Capítulo 5- Entrelaços De Relações IV

Dragon podia sentir o ânimo que Xiang apresentava em ajudá-lo de qualquer forma. Com a aproximação do torneio, Tempe não esbanjava mais tanto tempo para auxiliar a menina em seu treinamento, por isso ela buscava formas de suprir seu tédio. Mostrar responsabilidade sendo tutora de um amigo era um bom passatempo.

— Segundo passo do ensinamento Fei: ao invés de imitar uma pessoa, vamos ver como se sai em fazer a pessoa imitar você — declarou com simplicidade, fazendo o cérebro do fera sentado traçar um nó, doendo o suficiente para que seu semblante mostrasse estranheza atrás da máscara. — Digamos que, ao invés de você tentar usar minha voz, transmita meu pulso cerebral em meu próprio cérebro, assim eu vou achar que sou eu quem está pensando.

— Eu parei de entender no “ensinamento Fei” — comentou em tom humorístico.

— Só tenta me falar algo por telepatia, mas sem usar sua própria voz da consciência, usa a minha. — Com isso, mais uma vez, Dragon se dispôs a concentrar sua mente, era a primeira vez que expandia sua habilidade telepática ao invés da criocinese. — Aah! E tenta pensar como se fosse eu.

Eu sou incrível...

— Eu sou inc... — Por um instante, buscou entender. O dragão a fitava, estática como uma escultura, mas logo despertou do que aparentou ser um transe momentâneo. — Num minuto, achei que havia sido meu próprio pensamento realmente, foi muito verdadeiro, acho que só percebi que era você porque já sabia.

— Ótimo, qual o terceiro passo do treinamento Fei?

— Na verdade, acho que devemos aprimorar esta última habilidade, mas tem que ser com alguém que não saiba disso... — Sua mente maquinava igual aqueles aparatos que se espalhavam por todo o Monte Olimpo. — Precisamos de uma cobaia — declarou e começou correr de súbito, quase atravessando a porta sem, ao menos, abri-la. — Vamos!

— Acho que não devíamos...! — Era tarde demais, Xiang já havia alcançado uma alta velocidade pelo corredor.

Restou acompanhar a pequena, depois de trancar sua porta. Correram pelos caminhos que pareciam os levar para a parte mais alta do castelo, já que haviam cruzado várias escadarias. Acharam engraçado perceber as pessoas lhes dando espaço para que passassem, deviam pensar que faziam parte do grupo de feras que treinavam a velocidade pelas redondezas do palácio. Na verdade, os ígneos talvez pensassem isso, contudo, apenas a respeito de Dragon, pois todos conheciam Xiang. “Uma fera descontrolada não faria parte de uma batalha como o Torneio Feroz” era o que muitos comentavam.

— Espera — murmurou a marciana, antes que os dois virassem na última curva dos corredores. Esgueiraram-se pela quina da encruzilhada, como se fossem fugitivos. — Temos um pequeno probleminha...

Mostrando o mínimo de seus corpos, conseguiram ver um animal guardando a entrada da alta torre, o homem gostaria de saber o que haveria depois daquela saída, entretanto, o ser peludo atrapalhava sua visão. Era como um leão, só que quase alcançando os três metros de altura, sua pelugem era de um tom laranja-terroso. Dormia logo na entrada, para que a luz solar do lado de fora não o tocasse.

O que é aquilo? — indagou telepaticamente o dragão.

Aquele é um pixiu, um animal místico protetor. Ao redor do castelo existem vários espalhados, dizem que eles espantam os maus espíritos também... — esclareceu a menina de olhos escuros. — Não vamos conseguir passar sem acordá-lo, eu vou primeiro, pois eles não gostam de desconhecidos. Depois que eu o acalmar, você se aproxima.

Tudo bem...

Assim fizeram, Fei apressou-se em apaziguar o leão ameaçador depois de tê-lo acordado, mesmo que tivesse andado nas pontas dos pés, tão silenciosa quanto um fantasma. O guardião do castelo já a conhecia bem, ele era um dos seres místicos que a ígnea empregava como amigo, já que as outras crianças temiam se aproximar dela.

— Pode vir — chamou a garota, acariciando embaixo do queixo do animal deitado, seu braço sumia entre os pelos extensos. Ela se deixava ser lambida inteiramente, acreditando que aquilo espantaria qualquer ameaça possível. Assim que Dragon entrou no campo de visão do leão, esse pôs sua imponência de pé, um rugido ecoou dele, intimidante. — Calma, vocês dois! — Xiang o empurrava bem no focinho e estendia a mão para seu amigo, pedindo que ele deixasse de mostrar os dentes afiados.

— Deixe seu colega quadrúpede e babador longe de mim. — Foi quando o fera frio deixou de rosnar.

— Ele é amigo, pixiu, ele é meu amigo, tem que ser legal com ele também! — Xiang repreendeu seu comportamento, segurando sua grande cabeçorra peluda, depois o abraçou.

Pouco depois que fizeram as pazes entre o protetor e o homem, passaram pela saída e encontraram um imenso terraço. Quão grande é este castelo? Perguntou-se Dragon. Vislumbraram as máquinas enormes que se encontravam por ali, eram como um balão anexado a um navio. Variavam a cor de uma para outra. Atrás haviam hélices que deviam servir para impulsionar aquela tecnologia e também possuíam algumas extensões, que deviam ser os lemes usados para mudar de direção.

— São steágnos, os automóveis do céu... Foi o que você viu voando ontem — explicava enquanto desfilavam entre as geringonças de grande porte. — Estes são particulares, pertencem apenas aos Guerreiros Ferozes e outras pessoas da alta classe de Fogo.

A cada engenhoca que iam vendo, Dragon percebia que realmente não poderiam pertencer a qualquer pessoa. Além dos vários guardas olimpianos que rondavam os automóveis, sem descanso, como se guardassem a própria vida, também se podia ver algumas criaturas aladas circulando no céu.

— E então, por que viemos aqui? — inquiriu, parando no meio do enorme terraço, recebendo olhares desconfiados dos homens atentos.

— É aqui que entra a sua habilidade mágica... — Xiang declarou com um sorriso animado, o que não agradou o maior. — Como estes automóveis são particulares, não vão sair daqui até que os Guerreiros Ferozes lutem no torneio, mas, e se por acaso algum piloto tivesse a vontade de decolar com o steágno e passear pela cidade?

Apontou um homem que se via através do para-brisa de um dos grande aparatos locomotores, parecia manusear os controles de comando. O fera depressa expressou sua negação em relação aquele plano.

— Você quer voar em um desses, não quer? — persuadiu a pequena, com grandes olhos incisivos.

— Obrigar uma pessoa a fazer o que ela não deseja, contra sua vontade e sem sua permissão é antiético. Não posso fazer isso, Maria não aprovaria...

— Tudo bem, entendo... — Ponderou o que faria, realmente era uma má ideia, muitas coisas poderiam dar errado, e, na melhor das hipóteses, apenas o piloto envolvido acabaria numa enrascada pelo que fariam. — Mas prometi que você voaria em um steágno, e tenho outro plano de como vamos fazer isso.

— Eu aceito, se não for preciso manipular a mente de ninguém...

— Existem outros como estes, que estão sendo usados neste exato momento, podemos pegar uma carona — relatou com um sorriso que não pareceu convidativo ao seu amigo.

— Onde estão?

— Longe... Mas eu conheço um atalho.

Foi quando, mais uma vez, Fei começou correr e Dragon pôs-se em seu encalço. No entanto não regressavam por onde haviam chegado ali, disparavam em direção a beirada do terraço, sem a mínima intenção de parar. Os guardas os olhavam avançando, no entanto, obviamente não iriam os deter, não era o trabalho deles. A menor usou o impulso da velocidade para subir no parapeito e saltar sem medo.

O que tenho a perder? — questionou-se o dragão, indo logo atrás.

O que poderia dar errado? Bem, descobririam de um jeito ou de outro. Não haviam calculado a altitude, todavia, nem chegavam a considerar isso um problema. Na verdade, foi constatando a altura e sentindo o vento em suas tranças alvas que Dragon aproveitou o que considerava a liberdade, quando seu corpo não mais se via preso ao chão.

A cada milésimo de segundo, a aceleração do corpo deles crescia exponencialmente e o homem já começava a se perguntar o que Xiang tinha em mente. Escutou um zumbido agoniante e perdeu sua concentração da queda após perceber que o som ecoava tendo como origem o assobio da garota, cujas vestes de penas eram freneticamente sacudidas.

Era como um chamado, algo que dizia ao fera que ele devia salvá-la, de alguma forma sentiu que estava sendo obrigado a fazê-lo. Mas só posso salvá-la se me transformar, não devo deixar que me vejam daquela forma, não ainda...

Entretanto, antes que seus pensamentos decidissem fazer algo, um vulto alaranjado os ultrapassou na queda, já haviam traçado pouco mais da metade do percurso até a morte certa. O que surpreendeu o fera foi a visão tomando um melhor foco à medida que seu corpo diminuía a rapidez, sendo segurado pelo ser místico que conseguiu os alcançar com habilidade.

— Esqueci de contar que pixius conseguem voar! — exclamou Fei, sentada à frente de Dragon, sobre o grande leão alado.

Puseram-se a vislumbrar a vista panorâmica do imenso castelo, desfilando pelos ares entre as dezenas de torres altas.

— Vamos seguir com o plano, mas iremos precisar de uma distração. — Guiando o percurso que seguiam, proferiu a pequena.

— Pode deixar comigo...

Investiram rapidamente para um dos lados da construção, onde eram perceptíveis alguns steágnos decolando e pousando. Era o local destinado aos servos.

— Estão organizando o Torneio Feroz, vamos dar um espiada...

Xiang fez o guarda alado se aproximar o suficiente para que tivessem uma vista para os ígneos levando e trazendo cargas entre as máquinas, eram vigas de metal, tubulações, equipamentos de construção e outras peças.

Agora! — Com o sinal telepático, o dragão entendeu sua deixa, fazendo flocos de neve surgirem acima de todo aquele local, que se mostrava maior que o pátio central do palácio. A neve reivindicou a atenção de todos os marcianos, uma vez que nunca haviam visto um fenômeno como aquele. Dada a distração perfeita, o pixiu desceu até o solo em consonância aos olhares que se voltavam para o alto, depois alçou voo, deixando os dois poderosos travessos para trás.

Vamos! — Não tardaram em invadir a máquina pela entrada de cargas e esconderam-se entre as vigas de metal.

Alguns minutos mais depois de que a neve cessou e o locomotivo aéreo foi completamente carregado, era hora de decolarem. Assim ganharam os céus e zarparam ao rumo que a dupla esqueceu-se de se questionar qual seria, porém, nem pensavam em se preocupar.

Para ser sincero, Dragon afirmaria que aquilo não chegava nem aos pés de poder voar livremente, com suas próprias asas, porém, era incondicional o fato de poder transitar seus olhos entre cada detalhe daquela civilização. Por uma pequena janela de vidro gradeada, conseguiam vislumbrar a luz da tarde perpassar as nuvens de poeira que pairavam e iluminava a bela cidadela sobre o Monte Olimpo.

Eram como engrenagens de um só aparato aquelas casas, que, vistas de uma altura considerável, pareciam peças, essas enferrujadas por causa das cores ferrosas. Algumas fábricas exalavam fumaça, outras instalações emitiam barulhos altíssimos, eram perceptíveis também os automóveis como carros e motocicletas, além dos trilhos que se entrelaçavam por toda a cidade...

Gostando do passeio? — inquiriu a marciana, usando a mente para que não fizessem barulho desnecessário e fossem pegos.

Aqui é bem lindo... — O telepata declarou sem, ao menos, dar-lhe atenção. Fitava os ígneozinhos circulando e se embaralhando. — Eu gostaria de ter visto quando os dragões ainda eram livres, ou, pelo menos... estavam vivos.

É...

Ela não poderia o negar a dor que sentia ou o culpar por levar embora o clima alegre que não mais os circundava. Era a casa dele, a família, toda espécie do fera, num passado tão distante que parecia irreal. Interrompeu seus próprios pensamentos para que não fossem escutados, não arriscaria piorar a situação do seu amigo.

Fazia tempo que eu não havia saído do castelo, as coisas estão um pouco diferentes...

Se eu quisesse participar do Torneio Feroz... — ignorou a tentativa da garota em mudar de assunto — seria uma loucura?

Provavelmente... — decretou com brilho nos olhos. — Mas podemos formar uma dupla, seremos invencíveis!

Podia-se considerar incrível o modo como tinham habilidade de se expressar telepaticamente. Enquanto avistavam as construções, metros abaixo do steágno, passarem com lentidão por causa da pouca velocidade do automóvel pesado, os poderosos planejavam um possível futuro em que teriam de unir forças.

A máquina demorou bastante até que começasse descer e finalmente pousou. Encontravam-se na parte de fora da imensa muralha que demarcava a separação entre a capital do Monte Olimpo e o restante da cidade no gigantesco monte, sendo essa segunda construída sobre a parte mais periférica e íngreme do Monte Olimpo. O criocinético indagou o porquê da separação, ao que a menina respondeu apenas com: “O muro alto serve para manter separadas as classes dos olimpianos”.

Quando vistoriou a cidade que se seguia a partir da muralha para fora, notou que suas condições não eram as mesmas que se percebiam na capital. As residências não eram tão luxuosas, entretanto, ainda assim, bem harmônicas e hospitaleiras. Contudo podia notar que essa imagem piorava à medida que mais próximo da parte periférica.

Dali, não conseguiriam ver o fim do monte, mas esse seguia cada vez com menos elevação, até chegar num abismo quilométrico como paredões que delimitavam sua extensão. As moradias mais afastadas da muralha e próximas ao precipício mostravam pobreza e miséria, todavia, ao mesmo tempo, firmeza e garra eram transmitidas por aquele povo que lutava para sobreviver todos os dias de sua vida.

Depois que os materiais foram descarregados pelos servos marcianos que já se encontravam ali, esconder-se ficou mais difícil, no entanto, conseguiram enfim. O que estariam planejando fazer naquele lugar? Era a pergunta que não queria calar. No entanto não tiveram tempo de procurar respostas, uma vez que o steágno não demorou em decolar novamente, com direção ao palácio. Ainda havia muito que ser feito.

Para desembarcarem não teriam tanta dificuldade, mesmo que fossem vistos, bastava apenas que não fossem pegos. Com isso em mente, assim que as comportas traseiras do transporte foram abertas, a dupla disparou sem olhar para trás, sem que pudessem ser detidos pelos ígneos de mãos ocupadas. Corriam às gargalhadas, achando graça nos xingamentos que a pestinha recebia junto de seu novo amigo “terráqueo”.

Os dois respiraram melhor quando desaceleraram a corrida, conversando telepaticamente sobre o que haviam visto fora dali. Até que foram interrompidos por uma cena que os obrigou a se esconder na esquina da encruzilhada dos corredores.

Devemos ajudar...!

Oii! Poderosos terráqueos! Espero que estejam gostando dessa nova aventura! Deixem a estrelinha aqui e comentem o que estão achando dessa fantasia e peço que a compartilhem com outros leitores!

Qual será o desfecho dessas relações complicadas? Como esse Torneio Feroz é sediado e o que estão construindo? Olhos vermelhos estão surgindo pelas redondezas, devemos nos preocupar? E essa nova dupla, um dragão e uma garotinha, quão destrutivos serão? O que eles viram, que os deixou paralisados?...

-José JGF

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