Por Amor

Alegna terminou os curativos no irmão e se afastou rapidamente para que Guilherme lhe desse os calmantes.

Nívad recusou, virando o rosto para o lado, mas sua ação imediata não foi capaz de livra-lo. Sua boca foi forçada a se abrir pelas as mãos de Guilherme, e logo todos os comprimidos estavam descendo pela a garganta, quase sufocando-o. Ele até tentou regurgitar, tossindo por alguns segundos; voltando a respirar normalmente em seguida.

Após isso, pai e filho são levados para o porão conforme foi decidido pelos os seus algozes. E lá, uma nova cama é colocada ao lado de Magno, afim de servir como dormida para Nívad.

Depois que os dois são acomodados, presos em seus recantos, Guilherme deixou a esposa com eles, dizendo que precisava subir para um
banho pois estava bastante sujo com seu próprio sangue e de Nívad.

Só que na verdade ele não fez isso...

Tinha o pensamento fixo de que era necessário ter uma prova de que não seria traído novamente por Alegna. Então, fingiu que saiu do porão e se manteve escondido entre uma das vigas próxima as escadas.

Fora do alcance da visão dos irmãos, permaneceu quieto, esperando escutar sobre o que conversariam depois que ficassem a sós.

Agir daquela maneira não seria uma divergência mas fundamental.

Saber se a esposa não mudaria de ideia e continuaria confiando nele como fez há minutos atrás, era importante para não ser pego de surpresa. Principalmente agora, com tudo que já sabiam dele.

_ Vai me deixar feito um zumbi também?... Igual faz com o nosso pai?...

Guilherme ouviu a voz meia débil de Nívad e então se atentou imediatamente. Seu coração parecia demasiadamente acelerado e angustiado.

"Esse é o momento... O momento de saber se Alegna e eu estamos realmente conectados novamente"

Alegna olhou para Magno de repente e viu que ele dormia tranquilo como se nada tivesse acontecido e apenas pensou...

"Graças a Deus os remédios funcionaram rápido hoje!"

_ Sabe, não é por nada... É só porque eu... _Nivad continuou, com extrema ironia, apontando a cabeça em direção ao pai_ Eu não queria ter que ficar babando... Assim, desse jeito... Então, se não for pedir muito... Deixe que pelo menos eu tenha consciência quando precisar usar o banheiro... Quero evitar de estar sujando as calças...

_ Para com isso, Nívad..._ Desconcertada_ Jamais permitiria que isso acontecesse... Nosso pai... Nosso pai é porque precisa!... Por causa das dores e da insônia...

_ Jamais faria... Mas fez!..._ Após um segundo_ Olha só pra mim... Mal posso mexer os próprios dedos..._ Tentou erguer a mão e ela caiu pesada_ Acredite... Uma semana aqui... E eu estarei pior do que ele... Mesmo sem o efeito de droga alguma... Pode apostar nisso, querida irmã. Pode apostar! Sem medo.

_ Não está nos meus planos que fique assim tantos dias.

Guilherme arregalou os olhos.

Seria agora a traição?

_ Então pensa em me soltar?... Devo ter esperanças? É isso mesmo?

Um silêncio.

Guilherme sentiu o peito apertando a cada minuto.

_ Se concordar com os nossos termos, é claro que sim...Tudo só vai depender de você.

"Nossos termos"

Ela o incluiu!

E Guilherme sentiu finalmente o gosto suave da calmaria.

_ Que tipo de termos?...

_ Desistir de leva-lo daqui_ Alegna se referindo ao pai.

Nívad riu, lesado, sentindo a cabeça completamente zonza.

_ Me desculpe, mas eu teria que ser muito escroto... Pra deixar meu próprio pai, vivendo num buraco feito esse... _ Balançando a cabeça _ É óbvio! Que eu o tiraria daqui, na primeira oportunidade, Alegna.

_ Ele não precisa ficar no porão_ Disse, determinada_ Na verdade, ninguém precisa!... Mas se esse for o único modo, de manter esta família unida, não vou abrir mão disso. Eu sinto muito!

_ Eu sou um Aurom... _ Refletiu dizendo_ Mais do que eu gostaria de ser às vezes... No entanto, eu tenho certeza... Quase absoluta!... Que essa apreciação pelo o sadismo, que você concluiu que este sangue possui, eu não possuo!... Porquê, se assim fosse, eu mesmo teria matado Menezes..._ Cambaleou a cabeça_ Epâ!..._ Riu de si, voltando ao assunto depois_ Não vou mentir. Tive vontade... Várias vezes eu olhei pra ele, e quis esgana-lo com as minhas próprias mãos... _ Como se tivesse recordando, tentava recriar o ato com as mãos mas não conseguiu_ Ai, eu respirava fundo, bem fundo! E ia embora... Só que você..._ A encarou_ Você não teve problema algum em fazer isso... Foi tão fácil, não foi?... Só entrou lá naquela noite e... Pluft! Acabou com a raça dele num piscar de olhos... _ Riu novamente, já totalmente entregue aos efeitos das drogas_ Eu acho, Alegna, que você é mais Aurom, do que qualquer outro Aurom que já existiu!... Você é extremamente maligna... Eu já te disse isso hoje, não te disse?_ Franzindo a testa

_ Não vou mais perder tempo tentando te convencer de que não tive nada a ver com a morte dele. Você acredita se quiser. Eu não me importo, Nívad. Aliás, qualquer pessoa nessa cidade ou mesmo no mundo inteiro, pode pensar qualquer coisa ao meu respeito. Eu realmente, não ligo mais.

Na cabeça de Alegna havia se instalado um mecanismo onde seus bloqueios se quebraram de forma profunda e eficiente. Uma porta dentro de seu íntimo se abriu, trazendo enfim uma libertação. Ela sentia-se curada da doença da Necessidade Por Validação Alheia, pois havia identificado a origem de todo aquele medo de ser julgada, ridicularizada e rejeitada, inclusive a de ser vista como um fracasso.

Seus pais, eles sim foram um fracasso, mas ela não precisava ser igual a eles. Ela tinha algo maior: O amor verdadeiro de seu marido. E isso era o bastante para não repetir erros e construir uma nova história para aquela família.

Afinal, não foram esses os conselhos do padre Hermano? Esquecer tudo e trazer aos Aurom as glórias de forma correta e digna?

Ser uma Aurom, não tem a ver com ninguém nesta cidade! Só tem a ver comigo! Com a gente! Não é o que eles acham ou falam. É o que somos! E sem dúvida, somos os maiores!

_ Mas você deveria..._ Nívad, a tirando dos pensamentos_ Deveria está ligando... E muito!... Talvez não com o que pensam de você... Mas por ter casado com um cara como o Guilherme... Alegna, é sério. Você deveria, pelo menos, ficar alerta.

_Com o quê? Se hoje ele só provou que realmente me ama. Você viu!

Por detrás das vigas, alguém sorriu feliz.

Gostaria de agarra-la e beija-la. Oh, como gostaria de fazer aquilo naquele instante!

_ A última mulher que ele disse que amou, teve o corpo inteiramente coberto por concreto..._ Nívad com sinceridade_ Não quero botar pilha mas, se eu fosse você, juro que dormiria com um dos olhos abertos toda vez que estivesse ao lado dele na cama..._ Suspirou, voltando a expressão arteira_ Só me resta pensar, diante desse filme de terror todo, que você é muito corajosa ou é apenas uma garota muito carente, que se conforma com o primeiro psicopata que aparece em seu caminho..._ Gargalhou fraco por um segundo _ É isso! Minha irmã!_ já se entregando ao sono_ Esta é a definição mais verdadeira sua... Você é uma mulher carente de afeto masculino... Problemas com o pai, dá nisso!...  Todo mundo sabe.

Nívad fechou as pálpebras profundamente e dormiu dizendo:

Você... Não devia se entregar... Se entregar tanto... Não devia...

Alegna suspirou aliviada e olhou para o pai, que também já havia se rendido há tempos.

Nívad estava errado. O que ela sentia por Guilherme não tinha nada a ver com carência. Mas talvez estivesse certo que buscasse proteção masculina. E ela não se envergonhava de concordar com isso. A vida inteira se viu cuidando de tudo e de todos. Era justo que agora o universo tivesse se encarregado de mandar alguém que cuidasse dela. Já que o irmão nunca teve essa precaução.

Ainda pensativa, os deixou, trancando o porão. Mas antes, arrumou os lençóis e travesseiros do pai e do irmão, verificou a pressão arterial deles e por último, verificou as cordas que os prendia.

Em seguida, partiu de encontro ao marido, que já estava de pijama e limpo sobre a cama deles. Ele se apressou assim que achou que não precisava mais ficar de butuca.

_ Estou tão cansada_ Ela disse, suave, após sentar-se na beirada.

E Guilherme ergueu os braços como se a chamasse para si.

Ela o atendeu, se aninhando em seu peito, confortavelmente.

Enquanto se dedicava aos afagos entre os cabelos dela, Guilherme ouviu seu ressonar. Um ressonar quase feliz, de quem dorme tranquilo e bem.

E realmente ela estava.

Pois, amparada pelo o homem que seria capaz de qualquer coisa por ela, nunca mais teria noites ruins.

Guilherme, por sua vez, não dormiu de imediato. E ficou horas apenas pensando na conversa dos irmãos no porão.

Ele se sentia radiante, sabendo agora que podia confiar inteiramente na pessoa que escolheu para a vida. E isso era como ganhar um prêmio todos os dias.

Ele merecia esse prêmio, ao seu ver.

Por tudo que passou com Emanuelle, era mais do que digno viver esse relacionamento correto e honesto com Alegna.

Ele nunca, jamais, deixaria um outro amor se perder.

Até porque, esse era de fato real.

Apesar de Alegna ser uma criatura celestial.

Na manhã seguinte, os dois acordam juntos, abraçados.

Devagar, ele se levanta e abre as cortinas, admirando com curiosidade o que a tempestade causou lá fora.

Havia bastante lama e galhos espalhados por todo o terreno. No entanto, o canto dos pássaros e o céu claro, trazia leveza, mesmo sob aquela imagem caótica, fazendo com que esquecesse por um segundo as atribulações da noite anterior.

Era como se aquilo fosse um tipo de mensagem, dizendo que tudo sempre se renova, não importando o que acontecesse.

E era verdade.

A conversa entre Nívad e Alegna, de certa forma, trouxe discernimento dentro dele e essa certeza. E junto também, a conclusão de que era preciso ser mais honesto do que já tinha sido nas últimas horas. Pensando fortemente nisso, se virou para a esposa e começou, sem esperar que ela acordasse por completo.

_ Não quero esconder nada de você. Nunca mais.

Ela piscou os olhos, agarrada ao travesseiro, o encarando como se estivesse vendo um bonito anjo através dos feixes de luz da janela.

_ Fui eu, Alegna... Fui eu que troquei os remédios do Menezes... 

Ela não pareceu surpresa e tão pouco pareceu julga-lo. Apenas continuou prestando atenção.

_ Descobri que ele estava aqui no meu primeiro dia na mansão. Nívad havia deixado a porta destrancada naquela manhã, e eu vi quando ele passou rapidamente levando consigo o desjejum do velho numa bandeja..._ Continuou, e ela pareceu desconcertada por ter escondido isso dele. _ Menezes  estava sendo um estorvo pra você..._ Disse depois de um segundo_ E eu não suportei vê-la se virando em mil, enquanto cuidava da casa e daquele homem. Ele não merecia sua preocupação e nem o seu zelo. Por isso não me arrependo de nada.

Agora Alegna se mostrou surpresa.

_ Eu sei o  que ele tentou fazer_ Respondendo ao olhar dela_ Num de seus delírios febris, acabou me contando que pensou em se aproveitar de você.

Ela se encolheu, envergonhada.

_ Eu fiquei possesso com a revelação e parti pra cima dele, o agarrando pelo o pescoço..._ Alegna lembrou da história de Menezes sobre os fantasmas que  tentaram enforca-lo. Agora fazia sentido._  Mas quando pensei que deixaria marcas, decidi que teria que ser de outro jeito... Então me atentei, que com os remédios certos, ninguém desconfiaria de uma morte natural... Ele estava tão doente e fraco, que não daria na vista se ele morresse de repente.. E eu sabia também que vocês não procurariam a polícia de maneira alguma sem se comprometer...

Um silêncio, e ela se ajeitou na cama sentando.

_ Espero que não me odeie por isso... _ Guilherme enfatizou_ Ou que sinta medo de mim... Porque meu único intuito, era te ajudar, Alegna... Menezes, Jonas ou qualquer um que venha ser uma ameaça a você, irei intervir... Não importa o que eu tenha que fazer.

_ Jonas?..._ Ela levantou uma das sobrancelhas_ Mas ele nunca tentou nada contra mim...

_ Sim, ele tentou... Acredite.

_ Como?

_Você nunca se perguntou, o motivo dele nunca exigir as receitas dos medicamentos mais pesados que você comprava?... Você simplesmente chegava no balcão, sem nenhuma solicitação médica, e ele te repassava tranquilamente os remédios tarja preta... Meu Deus, querida, você realmente nunca estranhou?

_ Nunca parei pra pensar nisso... Lembro que comecei comprando os medicamentos mais comuns, e com o passar do tempo, fui passando para os mais fortes... E ele nunca pediu uma guia de algum médico ou algo parecido... Eu realmente não sei explicar... Agíamos de uma forma tão normal... Em nenhum momento, que eu me lembre, se recusou a vender porque não trazia comigo uma solicitação médica...

_ Ele nunca fez isso porquê tinha medo de você...

Ela arregalou os olhos, quase assustada.

_ Medo? Sempre achei que gostasse de mim.

_ Ele gostava muito de você sim mas também tinha medo. E além disso, já tinha sido amigo de seu pai. Então fazia também por pena. Ele sabia da sua história e do que você passou. E acreditava que você carregava um grande fardo por conta disso. Enfim, ele realmente compreendia que você precisava de todas aquelas drogas pra poder se aliviar e continuar seguindo em frente.

_Eu lembro que ele sempre me aconselhou a procurar um médico..._ Depois de um instante_ Ele insistiu nisso muitas vezes. Sempre quando eu aparecia pra comprar mais remédios.

_ Era o modo dele te orientar sem parecer intrometido demais _ Os olhos de Guilherme brilharam_ Um médico, ao te avaliar, te indicaria uma ajuda psicológica... Jonas achava que no mesmo instante que você estivesse com qualquer médico, você teria finalmente um diagnóstico... E teria o suporte necessário para tratar seus possíveis traumas e culpas... A questão é que ele não sabia como dizer isso a você. Você era misteriosa e causava receio nas pessoas. Então ele apenas te aconselhava, da forma mais sutil possível.

Alegna suspirou, triste.

_Se tratando dos tranquilizantes pesados que eu pegava na farmácia, ele devia está mesmo com bastante medo _ quase Sorriu.

_ Ele tentou, desesperadamente, me convencer disso. Do quanto você poderia ser perigosa.  Quando comentei com quem iria me casar, ele quase não acreditou, e tentou me avisar sobre você. Ele queria muito ganhar minha confiança e achou que ganharia pontos comigo revelando sobre os remédios.

_Por isso cortou a língua dele?_ Disparou, sentindo um pouco de gosto por saber dessa proeza do marido_ Para que não falasse mais essas coisas sobre mim?

_ Comigo e com mais ninguém!... Eu só pensei: E se um dia, alguém o encontrasse, será que
ele falaria sobre essas mesmas coisas?... No primeiro momento, confesso, não dei muita atenção para o que ele tinha falado sobre você... Mas quando descobri Menezes na mansão, percebi que eu não podia deixar Jonas falando demais..._ A olhou profundo depois de um segundo_ Acredite, Alegna, não foi fácil arrancar a língua de um homem... Mas era bem mais difícil te imaginar encrencada_ Ela foi se erguendo enquanto ele falava_ Posso lidar com os todos horrores que pratiquei... Mas jamais com o fato de te ver atormentada por um motivo ou outro...

_ Me sinto como aquela abelha lá no campo_ Ela disse depois de um segundo_ Sabendo que você sacrificaria qualquer coisa por mim.
 
Os dois trocaram olhares e se perderam neles. Ele foi até ela e a tocou na face delicadamente.

_ Só quero viver neste mundo se for pra te servir. Porque você é o amor da minha vida. 

Ela Sorriu, colocando as mãos no rosto dele também.

_Você cuidou de mim... E agora deixe que eu cuide de você... Então Ouça: Vá a farmácia, e com cuidado para que ninguém o veja, traga Jonas para a mansão..._ Decidida_ Aqui é bem mais seguro mantê-lo... Depois, feche tudo e não volte mais a cidade.

_ Mas como vamos conseguir sobreviver aqui sem o dinheiro que ganho lá, minha querida? As economias que Jonas possuía já estão quase no fim... Ele não tem muito guardado que dê pra tanto tempo_ Rebateu, mas com doçura.

_ Quanto a isso não se preocupe. Eu sei como conseguir dinheiro... Você viu o que eu tenho guardado lá no quarto da minha mãe... Só precisamos mesmo procurar as pessoas certas para realizar um bom negócio e tudo ficará bem..._ Apertou a nuca dele_  E eu até sei onde encontrar essas pessoas. Apenas, confie em mim...

 
Guilherme sentiu que seu coração estava para explodir de tanto amor por ela, e a abraçou com a certeza de que aquele seria o primeiro dia em que estariam conectados para sempre.

Eles haviam se fortalecido e se unido de verdade finalmente. E nada, jamais, seria capaz de destruir o que eles tinham agora.

Os feixes de luz, os faziam parecer dois anjos sob a claridade que escapava da janela.

Anjos decentes e pecadores, embalados um no outro. Parecendo iguais.

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