Grandes Mentiras
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Os três foram um dos últimos clientes a deixar o Cosmopolita naquela noite.
E aparentemente, acabaram exagerando um pouco na quantidade das taças de vinho tinto.
Alegna estava eventualmente alegre. Veio rindo das piadas bobas do irmão o caminho inteiro para casa. Guilherme, por sua vez, estava um tanto mais sério. Talvez porquê tivesse que se manter concentrado na estrada, pois era o menos embriagado da história e por isso era o único capaz de ficar atrás do volante. Ou talvez, porquê estivesse demasiadamente frustado. Afinal, suas investidas e indiretas durante o jantar, não provocaram nos irmãos a reação que esperava. Pelo o contrário, apenas serviu como estímulo para retomarem a cumplicidade.
Passaram pelo o único posto de gasolina que ficava na começo da estrada para a Colina. E nessa hora, Nívad chamou a atenção da irmã para o rapaz de macacão sentado em frente a lojinha de conveniência. Alegna riu destrambelhada ao lembrar da senhora Estela, viúva de Menezes, e agora, defunta, e toda aquela conversa de como convenceu o patético funcionário a lhe entregar as gravações das câmeras de vigilância.
_ Olha só para ele, Alegna_ Disse Nívad com certa zombaria_ Parece tão triste...
_ Deve está sentindo falta dos bolinhos de chuva. É isso._ Ela completou, arriscando uma piada de muito mal gosto, aliás.
Os irmãos desatam a rir novamente, deixando Guilherme suspirando, impaciente.
A mulher estava morta. E não se deve rir dos mortos!
Alegna parecia uma outra pessoa sob a sua visão. Não só por causa do álcool mas desde a última descoberta, horas atrás. Pensando fortemente nisso, Guilherme gostaria que o tempo pudesse voltar e que Nívad nunca lhe tivesse dado as cópias daquelas chaves.
_ Meu Deus! Nem eu faria uma brincadeira tão cruel dessas... Você é má, garota... Muito má mesmo! Eu tenho medo de você!_ Nívad, balançando a cabeça, enquanto continha o riso.
Assim que colocaram os pés na mansão, Alegna rapidamente subiu as escadas para se preparar para um banho. Guilherme acompanhou a esposa, deixando Nívad na sala com seus cigarros e sua vitrola velha. Ele mesmo avisou que ficaria acordado curtindo seus discos preferidos até conseguir pegar no sono, mas que não se preocupassem com barulho pois colocaria a música bem baixinho. Então ficou sozinho, esparramado no sofá, ouvindo seu Rock.
Alegna foi diretamente para o banheiro que ficava no quarto da mãe. Guilherme não se surpreendeu com a decisão e desviou o caminho, adentrando sozinho para o quarto de casal deles. Apesar de não ter sido mesmo nenhuma novidade, sentiu-se entristecido e até irritado, ao vê-la mais uma vez preferindo aquele cômodo a ele. Sentou-se então na cama, tirando os sapatos e o casaco, e depois disso, se entregou aos pensamentos inertes e vazios como forma de fugir dos desencantos.
No entanto, não permaneceu por muito tempo naquele estado apático. Logo, Alegna surgiu na porta, com os cabelos raramente soltos e usando apenas um roupão atoalhado para cobrir seu corpo pálido e pequeno. Seus seios estavam propositalmente apresentados pelas fendas do roupão e Guilherme apreciou a beleza doce e delicada diante dele. Ao se aproximar devagar, ela deu-lhes as mãos, para que o marido a seguisse, e então o levou até o quarto de Heidi, fazendo com que entrasse no banheiro graciosamente rústico junto com ela.
A banheira, em estilo retrô, já se encontrava até a borda quando ela desligou a torneira. E após medir a temperatura, mergulhando os dedos na espuma, se dirigiu até o marido, ofertando-lhe um suave beijinho em seus lábios. Guilherme recebeu o inocente carinho sem se manifestar. E isso foi o bastante para Alegna deduzir que poderia prosseguir. Sendo assim, se desfez rapidamente do roupão, ficando completamente nua para ele.
Guilherme a examinou dos pés a cabeça. Não pôde evitar. Tentou, mas os olhos eram bem mais curiosos. Em consequência disso, sentiu o sangue queimar todas as veias de seu corpo como se fossem explodir há qualquer instante. Novamente, ela se aproximou e o beijou mais profundamente, enfiando agora a língua no céu da boca de Guilherme. Ele a sugou como se fosse uma necessidade, e deixou que Alegna usasse as mãos dela para guiar as dele sobre seus quadris e seios. Por um segundo, ele se permitiu ao prazer de tê-la assim, tão decidida e selvagem. No entanto, havia lapsos, que julgou ser de sensatez, que o fazia recrimina-la, afirmando em sua cabeça há todo momento, que ela havia bebido demais e que seria bom pararem com aquilo.
Alegna ignorou totalmente as súplicas de suspensão do homem, e continuou se esfregando nele com paixão e vontade. Houve então um momento em que Guilherme se afobou, mesmo sob o cuidado de não parecer grosseiro, e a afastou com jeitinho e delicadeza.
_ Não, Alegna..._ Disse, passando a mão pelo o cabelo em desconcerto enquanto se encostava na parede _ Não faremos isso... Não com você completamente bêbada.
De repente se atentou ao roupão no chão e o pegou, cobrindo-a rapidamente.
_ Quando Guilherme?_ Ela protestou, ao tentar encontrar o olhar dele. Mas Guilherme fugia, com a desculpa que precisava terminar de dar o nó no roupão _ Quando vai acontecer?... Que dia, Finalmente... Você tomara a difícil decisão de comer sua própria mulher?
Como um grande salto, ele a olhou com extrema reprovação, achando o linguajar inaceitável e podre.
Parece...
Parece uma...
_ Não deveria ter bebido tanto..._ Com o tom meio irritado_ Olhe só para você... Veja como está se comportando? Tão vulgar! Tão promíscua!
_ Vulgar e promíscua?_ Ela franziu a testa quase debochando_ É isso que você acha de uma mulher, que apenas gostaria de fuder com o marido?
_ Mas que Diabos está acontecendo com você?_ Ele se afastou, perplexo_ Porque está agindo dessa maneira? Você não é assim, Alegna!
_Que Diabos está acontecendo com VOCÊ?... Meu Deus do céu! Só Me explica porquê isso seria errado?... Eu realmente não entendo! É alguma coisa comigo? É isso?... Você não sente desejo por mim?... Me diz, por favor! Eu preciso saber! Sou tão desinteressante assim? Qual é o problema, Afinal?... Porquê a gente simplesmente não pode transar?
Ele deu uma última olhada de desprezo, se retirando do banheiro imediatamente.
Ela foi atrás.
_ Você precisa conversar comigo, Guilherme!... Conversa comigo!... Você não pode fugir disso para sempre!... Somos casados!... Mas que droga!
_ Não! Não, Alegna!_ parando no meio do quarto_ Não dá para ter uma conversa com você! Não agora! Não assim! Você está completamente fora de si!
_ Você não vê o quanto isso é humilhante pra mim? Eu não deveria está implorando por isto! É embaraçoso!... Meu Deus, Guilherme, eu não acredito que você ache isso normal... Todo esse tempo... E você nunca me tocou!... E nem ao menos se interessa!
_ Eu respeito você!_ Com o dedo apontando na direção dela_ Não deveria ser tão difícil entender...
_ Isso não tem nada a ver com respeito ou qualquer coisa parecida..._ Balançando a cabeça, incompressível_ Fazer amor com quem gosta, é algo inteiramente natural... Estranho de verdade, é eu estar junta há mais de seis meses com um homem e ainda... Ainda ter a virgindade preservada! Isso sim é difícil de entender!..._ Pões as mãos na cabeça_ Eu fico me perguntando direto, se isso é um caso que precisa de algum tratamento ou se é porquê simplesmente não sente nada por mim... Fico confusa... Porque pra mim, é mais fácil encarar que esteja doente, do que não ser uma mulher desejável aos olhos do próprio marido..._ Suspirou, bagunçando o cabelo, tentando achar o equilíbrio _ Mas seja o que for, temos que cuidar disso... Conversar sobre isso, compreende?... Tentar descobrir a causa... O que não faz sentido é continuar como..._ Hesitou, fechando os olhos por um segundo_ Como se a gente fosse apenas bons amigos morando sob o mesmo teto..._ Ela hesitou novamente, abrindo os olhos. Continuou_ Você é um homem, Guilherme... Ao menos, deveria honrar isso... Honrar o que tem entre as pernas!
A sensação de fúria que Guilherme vinha controlando desde que se iniciou aquela conversa, simplesmente se rompeu. E suas pupilas dilataram, deixando seus olhos grandes e sua face rubrosa.
_ Por Deus, mulher... Você realmente está parecendo uma..._ hesitou, antes que falasse demais.
_Uma o quê?_ Ela o desafiou_ Uma vagabunda?... É disso que iria me chamar?... Talvez eu estivesse bem feliz agora se fosse como uma... Pelo menos, estaria satisfeita!
Guilherme não pensou muito quando deferiu uma tapa certeiro nela.
Alegna sentiu a ardência poderosa correr a face como formigas de fogo. Levou as mãos até o rosto, em lágrimas.
Desesperado, pensando talvez no absurdo que fez, ele se apressou até ela, arrependido. A agarrou, pedindo perdão, e ela apenas tentou se livrar de seus braços. Guilherme não obedeceu e grudou mais nela, segurando- a pelos os ombros, implorando que a esposa se acalmasse.
Alegna pareceu não ter o escutado, e iniciou-se então uma onda de gritos de socorro da parte dela.
_ Alegna, para!... Por favor, me escute! _ Segurando os tapas que ela dirigia a ele_ Não vou te machucar! Tá me ouvindo?... Mas se você continuar... Se continuar se debatendo assim... Posso acabar fazendo uma besteira sem querer...
_ Sem querer?_ Esbravejou, conseguindo se soltar__ Será que está mesmo preocupado com isso?... Veja! Você já me machucou!_ Apontando pro inchaço na bochecha _ E se isso aqui foi mesmo sem querer... Nem quero descobrir como seria se tivesse a intenção..._ baixou a cabeça massageando a face. E ao erguer o pescoço, continuou com olhos em chamas_ Mas não é tão difícil assim ter uma ideia de como seria..._ Ele franziu o cenho, esperando que ela completasse o raciocínio_ Me prenderia num quarto escuro e depois... Depois cortaria a minha língua! Não seria assim? Ou estou enganada?
Ele pareceu extremamente surpreso e ela prosseguiu, gritando:
_ Seria assim ou não? Responde!
_ Então você viu... _ Tentando se manter calmo. Suspirou baixando a cabeça, pondo a mão na cintura_ Alegna, querida, eu... Eu posso explicar aquilo...
_ Não se aproxima de mim..._ Vendo que ele estava chegando perto novamente_ Não chega perto...
_ Não é o que parece..._ Se chegando devagar_ Só deixa eu explicar, meu amor...
_ Se afasta, Guilherme! Eu tô avisando... Não encosta em mim!
_ Alegna... Pelo o amor de Deus... Querida... Querida, ouça... olha... Acredite em mim... Eu tive que fazer aquilo..._ Erguendo os braços na direção dela com cuidado_ Quando... Quando você souber os motivos, vai compreender... Eu sei que vai... só me escuta...
_ Guilherme, não... Não... Me solta... Me solta, Guilherme! Me deixa! Não!... Me solta!... Saí! Guilherme! Saí daqui! Me soltaaaa!...
Guilherme sentiu o colarinho ser puxado com força enquanto tentava segurar a mulher que esperneava em seus braços. Ele é jogado de forma tão violenta contra a penteadeira que todos o vidros de perfumes e todas as jóias foram derrubadas e espalhadas pelo o chão. Alegna não saiu do lugar. Ficou apenas mordendo os dedos enquanto via o irmão acabar com o rosto de Guilherme a socos e cotoveladas. Nívad era bem mais forte e tinha bastante testosterona acumulada para descarregar. Ele poderia passar horas batendo nele sem se cansar.
No entanto, com o cunhado totalmente desfigurado, achou que já tinha sido o bastante. Então o deixou de lado, dando-lhe as costas. Guilherme ficou caído no canto da parede, e de repente, uma energia, quase sobrenatural, surgiu nele, que o encorajou a revidar.
Partiu pra cima de Nívad.
Os dois se embolaram e caíram sobre a cama depois de destruir o restante do belo quarto. Alegna, ainda presa em seu cantinho, parecia mais triste com a bagunça nos móveis do que com o marido e o irmão se matando. Estava com o olhar perdido sobre toda quebradeira, e por alguns segundos, sequer se atentou a Nívad que estava quase a desfalecer pelas as mãos de Guilherme, apertando seu pescoço. Somente quando apanhou um dos portas jóias e o colocou de volta a penteadeira, foi que uma espécie de estalo em sua mente a fez prestar atenção na seriedade da situação.
Através do espelho, viu Guilherme sobre o irmão, sufocando-o. Deu uma olhada mais profunda para o porta jóia pesado de cedro e o segurou entre os dedos firmemente. Correu até o marido, e pelas as suas costas, sem que ele percebesse, desferiu o objeto em sua nunca.
O sangue imediatamente jorrou como um chafariz, fazendo com que Guilherme caísse pro lado, antes de revirar os olhos.
Alegna ficou a olhar para o marido sem acreditar no que tinha acabado de fazer, e nem se tocou quando a arma mortal deslizou de seus dedos. Nívad se sentou, massageando o pescoço e tossindo.
Ela não sabia ao certo descrever a sensação daquele momento. Se era de tristeza ou desespero. Na verdade, era como se a alma não estivesse dentro do seu corpo, e isso era o bastante para deixar tudo confuso e leva-la rapidamente a loucura há qualquer segundo.
Ela não chorou mas também não se preocupou em saber se o marido estava morto ou somente desmaiado. Apenas ficou lá, parada, observando o sangue fresco manchar a colcha de seda da mãe. As lembranças de uma vida se esvaziando diante dela, vieram de novo a tona, e ela quase vomitou. Mas se segurou direitinho, do mesmo modo que aprendeu a fazer durante as madrugadas de pesadelos constantes. Ela só se mexeu quando Nívad pediu que o ajudasse a levar Guilherme até a sala. Lá, eles o colocaram numa cadeira e o amarraram. E quando terminaram, Alegna sentou do outro lado do sofá como uma garotinha comportada esperando os presentes de Natal, enquanto Nívad, enfiava um algodão embebido em álcool nas narinas de Guilherme.
Quando ele despertou, Nívad foi até o sofá e sentou do lado da irmã.
Os gêmeos então permaneceram assim, observando Guilherme como se ele fosse um bicho desnorteado dentro da jaula. E finalmente, quando pareceu se lembrar do que estava acontecendo, tentou dizer algumas palavras.
_ Não precisa disso..._ Se referindo as cordas em seus pulsos. Ele mal conseguia falar com tantos dentes quebrados na boca.
Inclusive, aproveitou para cuspir um canino quase aos pés deles depois de empurra-lo com a língua.
_ Na verdade... Precisa!_ Nívad, também com alguns hematomas pelo o corpo_ Parecia bastante agressivo lá em cima... Meu pescoço que o diga!_ Passou as mãos pela a traquéia_ E, é claro, minha irmã também._Olhando em direção a ela.
_ Eu só estava me defendendo de você... E quanto a Alegna, ela sabe... Eu jamais a machucaria.
_ Você acredita nisso?_ Nívad dirigindo o olhar a ela outra vez_ Porque não foi o que eu vi... Inclusive, esse belo inchaço no rosto de sua esposa... Dúvido que tenha sido um beijo amoroso... E então?_ Suspirou, depois de um segundo__ Vão me dizer o que está acontecendo? Eu quase perdi o pescoço por causa da briga de vocês... Acho que no mínimo, mereço saber o motivo de tanta arruaça.
Alegna mostrou-se envergonhada e baixou a cabeça por um instante.
_ Pode falar pra ele, querida, se quiser...._ Guilherme docemente_ Tá tudo bem...
Ela ficou pensativa, envergonhada de falar sobre a falta de sexo dentro do casamento. Então preferiu contar sobre outra coisa...
_ Jonas...
_ Jonas? O da farmácia?..._ Nívad_ Sim e daí? O que o tio dele tem a ver com a discussão de vocês?
Ela olhou pra Guilherme como se pedisse aprovação. E então continuou:
_ Ele está escondido... Num tipo de depósito... Nos fundos da farmácia... E está acorrentado.
Nívad ergueu as sobrancelhas para Guilherme.
_ Foi você quem fez isso?_ Guilherme não precisou responder para que Nívad continuasse_ Mas porquê? Porque fez isso com alguém da sua própria família?
_ Não acho que sejam da mesma família._ Alegna sussurrou para o irmão mas Guilherme ouviu e confirmou.
_Verdade, querida... Não somos.
_ Então toda a história de parente doente, e a tal viajem que Jonas precisou fazer, foi tudo invenção sua?_ Nívad franzindo a testa_ Ele estava esse tempo todo em Peregrino, preso em sua própria casa?... Mas porquê diabos teve que fazer isso? Afinal, Guilherme... Se esse é mesmo seu nome!... Quem é você de verdade?
Guilherme sentiu o sangue endurecido no peito quando tentou suspirar.
_ Eu não tive escolha... Precisava de um lugar pra ficar e... E ser sobrinho do farmacêutico, me pareceu um bom disfarce... Ele é um homem sozinho... Não têm família alguma... Ninguém acharia estranho, se de repente, chegasse um parente distante para cuidar dos negócios dele enquanto estivesse viajando... _ Um silêncio_ E sim... Meu nome é mesmo Guilherme... Só mudei o sobrenome... Passei a usar o segundo nome de Jonas e me apresentei como Guilherme Sampaio... Fiz isso no intuito de tornar mais autêntico, e fora de qualquer desconfiança.
_ Meu Deus, cara..._ Nívad pasmo_ Isso quer dizer então, que ficou por aí nas sombras, estudando os moradores de Peregrino, até enfim encontrar alguém que se encaixasse perfeitamente nos seus planos... Me desculpe a sinceridade, mas pra mim, parece coisa de gente doída!_Olhou pra irmã Franzindo a testa_ Não parece?
_ Do que você estava fugindo?... _ Alegna desconcertada depois de um segundo, o encarando forte_ O que você fez de tão horrível para ter que mudar de identidade?
_ Tô até com medo da saber agora_ Guilherme quase pra si mesmo.
_ Como eu disse, me vi sem alternativa... _ Suspirou_ Fui obrigado a agir dessa forma, prendendo aquele homem e mentindo pra todo mundo, porque realmente não tinha pra onde ir... Falcão Peregrino era a cidade mais parada e inerte que encontrei enquanto buscava por algum refúgio... Estava desorientado, e sabia que aqui ninguém me acharia... E que todas as coisas ruins, finalmente ficariam para trás..._ Ficou a pensar. Balançou a cabeça em desconsolo_ Na verdade... Na verdade o que houve, antes de tudo isso acontecer, foi um acidente... E eu não encontrei outra solução, senão fugir.. E quem sabe, tentar refazer a vida, a onde fosse possível.
_ Um acidente? Mas que tipo de acidente?_ Nívad.
_ Bom, eu... _ Guilherme pareceu triste_ Eu conheci uma certa garota... Isso algum tempo atrás...._ Alegna sentiu-se enciumada e ele percebeu mas teve que continuar_ Eu tinha acabado de me mudar pra região de São Vicente do Sul, e ela,... Ela foi uma das primeiras pessoas que tive contato naquela cidade...
São Vicente do Sul? Cara você veio de longe mesmo! Isso é quase do outro lado do país! Nívad pensou.
_ Tivemos uma amizade curta porque rapidamente começamos a namorar, e menos de três meses, já estávamos morando juntos.... Loucura eu sei! Mas realmente achávamos que éramos almas gêmeas, e nem pensamos muito... Ela também tinha acabado de se instalar na cidade, e se sentia tão sozinha quanto eu... Depois entendi, que era como se tivéssemos encontrado um tipo de apoio um no outro, e que isso, foi confundido com amor..._ Suspirou, engolindo o sangue preso na garganta__Bem... No início, tudo parecia perfeito... Havia muita cumplicidade... Ao ponto de não duvidar, em nenhum momento, que tinha encontrado minha metade... Mas infelizmente, eu estava completamente enganado....Vi que ela não era nada do que parecia ser..._ Ergueu a cabeça buscando força_ Emanuelle era uma mulher bastante determinada... Tinha muitos ideais... Era cheia de sonhos e planos, e na época, estava cursando medicina... Esse era um dos seus maiores desejos de vida, e ela jamais mediu esforços para conseguir realiza-lo... De repente, esse empenho mais do que exagerado, foi ficando cada vez mais claro de que havia algo de muito errado... Ela pareceu bem mais ocupada com os estudos do que de costume, e então, consequentemente, começamos a nos ver menos, mesmo morando sob o mesmo teto... Mas só me atentei de verdade, quando começaram os telefonemas estranhos e as inúmeras mensagens que ela não parava de responder nem quando estávamos fazendo coisas importantes juntos... Nossos finais de semanas, foram ficando raros com o passar dos meses, e ela sempre vinha com a desculpa de que precisava fazer viagem com o grupo de estudos dela para instituições e hospitais em outras cidades... Nunca perguntei como isso funcionava, mas tinha dúvidas se isso existia mesmo, se realmente o curso exigia essas atividades no currículo... Só sei que toda essa falta de atenção e compromisso com a gente, me deixou com a pulga atrás da orelha por um bom tempo... Sendo assim, resolvi um dia segui-la na saída da faculdade... E foi então que todas as minhas desconfianças se confirmaram..._ Ele apertou os olhos como as más lembranças e depois os abriu, continuando_ Emanuelle estava saindo com homens mais velhos por dinheiro...
Alegna pareceu chocada e até se sentiu compadecida. Seus olhos, lacrimejando.
_ E quando questionei..._ Continuou_ Argumentou que precisou fazer aquilo para garantir os custos na faculdade... E aínda acrescentou, que se tivesse um namorado que a ajudasse, não teria feito nada daquilo, nunca! _ Baixou a cabeça_ Eu era só um simples entregador de pizza... E esse tinha sido o único trabalho que havia encontrado naquela cidade ... Não tenho muito estudo e nem experiência... Mas nunca me envergonhei... Era um trabalho digno... Ganhava pouco, é claro, mas o suficiente pra pagar algumas contas e não passar tanta necessidade... Ela sabia disso quando me conheceu. É isso que não entendo. E mesmo assim, aceitou ficar comigo... Só sei que aquelas palavras me deixaram bastante ofendido, e eu fiquei muito irritado.... Com o sangue quente, perdi o controle, e acabei dando um tapa muito forte nela....
Alegna pós os dedos em seu rosto e olhou para Nívad e quase o ouviu dizer:
Parece que ele gosta de bater em mulher, não é mesmo?
_ Depois disso, é claro que ela ficou muito brava também... Então veio pra cima de mim com tudo, me dando socos e pontapés... E no intuito de apenas me defender, a empurrei.... Sem medir as forças... Ela se desequilibrou e caiu, batendo a cabeça na quina da mesa de centro..._ Um segundo pensativo_ No primeiro momento, achei que só tivesse desmaiado... No entanto, quando me aproximei e vi o estado que o pescoço ficou... Bom, eu não sou médico mas... Era nítido que o pescoço dela havia quebrado...._ Parou um pouco pra respirar, fechou os olhos_ Eu fiquei... Eu fiquei totalmente desesperado... Não sabia o que fazer... Só sei que fiquei lá, diante dela por horas, pensando que talvez àquilo tudo fosse um pesadelo e que há qualquer momento eu acordaria... Então, num instante de lucidez, ou não! Eu a arrastei até o quintal... Cavei um enorme buraco... E a coloquei lá... Mais tarde, comprei umas sacas de cimento e... E cobri todo o terreno..._ Olhou pra Alegna e ele viu a lágrima no rosto dela mas continuou olhando firmemente_ Peguei o pouco do dinheiro que ela havia juntado, entreguei as chaves para o homem que tinha nos alugado a casa, e me mandei, estrada a fora.
Um silêncio quase morbido pela a sala.
_ Ela não tinha família?... _ Nívad quebrando o clima_ E os amigos da faculdade?... Ninguém procurou por ela?
_ Não fiquei tempo suficiente para descobrir se alguém sentiria falta... Mas sabe como é, pessoas trancam suas faculdade o tempo inteiro... Então não seria estranho, se de repente não a vissem mais... E os pais dela? Bom, eles não tinham um relacionamento muito saudável... O pai era um alcoólatra teimoso e inreversivel... Nunca ligou pra família... E a mãe... A mãe era uma fanática, que renegou a única filha simplesmente por que ela não aceitou seguir a mesma religião dela... Eles não se falavam há anos por essas razões... Enfim, nunca quiseram saber dela, e ela, nunca quis saber deles. Emanuelle era sozinha assim como eu.
_ E porquê não chamou a polícia na hora?_ Nívad_ Se foi só um acidente, não teve intenção alguma de fazer mal a ninguém..._ Dando de ombros.
_ Você não chamou a polícia quando passou pela a mesma situação com Menezes, chamou?_ Guilherme num tom quase sarcastico_ Então entende perfeitamente, que o medo é um dos principais motivos que impede de alguém fazer o correto numa situação dessas.
Nívad engoliu em seco.
_ Podia ter me contado_ Alegna.
_ Você, melhor do que ninguém, minha querida, sabe que existe coisas, que é difícil confessar... Até mesmo para aqueles que a gente ama e confia.
_ Não te contei sobre Menezes porque tive receio de que desistisse do casamento, Guilherme. Só por isso.
_ Não estou me referindo ao que fizeram com Menezes... _ A olhou profundamente, e ela sentiu que estava sendo decifrada_ Estou falando... Do que fizeram no porão.
Alegna arregalou os olhos, sentindo um pouco de falta de ar.
_Que porão?... O nosso porão?_ Nívad erguendo as sobrancelhas_ Mas o que tem isso?... Do que ele tá falando, Alegna?
Alegna estava nervosa e Nívad sabia disso só pela a sua respiração.
Então fez a pergunta mais uma vez, de forma comedida para que ela não surtarsse e saísse correndo. E ela permaneceu calada.
_ Então você não sabe mesmo?_ Guilherme, verdadeiramente surpreso com a falta de conhecimento de Nívad.
_ Não sabe o quê?_ Nívad se dirigindo irritado a ele_ Eu não faço a mínima ideia do que você está tentando dizer, cara!
_ Nívad, não o escute..._ Alegna interviu_ Ele só está tentando confundi-lo.
_ Você sabe que isso não é verdade, querida_ Guilherme tranquilamente_ Poderia está fazendo isso sim, sei lá, talvez pra escapar, não é mesmo? Mas você sabe perfeitamente que não tem a ver com isso... _ Quase sorrindo com doçura_ Conte ao seu irmão sobre o porão... Liberte-se desse abismo e desse peso de carregar isto, Alegna.... Eu acabei de fazer isso! Você não viu? Não é tão ruim, minha querida. Acredite. É quase um orgasmo!... E você queria tanto provar de um, não queria?
_ Cala a boca!_ Ela se ergueu, batendo na cara dele com asco.
A raiva dela atravessou o olhar dele como agulhas em brasa, e Guilherme quase sorriu com o sadismo do momento.
Então como quem estava se deliciando com toda a cena a sua volta, virou-se para Nívad, dizendo calmamente.
_ Desça até o porão, caro cunhado... Garanto que lá, encontrará muitas respostas.
Nívad franziu a testa enquanto Alegna encarava o irmão desesperadamente.
Os gêmeos cruzaram os olhos e Nívad estendeu as mãos como se pedisse as chaves do porão. Ele poderia usar as suas mas nunca lembrava onde as tinha deixado. Devia está por aí, em cima de algum móvel velho ou quarto. Não estava com cabeça para sair procurando pela a casa.
Alegna estava sem as suas chaves também e apenas balancou a cabeça negativamente.
Nívad então, sabendo que Guilherme carregava as dele, meteu as mãos no bolso da calça dele e tirou o molho de chaves. Alegna pareceu chocada que Guilherme possuía as cópias, até aquele instante ela não tinha conhecimento disso.
Vendo que o irmão seguiria rumo ao porão, quase se jogou aos pés dele, implorando que não descesse até lá.
Nível a ignorou completamente, e se dirigiu rapidamente para os recantos mais profundos da Mansão Aurom.
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