Capítulo 5 - A Canção


Narrador - noite do mesmo dia.

Era quase noite quando London se sentou no chão de pedra da praça que a mulher lhe dissera mais cedo.

Ela encarou a multidão que esperava ansiosa o que fosse acontecer naquele palco improvisado que fizeram, fossem crianças ou adultos, estavam ansiosos.

Mesmo ali, ninguém parecia notar quem London era, e ela gostava assim. Ainda não tinha entendido como a mulher a reconhecera e outros não, mas tudo bem, pelo menos naquele mundo, não havia alvoroço sobre aqueles que eram conhecidos pela maioria.

Pertinho da garota, um grupo se aproximava da multidão e se misturava com aqueles que estavam de pé.

- Por favor, diz que você achou o caminho agora. - Implorou Jun para Marnie.

- Se vocês estivessem me ouvido mais cedo quando eu falei que ela estava circulando a sétima órbita umas quatro vezes, nós já teríamos encontrado o palácio. - Christian disse colocando as mãos nos bolsos de sua calça jeans branca rasgada.

- Você pode parar de encher um pouco? - Marnie disse olhando para trás e encontrando o amigo. - As placas me deixaram perdida, tá legal?

- As placas. - Pensou Christian alto. - Você que se perde muito fácil. Aposto que nem lembra mais onde estacionou o carro.

- Eu lembro muito bem. - Marnie disse com uma carranca presente em sua face.

- Aham. - Provocou Christian.

- Gente, vocês podem parar, por favor? - Pediu Lily. - O sol já está sumindo do céu. Passa das seis. E nós nem sequer conseguimos avistar o castelo.

- Também, né?! Esse lugar parece mais um labirinto disfarçado. - Jun comentou.

- O que será que está para acontecer aqui? - Perguntou Carl chamando a atenção dos outros.

Todos olharam em direção ao palco onde dois homens de cabelos e roupas azuis da época medieval subiram até o palco. Cada um se colocou num canto. Ambos se curvaram para o público depois de um sorriso. Uma mulher de cabelo azul marinho preso num grampo, um vestido antigo de mesmo azul, parou ao pé do palco com um gayageum da cor de um cristal e fios prateados. Ela sorriu para todos e esperou. O show começou.

Enquanto as primeiras notas do gayageum eram tocadas, os homens trouxeram luz ao palco com imagens brilhantes azuladas moldadas em duas formas, uma era de uma mulher de um azul mais vivo e a outra de um homem de um azul apagado, triste. A imagem da mulher mal se mexia durante os primeiros versos enquanto a do homem se mantinha parado.

O sol que aquece sua pele
Não alcança mais sua alma
Tudo está ficando frio lá dentro
E na presença daqueles mesmos mil pensamentos
Que te invadem a mente por noites e mais noites
Você chora

A imagem da mulher se sentou no chão do palco e se manteve ali parada enquanto a imagem do homem agora caminhava para frente e encarava a lua.

Eu sei que eles não podem
Mas se eles pudessem entender
A beleza desse pequeno mundo que há dentro de você
Onde criaturas das trevas
E criaturas da luz
Se encontram todas as noites

Foi então que mais luzes nasceram entre a plateia, algumas eram tão intensas como a da imagem da mulher, outras, tão pouco quanto a imagem do homem.

- Que lindo. - Lily sussurrou para Carl.

- Muito. - Sussurrou o garoto de volta enquanto uma luz mais brilhante nascia ao seu lado.

As luzes correram para o palco e começaram a dançar lentamente com a música de um lado para o outro, se misturando e então se afastando.

A imagem do homem olhou para a da mulher que o olhou de volta. Ele estendeu sua mão para ela que a segurou e se levantou.

Uma doce música paira pelo ar
Enquanto todos dançam num salão tendo o céu como teto
Onde o ingênuo e o corrompido se tocam com ternura a cada passo
Por um momento encontram-se seus olhares
E é como se isso fosse o suficiente para parar o tempo
E eles nunca precisassem ter que dizer adeus

As imagens se juntaram numa dança calma. Eram como se fosse o oposto um do outro, mas se completassem perfeitamente.

- Que fofo. - Uma menininha na frente de London disse para sua amiga.

London sorriu para a criança. Ela também achava aquilo.

A cena era algo lindo de se ver. A praça com as luzes apagadas deixando apenas aquelas no palco ao centro do espaço, a música e o sentimento tomavam qualquer um que viesse assistir.

Mesmo a letra estando em latim, London ainda entendia algumas coisas graças a Liam. O suficiente para que seu coração fosse tomado por todo aquele sentimento.

- Lá vem a parte triste. - Sussurrou Christian colocando as mãos nos bolsos da frente de sua calça.

- Conhece a música? - Marnie perguntou para ele estranhando suas palavras.

Christian assentiu com a cabeça chamando a atenção de todos.

- É uma cansão sobre nós mesmos e nossos caminhos. Mas ela é meio ambígua aos ouvidos de muitos. - Ele parecia triste. - Muitas histórias terminam como esse casal que estão vendo. - E apontou para o palco com o queixo.

A música continuava no gayageum da menina.

Mas a noite se esvai
O dia está chegando
A realidade cruel costuma os alcançar no fim
É como se estivessem fadados a crescer
E então a um dia, um morrer
Junto a este simplório mundo com o tempo

A imagem da mulher em luz começou a desaparecer diante da imagem do homem. Logo as criaturas também fizeram o mesmo. E a luz do homem foi se enegrecendo.

Mais notas do gayageum foram tocadas. Pareciam mais tensas, pesarosas.

A imagem do homem desceu o palco enquanto cada vez mais se tornava enegrecida. Ele vagava entre a plateia atravessando alguns ali. Parecia triste, desanimado, cansado.

As notas do gayageum cessaram por um momento.

Ele parou entre algumas crianças e olhou para cima onde uma faísca azulada descia.

A primeira parte da última estrofe da música foi cantada pela menina lentamente.

Não se assuste muito com minhas palavras
A vida é impiedosa mesmo
Mas há sempre uma centelha de luz
Para aqueles que abraçam a esperança

A imagem do homem estendeu a mão para a faísca que caiu na mesma. Aquele rastro de luz se transformou numa mão que se estendeu formando o corpo brilhante. Lá estava ela novamente, a imagem brilhante da moça que estava presente anteriormente. Ela sorriu pra ele e ele a puxou para perto iniciando outra dança.

As notas do gayageum voltaram a pairar pela noite.

Não temos a certeza do que vem amanhã, isso é certo
Então apenas deixe com que dancem um pouco mais, por esta noite.

As últimas notas foram tocadas e então a música chegou ao seu fim.

Silêncio. Ninguém dizia ou tinha alguma reação.

As imagens se abraçaram. E então desapareceram na noite.

Todos aplaudiram.

- Isso foi incrível. - Marnie disse aos outros enquanto aplaudia.

- Realmente. - Lily concordou.

- É melhor continuarmos logo. Vai ficar tarde e vamos ter que arranjar um lugar pra ficar por hoje. - Jun os lembrou enquanto continuavam a aplaudir os integrantes do espetáculo que agora agradeciam no palco.

Eles estavam prestes a se retirarem quando viram uma garota no meio da plateia se levantar e começar a caminhar para longe enquanto secava o rosto.

- Aquela é...

- Sim, é a London. - Carl confirmou as palavras de Jun. - London! - Gritou em meio aos aplausos.

- Não grita! - Marnie disse. - Não reparou que ninguém sabe quem é ela?

- E qual o problema?

- Pode ser perigoso pra ela estar em público. O local é muito aberto.

- É verdade. - Lily concordou temerosa pela amiga. - Vamos dar a volta e encontrá la.

A multidão ficou cada vez mais longe, assim como o barulho. London caminhou para uma das beiras daquela órbita perto da praça. Era um lugar perto de um prédio bonito de vidro de seis andares. Tinha flores aqui e ali e um caminho com grama marcada até a borda. O som da água caindo na água ficou mais forte a medida que ela chegava.

Jun sentiu o medo lhe tomar por um momento, sua melhor amiga não parecia bem há um momento atrás, agora ele, junto aos outros, a via ali de costas encarando a visão que tinham do castelo.

- Olhem. - Christian disse se referindo ao castelo. - Lá está.

O silêncio tomou o lugar quanto as vozes, só se ouvia a água.

- Será que ela está bem? - Lily perguntou a Jun que estava mais próximo da mesma.

London olhava para o mesmo lugar que seus amigos. A poderosa construção de pedras brancas estava lá, iluminada pela noite que havia chegado fazia pouco tempo. Lágrimas já não desciam mais por sua face, mas a preocupação era presente em seus olhos cada vez mais azuis profundos.

- London? - Jun chamou com certo receio.

London se virou em parte do corpo para eles e lhes deu um pequeno sorriso. Logo voltou sua atenção para o castelo.

Mais silêncio.

- Quando vocês eram pequenos, o que mais desejavam? - Ela perguntou de repente.

- Dez milhões de euros para eu converter em reais e ter mais dinheiro ainda pra gastar. - Disse Lily com sua sinceridade.

Carl riu.

- Um restaurante para que eu pudesse comer coisas chique todos os dias. - Carl admitiu.

- Queria me casar e ter filhos. - Marnie respondeu pensativa.

- Comprar um cassino em Las Vegas. - Christian respondeu.

E então mais silêncio.

London se virou e encarou Jun.

- E você? - Ela perguntou.

- E você? - Ele perguntou de volta.

Foi então que ele soube, quando ela esfregou aqueles lábios um no outro enquanto desviava o olhar por um segundo, que algo estava errado.

- Eu só queria ser feliz novamente. Algum dia. - Disse baixo. Seus olhos fitaram a grama. - Mas o tempo está passando. - Ela engoliu em seco tentando não deixar com que as lágrimas viessem. - E eu não consigo. - Negou com a cabeça. - Realmente não consigo.

E se virou novamente, encarando o castelo mais uma vez.

O ambiente agora era tão pesado que ninguém sabia o que dizer.

Marnie foi quem teve a primeira reação. Ela apenas foi até sua melhor amiga, se colocou a sua frente e a abraçou. E era só isso o necessário naquele momento. Só um abraço.

London chorou. Tudo o que prendia, toda a agonia estava sendo liberada junto com a tristeza.

- O que uma música não faz... - Christian pensou alto. - A gente vai ter que ver como ajudar os pombinhos agora.

- O que? - Perguntou Jun o encarando confuso.

- Não entendeu ainda? - Christian o encarou de volta. - Por que acha que a London saiu daquele jeito da praça?

Foi então que Jun entendeu tudo. A música, as luzes.

Ele suspirou e encarou sua melhor amiga mais uma vez.

- Maldita ambiguidade. - Disse cuspindo as palavras.

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Essa cansão na vdd é um poema que fiz faz muuito tempo, porém eu queria fazer uma música que retratasse os pombinhos e essa tem a parte da dança, essa parte eu imagino muito desde q comecei o primeiro livro, então né.. eu espero que tenham entendido o cap, sei que é muita coisa, mas tentei deixar o mais claro possível.

Gayageum é um instrumento músical coreano. Eu amo o som e achei legal por aqui.

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