitando a oferta, finalmente abaixando um pouco da guarda para com Seonghwa. Com esse problema parcialmente resolvido, eles se apresentaram e Seonghwa descobriu que o nome verdadeiro de Foxy era Wooyoung e o rapaz desconhecido sentado ao lado dele se chamava San e respondia pelo codinome Mountain.

— Jongho explicou mais ou menos a situação, mas seria bom saber mais antes de concordar com qualquer coisa — disse San de seu lugar ao lado de Wooyoung.

Yeosang, então, pegou sua bolsa que carregava seu equipamento e os colocou sobre a mesa: uma tela e uma luva que ele modificou para se tornar um teclado e um mousepad, de forma que ele podia carregar os dois quando não podia estar em casa com seu equipamento principal. Com tudo em mãos, ele se pôs a explicar tudo de novo, usando as plantas e as poucas informações que tinham para situar San e Wooyoung.

— Deixa eu ver se eu entendi — Wooyoung começou — você quer invadir um lugar que a gente conhece pouco, escondido em um lugar que a gente não sabe qual é para roubar uma coisa que a gente não sabe o que é. E você quer que a gente descubra um jeito de passar por mecanismos de segurança que a gente não sabe quais são?

Hongjoong parecia resignado quando suspirou.

— Eu sei que parece que não vai dar certo — Seonghwa teve que se segurar para não falar que as coisas estavam um pouco além do "parece que não vai dar certo", mas achou que pelo menos um deles deveria tentar ser otimista —, mas o pagamento vale o esforço necessário.

San e Wooyoung se entreolharam e Seonghwa sabia reconhecer uma conversa silenciosa quando via uma, tendo feito isso com Yeosang tantas vezes que nem valia a pena contar.

— Beleza — San concordou, depois de deixar a sala em completo silêncio por alguns minutos. — A gente topa.

Seonghwa encontrou certa dificuldade para conter os soquinhos vitoriosos no ar que ele sabia que queria dar. Talvez ele e Wooyoung fossem ter atritos no processo, talvez tudo desse errado por um motivo que nenhum deles esperava, mas naquele momento eles tinham uma chance.

— Como vocês trabalham? Jongho comentou que vocês só trabalham juntos — Mingi perguntou.

— Sannie planeja e eu executo, basicamente. A gente estuda o lugar, San vê como eu posso entrar e sair sem ser pego e eu entro — Wooyoung respondeu, dando de ombros. — E vocês? Na verdade, eu sei perto de nada de qualquer um de vocês além do nosso querido tatuador ali — disse, apontando para Seonghwa com o queixo — e Jongho.

— Eu sou hacker — falou Yeosang e Wooyoung fez uma expressão, como se estivesse impressionado. — Eu e Seonghwa hyung trabalhamos juntos, mais ou menos do mesmo jeito que vocês. Você pode ter ouvido falar de Mist — sugeriu e San assentiu pelos dois —, pois bem, somos nós.

Hongjoong também entrou na conversa.

— Eu e Mingi somos caçadores de recompensas, a gente se ajuda de vez em quando.

Wooyoung olhou ao redor do grupo, parecendo ponderar.

— Acho que é um grupo promissor. Podemos ajudar vocês a descobrir uma rota pra entrar e sair, mas seria mais fácil se a gente conseguisse alguém de dentro.

— Bom, eu não conheço ninguém da Starship, mais difícil ainda seria encontrar alguém disposto a dar as costas pra uma das grandes empresas — disse Hongjoong, fazendo Seonghwa e Yeosang se entreolharam. — O quê? Vocês conhecem alguém?

Yeosang foi quem respondeu.

— Talvez, mas não sei se ele está disposto a se enfiar nisso aqui.

— Não custa tentar — Seonghwa ponderou. — Você pode perguntar.

— Eu vou perguntar — Yeosang concordou facilmente.

A reunião não durou muito depois disso e o grupo se dispersou, indo cada uma para seu lado, deixando apenas Seonghwa e Yeosang para trás enquanto tentavam entrar em contato com seu possível informante. A ligação foi demorada e levou algum tempo de argumentação, mas os dois conseguiram convencer Golden a se juntar a eles.

───── continua...


Notas da autora

Heeeeeeeey meus loves, como estão??? Espero que estejam bem.

Vim com  mais um capítulo e dessa vez tem um detalhezinho que vai fazer a diferença mais para frente na fanfic, então espero que vocês tenham pegado (👀).

E temos o grupo  ficou maior, nosso Foxy apareceu (com um nome dessa vez kkkk) e com sua cara metade. 

Espero que tenham gostado dessa capítulo e até semana que vem, meus anjos ❤️❤️❤️.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top