Maldita Maitê do Grupo de Debates

RESIDÊNCIA HEMPHILL, 16:15 DA TARDE

Remy foi muito bem recebido por Hannah Peterson Hemphill assim que entrou. Tinha trago consigo o sorvete que Angie tinha pedido por mensagem alguns minutos antes dele chegar e subiu as escadas assim que conversou um pouco com os pais da amiga. O ruivo bateu na porta do quarto duas vezes antes de entrar e encontrou um rastro de lenços usados que iam até a cama, onde Eloise chorava abraçada a Angie, que acariciava o cabelo meio loiro da amiga. Levi está sentado na poltrona ao lado, com a bola de futebol no colo, claramente entediado. Não demonstrava reação alguma, até ver que finalmente o que lhe interessava havia chegado.

— Aí, meninas, chegou o sorvete. Graham, usted és o mejor. - Levi vinha da Argentina, e costumava misturar o espanhol com a língua local, algo que Remy pensava ser comum a todos os Eder, pelo que conheceu dos parentes do garoto. — Oh, Elly, tenta dar uma animada, Remy trouxe menta e chocolate. Seu predileto.

— Obrigada, Remy. - ela respondeu, com a voz chorosa. Por um minuto, todos pensaram que ela havia se acalmado, mas logo abraçou Angie outra vez e continuou sua lamúria. — Era o nosso sorvete predileto, meu e do River.

— Elly, meu primo é um idiota. Não fica assim por causa dele, ele nem te merece. Pode achar alguém muito melhor. - Remy comentou, entregando o pote do creme gelado para a menina. — Não é, galera?

— Totalmente. - Angie apoiou a melhor amiga. — A perda foi totalmente dele. Ainda não acredito que ele terminou por mensagem, totalmente chernoboy.

— Sim. - Levi comentou, de boca cheia, se servindo do sorvete antes mesmo da própria Eloise. — Se ele tivesse aqui agora, eu dava um soco na cara dele.

— Obrigada por virem ficar comigo, pessoal. Devem ter perdido as extracurriculares por minha causa. Mas já estou ficando melhor, até mesmo o David ligou da Universidade, me senti bem mais querida. - a menina riu, abraçando seu ursinho de pelúcia.

— Ah, tudo pra faltar a aula de teatro. - Remy deu um pisão no pé de Levi, mantendo o sorriso no rosto. — Digo, por você, Elly, somos os melhores amigos.

— Agora, se me perguntar, poderia se recompor e mostrar ao primo idiota do Remy o que ele perdeu. - Angie procurava as palavras certas para consolar Eloise, com certo medo de infla-la demais, já que sua amiga tinha um lado um pouco rancoroso. Honestamente, sabia que um namoro de acampamento de verão não demoraria muito, o menino morava do outro lado do oceano.

— Sim. - Eloise concordou, dando uma bela colherada no sorvete, direto no pote, com a maquiagem completamente arruinada. — E daí que o babaca do River terminou comigo por um audio de 13 segundos? Eu estou bem, maravilhosa, totalmente recuperada. Sou uma nova mulher, madura e segura de si. Angeline, solta agora meu ursinho.

Eloise arrancou o animal de pelúcia da mão de Angie e se manteve o abraçando. Os demais tentaram então distraí-la um pouco. Costumavam ser um grupo de cinco, junto de Ceci Suaçuna, uma brasileira naturalizada, descendente de nativos de seu país. Era uma garota animada e bastante alto astral, mas tinha partido para a Universidade meses atrás, deixando apenas os outros quatro. Ganharam o nome de Candy Gang porque se conheciam desde muito pequenos e sempre andavam pelas ruas da cidade comendo doces e comprando da doceria antiga do centro, que tinha fechado anos antes. O hábito de andar comendo doces sumiu com o tempo, mas o hábito persistiu.

— Inclusive, estão sabendo que a Molly Kirkland vai dar uma festa amanhã a noite? Os pais dela estão fora de casa, recebi a mensagem hoje mais cedo. - Levi comentou, enquanto todos dividiam o espaço de uma cama de solteiro com quatro colheres brigando por mais um pouco de sorvete. — Será que ela já aceitou que somos almas gêmeas?

— Eu me preocuparia em fazer ela lembrar seu nome primeiro. - Angie deu de ombros, lambendo a colher, fazendo Remy e Eloise rirem. — Ela nem sabe que você existe, Levi. Nem se você se vestisse inteiro com glitter.

— Fora que ela já namora né, cabeção. - Remy relembrou aos amigos, que o encararam. — Lembram? Ela namora o Wyatt Gallard desde o último jogo. Eles adoram ficar se comendo por todos os cantos da escola.

— Todas as vezes a Lorraine tem uma síncope. - Angie gargalhou, e os outros a acompanharam. — Por mais que eu ache a ideia de interagir com a Kirkland bem anti higiênica, uma festa seria ótimo.

— Ótimo mesmo, vou mostrar pro idiota do River que ele não devia ter me trocado pela maldita Maitê do grupo de debates. Ela e aqueles dois melões nos peitos. Quem pensa que é, a Cassie de Euphoria? Talarica não tem perdão. - Eloise remoeu sua mágoa, que claramente não tinha sumido como todo aquele sorvete. — Tomara que tenha muita bebida, preciso mesmo disso.

— Esse é o espírito, galera! - Levi comemorou. — Vou mandar mensagem aqui pro time e dizer que a gente é presença marcada, mas vamos precisar levar alguma coisa. Felizmente, consegui pegar duas garrafas de whisky do meu irmão.

— Meu pai tem vodka russa que a tia Rayssa deu no armário de cima, ele jura que eu acredito que é água benta. Ele nem reza. - Angie girou os olhos. — Podemos juntar as duas e levar como contribuição dos quatro.

— Eu nem sei se posso ir, na verdade. Meus pais não gostam que eu fique fora até muito tarde. - Remy comentou, atraindo olhares para si. — Fora que as provas tão chegando, seria legal dar uma estudada. Dormir cedo ajudaria.

— Sim, Remy, claro que sim. Sabe quem também dorme cedo? A vovó Helen, mas ela tem oitenta e seis anos e uns três tipos diferentes de problema na coluna. - Eloise resmungou. — Vai mesmo furar com a gente?

— Não vai mesmo, eu sei onde ele mora, e levo o ruivo aqui arrastado. Tem que perder um pouco essa sua timidez, velho, é nosso Ensino Médio, temos que curtir, dar uma espairecida. Beijar, beber, jogar papel higiênico em casas de quem não dá doces no dia das bruxas, esse tipo de coisa.

Remy franziu o cenho.

— Claro, odiaria ficar sem preencher esses tópicos na minha ficha de adolescente. - ironizou.

— Vamos, Remy. - Angie o estimulou. — Pela Elly, ela está triste e foi o seu primo que fez isso, o mínimo que pode fazer é ir com a gente.

— Mas eu avisei, tipo, umas dez vezes, que o River é mulherengo. Ele não ia suportar namorar alguém a distância por causa de um rolo de verão. Alertei a Eloise muitas vezes, mas ela não me ouviu.

Eloise choramingou e colocou o travesseiro na cara.

— Ai amigos, era o sexo. A sensação era boa demais. Nem um guindaste me tirava de cima.

— Muita informação. - Angie fez uma careta. — Mas enfim, Remy, você vai sim.

O garoto ruivo olhou para os três amigos. Eloise tinha os olhos caídos como um filhote de cão caído da mudança e um biquinho fofo. Angie o observava com um olhar que clamava um por favor e Levi tomava o resto do sorvete em silêncio, mas sorriu com a boca suja de menta. Remy massageou as têmporas e deu um suspiro. Amava demais aquele grupo de loucos.

— Tudo bem, mas só até uma da manhã, não posso ficar até muito tarde. Tenho aulas de direção no dia seguinte.

— Eu já disse que eu te ensino, pô. Coisa mais fácil que tem.

— Você quase atropelou duas velhinhas, Levi.

— Exatamente, quase.

Eloise interrompeu a conversa para falar um pouco mais mal do seu ex, um ruivo primo de Remy, chamado River Graham. O garoto era um atleta profissional de natação e morava no país de Gales, de onde o resto da família Graham havia se originado. Passou o verão ao lado do primo por terem a mesma idade e se envolveu com Eloise. Remy achava que os dois tinham apenas se dado bem, mas só teve ideia do quão bem quando os viu quase engolindo um ao outro em um luau na praia antes das aulas. Demoraram apenas uma semana para engatarem um namoro e tinham decidido levar o relacionamento de forma virtual, mas não demorou mais do que quarenta e oito horas para River trocar Eloise pela sua ex, Maitê do grupo de debates.

— Aquela puta debate bem, mas deve fazer outras coisas boas com a boca também. Vadia arrombada miserável. - Eloise era bem boca suja quando irritada, diferente de seu irmão mais velho, David, que era doce e meigo em todas as situações.

— Eloise Hemphill, cuidado com o vocabulário. - A mãe da menina parou na porta, usando um avental de cozinha e carregando um belo arranjo de pratos. — Meninos, podem me ajudar com esse peso? Acabei de terminar o jantar, e quero que todos comam aqui.

— Já é, tia Hannah. - Levi foi o primeiro a levantar. — É assado de panela? Deu pra sentir o cheiro daqui.

— Esse garoto só pode ter um poço no lugar de um estômago. Não é possível. - Angie comentou, se levantando junto dos demais para seguir todos até a sala.

— Claro, querido. Sei o quanto você gosta do que eu cozinho. Elogia bem mais até do que minha própria filha. - Hannah cutucou, fazendo a mais nova Hemphill girar os olhos.

— Mãe, eu acabei de perder o amor da minha vida! Não pode ser um pouco mais compreensiva?

— Você nem sabia o nome do meio dele, Eloise. - Hannah respondeu com tédio.

— Não há limites para o meu amor! - Eloise gritou, já indo na frente com Angie.

— Sim, existe, a Maitê do grupo de debates! - Levi respondeu.

A algazarra aumentou quando Eloise começou a correr atrás de Levi, ao mesmo tempo que todos caíram em risadas. Remy ficou observando tudo enquanto gargalhava, até que seu olhar foi para a janela, percebendo o quão estrelado estava o céu. Talvez aquele ano fosse ser melhor do que os últimos.

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