CAPÍTULO 12

"Um tiro de um desconhecido dói
mas não mais do que a facada de um amigo."
~ Autoral

**JESUS**

Eu tirei a Amber do quarto o quanto antes. Na verdade, eu deveria tê-la tirado daquele quarto no primeiro momento em que a mãe dela entrou na defensiva aquele jeito.

Eu não quero julgá-la, aquela mulher é a mãe da Amber afinal, eu tenho certeza de que ela já deve ter passado por muitas coisas na vida, a própria Amber já me contou isso.

Mas aquela mulher que eu vi na cama do hospital... Ela não se parece nada com a mulher que a Amber me contava. Sim, às vezes, quando a Amber me contava sobre sua mãe, dava-se a entender que ela não era realmente uma mãe perfeita, mas ninguém é 100% perfeita.

Então, como? Como uma mulher que lutou a vida inteira por si mesma acaba daquele jeito? Se sujeitando uma vida miserável, com um homem horrível e odiando a própria filha? Como alguém chega nesse ponto? Será que são as consequências das lutas que já passou?

Esse pensamento tem me assustado constantemente. Todos os meus amigos, inclusive eu, somos pessoas que já lutaram constantemente por nós mesmos. E não importa quantas lutas ganhemos, nunca temos tempo para comemorar a vitória, porque sempre há outra luta.

Tenho pensado bastante nisso, e admito que perdi boas noites de sono assim. E, se o esforço das lutas que escolhemos batalhar, no final, não valham de nada. Porque no final, ainda estaremos quebrados e ainda não teremos ninguém para lutar por nós. E se, no final eu acabar como a mãe da Amber. E se a Amber acabar como a mãe.

O pensamento meu fez tremer.

E falando na Amber. Desde que deixamos o quarto, Amber se encostou no lado de fora da parede do quarto de sua mãe e começou a chorar sem controle, se curvando até chegar a abraçar seus próprios joelhos, para tentar controlar os soluços violentos.

Eu tentei de todo custo convencê-la a sairmos daqui, até mesmo tentei arrastá-la, mas agora eu estou tão desconcertado quanto ela, sentado ao seu lado do chão nesse asilo maldito.

Eu sabia. Eu sabia que isso não daria certo, sabia que essa era uma causa perdida. E agora, eu e a Amber estávamos caídos no chão, mais uma vez.

E por mais que seja errado, tudo que eu goataria agora era um cigarro.

Sabia que agora, eu não era a pessoa que conseguiria dar o apoio necessário que ela precisava, mas eu sabia quem podia.
Jonas.

◇◇◇

- Onde ela está?

Eu me levantei no mesmo instante em que ouvi a voz de Jonas repercutir pelo corredor.

Ele parecia atordoado, até mais que eu.

Eu sabia que se eu não consegui tirar a Amber daquele estado de transe horrível que ela estava pode causar da mãe, a única que pessoa que poderia fazê-lo era Jonas.

Só que eu não contei nada a ele exatamente o que tinha acontecido aqui. Eu travei na hora de contar sobre tudo o que eu vi agora pouco, a única coisa que contei foi que eu precisava da ajuda dele.

Porque Amber precisava dele.

Eles tinham esse tipo de conexão... Uma conexão pela dor.

É um pouco difícil para eu falar disso, porque eu descobri sobre isso muito depois, mas quando Jonas chegou no St. Monica, ele não estava nada bem...

Bom, digamos que não foram os melhores momentos para ele lá.

Era até de se esperar, na verdade. Jonas já era estranhamente quieto nos primeiros meses em que ficou junto a mim e Amber.

Me lembro de me sentir até estranho em ficar na mesma sala que ele, é que ele sempre foi muito observador e sempre parecia saber de tudo o que acontecia naquele lugar. E pra ser honesto, eu e Jonas não nos gostávamos muito no início.

O que hoje parece ser uma loucura, porque agora o cara é o meu melhor amigo e literalmente uma das três pessoas que eu confio de olhos fechados.

Eu e ele... Nós demoramos um pouco para nos adaptar nos primeiros meses fora do reformatório, principalmente por estarmos todos separados.

Quando ocorreu nosso "reencontro", quando eu vi Micaela e ele, eu lembro de sentir uma sensação que a muito tempo não sentia, aquela sensação que chacoalha o nosso interior de tanta a felicidade, aquele sentimento quente e aconchegante, casa.

E agora, eu sabia que a única pessoa que poderia ajudar a Amber com a dor que ela estava sentindo, trazer esse sentimento que eu senti quando os reencontrei, era Jonas.

Porque, no final, a verdade era que por trás daquela cumplicidade e do jeito protetor daqueles dois, havia duas pobres almas que já sobreviveram à tempestades demais.

Porque quando Jonas chegou no reformatório, ele não estava bem, ele tinha depressão ou alguma merda desse tipo. Enfim, Amber o ajudou muito a passar por tudo aquilo, e eu também depois que descobri.

- No fim do corredor, não consegui tirar ela de lá. - Jonas começou a ir na direção que mostrei sem nem pestanejar. Mas eu o impedi segurando pelo braço.

- Ela não me explicou nada ainda, eu nem sabia que a mãe dela, eu.... Eu não sei o que dizer a ela. - eu tentei explicar a Jonas o que aconteceu, mas a minha voz gaguejava mais que a de uma pessoa chorando.

Jonas se virou para mim e colocou as mãos nos meus ombros, os apertando em apoio. Seu rosto está retorcido em uma expressão preocupada.

- O que aconteceu, irmão?

Respirei fundo lembrando que o rapaz na minha frente era Jonas, meu melhor amigo, o cara que eu contava tudo, que compartilhava da mesma dor que eu, meu irmão.

- A mãe da Amber está viva.

O espanto ficou visível em seu olhar, por poucos segundo, mas ficou. Jonas não deixou aquela surpresa afetá-lo, e ao mesmo tempo ele parecia assimilar as poucas informações que ele tinha.

Digamos que eu só o chamava para me ajudar com a Amber quando as coisas já tinham saído de um nível caótico e chegado ao um nível catastrófico.

Ele se recompôs e prosseguiu.

- Me conte tudo o que a mãe dela disse. Você tem que me contar tudo.

**JONAS**

Eu me ajoelhei na frente daquela cachoeira de lisos fios escuros que faziam um escudo entre qualquer um e minha amiga. Eu me aproximei dela o suficiente para que ela sentisse minha presença.

Quando seu rosto encontrou o meu, e seus enormes olhos, incrivelmente vermelhos, encararam os meus, algo no meu peito se apertou.

Não era a primeira vez que eu a via chora, não mesmo. Nós todos já passamos por muitas coisas juntos, rebeliões, brigas, gangues com rivalidade, e muito outras situações com o passar do tempo que ficamos juntos.

E em todos os momentos juntos, eu sempre vi a Amber se reerguer de todas as situações que a botaram no chão. Às vezes, eu acha que era impossível ela ainda estar de pé depois de tantos tombos que ela sofreu na vida, para uma garota da sua idade. Mas essa era a primeira vez em muito tempo, em que senti que talvez, apenas dessa vez, ela não conseguisse se reerguer sozinha.

As coisas que Jesus me contou, pelo menos a maior parte, era assustador. Essa garota lutou para achar sua mãe, da mesma forma que uma prisioneira luta pela liberdade. E depois de tantas lutas, tanto esforço, ela acabar assim...

Para mim só era engraçada como as outras situações da sua vida, todas as maldades que ela passou a deixaram mais forte, tão forte como uma montanha, tão fria como um bloco de gelo e tão inteligente e calculista quanto a maioria das pessoas, mas basta algumas palavras estupidas de uma mulher tão baixa quanto como a mãe a fazem desmoronar por completo.

Às vezes, eu só acho engraçados como as coisas mais simples são aquelas que nos destroem mais.

- Eu estraguei tudo, estraguei tudo. - ela soluçou ao meu lado - É tudo minha culpa, sempre é minha culpa. Se eu não tivesse nascido nada disso teria acontecido com ela. - ela lamentou enfiando os dedos entre os fios dos cabelos - Ela disse que eu causei tudo isso, disse que eu provocava e forçava meu padrasto a fazer aquelas coisas comigo - eu sentia o nojo e o pavor em sua voz - Por que eu tinha que ter nascido, Jonas? - ela me questionou mais uma vez, permitindo que suas lágrimas descessem dos seus olhos.

- Ei me escuta - eu disse tocando meus dedos em seu queixo e erguendo o mesmo para mim - Você não vai cair nessa você não vai querer desistir, não agora, não comigo aqui. - ela tenta afastar o seu rosto de mim, mas eu me recuso a deixá-la afundar naquele poço de vitimíssimo e culpa. Eu conhecia aquele lugar muito bem para permitir que ela caísse lá também.

- Não passamos por um inferno naquele reformatório, enfrentando marginais, gangster, e o filho do capeta para você desistir agora. - eu indaguei firmemente colocando minhas mãos nos lados de seu rosto, a trazendo para perto, fazendo-a me encarar fixamente sem desviar o olhar.

Olhar aqueles enormes olhos vermelhos tão de perto fez meu peito se contorcer mais.

- Você não causou nada disso, você não o forçou a fazer nada. Seu padrasto fez aquelas coisas porque é um ser humano horrível. - deixei claro desde o começo - Você não é um erro. Não é um engano. Você não é uma ninguém. - eu digo secando as lágrimas que ainda escorriam pelo eu rosto - Você é minha melhor amiga, Amber. Por sua causa minha irmã ainda tem um irmão que continua vivo. - eu digo me lembrando das nossas inúmeras conversas nos parapeitos do telhado - Por sua causa eu não me perdi, eu não sucumbi, eu não afundei. Você me tirou do fundo do poço, Amber. Você me tirou daquele telhado. - eu me levantei - E é isso que eu vou fazer com você.

Agora de pé, foi muito mais fácil pegá-la pelos braços e a levantar. Ela ainda chorava silenciosamente e ainda tremia pelos soluços. Mas eu passei um de seus braços pelos meus ombros e a mantive de pé ao meu lado.

- Vamos Amber, resista. - disse mantendo aquele pequeno corpo em pé - Você lidou com idiotas sociopatas muito piores que isso - eu indaguei dando um passo, o que a obrigou a dar um passo também - Você não passou pelo inferno, apenas para se destruir com as palavras de uma mãe que não tem ideia da filha incrivelmente forte que tem.

Não devia ter dito aquela frase. Os joelhos dela fraquejaram assim que a frase deixou meus lábios. Eu fui rápido em segurá-la, pegando suas pernas rapidamente e as erguendo. Ela ainda tentou acalmar os soluços enquanto repousava a cabeça no meu peito, mas as lágrimas ainda molhavam minha camiseta.

Eu não me importei com as lágrimas, os soluços ou os resmungos dela, apenas queria que ela ficasse bem. Eu a carregarei até a saída desse lugar horrível e em algum momento desse percurso Jesus se juntou ao meu lado.

E juntos, nós dois levamos nossa amiga, nossa irmã, nossa família, para fora dali. Para um lugar seguro. Nós a levamos para casa.

◇◇◇

Amber só apagou na metade do caminho para a casa do seu tio. Em todo o percurso eu, Amber e Jesus viemos em silêncio, e mesmo quando ela apagou, provavelmente por tanto chorar, nós dois ainda seguimos assim.

Muitas coisas ainda tinham que ser esclarecidas e eu faria Jesus espremer cada célula de verdade que ele sabia, mas depois. Agora nós dois tínhamos um problema maior, contar a pouca verdade que sabíamos para o tio dela.

Jesus carregava Amber adormecida em seus braços, e eu fiquei com a tarefa difícil, bater na porta.

Eu encarei Jesus seriamente, ele sabia o que meu olhar significava, ele estava me devendo muitas coisas agora, verdade e favores.

- Meninos! - Kendrick sorriu alegre quando abriu a porta e nos encarou, porém, sua expressão fechou quando olhou para trás de mim e viu a Amber adormecida nos braços de Jesus. - O que aconteceu?

- Está com tempo? - eu questionei friamente - Nós temos muito o que conversar.

Kendrick pareceu hesitar por um minuto, encarando a mim e a Jesus com dúvida, mas logo abriu mais a porta e cedeu um espaço para que eu e Jesus passássemos.

- É bom que vocês tenham uma boa explicação para isso. - Drick indagou depois que Jesus pôs Amber deitada no sofá. Enquanto esperava em pé no batente da sala. - E então?

Jesus suspirou se afastando da Amber e se aproximando de Kendrick. Ele pôs a mão em seu ombro e o apertou fracamente.

- Acho melhor você se sentar Drick, temos algo sério para te contar. - Jesus pediu com aquela voz gentil e ao mesmo tempo mandona dele. Kendrick por outro lado continuou parado no mesmo lugar.

- Depois de tudo que eu passei com a Amber, acho que consigo ouvir o que vocês.... - ele começou a dizer para nós dois com aquele seu tipo olhar de "se vocês me enrolarem mais eu vou dar um jeito de prender vocês dois" o que ele realmente podia fazer, e como eu não estava a fim de conhecer mais nenhum tipo de reformatório ou prisão respondi logo.

- Sua irmã está viva Kendrick. - eu praticamente cuspi as palavras em cima dele, e então o vi virar uma estátua, bom praticamente. Ele ficou tão imóvel que pensei que isso realmente tinha acontecido.

- O-o que você acabou de dizer? - ele parecia lutar contra a verdade que o assolava.

- É isso que você ouviu Kendrick, Clarisse está viva.

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