Morena, tu tá metida com droga?!
REFEITÓRIO, PARADISE HOLLOW HIGH SCHOOL, 12:00 DA TARDE
Angie remoeu sua mente para tentar encontrar uma desculpa plausível para dar ao pai pelo motivo de não ter dormido em casa. Ou o fazia acreditar que tinha sido arrebatada pelos próprios anjos da crença comum da cidade ou com certeza ficaria de castigo até a Universidade. Ela passou a madrugada escondida na oficina de Timothy Kendall, um garoto que mal conhecia e era famoso na cidade por ser um assassino. Angie não sabia de onde vinha essa sua inteligência de querer fugir de um grupo de prováveis pistoleiros com um garoto que matou com quatorze anos. Se estivesse em um filme de terror, com certeza não teria sido o mais sensato.
Ele disse para que ela descansasse, mas obviamente não conseguira pregar o olho. Timothy também não tinha dado nenhuma informação do que tinha acontecido, muito menos indicou que futuramente viria a revelar algum detalhe, o que a deu o gostinho maravilhoso - perceba a ironia- de ficar remoendo quem poderia ter ido atrás dela durante a noite e durante todo o primeiro horário, o qual tinha assistido virada da madrugada anterior, sem um material em mãos e cheirando a graxa de motocicleta. Com certeza, não foi assim que imaginou seu primeiro dia.
Estava sentada em uma das mesas, quando sentiu um toque em seu ombro, dando de cara com a gentil Flame Firestone. A ruiva deu um sorriso e moveu as mãos rapidamente, pronunciando algo inaudível nos lábios. Angie retribuiu o sorriso.
— Nada, Flame, só cansada. - Ela respondeu em um timbre audível, respondendo com os mesmos sinais de mãos. Felizmente, sabia muito de linguagens de sinais por causa de seu pai, que trabalhou em um hospital para surdos durante muito tempo.
A garota de fios ruivos colocou a bandeja sobre a mesa e fez mais sinais com a mão, a qual Angie teve de prestar a máxima atenção para compreender, e se não estivesse errada, Flame teria dito: "Se precisar conversar, estou aqui." Angie deu um sorriso agradecido, e acenou quando a garota se afastou, indo se sentar junto das amigas. Mas, diferente de Flame, a próxima pessoa não foi tão discreta.
Eloise deixou a bandeja cair com tudo na mesa em um estrondo, se sentando de frente para a amiga e segurando em seu rosto, sem nenhuma indicação de pedir permissão ou falar algo antes. Quando viu seu estado, bateu as mãos na mesa e soltou:
— Morena, tu tá metida com droga?! - atrás dela, Remy e Levi vinham com suas bandejas de almoço, e se sentaram junto dela.
— Não, Elly. - Angie indagou, bocejando. — Eu só não dormi de noite, nada demais.
— Ficou fazendo o quê? Jejum do Ramadã? - Eloise ironizou.
— Sou judia, Eloise, não islã. - Angie a corrigiu. — E não, eu apenas tive uma madrugada complicada.
— Todos tivemos, meu pai me deu uma bronca por ter chegado tarde ontem. - Remy comentou, brincando com sua comida ao usar o garfo. — Vou ficar de castigo por uma semana, sem computador, sem rolê nos fins de semana e sem Levi.
— Eu achei a última parte un absurdo total. - Levi concluiu sua frase em espanhol como sempre fazia. — Sou eu que animo aquela casa de ruivos deprimidos que escutam bater de tambor.
— Aquilo é a sinfonia instrumental que meu pai gosta de ouvir, Levi. - Remy girou os olhos.
— parece la invocación de un demonio, eso sí. - Levi comentou, mastigando um pouco de sua comida. Ele pegou inclusive do prato de Remy e levou um empurrão.
Eloise olhou para os dois como se visse dois retardados mentais interagindo, mas voltou a encarar a amiga.
— Eu teria acreditado e começado a lamentar o fato de que este é nosso primeiro dia como juniors, e estou sem um namorado, se eu não tivesse te visto chegando na moto do Timothy Kendall, ANGELINE! - Eloise fez um escândalo. — Você tem fetiche em serial killers, toca siririca pro Ted Bundy? Sempre esperei isso do Remy, quer dizer, não uma siririca.
— Fala baixo, Eloise! - Angie deu um tapinha de leve na amiga para ser mais discreta. Molly Kirkland olhou para a mesa do quarteto por um segundo, mas logo desviou o olhar e começou a rir de algo que Danielle Pygmalion, outra líder, tinha lhe dito. — Eu vou contar pra vocês, mas não aqui. Mais tarde na minha casa?
— Eu não posso, lembram? Meu castigo, que mencionei não tem nem cinco minutos atrás... - Remy indagou, indignado por não terem lhe dado atenção. Levi estava ocupado comendo.
— Oh, tenha dó. - Eloise arrancou o celular de Levi de sua mão, colocou a mão no nariz, para deixar a voz fanha e esperou chamar. — Alô, senhor Graham? Aqui é a Lorraine, secretária da escola. Como vai? Queria confirmar a presença de Remington hoje após a aula para o ensaio do coral. Querem cantar Bethoven na apresentação de inverno e cabe a ele como homossexual exigir que ponham Lady Gaga. Hahaha. - imitou inclusive a risada de Lorraine. — E claro, valem pontos. Obrigada, senhor Graham, depois marco minha consulta jurídica com o senhor para arrancar até os suspensórios do meu maldito ex marido na justiça. Tchau tchau.
— Você é completamente maluca. - Remy comentou para Eloise, que mandou um beijinho no ar e entregou o celular para Levi.
— Também acabou com meus créditos! - Levi protestou, de boca cheia.
— O que vocês seriam sem mim? - disse a Hemphill. — Pronto, de nada. Seja o que for que a Angie vai nos contar, deve ser importante, eu conheço esse olhar dela. Foi o mesmo que ela me deu quando ficou sem absorvente no dia que saiu com Curran Gibson no nono ano.
— Eloise! - Angie a repreendeu, e a menina deu de ombros. — Olha a vergonha.
— Você saiu com o Curran Gibson? O cara que consegue entoar o hino nacional com o suvaco? - Levi parecia chocado, depois deu um sorriso. — Ele é o meu herói.
— Não espalha. - Remy disse para Levi enquanto batia em suas costas.
Por mais que a tensão fosse palpável em cada parte do seu corpo, Angie conseguiu se distrair por alguns minutos com a ajuda dos amigos. O bom humor deles lhe cativava, e o jeito único de cada um deles a fazia rir ao ouvir os relatos de primeiro dia. Em uma mesa um pouco mais distante, os populares da escola não tinham a mesma experiência. Quando Kyris cochilou, Wyatt deu uma cotovelada para que ele acordasse. O jogador tinha adormecido em cima de seu hambúrguer e metade de seu rosto estava sujo de ketchup.
— Então, essa foi a história de quando eu conheci Keanu Reeves e ele se apaixonou perdidamente por mim.
Molly terminou seu relato, achando que tinha sido o centro das atenções, vendo Coral fingir um sorriso e Flame fazer o melhor esforço para parecer estar atenta ao assunto. Felizmente, Molly não entendia bem linguagem de sinais como Coral para entender aqueles feitos pela ruiva "Meu Deus, ainda não acabou?"
"Eu acho que não está nem na metade." respondeu a outra, no meio do monólogo interminável. Nem mesmo Wyatt, que deveria ser o namorado atencioso, estava prestando atenção. Quando ela encerrou, foi como se o feitiço do sono tivesse finalmente se dissipado.
Todos sabiam que era mentira. Molly sempre inventava coisas para se sentir superior aos demais quando ouvia relatos incríveis. Quando Coral tinha vencido o concurso de soletrar, Molly tinha dito que já tinha vencido cinco. Quando Flame aprendeu a linguagem de sinais para se comunicar melhor, Molly mentiu dizendo ser mestra em braile. Todos sabiam de suas, como Wyatt mencionou, fanfics, mas não tinham coragem de desafiar a rainha da escola. Nem mesmo Coral, a considerada emo rebelde, que tinha ficado confortável na posição de amiga de Molly. Frequentar uma mansão e uma piscina todo fim de semana era bem melhor do que ficar no pensionato onde vivia.
— Uh, não olhem agora, mas temos um assassino a bombordo. - Kyris caçoou, rindo junto com Wyatt. Timothy chegou no refeitório, e, como todos os anos, era impossível não atrair olhares. — Impressionante que esse filho da puta ainda está solto.
— Isso aí, brother, devíamos meter a surra no infeliz. - Wyatt apoiou. Coral olhou para os dois com tédio.
— Os idiotas morrem de medo dele, não seriam capazes nem de chamar ele de feio. - disse a menina de forte lápis de olho ao redor das pálpebras. — Ele diz que foi um acidente, a arma disparou sozinha.
— E você acredita? Ele teria dito qualquer coisa pra se safar. - Molly comentou, seu olhar preso nele. Timothy era... atraente, sua imagem de assassino a sangue frio era até sexy, mas com certeza, nada boa para sua imagem.
"Não deveríamos julgar, não somos todos inocentes até que se prove o contrário?" Flame era mais otimista, gesticulando suas falas para Coral, que falou aos demais, embora boa parte deles já a entendesse. "Não acha, Dennis?"
Dennis levantou os olhos quando percebeu o olhar de Coral sobre si, e apenas aí tirou a atenção de seu celular. Remy Graham tinha cumprido sua promessa e lhe mostrado a escola mais cedo, mas teve de recusar seu convite de almoçar junto dele e os amigos por já ter combinado ficar com os amigos de Flame, mas prometeu falar com ele no final da aula para ser apresentado às outras amigas do ruivo, Angie e Eloise, já que tinha conhecido Levi na festa.
— Ah, sim. Eu não sei o que aconteceu, é meu primeiro dia, então tô meio perdido. - Dennis admitiu. Para ser sincero, não se sentiu à vontade naquela mesa nem por um segundo, o relato de Molly minutos antes parecia um surto completo.
Como não era o mais interessante para os demais, pode voltar para o que fazia logo após sua resposta. Tinha pegado o número de Remy e os dois conversavam sobre cultura geek desde que tinham se separado mais cedo, e conversar com o ruivo parecia bem mais interessante do que fingir estar enturmado com o time de futebol.
Remy: Tá bom, próxima pergunta. Estelar ou Ravena?
Dennis: só existe uma resposta certa pra isso. Ravena.
Remy: errado, a resposta é que não existe isso, é rivalizar duas personagens incríveis, até porque se fosse o caso, a Estelar é mais foda.
Dennis: está falando isso só porque ela é ruiva que nem você? Não vale.
O novato baixou a visão de seu celular e procurou Remy com o olhar, o encarando por um tempo. Quando o ruivo percebeu, deu um sorriso curto, o qual Dennis retribuiu, dando um aceno. Remy pareceu desconcertado, mas acenou de volta. Os jogadores pareceram incomodados, enquanto Molly observou a cena girando uma de suas mechas loiras no indicador.
— O novato já passou pelo seu trote de boas vindas? - A pergunta dela foi o suficiente para a mesa se focar na Kirkland. — Seria um desrespeito com o legado de PHHS que tivéssemos um novo aluno e ele não tivesse pagado a prenda.
— Bem lembrado, gata. - Wyatt colocou os braços ao redor da cadeira de Molly, dando um sorriso malicioso. — O loiro aí precisa provar seu valor.
— Saber correr também. - Kyris acrescentou. — Claro, isso se não for um marica e não ficar com medo. Nem todos são corajosos, Millington. Vamos entender se for o seu caso.
— Eu sou de boa. - Dennis respondeu. — Topo o que for. Como isso funciona?
— Chamamos de prenda ou trote. - Molly explicou, estourando uma bola de chiclete com os lábios. — Você cumpre um desafio. Se obtiver sucesso, ótimo, se não, paga uma prenda.
— Pode começar com... - Outro dos alunos se manifestou. Tinha os cabelos pretos e olhos castanhos. Seu nome era Victor Fawcett. Ele olhou ao redor e ao achar seu alvo, deu um sorriso. — Atrai o ruivinho pra nosso vestiário, aí podemos dar uma lição nele, como uns socos, pontapés. Algo pra ele aprender a ser homem.
— Eu não vou fazer isso. - Dennis se manifestou.
— Pode pagar a prenda, então. - Molly piscou o olho para Victor. Exatamente como tinha suspeitado. — Conhece a maldição do lago Hosterfield? Dizem os rumores que os primeiros colonos foram mortos afogados naquelas águas durante a independência. Quando se chega muito perto durante a noite, podemos ouvir os pedidos de socorro das mulheres e crianças...
Dennis engoliu em seco. Não gostava nada de fantasmas. Flame assumiu uma expressão irritada e apontou: "Parem de assustá-lo, isso é uma lenda idiota!", mas todos a ignoraram. Wyatt e Kyris queriam rir do novato bobão.
— Dizem que toda noite de lua cheia, como aquela em que foram sacrificados, as almas dos mortos voltam e puxam qualquer um pra baixo, para ficarem presos na escuridão eterna. Nosso desafio é simples. - Molly continuou. — Só dar um amigável mergulho no lago hoje à noite. Soubemos que você gosta de nadar, não vai ser um sacrifício.
— I-isso é idiotice. - Dennis respondeu, e logo Kyris e Wyatt começaram a imitar duas galinhas. Flame girou os olhos. Coral estava adorando. — Eu topo.
— Esplêndido. - Molly deu um sorriso malicioso. — Nos vemos no lago à meia noite, bonitinho. E ah... seja bem vindo à Paradise Hollow.
A mesa logo foi tomada por outro assunto, e o olhar de Dennis se tornou distante. Estava com medo, principalmente porque fora Flame, não tinha sentido confiança em nenhum dos outros. Ele tentou conter o tremor em suas mãos e falou a si mesmo para não ter medo de nada, como seu irmão mais velho, que era a pessoa mais corajosa que conhecia. Homens não deviam ter medo.
Remy: É bom conversar com você.
Ele tinha recebido aquela mensagem em meio ao debate sobre as heroínas da DC, e tinha sido uma boa surpresa. Dennis deixou escapar um sorriso, pensando que nem todas as pessoas que tinha conhecido ali até agora eram de todos ruins.
Dennis: Espera até eu começar a falar porque o final de Game of Thrones é tão ruim. - e apertou o enviar, mergulhando no seu mundo favorito, e se pudesse, jamais sairia dele.
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