06. decisões estúpidas
Manchando o piso do corredor da escola com passadas animadas e azuis, Taehyung deu um abraço de lado ao seu amigo, destravando uma piada boba da sua boca, rindo alto da expressão confusa do Jimin.
Desta vez, um som estrondoso de marchas pesadas preencheu o local, sendo seguido pelo vermelho, que traçava todas as linhas da expressão do garoto, assim como nas pontas do seu cabelo. Ele bufava alto, como se quisesse que todas as pessoas ali notassem a sua fúria.
— Acabou tudo! — gritou, assim que passou ao lado do Taehyung e do Jimin, dizendo sem nem mesmo mudar seu campo de visão, evitando contato com os olhares atônitos dos outros dois. Ele colocou ambos os braços em sua cintura, esperando o seu amigo dar explicações.
— Para de ser tão dramático... — Jungkook deu um leve empurrão do Yoongi, travando seu olhar ao do Jimin, assim que ele também cruzou seus braços, fechando a expressão, já esperando pelo pior. Ele juntou suas mãos, comprimindo os lábios, se preparando mentalmente para dizer o ocorrido.
Com um olhar enleado, ele cobriu a coragem, que juntou pela manhã inteira, com o seu medo exagerado. Era perceptível o suor pintando suas bochechas rubras, e sua garganta ficou tão seca que nenhuma palavra foi dita, durante longos segundos.
— Então, lá estava o JJ tomando café da manhã enquanto lia a página em que estava os nomes numéricos das ruas dos Ducibus. Só que, um azar que veio em uma velocidade absurda, incalculável, saindo de um lugar muito distante e caindo bem na minha casa, especificamente na mesa da cozinha, sendo, coincidentemente, onde o ser humano chamado Jeon Jungkook estava, tal qual estava tendo um dia tranquilo, tomando um refrigerante cheio de corante... — Jungkook começou a dizer em disparada, perdendo toda a sua postura madura com as expressões que fazia, sendo congênere a uma criança que conta algo que aprontou, para a mãe.
— Moral da história: com a mão furada que tinha, o Jeon deixou o copo cair sobre as páginas do caderno, acabando com grande parte das pistas que estavam naquelas folhas preciosas — Yoongi completou, sabendo que o outro garoto iria prolongar a história em níveis estrondosos demais para uma pessoa ter paciência de escutar.
Os outros dois garotos riram alto, mas com as sobrancelhas juntas em descontentamento, tentando processar as palavras. Eles se olharam e abriram os braços, fazendo gestos de desdém com as mãos, juntando diversas reações diferentes, já que eles não sabiam ao certo qual seria apropriada para aquela descoberta.
— Eu sinceramente não sei porque disso tudo. Certamente deve ter outro local com essas informações — JJ voltou a dizer, torcendo com todo o restinho de sorte que tinha para que o que disse fosse verdade.
— Tem sim, tal qual é impossível que possamos entrar — Yoongi o interrompeu mais uma vez, ainda com suas mãos em sua cintura, fazendo caras e bocas enquanto debochava do seu amigo com um revirar de olhos.
— Onde? — Jimin perguntou, curioso, levantando suas sobrancelhas levemente enquanto cruzava os braços.
— Wheein me disse que a sala do diretor do NosSo tem uma pasta com todas as informações que precisamos. Porém, esse clube faz parceria com o prefeito da cidade, sendo assim, há segurança máxima — explicou, misturando suspense em suas palavras, murmurando algo inaudível.
— Segurança máxima, tsc — o dono do boné repleto de desenhos de cerejas, repetiu as últimas palavras do outro, duvidando das suas palavras.
— E você diz isso só agora? Depois que eu passei incansáveis horas estudando aqueles números?! — Jungkook elevou o tom de voz, mas logo o som das suas cordas vocais foi substituído por mais burburinho dos outros — Não que você queira saber, ainda sim eu vou dizer. O zero é a rua daquela bar, pois não há nada lá, tal qual é exatamente o significado desse número. O quatro é a fazenda de morangos, pois remete aos quatro elementos da natureza. Água porque há um lago logo ao lado, terra... nem vou dizer porque é óbvio, assim como o ar, que está em todo lugar...
— E fogo? — Yoongi perguntou, desconfiado da fala do amigo.
— Você não conhece a sua própria cidade? Há uma confeitaria em frente a fazenda. Yoongi, pelo amor de Deus! — também cruzou seus braços, enrugando seu rosto, expressando seu sentimento de total desagrado.
— E você não anotou tudo isso por quê? — estreitou os olhos, ainda desafinando-o.
— Eu iria fazer isso quando já estivesse pensado em tudo.
Jimin e Taehyung voltaram a cruzar seu campo de visão, encarando as orbes escuras um do outro, meneando a cabeça no mesmo segundo. O mais alto virou-se para trás, pegando alguns cadernos do seu armário, logo colocando em sua mochila de cor azul, congênere aos seus sapatos. Os dois garotos deixaram os demais para trás, enquanto discutiam entre si, mas logo ouviram passos pesados e resmungos cheios de brutalidade aos seus encalços.
— Por que não invadimos a sala do diretor? Não vamos conseguir entrar legalmente mesmo — Jimin sugeriu de repente, dando de ombros.
Os outros três arregalaram seus olhos e sentiram uma pontada no coração, exatamente no mesmo momento, juntando o sentimento de surpresa em um só, expressando-o nas faces mais assustadas já feitas naquela manhã. A visão deles se baralharam logo após, tentando focar no garoto de boné, dono das ideias mais insensatas e inesperadas.
— Bateu a cabeça? — Jungkook destravou um grito dos seus lábios, quando eles já estavam na calçada da escola.
— No mínimo umas dez vezes — Taehyung quem disse, surpreendendo o próprio amigo, se recusando a defender aquela sugestão de solução para um problema nem tão importante assim, no seu ponto de vista.
O humor deles, naquele dia, estava questionável. Certamente, se Hwasa estivesse ali, ela teria resolvido tudo em poucos segundos, jogando as melhores cartas, tomando decisões cautelosas. Porém, ela havia atingido a maior idade e com isso seu tempo está sempre preenchido por atividades pagas, mais complicadas do que as do passado, quando ainda estudava.
Antes era uma ajuda simples como entrega de cartas e marmitas, já agora, além desse serviço, ela pegava a caminhonete da sua irmã para ir na cidade vizinha pegar as encomendas de instrumentos musicais da loja em que sua irmã mais velha trabalhava. Sendo assim, seus passos não eram mais apenas com uma bicicleta provecta.
A garota precisava urgentemente achar um emprego fixo que lhe pagasse bem e largar os outros que não lhe garantiam um bom salário no final do mês.
— Vocês têm uma ideia melhor?
— Melhor que isso? Qualquer uma — Yoongi rebateu, resmungando entre suas passadas ligeiras. Ele estava possesso de raiva com tudo que escutava naquela manhã. Era muito para digerir e sua mentalidade era madura demais para dar muito espaço, em seus pensamentos, para todas aquelas bobagens.
— Então diz ao menos uma — Jimin retrucou, iniciando uma batalha de debates sem rumo.
— Podemos pedir ao diretor daquele projeto, com extrema educação, para que nós passe o que queremos — Taehyung sugeriu, enquanto mastigava uma balinha azeda de limão.
— Podemos também perguntar a alguém da equipe que tenha essas devidas informações, ou, até mesmo, fazer parte do NosSo — Jungkook ajudou nas ideias, despachando o que tinha em mente, compartilhando as suas reflexões.
Yoongi lançou um olhar sugestivo ao garoto vestido com um boné presenteado pelo dono do fliperama por ele frequentar tal lugar tantas vezes. Ele retribuiu o sentimento de soberba, mesmo sabendo que sua opinião havia sido, realmente, descartada.
— Então me avisem se conseguirem todos os nomes que precisamos — finalizou, por fim, lançando a todos um olhar cheio de desdém, mas coberto pelo manto mais sombrio, chateado por ninguém concordar com suas decisões arriscadas — Você sabe que somos os piores detetives de todos, não é? Invadir a sala do diretor jamais daria certo — disse, desta vez, para o seu subconsciente, enquanto ele já estava distante dos outros garotos.
—Você é o pior, porque não fui eu quem disse tais besteiras em voz alta — revidou, rindo do olhar em chamas que o outro lhe lançou — Aliás, eles não vão conseguir...
JUNGKOOK
— Se o Jimin descobrir, ele vai picar a gente, fritar e comer com molho de pimenta!
— Por que tão específico?! — resmunguei, enquanto o seguia pelo corredor.
Eu não faço a mínima ideia de como chegamos a esse ponto, principalmente com o Yoongi, pois ele é o cara mais maduro que eu conheço. Nunca, em toda a nossa amizade de... talvez uns dez anos, eu o vi quebrar alguma regra. E quando eu digo isso, é com toda a sinceridade que possuo.
Ele é o típico badboy dos livros mais atuais, tais quais de malandro só tem o estilo.
Sendo assim, pisoteando sobre todas as barreiras que ele construiu pela vida toda, nós estávamos indo direto para a toca do leão, literalmente, e não era para conversar e pedir informações, com delicadeza. Descartamos a sugestão do Taehyung, pois ela não funcionou logo de cara.
Eu não sabia que domar leões era tão difícil. Lá se vai meu sonho...
Parecia que os esquemas malucos que o Park teve passou para as nossas cabeças, pois não couberam no cérebro pequeno dele.
Enfim, cortando as palavras frívolas e guardado em gavetas enferrujadas para nunca mais saírem de lá, eu foquei no nosso plano, assim que entramos na sala. As cortinas estavam fechadas, então o local sobrepôs o escuro como o céu naquele fim de tarde. Logo quando meu amigo acendeu o abajur de cor esverdeada, eu pude analisar onde estávamos.
Havia duas poltronas vermelhas em frente a uma grande mesa de trabalho embrulhada com uma madeira escura. Um pote transparente estava banhado por canetas e um outro, logo ao lado, com clipes e adesivos diversos. Uma prancheta estava perfeitamente alinhada com o pequeno telefone pesando sobre uma pilha de papéis e um estojo também vermelho.
Nos confins da sala, havia uma prateleira enorme com os mais diversos livros e algumas miniaturas de carros decorando cantos vazios. Ao lado da porta, havia um pequeno armário de metal, com uma outra luminária sobre o tal. Ligeiramente as gavetas do móvel foram abertas por mãos ágeis e pálidas.
Me apressei a ajudar na procura, abrindo os armários embutidos da mesa. Todos os documentos eram divididos em pastas coloridas, contendo o nome de cada um em uma caneta azul escuro ou preta, mas nenhuma havia o que eu desejava.
— Você acha que essas informações são tão confidenciais assim? Ele não deve deixá-las em um lugar tão secreto — Yoongi discordou dos pensamentos que havíamos tido mais cedo, me encarando enquanto esperava minha confirmação.
— Eu pensei em um lugar, mas é óbvio demais — revelei, enquanto manchava o piso com o meu sentimento de adrenalina, mesmo que eu estivesse com uma expressão serena, apenas seguindo até as decorações na parede — O mapa, Yoongi — murmurei, percebendo sua presença ficando cada vez mais perto de mim, vendo sua expressão indignada pelo reflexo da janela.
O vi revirar os bolsos do casaco, então eu logo fiz o mesmo com o meu, procurando pelo meu caderno de anotações. Seus olhos faziam uma dança agitada pelas palavras e números que escrevia e pela planta da cidade reluzindo em nossa frente. Ele não deixou de esconder seu sorriso vitorioso, levando sua atenção, vez ou outra, para as minhas mãos, que faziam curvas agitadas nas folhas abstersas, dando rodopios com uma caneta de cor vermelha, manchando as páginas brancas.
Porém, logo minha concentração se desfez totalmente, limpando da minha mente todas as informações que havia coletado anteriormente. Marchas pesadas puderam ser ouvidas de longe, sendo seguidas por outros estalos, estes eram mais leves, no entanto, seu som era mais contínuo, sendo assim, a outra pessoa, certamente, estava andando com extrema pressa.
— Eu tenho que fazer uma ligação importante agora. Conversamos depois, Whe — era a voz do diretor. Mesmo que eu não o conhecesse bem, eu pude sentir que estava mais grossa que o normal. Ele parecia estar estressado.
— Melhor pular a janela — sugeri apressadamente, enquanto ouvia os outros dois continuarem conversando lá fora, muito próximos da porta.
— Está maluco? Estamos no segundo andar — opôs às minhas ideias de modo rápido demais, me fazendo abrir os braços logo em seguida, esperando que ele acrescentasse algo.
— Tenho certeza que a nossa conversa é mais urgente — Wheein falou em um tom mais alto do que o que estava usando antes, e eu pude logo discernir o plano que ela decidiu seguir. Havíamos dado muitas opções, então não sabíamos qual ela iria usar, mas agora estava claro, e finalmente a sugestão do Yoongi havia feito sentido para mim.
— Eu te disse que quebrar a maquete do novo projeto daquele cara era a melhor garantia de sucesso! — comemorou baixinho, dando um leve golpe em meu braço.
Pode-se ouvir gritos de fúria e, posteriormente, os passos brutos se afastaram rapidamente. Ao fundo, a risadinha da Wheein se fez presente, então ela abriu a porta, levantando um dos seus polegares, garantindo que a barra estava limpa.
Voltei a minha atenção para as minhas anotações, escrevendo os últimos números, guardando meu pequeno caderno no bolso, assim como o amigo ao meu lado, que logo levantou sua mão, esperando pelo meu toque. Nós rimos, fazendo movimentos de lutas, sem nos acertamos, de fato.
— Eu estava trabalhando nisso a meses! Vocês já conferiram a câmera? — voltei a ouvir a voz estridente, enquanto estávamos passando pelo corredor. Paramos ao lado da porta aberta, escutando o show do grande caos que causamos. Ou melhor, que a Wheein causou.
— A gravação parou pela manhã, certamente deve ter sido causada pelo trabalho dos homens que vieram colocar as novas cortinas — um outro garoto justificou, disfarçando o soluço baixo que saiu dos seus lábios, com um pigarro, continuando sua fala logo em seguida: — Como pode ver, a câmera virou-se totalmente para o lado, então deve ter mostrado apenas a parede — completou, encolhendo seus ombros, olhando para os próprios sapatos brancos.
— Antes de lhe avisar, eu fui conferir, e não gravou nem mesmo a parede, como ele disse. Está tudo preto, de todas as câmeras — a garota contradisse a fala do outro, ficando um pouco mais perto do mais velho entre eles — Sendo assim, eu acho melhor você contratar profissionais para a limpeza das salas restritas, ao invés dos integrantes do NosSo. Todos somos jovens, diretor, e muitos não tomam os devidos cuidados — pude sentir uma risada travar em sua garganta, enquanto ela mudava seu campo de visão para cantos aleatórios da sala.
Ela aproveitou o plano para que pudesse fazer uma tentativa de fuga dos serviços não planejados naquele clube. A garota havia usufruiu da brecha das nossas ideias para reclamar do desperdício de tempo que gastava limpando as salas daquele lugar, ao invés de focar realmente nos projetos sociais.
— Como...? Que dia de merda! — o diretor vociferou uma última vez, antes de jogar seus cachos loiros para trás, fechando seus olhos com força, soltando um longo suspiro.
Levei meu olhar aos do garoto que estava do meu lado, abrindo mais um sorriso brincalhão, para, logo após, sairmos às pressas dali, descendo as escadas entre murmúrios animados.
Enquanto o encrenqueiro Jimin, provavelmente, estava fazendo dever de casa, trancado em seu quarto, o Yoongi, que dizia ser o racional do grupo, estava aprontando e quebrando regras de adultos.
— Está bom? — meu pai perguntou, assim que coloquei o garfo entre os lábios. Fingi saborear o gosto por um tempo, fazendo diferentes expressões e alguns barulhos engraçados com a boca.
O encarei por alguns segundos, colocando ambas as mãos sobre o balcão um pouco sujo de farinha de trigo, grudando meus dedos em meio a bagunça do meu velho, causada apenas para fazer um bolo de cenoura.
— Pai... — pressionei meus lábios, fazendo um pouco mais de suspense, vendo seus olhos brilharem e suas pálpebras levantarem-se lentamente — Isso está... — fechei meu olhos, elevando minha mão direita, esfregando os dedos uns aos outros.
Mas, assim que eu elevei meus lábios para destravar minha crítica profissional, a campainha tocou, gritando em nossos ouvidos, sendo seguida por suspiros longos e decepcionados.
— Sua vez — Sang-in murmurou, se virando para a pia, começando a lavar as vasilhas que usou no preparo do redemoinho.
Fui até a porta, lentamente, ignorando o segundo chamado irritante. Arrastei minhas pantufas pelo piso amarelado, xingando mentalmente quem quer que seja o visitante noturno. Então, quando abri a porta, lá estava ele, o encrenqueiro que conversa sozinho.
Park Jimin, dono dos bonés mais esquisitos de toda a pequena cidade em que moramos.
Ele usava um moletom preto, cheio de rabiscos brancos, talvez feitos por si mesmo, junto a uma calça jeans rasgada, também escura. Em seu braço, descansava um skate surrado, semelhante aos seus sapatos. No entanto, para a minha surpresa, não havia nenhum boné exótico adornando seus cabelos escuros.
— 'Tá fazendo o que aqui? — perguntei com completo desdém, vendo-o fazer uma careta por rápidos segundos, comprimindo os lábios, como eu havia feito a poucos momentos antes, imitando meu suspense.
— Três coisas — levantou a quantidade de dedos que havia dito, e isso o deixou super fofo, pois a mão dele é pequena e gordinha, como as de um bebê. Portanto, eu nem mesmo consegui levá-lo a sério, apenas cruzei meus braços e fingi prestar atenção — Vim me vangloriar; receber a nomeação de melhor detetive da falsa banda; saber se conseguiram o nome das ruas e como.
— Foram quatro coisas — o interrompi, mesmo sem ele dar indícios de que iria continuar sua fala — Além disso, de onde você tirou que é um bom detetive? Achou os Newelvis? — perguntei com um tom gozador, me escorando no batente da porta.
— Você acha mesmo que eu iria vir aqui lhe dar uma informação sobre a investigação no meio da noite se não fosse algo intrigante? Além disso — tentou imitar minha voz, também cruzando os braços — Se você é o primeiro a saber, tem relação contigo. É como minha mãe diria: Eu fui conferir, achei algo que estava embaixo do seu nariz, mas foi encontrado por pessoas cegas, então terei que esfregar na sua cara.
— Não me diga que você... — minha voz se prendeu sobre a leve ventania que passou por nós, impedindo que eu continuasse minha frase. Estreitei meu olhar, negando com a cabeça, impedindo-me de acreditar no que eu estava pensando.
Por fim, dei passagem para o garoto entrar, pois eu pude perceber em seu olhar zombeteiro, que ele não diria nada sem antes provar da sobremesa deliciosa que eu sei que ele sentiu de longe, porque o vi fungar seu pequeno nariz e lançar-me um sorrisinho.
Ele me encarou por alguns segundos, receoso, e então, fixou suas orbes em seus sapatos, pensando se os tirava ou não. Eu apenas esperei todo o combate mental — que imaginei que ele estaria tendo —, permanecendo com meus dedos cravados na porta, os batucando na madeira provecta.
Eu de fato, nunca imaginei que ele voltaria a pisar no carpete da minha casa. Sinceramente, nem mesmo na rua do meu bairro.
Seu afastamento foi tão intenso e repentino que eu jamais cogitaria este acontecimento. No entanto, devido às circunstâncias, ele estava ali, parado no tapete escrito "bem vindo", retirando seu converse vermelho, o deixando no cantinho da entrada, mostrando apenas as suas meias de dinossauros, mesmo desenho estampado em sua bochecha, em um band-aid mal colocado.
Queimamos nossa língua ao prometer coisas improváveis.
— Park? — meu pai tremeu o cômodo com suas cordas vocais exorbitantes, permanecendo com os lábios afastados uns dos outros por um tempo, antes de puxá-los para um lado, mostrando um sorriso largo e contagiante — A bandeira de paz finalmente veio! — murmurou para si mesmo, apesar de termos o escutado. Ele juntou suas mãos e as levantou até a altura do rosto, como se estivesse agradecendo para... o teto?
— Boa noite, tio Sang... Senhor Jeon — corrigiu-se imediatamente, ainda bem, antes de curva-se levemente, de modo rápido, mas respeitoso o bastante.
— Me desculpe por vir tão tarde... Mas eu tenho algo muito importante para contar ao seu filho — me olhou de relance, mostrando-me um sorriso ladino, queimando o ar gélido com seus olhos ferinos.
— Você sempre será bem vindo à nossa casa, Park. Vamos, sente-se, eu fiz bolo! — ofereceu, apontando para o banquinho que eu estava sentando. Comprimi meus lábios mais uma vez, privando meus xingamentos, tentando não transmitir a raiva que irradiava todo o meu corpo.
Jimin recebeu um pratinho decorativo em mãos, junto ao garfo caro, usado apenas por pessoas importantes, como os colegas de trabalho do meu pai. Porém, até onde eu saiba, o Park não tem nem um pouco do quesito para usar aquele talher. Até mesmo eu, que moro aqui, nunca usei! O meu inimigo tem mais privilégios que eu.
Me sentei ao lado do baixinho, revirando meus olhos ao receber uma fatia extremamente pequena, comparada ao outro garoto. Agradecendo com a voz mais doce que já ouvi, Jimin comeu a primeira fatia, fazendo caras e bocas, animando meu pai com a sua reação exagerada. Sinceramente...
— Come logo — sussurrei, chutando sua perna, discretamente, para o Sang-in não acabar me dando broncas em frente a alguém tão específico.
No entanto, eu deveria ter ficado calado, pois o Jimin demorou ainda mais e não recusou o segundo pedaço, fazendo a mesma besteira que cometeu no dia em que visitamos a mãe do Felix. De educado esse garoto não tem nada...
Será que ele não sabe que quando a pessoa oferece pela segunda vez é apenas uma cortesia não intencional? Se deixar, ele come tudo!
— Eu sabia! — Jimin gritou, enquanto já estávamos trancados em meu quarto, tentando contar tudo em segredo, mas ele não conseguiu — Vai dizer que eu tenho as ideias mais legais, quando?
— Nos seus sonhos, talvez — contradisse seus pensamentos eufóricos, o fazendo emburrar a expressão, enrugando sua testa. Logo eu apenas ri do seu estado, sabendo que eu tinha o poder de o irritar facilmente — Você pensou em invadir e apenas isso. Nós formulamos o plano inteiro. Sendo assim, tudo ocorreu como imaginado apenas porque foi eu, o Yoongi e a Wheein quem entramos em ação.
— Engraçado dizer isso. Você invadiu o hotel e não conseguiu o que queria — caçoou de algo incerto, chegando mais perto da cama, levantando-se da cadeira em que estava sentado a segundos atrás.
Meu corpo travou no mesmo segundo. Não por ele estar próximo demais, mas por pensar no que ele havia feito, novamente. Quando dizemos que não havia nada no porão da sala "restrita" do hotel, ele ficou com um olhar duvidoso por todo o restante da aula, dizendo que voltaria lá uma hora ou outra. Então, eu apenas retrucava, dizendo para ele comandar aquela investigação sozinho e procurar pistas sem a ajuda de ninguém.
Porém, pelo que eu imagino que ele vá dizer, o garoto descobriu algo estimulante de entusiasmo... Ou só mais uma notícia insignificante.
— Pessoas inteligentes resolvem enigmas, com uma rapidez extraordinária — voltou a dizer, curvando seu corpo, para que seu rosto ficasse na mesma altura que o meu, encarando meu olhar ansioso e, provavelmente, minhas bochechas rubras — No teto havia uma pintura, certo? — concordei, mesmo sabendo que ele não precisava de uma resposta — Ao seu redor estava a chave, em cada espaço livre, em torno das suas curvas de expressão, decepcionadas por não ter achado nada — ele colocou ambas as mãos nos bolsos do seu moletom, então eu engoli em seco, inquieto para saber o que ele descobriu.
Quanta enrolação!
— Aquela era uma cena de um livro, tal qual tinha uma capa dourada extremamente chamativa. E, adivinhe só — arqueou ambas as sobrancelhas, chegando um pouquinho mais perto, quase encostando a ponta do seu nariz ao meu — Ele estava grudado na prateleira, servindo de alavanca para uma outra repartição secreta. Por essa você não esperava! — gritou, tirando sua própria conclusão, porque aquele fato já havia passado pelos meus pensamentos assim que ele tocou no assunto do hotel.
Como se eu fosse adivinhar que aquela pintura representasse uma história presente naqueles móveis de madeira! A cor do exemplar não favoreceu em nada, até porque havia livros com capas mais extravagantes. Foi apenas por azar não termos encontrado essa "passagem", pois retiramos vários livros do lugar, também cogitando aquela possibilidade ao entramos no porão.
Então, o que eu acho, genuinamente, é que o Jimin descobriu aquilo por sorte.
Sorte! Apenas por isso. Certeza absoluta que ele nem mesmo soube decifrar aquelas pinceladas confusas. Sinceramente... ele faz parte do clube de leitura, mas não deve conhecer tantas obras assim, e, principalmente, lembrar de todas elas.
— E tinha o que lá? Mais livros? — perguntei com desdém, não tão animado como antes, colocando minhas mãos em seu tronco, o empurrando para trás, para que se afastasse de mim.
Ele estava estabelecendo uma intimidade que a gente não tinha! Nunca tivemos e nunca teremos! Eu não estava gostando da aproximação dele, de uns dias para cá, pois isso me deixava super confuso, e eu odeio sentir receios! Não quero que ele ande em um vazio, e eu não quero estar em seus caminhos sem que ele me dê confiança de que não seguirá por outro, mesmo depois de eu ter me dedicado no que criei para nós.
Ele já fez isso antes, e ser traído duas vezes é um peso que eu não quero carregar.
Portanto, é melhor nós continuarmos com as brigas, e não criar nenhuma trégua.
— Tinha um... — voltou a contar sua história de grande suspense, arregalando seus olhos, levemente, abrindo um sorriso festivo.
Afirmo, sem precisar escutar dele, que eram mais estantes. Pode confiar.
Contudo, ele ficou estático, assim como eu, quando escutamos a porta se ranger, sendo seguida por uma luz intensa que invadiu uma pequena parte do quarto.
Nós olhamos para a direção da porta no mesmo segundo, vendo meu pai com uma das mãos em frente aos seus olhos, afastando seu dedo indicador dos outros, lentamente, espiando seja lá o que for.
— O que foi...? — perguntei, extremamente confuso, percebendo a presença do Jimin ir se afastando e pude vê-lo, pela sombra do seu corpo no chão, endireitar sua postura.
— Você ainda é menor de idade, a porta deve ficar aberta — colocou ambas as mãos na cintura, empurrando a tal citada anteriormente, com seu pé. Ela só não se abriu inteiramente pois travou no meio do caminho, batendo na cômoda.
Bufei, cheio de stress, mesmo que eu tenha concordado com sua decisão. Então, assim que ele saiu, o garoto que estava comigo voltou a sentar-se na cadeira da mesa de estudos, apoiando seu rosto sobre sua mão, parecendo ter esquecido todo o drama que estava fazendo.
— Tinha um o quê, Jimin? — perguntei atônito, chutando seu tênis, de leve, chamando sua atenção.
— Um cassino.
Um o quê???
Um cassino? Como assim???
Será que ele sabe o que é um cassino? Ou melhor, será que eu sei? Muitas palavras têm diversos significados e essa pode ser uma delas...
Neguei rapidamente, desacreditado, rindo sarcasticamente, me escorando na parede ao lado da minha cama, tirando ambos os pés do chão. Passei a encarar a paisagem sobre a janela, que mostrava uma rua deserta, mas iluminada como em comemorações de natal. A grande maioria das casas cintilavam luzes chamativas pela janela, e a claridade só se intensificava com os postes em cada esquina. Toda essa atenção aos detalhes apenas para me distrair.
O Park curvou seu corpo para o lado, entrando no meu campo de visão, mostrando-me um sorriso largo, elevando suas sobrancelhas, lançando olhares sugestivos, esperando uma reação melhor.
No entanto, não viria. Eu iria acreditar naquilo apenas quando visse com meus próprios olhos. Portanto, aquele garoto mentiroso e idiota poderia sair da minha casa imediatamente, pedindo desculpas por ter gasto meu tempo precioso, tal qual eu poderia estar fazendo milhares de coisas mais importantes do que escutar falsos relatos.
Muito engraçado querer deixar a história mais instigante, mas um cassino é algo absurdo demais, fora da realidade. Afinal, porque esconderam algo tão divertido? Apesar disso, eles não teriam uma boa clientela estando dentro de um hotel no fim da cidade, que fica em cima de um bar antigo — onde dificilmente lota — embaixo de um quarto aleatório, escondido em uma mini biblioteca.
Tem como ficar mais irreal?
— É sério, Jungkook. Há um cassino mesmo, cheio de pessoas, cheio de grana e bebidas em todos os cantos! — voltou a dizer, deixando que sua animação dominasse seus sentimentos novamente — O lugar não é muito grande, mas há diversos jogos com cores extravagantes, que emanam euforia e transbordam tentação com aquelas músicas viciantes. Há barulhos diversos que podem causar êxtase, aquele lugar é o céu! — se levantou novamente, dizendo palavras absurdas com o uso de diversos gestos aleatórios com as mãos.
Enlouqueceu de vez.
— As pessoas usam roupas chiques e riem umas com as outras com taças nas mãos. Eu nunca, em toda a minha vida, quis tanto gastar toda a grana que possuo para entrar naquela dança lúdica — sorriu ainda mais, dando alguns pulinhos leves, tentando, a todo custo, me fazer vibrar junto a si.
Sem chance.
Eu apenas revirei meus olhos, e bufei alto, voltando a encarar a janela, tentando procurar por qualquer ponto que me livrasse da imagem do Jimin, tal garoto que eu já não mais queria sua precisa ali.
Aliás, em momento algum eu quis.
— Você está agindo assim não por duvidar do que digo, e sim por eu ter descoberto algo que você foi incapaz! — exaltou seu tom de voz, me fazendo levar minha atenção totalmente para si.
O que mais me deixava frustrado era o fato de que ele estava certo. Eu senti leves pontadas de inveja e um imenso ódio por mim mesmo por ter vasculhado o lugar dos pés a cabeça e não ter pensado no óbvio — ok, quase óbvio —, sendo que ele, sozinho, achou um cassino!
Tenho certeza de que, se conseguirmos algo importante com essa informação, o resto da banda irá o vangloriar por um bom tempo, e isso me irrita tanto...
— Ki, preste atenção — usei o apelido que eu tinha o dado, enquanto me levantava, lentamente, vendo-o com uma expressão furiosa, cruzando seus braços — Não tente ficar enaltecendo suas descobertas, pois nós estamos trabalhando em equipe! Portanto, terá coisas em que eu, Yoongi, Taehyung ou qualquer outro, descobrirá antes de você, afinal, cada um tem uma capacidade diferente — também cruzei meus braços, elevando meu queixo, tentando passar uma aura madura no meio daquele caos que o Jimin havia criado ao nosso redor.
Eu sentia isso porque, sempre que ele ficava irritado, aquilo, de alguma forma, me afetava também, e deixava meu corpo formigando, como se eu sentisse impulsos para resolver aquela situação de alguma forma.
— Aka, você mesmo disse que eu deveria resolver tudo sozinho, e é o que estou fazendo! — também se levantou, novamente me encarando no interior do meu olhar, parecendo sentir meus sentimentos — Descobri que poderíamos saber as tais ruas dos Ducibus pesquisando o significado dos números de cada uma que havia no caderno do Felix. Quando você estragou tudo — me empurrou de leve, com uma das suas mãos, destacando aquela última frase, em específico, me fazendo encolher os ombros, espontaneamente — eu sugeri que invadíssemos a sala do diretor dos NosSo e, mesmo discordando da minha sugestão, você e o Yoongi fizeram exatamente o que disseram ser uma estupidez! — se aproximou mais de mim, como à pouco tempo atrás — Por fim, eu descobri a porra de um cassino!!!
Olhei de soslaio para a porta, verificando se meu pai não havia aparecido entre a exagerada luz amarela do corredor.
Eu estava a ponto de ter um surto de ódio! Isso por não saber retrucar o Jimin e ter consciência de que ele estava certo em tudo que dizia.
Nunca me senti tão envergonhado como agora, e mesmo que eu tivesse que olhar um pouco para baixo, para encontrar suas orbes intensas, eu me sentia bem menor que ele naquele momento. Eu só queria me enfiar dentro das paredes da minha casa, me escondendo daquele baixinho insuportável!
— Se não acredita em minhas palavras, vá até o hotel novamente e veja com seus próprios olhos. Aí sim, poderemos conversar — finalizou seu discurso que eu não queria ter ouvido, e então, se virando de supetão, ele foi em direção a porta e, mesmo sabendo que eu o segui com o olhar, ele não olhou para trás.
Já vai tarde!
Eu gritei internamente, soltando xingamentos incompreensíveis, embolando as palavras em meio ao meu momento de naufrágio.
Não queria admitir, mas naquele momento eu percebi que o Park Jimin mexia comigo em diversas formas diferentes, apesar de ser proveniente de coisas absurdamente bobas. Senti como se eu tivesse sete anos de novo, chorando de raiva por perceber que alguém causava desordem em meus sentimentos, ao ponto de fazer minhas mãos tremerem.
Eu o odiava tanto!
{...}
vish, e essa conexão suspeita... saberá disso só nos próximos capítulos, hein! kkj
até mais!
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top