CAPÍTULO 22
**LOGAN**
Já era cedo. Tinha perdido o sono logo cedo, ou melhor, ele foi arrancado de mim. Tudo começou quando fui expulso da minha própria cama para dormir no sofá. Minhas costas gritavam em protesto pela manhã.
De qualquer forma, me arrumei e deixei minha casa logo cedo. Dormir não era o plano mesmo.
Passei na cafeteria. Não era meu turno hoje, mas eu conhecia o rapaz que estava trabalhando lá hoje, um café iria bem agora.
Passando pela porta da cafeteria, fiz um sinal cumprimentando Deluca. Ele arregalou os olhos em surpreso ao me ver.
Consegui o emprego para ele a menos de três mês. A cafeteria podia ser do meu tio, mas era eu que dirigia o lugar, e cuidava inclusive do quadro de funcionários.
- Caiu da cama? - Deluca respondeu achando graça da minha expressão.
Alto como eu, mas com a pele tons mais claros que a minha, cabelo raspados quase rente ao couro cabeludo e platinado. Com o uniforme daqui parecia apenas mais um rapaz comum, mas fora dessas paredes podia simplesmente ser confundido com um adolescentes indie de series.
- Cale a boca - resmunguei entrando dentro balcão e começando a preparar um café para mim.
- Sabe, você não apareceu ontem - ele comentou se apoiando no balcão e pendurando o pano em seus ombros, assim como eu costumo fazer. - Tudo o ocorreu bem ontem, caso queira saber. Mas há alguém que não está muito feliz, você pode imaginar.
Nós dois sabíamos que ele não estava se referindo a cafeteria.
E eu sabia bem, quem ele estava se referindo. Meu peito se aliviou em parte, ao saber que tudo correra bem.
- Tive alguns imprevistos - instiguei terminando de colocar meu café no copo - E afinal, você e Ralph já são grandinhos, tenho certeza que vocês conseguiram cuidar das coisas sem mim. Mas fico feliz que as coisas tenham acabado bem. Vou averiguar todas essas coisas quando acabar com meus imprevistos.
Deluca cuidava das coisas quando eu ou Ralph não estávamos. Ele também auxiliava Ralph, que sempre se encarregava das minhas obrigações.
- Algo que eu deva me preocupar? - Deluca cruzou os braços levantando uma sobrancelha em questionamento.
Terminando meu café levantei o copo até meus lábios e tomei um gole antes de dizer:
- Não - respondi sentindo o gosto amargo do café na minha boca - Apenas estou cuidando do nosso futuro.
- Toda vez que você faz isso, acabamos me mais encrenca. - Deluca disse sorrindo. Eu sorri de volta.
- Não finja que vocês bastardos, não adoro quando eu faço isso. - retruquei fazendo Deluca gargalhar.
Bastardo.
◇◇◇
Entro na casa dos Gonzalez, chegando na cozinha pela passagem da garagem para a cozinha que conheci ontem.
Encontrei com Jonas apenas de shorts, sentado numa banco alto e encarando o computador com tédio, ele parecia cansado. Micaela não estava longe dele, sentada em um banco parecido a sua direita, ela se debruçava sobre uma pilha de papeis, dormia sob eles.
Não havia nenhum sinal de Amber na cozinha.
- Vocês viraram a noite? - perguntei olhando para o rosto cansado deles.
Jonas tirou os olhos da tela lentamente, sem se assustar com minha presença, apesar dela não ser esperada. Mas Micaela deu um sobressalto do balcão, colocando a mão no peito quando percebeu que era apenas eu em sua cozinha.
- Sim - a mesma respondeu ofegante depois de se acalmar.
Era de se admirar. A dedicação deles para achar Jesus era de se admirar.
Eu também estou preocupado com Jesus, parece certo, depois de passar tanto tempo com ele e Jonas nos últimos dias.
Se para mim, que tive tão pouco tempo na presença de Jesus, sinto esse sentimento... Como se algo faltasse. Não posso nem imaginar o que eles estão sentindo, já que eles tem essa amizade desde o reformatório. Convivendo entre si desde então.
Jesus era o que emanava humor e alegria no grupo. Dava para notar o ar pesado e opaco que se estabelecia na casa dos Gonzalez agora, diferente do primeiro dia que estive aqui com jesus até o momento de seu sumiço.
Eu podia fingir não notar, mas eu vi os olhos inchados e o olhar vazio de Jonas.
Um barulho de passos soou pelo corredor que levava a sala, e a voz de Amber apareceu no ar:
- Vou ao mercado, preciso me afastar dessas telas por um tempo se não vou surtar, querem alguma coisa?
Eu ouvi quando seus passos pararam atrás de mim, imagino que minha presença causará essa parada abrupta.
Micaela não percebeu, ou pelo menos, fingiu muito bem. Logo ela se espreguiçou e fez seu pedido a Amber, logo em seguida Jonas fez a mesma coisa. Eu então me virei, encarando Amber.
Ela com seus cabelos castanhos, com pequenos cachos feitos nas pontas, um suéter verde que contrastava bem com seu tom de pele, e uma calça jeans preta. Mas seus olhos, assim como os de Jonas, não me passaram despercebidos.
Ela esperou por minha respostas, e eu neguei pedir por algo, sem olhar em seus olhos. Esperei até que ouvisse seus passos longe da cozinha, antes de encara Jonas e ver o olha de desaprovação. Porém, como de costume, ele não falou nada.
- Eu entendo. - a voz de Micaela soou ao meu lado - Você estar bravo com ela, eu entendo.
Nunca tive muita interação com a irmã de Jonas antes. De alguma forma ela sempre pareceu o oposto de seu irmão.
- Não estou bravo com ela.
Não era uma mentira, e não chegava a ser uma verdade.
Micaela me encarava como se soubesse a verdade nisso.
Ela entortou a cabeça em afirmação ao meu pensamento:
- Quando ela falou, ela esperou sua resposta, procurando pelo seu olhar. Mas você não procurou o olhar dela de volta. - Micaela me apontou - Você não a ignora, o que é bom. Isso mostra que você não é um babaca, mas você não olha nos olhos dela quando a responde, como um medroso.
Eu apesar de tudo não era medroso.
Mas é obvio o fato que eu estou bravo com Amber. Ela me prendeu a uma cadeira, me ameaçou no carro. A maioria das pessoas estaria mortas a este ponto por cometer esses atos.
Não podia negar que foi meu interesse por esse grupo que me levou a onde eu estou hoje, mas é apenas esse mesmo interesse que os mantém vivos.
Se eu os trouxesse para o meu lado... O futuro estaria a nosso favor.
- Eu não tenho o direito de ficar bravo com ela por ter me prendido numa cadeira ontem e ainda sou covarde por não querer encará-la? - questionei a mesma em ousadia, pude ouvir os resmungos de Jonas perto de nós.
- Ela te soltou depois. E você é covarde por não dizer o que pensa a ela.
Acabo de perceber que prefiro o cinismo e o silêncio julgador de Jonas do que a verdade sincera e dolorida de sua gêmea.
- É só que...Não há nada e mesmo que houvesse, nada a obriga a se abrir comigo sobre coisas que ela não quer. - disse concluindo - E sei que ela não tem o hábito de se abrir em geral... Mas a forma que ela reagiu quando soube que eu descobri, eu esperava algo diferente.
Realmente. Não mentia sobre isso. Podia mentir sobre o motivo de minha raiva, que se direcionava mais a afronta dessa misteriosa menina, que em um dia teve coragem de fazer comigo o que nenhuma pessoa em sã consciência faria. Mas não mentia sobe esperara algo diferente sobre sua reação.
O jeito que ela agiu com a situação, suas ações, ameaças e falas, mostravam-me um lado extremamente atraente e perigoso sobre Amber. Quem seria essa garota afinal?
- Você preferiria que ela tivesse te contado e você não entende o porque ela reagiu assim. - Micaela me esclareceu, e surpreendentemente, apesar da farsa, percebi ser verdade - Eu não culpo você por ficar com magoado...
- Bravo, eu fiquei bravo, não com magoado. - a interrompi, passeando pela cozinha até me estabelecer na pia.
- Semântica - ela retrucou - Você também deve ter segredos que não quer que ninguém saiba, todo mundo tem.
Realmente. Eu não podia discordar da garota.
O dom dos Gonzalez de ler e entender as pessoas era mesmo uma droga.
- De qualquer forma, você nunca vai entender como foi para nós lá, como foi para ela lá. - Mica disse se levantando da bancada e se aproximando - Ninguém deveria ser obrigado a lembrar de que viveu naquele lugar a cada passo que dá. Apesar dos métodos dela, ela fez o que fez para proteger a mim meu irmão e Jesus. Tudo que ela faz é por nós.
- É muito bonito, essa ligação de vocês.
- É isso que uma família faz, não é? Não que alguém um aqui saiba muito sobre família - replicou ela, pensando alto - No fundo, estados todos quebrados do mesmo jeito, em lugares que talvez ninguém veja.
◇◇◇
Já devia ser quase meio dia. O tempo estava contra nós, logo 24h teriam passado desde a entrega do bilhete, só temos mais 1 dia para encontrá-lo.
Na minha cabeça eu pensava o que aconteceria se não achássemos Jesus. E as consequências disso.
Amber interrompeu meu pensamento antes que eu o desenvolvesse.
- Acho que consegui algo.
Nós todos estávamos sentados ao longo do sofá, Jonas ao meu lado, Micaela e Amber se sentaram juntas na outra ponta do sofá.
- Eu também - respondeu Micaela, eu e Jonas nos aproximamos delas para observar - Logan descobriu que as digitais pertenciam a Lance Guilard, quando eu joguei esse nome no site da polícia hoje, olhe o que me apareceu.
A foto que eles me mostravam era de Lance Guilard, eu o conhecia bem, reconhecia aquele cabelo, a pele extremamente branca, e as pequenas e irritantes sardas em seu rosto.
Mas pelo visto eu não era o único a reconhecer Lance na sala.
- Maldito - praguejou Jonas furioso.
- Vocês conhecem ele? - questionei vendo a expressão furiosa no rosto de Jonas e Micaela. Já Amber, a expressão contida em seu rosto é totalmente diferente, é calma, contida, quase sem expressão alguma.
Ela encarava a foto na tela do computador como se pudesse realmente encarar os olhos de Lance pessoalmente. E entre aquela máscara que mantinha sua expressões camufladas, eu consegui enxergar um pouco de seu ódio surgindo em seu olhar.
- Nós temos um passado. - ela me esclareceu - Ele também esteve no reformatório. Ele e sua maldita gangue.
Eu já estava prestes a perguntar por mais, mas Jonas me conhecendo se adiantou em dizer:
- Seu nome aqui fora pode ser Lance, mas nós o conhecemos como Ruivo, e ele era o líder dos Guilards em St. Monica.
◇◇◇
Muita coisa estava acontecendo. Eles conheciam Lance, conheciam os Guilards, o que mais do meu mundo eles conheciam?
Eu tinha que ligar para Ralph, tinha que ligar para qualquer um. Por isso inventei uma desculpa, enquanto os gêmeos almoçavam algo rispidamente, para sair para o jardim adjacente a casa para fazer minha ligação. Eu só não esperava encontrar Amber aqui também, com um cigarro em mãos.
- Eu não sabia que você fumava. - disse descansando minhas mãos em meus bolsos. Amber me encarava fixamente, como se ainda tentasse ver os segredos através de mim.
Essa era a primeira vez que ficarmos sozinhos desde nossa conversa no carro.
- Só quando estou estressada. Maldito hábito de Jesus. - ela avaliou segurando o cigarro entre os dedos.
- Então, parece que mais amigos seus da época do reformatório estão aparecendo.
- Dadas as circunstâncias, eu dificilmente chamaria eu e o Ruivo de amigos.
- Tem alguma ideia do porque ele pegou Jesus? Porque agora?
- Acredito que sim. Depois que Jesus levou o tiro no ombro, ele me contou que o conseguiu ao tentar ajudar uma garota ruiva de se livrar de uns dois, três caras. -
Então foi assim que aquela bala foi para em seu ombro.
Jesus lutou mesmo contra 3 caras para salvar uma garota que provavelmente nunca mais veria na vida? Ele levou um tiro por isso?
Como um adolescente de 16 anos tem uma conduta assim? Tão admirável, mesmo tendo passado por lugares tão horríveis, onde provavelmente esses atos eram tão comuns.
- Mais tarde ele confessou para mim que ele os reconheceu da época do reformatório.
Quantos dos Guilards estavam no reformatório na mesma época que eles? Eu sabia que alguns deles foram mandados para um reformatório pouco mais de 1 ano atrás, mas o reformatório para qual foram mandados era um dos piores que ainda existem.
Se Amber e seu grupo realmente estiveram lá, muitas coisas sobre seus jeitos e comportamentos começariam a se encaixar.
- Então você ja imaginava que eles poderiam estar envolvidos? - questionei me aproximando dela.
- Tinha minhas suspeitas. - ela disse soltando a fumaça que prendia em seus pulmões em meu rosto, dada a nossa proximidade - Quando as digitais bateram com alguém com sobrenome Guilard, eu tive minha certeza. Mas até então eu pensei que seria outro no comando dos Guilards, não o Ruivo.
Sim, eu também achava isso, se Lance está envolvido nisso, ele estava no comando.
- Bom, então se trata de vingança. - eu conclui mantendo a mesma proximidade entre nós - Mas se você já sabia que os Guilards estavam envolvidos porque não falou para os outros?
Amber me encarava levando o cigarro ao lábios e o tragando.
- Ah eles sabiam dessa possibilidade, não guardamos segredos assim aqui. - levantei minha sobrancelhas em falsa surpresa.
- Bom, então só eu não fui informado. - Amber deixou sua cabeça pender para o lado, enquanto soltava a fumaça:
- Não pode me culpar por ainda não confiar em você. - respondeu tornando seu olhar mais observador ao me encarar.
Não me deixei abater, porque eu sabia que estávamos naquele nosso jogo de novo. Instigávamos e buscávamos verdades, mas no fundo, isso era uma disputa para ver quem cederia primeiro, e ambos sabíamos disso.
- As vezes, eu penso que sou eu quem não deveria confiar em você. - eu abaixei minha cabeça ao me aproximar novamente dela - Inimigos de gangues mafiosas. Ferimentos de balas. Reformatórios. Eu descobri seu nome, mas parece que ainda não sei nada sobre você.
E tudo bem. Eram os segredos dela, cobertos por tantas armadilhas, que me instigavam cada vez mais. E quando vi a chama se acender em seu rosto, e o abaixar de uma de suas sobrancelhas, eu soube que tinha acabado de cair em uma delas.
- Eu poderia dizer o mesmo sobre você. Em nenhum momento eu disse que os Guilards eram uma gangue mafiosa. - ela contrapos batendo a ponta dos dedos em meu peito - Você finge não saber coisas que sabe. Você descobriu sobre nós e o reformatório, tenho certeza que se eu ligar para as pessoas certas posso descobrir coisas de você também.
E ai estava, a pontada de ameaça que a presença dela me causava. Sempre com ameaças, sempre com cartas na manga. Muitos já foram descartados por me fazerem sentir menos, entretanto, ela ainda está aqui.
- Você pode tentar. Mas dadas as circunstâncias, - retruquei em suas palavras - Não sou eu que escondo as coisas aqui.
Ela não me respondeu depois disso, e eu não a instiguei, por instantes, o silêncio rendeu nós dois, e nós apenas nos encaramos. Peito a peito, cara a cara.
Ela tentava ainda parecer intimidante, mas nossa distância não estava a favor dela, ela sabia disso. Ela correu as pontas de seus dedos de meu peito para meu pescoço. Suas unhas arranhando minha carne, enquanto seus olhos divagavam pela trilha que suas unhas deixavam.
Ela seguiu com seus dedos até que eles encontraram as pontas da minha mandíbula, ela foi ardilosa ao meu puxar meu rosto ao seu e sussurrar extremamente poderosa:
- Eu descobri seu nome, mas parece que também não sei nada sobre você, Harper.
Depois disso, meu corpo apenas correu em instintos com minha mão agarrando sua cintura e a puxando para mim. E nós nos encaramos de novo, até que eu estivesse perdido o suficiente em seus olhos para não perceber seus movimentos até que os seus lábios selaram os meus.
Ambos soltamos suspiro de alívio quando nossas línguas finalmente se tocaram e a pressão trucidaste escapou de nossos corpos quando nos tocamos.
Levei minhas mãos aos seus cabelos e os puxei com força, descolando nossas bocas o suficiente para ver o olhar de desejo desperado em seus olhos.
- Diga que sente muito. - eu ordenei.
As sobrancelhas de Amber se curvaram e eu senti seu corpo endurecer de novo.
- Pelo que? - seus lábios sussurraram ainda com desejo.
- Por não confiar em mim quando seus instintos dizem o contrário.
Essa era a hora arriscada. Nem eu mesmo previa o que estava prestes a acontecer.
- Olho para você todos os dias e sinto impulso cada vez que a vejo na sala, olho para você e sinto vontade de te contar todos os meus segredos, as minhas verdades. - sussurrei em seu rosto, fazendo minhas mãos ainda em seu cabelo, trazerem ela mais para mim - Eu sei que você também tem isso. Então diga que sente por não confiar em mim, porque é impossível que eu sinta esse sentimento sozinho.
- Di-Diga que sente também, e então eu direi. - ela deixou a voz falhar, mas sua atitude queria mostrar que ela ainda tinha poder ali, naquela situação, mas nos dois sabíamos que essa atitude falhou.
- Eu...
A porta abrindo atrás de nós nos obrigou a afastarmos. Jonas apareceu em minha visão, sua cara não escondendo seu pensamento do que ele acabou de ver.
"Que bom que se acertaram, mas há coisas mais importantes do que se beijar agora"
- Temos as coordenadas, achamos eles - ele foi cirúrgico ao dizer.
Sinto Amber se desconectar de mim, seus fios de cabelos esvaindo pelas minhas mãos e então ela segue com Jonas para a cozinha, parando rapidamente na porta para dizer:
- Depois que encontrarmos Jesus, Harper. Eu e você teremos uma longa conversa sobre nossos segredos.
E então ela se foi. E eu sabia, sabia o que ela tinha acabado de me oferecer.
Eu tinha acabado de conseguir um lugar em sua gangue. A conversa seria a limpeza de nossos segredos, para que eu fosse igual a ela, igual a eles, para que eu me tornasse um membro de sua gangue.
Que eu guarde todos os meus segredos do mundo, mas não deles, jamais deles.
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