CAPÍTULO 7
Tão estranho carregar uma vida inteira no corpo
e ninguém suspeitar dos traumas, quedas, medos, choros.
~ Caio Fernando Abreu/ O pensador
**AMBER**
Já era quase de noite, e tudo o que eu quero agora é chegar em casa, já tive surpresas demais por um dia.
Ainda me belisco toda vez que me lembro do momento que revi Jonas e Micaela no refeitório, ainda parece um sonho. Um sonho que tive que deixar para se concretizar no dia seguinte. Tive que me despedi da gangue assim que o horário das aulas acabou, eu não queria me desgrudar deles, é claro, pelo menos, não pelos próximos anos.
Eu tinha um compromisso muito importante pela tarde, tinha que ver minha mãe, e por mais que eu quisesse eu não podia adiá-lo, não de novo. Tento passar uma tarde inteira com ela, uma vez por semana, assim eu me sinto menos culpada por visitá-la por alguns minutos entre as 5h e 7h da manhã, isso quando eu não acordo atrasada e acabo não conseguindo vê-la.
De qualquer forma, hoje meu dia foi, mas puxado que o normal, é reconfortante saber que logo estarei em casa. Mas mesmo em casa, eu ainda tinha um assunto inacabado para cuidar. Tinha que me desculpar com meu tio. Nem sei por onde começar essas conversa. Mas sei como tinha que fazer para iniciá-la. Preciso passar pela porta de casa.
Abri a porta e entrei rapidamente, retirando minha bolsa dos ombros e a colocando pendurada nos ganchos perto da porta. Tive uma surpresa ao passar pela porta da sala e encontrar meu tio Kendrick sentado no sofá.
Isso é estranho, normalmente ele só chega mais tarde, por causa de toda papelada do trabalho que ele sempre deixa para resolver a noite. Ele estar aqui mais cedo essa noite só mostra o quanto precisamos ter essa conversa.
- Drick - disse entrando na sala chamando sua atenção - Pensei que chegaria mais tarde hoje, se você me der meia hora eu acho que consigo algo para o jantar. - cruzei meus braços trocando os pesos sobre as pernas.
Hoje é o meu dia de fazer o jantar.
- Não se preocupe, eu pedi comida para nós. - ele jogou o celular no outro assento do sofá e me encarou.
Por mais que esse olhar de "precisamos conversar" me deixe muito nervosa, me senti aliviada por não ter que fazer o jantar
- Graças a deus - disse me jogando de modo desajeitado ao seu lado no sofá.
- Achei que você não era religiosa. - Drick argumentou ironicamente com suas sobrancelhas levantadas. Bom, ele está com senso de humor hoje.
- Não sou, mas sou uma pessoa cansada - eu virei minha cabeça para encará-lo e abri um sorriso zombeiro - Você não vai acreditar com quem eu encontrei hoje.
Não gosto do que estou fazendo. Não gosto de adiar essa conversa com meu tio, mas esse foi um dia ruim, talvez mais alguns minutos de conversa simpática façam eu me sentir melhor.
- Você vai me fazer perguntar ou vai me contar logo? - perguntou se arrumando no sofá. O que me fez rir.
Parece que fugir de assuntos sérios é um dom de família ou talvez nós dois já estamos esgotados desse assunto.
Encarei novamente Kendrick, seus olhos exalavam expectativa, interesse no que eu estava prestes a dizer.
Às vezes me esquecia que Kendrick era irmão de minha mãe e não meu, porque apesar da diferença de idade e de o chamar de tio as vezes, sempre o vi assim, como um irmão mais velho.
- Jesus, Jonas e Micaela. - eu comento, observando o espanto se espalhar pelo seu rosto.
Eu posso não ter contado tudo ao meu tio sobre St. Monica, mas eu contei sobre Jesus, Micaela e Jonas. Ele mesmo já o viu várias vezes em algumas visitas coletivas no St. Monica e depois que todos foram soltos.
Apesar de ser mais velho, Kendrick tem um lado adolescente que não cresceu junto com ele. Me lembro de umas das primeiras vezes que ele e os meninos se encontraram, foi difícil distinguir ali, quem eram os adolescentes de 16 anos e o adulto de 26. Eles formavam um trio realmente inesquecível.
- Isso é muito bom Amber, nem posso imaginar o que sentiu os reencontrando. Eles são bons pra você - ele disse com um sorriso de orelha a orelha. - Podemos sair para jantar qualquer dia desses, acho que te faria bem - seu sorriso então foi se desaparecendo até que seu rosto ficasse rígido - E sobre hoje de manhã... - eu o interrompi antes que ele assumisse a culpa pelo ocorrido hoje de manhã, igual ele sempre tenta fazer.
- Não. Você estava certo. Isso - disse apontando para mim - É tudo uma bagunça. Os meus pesadelos não vão melhorar, não se eu continuar tentando sozinha. - suspirei encarando o chão - Talvez eu procure um psicólogo, talvez até mesmo o do colégio se isso te agradar, mas eu preciso e tempo para me organizar até lá.
Drick tocou suavemente a ponta de meus dedos, me fazendo voltar a olhá-lo.
Ele quase nunca me toca.
Não que ele tenha nojo de mim ou algo assim, isso faz parte da nossa convivência, ele sabe meu histórico com os homens que minha mãe saia.
Desde que eu lhe contei sobre os homens nojentos que minha mãe saia e minha convivência com eles , ele sempre tentou me passar o máximo de conforto de formas diferentes do toque. E, para falar a verdade, eu nunca me senti tão amada por um parente como me sinto amada por ele, mesmo que sem tantos toques.
Então encarei seus olhos, e neles achei o conforto que buscava. Tudo vai ficar bem, você verá. É isso que seus olhos transmitiam. Estou com você, sempre.
◇◇◇
Não sei que horas são. Sei que estou atrasada, também sei que estou no corredor da Phillipez com minhas roupas estão amassadas, meu cabelo está despenteado e tenho certeza de que minha cara pode ser facilmente confundida com a de um zumbi. E tudo isso por causa de um maldito pesadelo.
Acordei gritando como sempre, mas dessa vez está 30 minutos atrasada. Na verdade, eu ainda estou.
Era para mim estar no meio da aula de biologia avançada agora, mas eles não deixam os alunos entrarem com mais de dez minutos de atraso nas salas, e eu estou bem mais atrasada que isso. E para piorar estou de mau-humor.
Entrei no corredor do meu armário, tentei abri-lo e pegar minhas coisas o o mais rápido possível sem derrubar nada, eu realmente preciso de alguém para organizar meu armário.
- Bom dia - falou uma voz rouca próxima ao me assustando. Senti meu corpo tencionar pela proximidade da voz.
Quando me virei, com os punhos prontos para golpear quem quer que fosse, acabei dando de cara com Jesus e Jonas que me encaravam com as sobrancelhas erguidas.
Os dois estavam muito suados, quase brilhando com reflexo da luz. Eles usavam um uniforme que, julgo ser do time de basquete da Phillipez.
O uniforme não passava de nada mais que uma regata vermelha com listras amarelas perto dos braços e na barra da blusa, os shorts seguiam a mesma risca, vermelhos com bordas amarelas.
Os nomes Martin e Gonzalez estampados nas suas costas.
Os dois se aproximaram um pouco mais até que Jesus se encostou no armário ao lado e me olhou de cima a baixo. Jonas, que ficou ao meu lado, fez o mesmo. Depois o olhar dos dois se focaram no meu armário e no conteúdo dentro dele. Vi as sobrancelhas dos dois se franzirem quando encararam a blusa - do garoto do café - ali dentro.
- Vocês querem que eu tire minhas coisas do armário para vocês procurarem por drogas? - eu questionei grosseiramente cruzando meus braços.
Jesus emitiu um barulho que não tenho certeza se foi um urro ou uma risada. Jonas, como sempre, fez a única expressão que ele conhece e levantou uma sobrancelha com um olhar sugestivo. Aquele tipo de olhar que me irrita de manhã.
- Irritada essa manhã, querida? - Jonas se retratou a dizer com aquele tom sarcástico na voz.
- Atrasada na verdade, o que vocês estão fazendo aqui mesmo? - Questionei sem me preocupar se os meninos se sentiram ofendidos ou não. Eles já eram grandes o suficiente para lidarem com palavras rudes. Voltei a procurar o material da próxima aula dentro do armário.
- Temos treino durante o primeiro período. - respondeu Jesus - Sério você precisa arrumar seu armário, isso está uma bagunça. - disse apontando para meu armário com uma cara enojada.
- E você está horrível. - Jonas completou daquela forma que ele faz quando tenta ser sutil. Tenta.
Respiro fundo encarando os dois de cima a baixo. Pelo visto eles ainda fazem aquela coisa de completar as frases do outro, desnecessariamente, e o senso critico deles ainda continua tão intacto quanto antes.
- Vocês dois por outro lado estão reluzentes hoje - ironizo com um sorriso falso nos lábios, os dois reviram os olhos ao mesmo tempo.
- Já que vocês estão aqui, acho que é bom saberem que contei ao meu tio que vocês estão na cidade - respondi empurrando os materiais restantes de volta ao armário. Talvez Jesus estivesse certo, isso está mesmo uma bagunça.
- Ele quer fazer um jantar com vocês dois e Micaela. Está com saudade. - encarei os rostos de Jonas e Jesus se suavizarem e um sorriso aparecer no rosto de cada um, até mesmo no de Jonas.
Senti falta desses sorrisos.
- Diga a ele que aceitamos o jantar - foi Jonas que respondeu, Jesus concordou com um aceno.
- Ótimo, podem achar um lugar legal onde podemos fazer isso, por favor? - questionei fechando meu armário e os encarando, suas caras estavam confusas - Não podemos fazer em casa, ela ainda está uma bagunça pela mudança.
- Cuidamos do lugar. - Jesus fez um aceno com a cabeça e eu sorri me aproximando do mesmo, em uma tentativa falha de passar um braço pelos seus ombros.
- Ótimo, e Jesus - cobri minha boca com a mão enquanto fingia sussurrar a próxima parte - Não deixe Jonas escolher o lugar, você sabe, se dependermos do seu gosto exótico para lugares, vamos acabar comendo em um beco sujo ou em cima de um prédio abandonado - eu encarava Jonas enquanto dizia tudo aquilo de forma pouco discreta para Jesus.
Jonas se contentou a revirar os olhos e fungar, mas seus olhos traziam um olhar divertido e brincalhão.
Sempre que tenho a chance eu brinco com Jonas sobre uma conversa que tivemos no primeiro dia em que nos conhecemos. Ele e sua irmã tinham passado por três reformatórios antes de chegarem no St. Monica, e pela perspectiva de Jonas, era porque ele gostava de conhecer vários lugares... Exóticos, como aquele.
- Pensei que estivesse atrasada - disse Jonas sugestivamente, com os braços cruzados acima do peito e as sobrancelhas levantas, numa tentativa falha de nos fazer mudar de assunto.
- Estou na verdade, por isso vou indo. - eu ai começar a andar para longe dos dois, em direção a minha sala, mas a voz de Jesus soou não muito atrás de mim.
- Nós só temos uma última pergunta para você.
Ele disse 'nós' tipo no plural? Eles começaram a falar pelo outro agora? Isso virou o que, comunicação via bluetooth?
Mesmo sabendo que nada de bom sairia da boca de Jesus eu me virei e esperei que um dos dois falasse.
- Por que tem um moletom do time de basquete da Phillipez do ano passado no seu armário? - Jonas questionou com um olha zombeiro, me dando o troco pela piada anterior.
Mas naquele momento só tinha uma pergunta pairando a minha mente.
O que?
◇◇◇
Jesus e Jonas me importunaram pra saber de quem era aquela blusa e por que eu estava com ela no meu armário o caminho inteiro até minha sala de aula.
Eu gostaria de poder contar a eles que a blusa não é nada demais. Que é de um garoto que eu mal sei o nome, mas para eu contar isso a eles eu teria que contar como o conheço, e isso envolveria eu contar o porquê de eu acordo tão cedo e... Bom, não estou pronta para trazer o assunto dos meus pesadelos em uma conversa, pelo menos não agora.
Agora, já na sala de aula, a professora começava a explicar a matéria e citou um trabalho que teríamos que fazer para semana que vem, bem o básico da matéria, só para revisar mesmo. Ela começava a explicar o trabalho quando foi interrompida por uma batida na porta.
- Sr. Harper atrasado, de novo - disse a professora Samantha. Meu olhar foi atraído a porta para encará-lo, o garoto do café passou por ela.
Ele parecia ter acabado de sair de uma maratona, assim como os meninos mais cedo. Seu cabelo estava molhado e bagunçado, e sua pele parecia mais pálida e brilhante do que o normal.
- Desculpe, Professora Sílvia, o treinador Baxter me chamou. - ele explicou pondo a mão nos cabelos, de modo desajeitado, a professor por outro lado parece segurar o sermão que estava prestes a dizer.
- Que isso não se repita, arrume um lugar e comece a prestar atenção. - a professora retrucou com o nariz empinado.
O garoto direcionou seu olhar a sala analisando, até que seu olhar parou em mim, e um singelo sorriso cresceu em seus lábios.
Não por favor que ele não sente aqui, não, não...
- Oi de novo, garota dos cupcakes. - disse se aproximando da mesa onde eu estava, murmúrios circulavam a sala.
Eu não o via desde ontem de manhã e sabia disso e ele também, mas entrei na deixa.
- Garoto do café, que prazer em revelo. - respondi com um sorriso sínico. Ele deu um pequeno riso enquanto se sentava na cadeira ao meu lado.
Os cochichos na sala aumentaram.
- Senti falta desse sorriso sínico hoje de manhã no café. - o garoto pegou um caderno e uma caneta na mão, mas não o vi escrever nada até que a professora se virasse para encará-lo diretamente.
- Acordei atrasada
A conversa não passava de sussurros agora. Mas o garoto não parecia se importar muito com isso, ou como todos ficaram misteriosamente silenciosos agora.
- Engraçado, não era você que aparecia no meu café as 5h da manhã com problemas de insônia? - o garoto abaixou a cabeça antes que eu pudesse o olhar, percebi então que a professora o encarava ruidosamente.
- Pelo que eu saiba o café não é seu - eu sussurrei o encarando assim que ele voltou a se sentar normalmente - E eu nunca disse que tinha um problema com insônia.
- Bom você claramente tem alguma coisa. - o menino debochou e eu o encarei incrédula - Ninguém aparece numa cafeteria as 5h da manhã sendo que as aulas só começam as 8h.
Foi estranho, mas, de alguma forma, comecei a me sentir encurralada com aquele tipo de suposição.
- Você também está lá as 5h da manhã e suas aulas começam no mesmo horário que as minhas, que eu saiba - eu espetei.
- Diferente de você, eu trabalho lá - o canto do seu lábio direito se puxou mais no final da frase. Uma coisa que tenho notado que ele faz com uma certa frequência.
- Na verdade, não acho que trabalhe lá pelo dinheiro - as palavras saíram da minha boca antes que eu percebesse, o garoto pareceu ficar nervoso com isso, mas logo voltou a deixar sua expressão neutra. O que me deixou muito mais curiosa sobre aquele assunto - De qualquer forma você está lá, não está?
Ele se virou o corpo para mim, pouco ligando para a professora ali na frente ou os outros alunos ao redor, ele me encarou com aquelas orbitas claras e cintilantes e trouxe seu rosto para perto, analisando.
- Como você consegue ser tão malvada a essa hora da manhã? - ele questionou, mas não parecia nem um pouco afetado com isso, ele parecia... Impressionado?
E então ele sorriu, como se eu fosse algum tipo de bichinho exótico que eles jamais tivesse visto antes.
- É um dom. - redigi.
- Imagino que sim, que bom que o frio não afetou sua sutileza - seu sorriso era sarcástico - Por falar em frio, acho você está me devendo uma blusa.
Me lembrei então da conversa com os meninos hoje na frente do meu armário. Blusa do time de basquete do ano passado.
- Você faz parte do time de basquete? - o garoto pareceu confuso com aquela mudança de assunto repentina.
- Você me deu a blusa do time de basquete do ano passado - eu pigarrei, seu rosto foi de confusão total, para uma cara séria - Alias, por causa disso todos me olharam como se eu fosse... - as palavras faltaram na minha boca - algo que eu não sou. As pessoas sussurram coisas maldosas sobre mim por sua culpa. Afinal, como novata que não estava aqui ni ano passado teria uma blusa daquela? - eu finalizei com uma voz mais ácida do que gostaria.
- Eu te dei uma aquela blusa porque você estava congelando de frio. Você não faz o tipo que se importa com o que os outros acham de você - ele comentou com um certo fervor na voz, se virando para encarar os rostos nas cadeiras ao redor, vi os vultos de cabeças desviando a direção conforme o garoto os encarava.
Fiquei quieta sobre o seu último comentário. Ele voltou a me encarar segundos depois.
- Desculpe se não estava preocupado com os olhares que você receberia - um pesar soou em sua voz e por um momento senti que podia acreditar naquilo que ele dizia - Mas por que você liga para olhares? Você anda com os exilados, não deveria já estar acostumada esse tipo de coisa? - ele sussurrou debochando. Suspirei. É, o momento passou.
- Não gosto de olhares desnecessários. - eu me virei, o encarando, e então percebi que não estávamos tão distantes quanto imaginava, nem um pouco distantes na verdade.
Nossas pernas se encontravam no pequeno espaço entre as cadeiras e seu rosto parecia ter se aproximado mais ligeiramente do meu.
- E pare de chamá-los assim! - eu dei um tapinha fraco em seu antebraço.
Voltei a escrever as anotações do meu caderno, mas ele riu baixinho e se aproximou lentamente do meu ouvido.
- Vou te falar uma coisa garota dos cupcakes, apenas uma vez, porque não gosto de coisas repetitiva. - eu arrepiei pelo quão próximo do meu ouvido ele estava que nem sequer me movi.
Seus dedos tocaram em uma mecha do meu cabelo, ele a colocou atrás da minha orelha, e aproveitou o movimento para tocar os lábios perto dos meus ouvidos, sua voz profunda os inundou mais uma vez:
- Primeiro, é impossível você não atrair olhares aonde quer que você vá, senhorita Lewis. Mesmo que as vezes sejam olhares desnecessários. - a voz ficou mais baixa agora - Não acho que importe o que esteja vestindo, quando as pessoas põem os olhos em você, acredite, é um grande sacrifício olhar para outra coisa que não seja a senhorita.
Ele então sem aviso se afastou de mim, apenas para tocar no meu queixou e o guiá-lo para sua direção. Ele encarava bem os meus olhos de uma forma que me fazia querer olhar os seus da mesma forma. Eu senti uma pequena queimação nas minhas bochechas. Pequena.
- E segundo, eu só os chamo assim para meu divertimento, porque sei o quanto você odeia. - ele piscou para mim e abriu aquele sorriso irritante, retirando aquela mão do meu queixo.
Eu precisei de alguns segundos para que a queimação nas minhas bochechas fosse embora, dando lugar a constante vontade de revirar os olhos e batê-lo, de novo, já que ele parecia se divertir com tudo aquilo.
- Você realmente tem um ótimo dom de me fazer te odiar quando finalmente estava começando a gostar de você, garoto do café. - disse apoiando o rosto a minha mão, entediada com o conteúdo que a professora falava junto a nossa conversa.
- Então você estava começando a gostar de mim, garota dos cupcakes? - ele disse num tom provocador e eu senti a queimação no meu rosto voltar. Me senti desconfortável - Então... Que tal me falar mais sobre seu suicídio social e grupo dos exilados, hein? - ele questionou mudado de assunto quando viu meu desconforto, mas manteve o sorriso genuíno no rosto, eu revirei os olhos.
- Nem mesmo tente - disse rudemente, focando minha vista na folha de anotações na mesa, ele gargalhou. Babaca.
◇◇◇
- Por que eu acho que algo está te incomodando? - Jesus questionou se jogando no lugar vago ao meu lado no sofá.
Nesse momento eu e Jesus nos encontramos largados no meio da sala de jogos da casa dos irmãos González.
Eu nunca tinha vindo nessa casa deles antes, e pra falar a verdade, chamar esse lugar de casa é um eufemismo a palavra eufemismo.
Micaela e Jonas, por outro lado, estavam a poucos metros de nós, no meio de uma montanha de papéis e livros de álgebra, em uma pequena mesinha de centro que servia de apoio para toda aquela tonelada de papel. Os dois estão perdidamente distraídos em uma discussão sobre uma questão que tenho certeza de que as respostas dos dois estão erradas.
Voltei a minha atenção ao Jesus que agora se esparrava ao meu lado no enorme sofá cinza na sala.
- Delírios. É algo muito sério, devia procurar um médico - desconversei, voltando a colocar a ponta do lápis na minha boca.
Tenho várias coisas me incomodando no momento, a situação da minha mãe, meus pesadelos, preocupações com a escola, e muito mais, mas acho que a maior de todas elas é não poder contar ao meu melhor amigo sobre isso.
- Eu não sei se me sinto ofendido ou com raiva por você ainda tentar fugir de assuntos sérios na minha cara - Jesus colocou a mão no peito como se tivesse realmente ofendido.
Revirei os olhos sabendo o que viria a seguir. Quando Jesus começa um diálogo com frases dramáticas, é porque ele tem uma avalanche filosófico em mente.
- Eu acho que você se esqueceu que eu ainda sou seu melhor amigo e te conheço melhor do que ninguém. Você pode fingir o quanto quiser pra eles - ele acoplou, dando um leve aceno de cabeça aos irmãos - Mas pra mim você é um livro aberto e eu conheço cada página sua - ele se sentou no sofá - Então quando eu digo que tem algo te incomodando, eu sei que tem algo errado acontecendo.
Jesus tirou o livro de álgebra da minhas mãos, tomando seu lugar com uma das mãos, suavemente. Seu rosto sério encarou o meu.
Senti como Jesus estava preocupado comigo. Assim como eu acho que estaria se sentisse que ele estava incomodado com algo
Sua mão, sutilmente, começou a fazer carinho na minha.
- Você é minha melhor amiga Amber, você sabe disso, e se algo acontecesse com você... - ele pausou a frase como se pensasse o que faria naquela situação - Bom eu ficaria louco - ele apertou mais forte minha mão dando um sorriso nervoso - Então quero que saiba que estou aqui se precisar.
Não tinha certeza se podia responder aquilo. Então apenas assenti.
- Um pelo outro. - ele recitou. Aquilo era uma coisa antiga que falamos um para o outro, quando parecia que o mundo estava disposto a cair sobre nós. Era quase como um mantra nosso.
- Sempre. - dei-lhe um sorriso sincero.
- Eu não sei qual é o tamanho do problema e nem se ele tem uma solução, mas sei que se tudo der errado - um sorriso brincalhão se abriu nos seus lábios - Bom, ainda podemos fugir para Vegas, mudar de nome e nos casamos um com o outro - a frase me fez gargalhar.
Uma das poucas vezes em que eu e Jesus nos permitimos pensar sobre como seria a vida fora do St. Monica, eu comentei com o mesmo, que se as coisas estivessem muito ruins para nós dois, depois de tudo aquilo. Nós poderíamos nos mudar para Vegas, poderíamos mudar de nome e recomeçar.
Mas nunca disse a parte de nos casarmos, isso é completamente a ideia de Jesus.
Era uma ideia boba. Recomeçar, quero dizer.
Essa ideia manteve um fio de esperança naquela vida monótona e desafiadora que vivíamos. A ideia de que talvez a vida fora dos muros de St. Monica, talvez ela pudesse ser boa. Essa ideia nos aquecia durante a noite.
- Prefiro morrer. - eu retruquei com a voz forçadamente enjoada. Jesus revirou os olhos.
- Até parece - ele fez uma careta - Além do mais, pense pelo lado positivo, minha mãe ainda faz um bolo como ninguém, você teria um estoque de bolo infinitamente bom.
Só a ideia de ter estoques infinitos do bolo da mãe de Jesus já faz a ideia de fugir para Vegas com Jesus mil vezes melhor, desse jeito até posso pensar sobre a ideia de casarmos.
- Bom, talvez seja um bom plano B. Mas só porque gosto da sua mãe. - no final nos dois gargalhamos.
Eu nunca tive muitos amigos, de fato, eu nunca tive nenhum até encontrar Jesus.
Eu nunca fui aquela garota linda e popular das escolas, aquela que todos conheciam e queriam ter amizade.
As amizades que eu tive antes só me destruíram mais. Jesus foi a primeira pessoa que eu dei o direito de me conhece por inteira, cada página e cada pedacinho.
Às vezes, eu acho que isso só aconteceu pelo tamanho da insistência dele em conhecer mais, na verdade tenho certeza de que foi isso, a sua insistência.
Jesus foi o primeiro que olhou na minha cara e percebeu que eu carregava uma máscara, talvez esse seja o grande motivo para o tamanho da sua insistência, a curiosidade.
Também sei que foi pela empatia, por saber que não era o único que também sabia o peso de carregar algo assim, porque ele também carregava uma máscara.
- Posso te contar um segredo? - questinei com um brilho nostálgico nos olhos. Brilho esse que refletiou nos olhos deles
- Apenas se eu te contar outro em troca. - ele recitou.
Só sei que depois que comecei a andar com Jesus ele fez de tudo para eu falar o qualquer misero detalhe sobre mim. E eu tentei, Deus sabe o quanto que eu tentei ignorá-lo, eu fui grossa, eu fui seca, rude, selvagem. E a vontade de bate nele era enorme.
Mas o garoto parecia não se importar com aquela máscara que eu criei para todos temerem. Ele também tinha a dele. E a assumia em quase todos os momentos, exceto comigo.
No final, acho que esse é o lance do nosso grupo, todos carregamos uma máscara, por motivos diferente e de formas diferentes, mas todos temos uma eu, Jesus, Jonas, Micaela, todos.
Talvez por isso viramos amigos, talvez a empatia ou afeição de saber como é o peso de fingir ser uma pessoa que você não é realmente tenha nos aproximado.
Tudo o que sei é que Jesus tinha uma máscara quando nos conhecemos, mas nunca usou aquela máscara comigo, sempre deixou a guarda baixa, até que eu deixasse a minha guarda baixa também para que eu o deixasse entrar e ver a verdadeira Amber.
Não foi uma coisa natural, baixara guarda depois de tantos anos a erguendo para que ninguém pudesse entrar, não foi nada fácil.
Na verdade, foi uma coisa totalmente fora do meu controle. Jesus me viu por dias acordando dos meus pesadelos e tudo o que eles faziam comigo, ou ouviu pelo menos, por dias.
Depois daquele dia em que acordei aos prantos, chorando pelo pesadelo e Jesus me amparou.... Eu não sei, aquilo criou uma ligação entre nós, uma ligação muito forte. E me abrir com ele depois daquilo apenas, parecia o certo.
Quando o fiz pela primeira vez, quando me abrir e contei quem era realmente a Amber... A sensação foi como se já fizéssemos isso a anos.
Uma noite de muitas revelações tinha se passado, e no dia seguinte ainda éramos nós, sem nenhuma enganação, nem fingimento.
Depois daquele dia sempre pareceu certo me abrir para ele, foi algo tão surpreendente pra mim, que as vezes eu nem percebia quando eu estava desabafando com ele, as vezes ele também não percebia quando começava a desabafar comigo.
Não havia cobrança, nem dúvida, nem julgamentos, muito menos conselhos meia boca. É algo que nem nos mesmos sabemos explicar as vezes, só acontece, é uma conexão quase sobrenatural.
Foi só então que percebi que ele não me julgaria ou sentiria pena de mim, independente do que eu contasse, soube que ele seria meu abrigo e meu porto seguro, e sim pode parecer loucura eu dizer isso dele por o conhecer a pouco tempo, talvez um pouquinho a mais do que loucura.
Ele e eu... Nós somos como dois livros velhos da mesma obra, que acabaram largados na prateleira mais alta de uma estante. Podíamos estar sozinhos, abandonados, mas éramos o complemento um do outro. É uma amizade que parece que foi formada em outra vida.
Por isso que quando comecei a contar sobre meus sonhos para ele no meio da sala da mansão dos irmãos, eu não parei na parte em que eu acordava, mas sim na parte que meu dia terminava, porque com ele não a conversa não tinha apenas um foco.
******************
Bom dia babys!
Como vocês estão, hein?
Quem ai está com vontade de mudar para Las Vegas e se casar com Jesus (me: Eu quero🖐) KAKAKAKAKA.
Vamos falar de coisa boa, Amber, Jonas e Jesus são meu tudinho. Não duvido nada que eles acabassem procurando por drogas naquele armário mais tarde. Nesse capítulo esses dois..... Enfim as conhecidas maria fifi do bairro KSKSKSKSKSK
Mas e esse garoto do Café gente? A Amber nem o nome dele sabe, mas a química entre aqueles dois é inegável. Me digam que não foi só eu que senti aquela química toda. Se alguém falasse aquelas coisas no me ouvido ou eu desmaiava ou eu beijava o cara SKSKSKSKSKKSSKS
E aquela cena da Amber com Jesus, ela aqueceu meu coraçãozinho a noite. Eu já disse, mas vou dizer de novo, eu amo o Jesus.
Enfim, bom final de semana babys.
Lembrem de comentar e votar hein.
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