CAPÍTULO 73

O navio de An Lepard havia lançado âncoras numa enseada de águas calmas da lendária ilha. Era rochosa, com espigas angulosas cobertas de branco e cinza devido às fezes da imensa quantidade de pássaros que viviam ali. O pequeno bote era remado por  dois marujos de Lepard e carregava Kyle, Gorum e Zorena. 

Kiorina observava este se distanciar à partir do convés sentindo amargura em seu íntimo. As recordações das discussão que teve com Kyle, horas antes, martelavam em sua cabeça. Quando ela se aproximou dele, sussurrava sozinho. Explicou que falava com Noran.

– Kiorina – ele hesitou – eu... logo mais partirei para uma jornada perigosa e... Bem, eu... Mesmo confiante, não há garantias. O futuro escorrega por entre os dedos como areia fina.

A ruiva tinha os braços cruzados e um a expressão fechada. Nada dizia, apenas o observava. Sentia-se traída. Desde a visita à terra dos Inikutz, eles haviam se aproximado. Nunca conversaram sobre compromissos, mas ela sentia que tinham um futuro juntos. Então ele abandonou tudo. O compromisso com ela e com Lacoresh para ficar com uma mulher que havia surgido do nada. Escutava suas palavras, mas apenas se segurava para não explodir. Para não explodi-lo, na verdade. Tentava afastar os pensamentos de envolvê-lo em chamas enquanto ele continuava falando.

– Sei que fui um... um...

– Traidor? Idiota? Calhorda? – disse contendo a ira.

– Sim, isso tudo. Eu peço desculpas. Não, peço perdão. Eu fui egoísta. Não pensei em seus sentimentos... Eu apenas estava muito confuso. Mas agora, eu...

– Já disse o que queria, Kyle Blackwing? – Uma lágrima escorreu – Sai já da minha frente! Nunca vou te perdoar!

Mas quem saiu foi Kiorina, que correu para uma das cabines do navio. Kyle aceitou a reação dela, mas não desistiria de seu propósito.

O bote chegou a praia cheia de pequenas pedras. Kyle procurava afastar Kiorina de seus pensamentos. Respirou fundo e procurou concentrar-se. Olhou para a parte alta da ilha e viu a fortaleza em ruínas. Era construída com rochas avermelhadas e sua alta torre subia como um palito contra o céu cinzento. Do navio, os demais também podiam ver a torre. Ventos gelados que anunciavam uma tempestade causavam temor.

Kyle disse aos marujos – Se não voltarmos até o anoitecer retornem ao navio. O capitão saberá o que fazer.

Um deles acenou e disse com seu sotaque carregado – Boa sort, Blequeuin. Boa sort, Gorrum.

Kyle seguiu. Não carregava nenhuma arma. Gorum usava meia armadura de escamas e sua pesada espada montante. Zorena vinha atrás com seus espadins, um na bainha e outro preso às costas. O som das centenas de aves cinzentas era alto e estas alçavam voo na medida em que os três avançavam.

A tempestade foi se configurando, com ventos fortes, raios e som dos trovões. Estava estranhamente posicionada apenas sobre o terreno da ilha. As nuvens escuras se convulsionavam e o céu se fechou como uma cortina de chumbo. A chuva gelada os tocou e Gorum estremeceu – Se vamos enfrentar uma bruxa e suas criaturas, não devíamos ter trazido Kiorina?

– Não. Ela está muito abalada. Poderia colocar tudo a perder. – respondeu Kyle tendo que falar alto para ser ouvido acima dos sons da ventania.

Do navio, já não podiam mais vê-los e a fortaleza também sumiu engolida pelos efeitos da tempestade.

Zorena disse – Ela dormir. Tempestade apenas recurso em afastar os medrosos. Preparar. Perigo em fortaleza.

Chegaram ao portão da fortaleza. Parecia uma caverna escura. Há muitos anos o portal de metal e madeira havia ruído e não restava deste, nem pó.

A água estava empoçada sob a sombra do portal que atravessava o espesso muro, como um túnel. Kyle percebeu o ataque, quase tarde demais. Atirou-se no chão para evitar o safanão dado pela criatura camuflada que se desprendeu das paredes rochosas. Zorena afastou-se e Gorum observou atônito o construto de pedra avançar rangendo em sua direção. Desembainhou sua espada para se defender. Podia ver apenas seus contornos. Tinha cerca de três metros, tronco largo, pernas grossas em torno dos pés e finas acima destes. Os braços tinham forma semelhantes, eram largos blocos perto das mãos que lembravam marretas ligados ao torso por estrutura relativamente fina. A cabeça era pequena e enterrada no tronco, sem pescoço e algo reluzia a partir desta.

Gorum recebeu uma marretada que o arremessou para fora do portal. Ele rolou e parou na beira do penhasco que descia íngreme em direção à praia por cerca de cinquenta metros. Zorena recuou mais e a criatura seguiu-a para fora. Andava a passos largos, porém, lentos. Kyle se esgueirava pelos cantos tentando não atrair atenção.

Zorena sacou uma pequena adaga e lançou contra o olho da criatura. Era uma pedra polida e negra do tamanho de uma bolacha. A adaga fincou-se ao lado, numa reentrança cheia de musgo e pequenas plantas. Sob a luz do dia, puderam ver um gigante de pedra coberto de musgo e plantinhas crescendo de suas frestas e rachaduras.

Zorena gritou – Bruxo! O olho ser chance!

Kyle saltou sobre as costas da criatura e escalou com grande agilidade. O bloco enorme no lugar da mão veio sobre ele, mas ele escapou saltando sobre a cabeça. Segurou-se numa arvorezinha que crescia no ombro fazendo-a dobrar e lascar. Ficou pendurado contra a porção frontal. Zorena notou que Kyle lutava de olhos fechados. Um novo golpe veio e Kyle desviou-se no último instante levando o bico de sua bota contra o olho da criatura. Atingiu-a com precisão, A esfera de vidro negro cravada no rosto do construto foi estilhaçada. Este estremeceu e caiu levando Kyle consigo. Ele rolou ganhando algumas escoriações até parar perto de Zorena. Ela lhe estendeu a mão e ajudou-o a levantar-se. Blackwing tinha um corte no rosto. Sangue e lama misturados escorriam, lavados pela chuva forte.

Gorum sentia dores fortes, mas conseguiu erguer-se e passou a resmungar.

– Isto ser começo – a mulher avisou.

– Eu sei – Kyle ainda tinha o coração acelerado. Uma grande diferença entre as visões e a realidade era a dor e o cansaço – Vamos!

Atravessaram o portal e chegaram no pátio da fortaleza. Um escadaria semi arruinada conduzia até um plataforma a base da torre. Vista dali, parecia bem mais alta que antes. Mas Kyle não tomou a direção da torre.

– Onde bruxo ir? – Zorena tomou-o pelo braço – Grisma em torre.

– Não vim aqui para ver a bruxa imortal, mas um de seus prisioneiros.

– Prisioneiros? – Indagou Gorum com uma careta de dor.

– Sim. Esta é uma prisão sem muros.

– Mas hein?

– Apenas venham, depressa.

Seguiram-no e Zorena estava perplexa. Ela viveu ali alguns anos, mas nunca soube que o local era uma prisão. O que mais Kyle saberia sobre aquele local e sobre Grisma que ela ignorava?

Kyle os conduziu a um outro portão, menor, e que levava a uma escadaria descendente. Zorena tirou um frasco de óleo de um dos bolsos de seu traje e improvisou uma tocha. Aquelas passagens subterrâneas pareciam não ver gente há muito tempo.

Gorum e Zorena sentiam-se perdidos, mas Kyle parecia saber onde queria chegar. Como antes, seguia de olhos fechados, mas sem sofrer um tropeção sequer.

Além dos pássaros pescadores, insetos e pequenas plantas, não parecia haver nada vivo naquela ilha. Havia uma cela com uma porta de metal que se desfez em pó assim que Kyle a tocou. Em seu interior, havia um esqueleto preso a correntes de metal sem ferrugem. O esqueleto estava todo unido, exceto pelas pernas e bacia que não puderam localizar.

O esqueleto ergueu a cabeça e falou numa língua incompreensível. Gorum e Zorena estremeceram. Kyle pode compreendê-lo e retrucou na mesma língua.

O esqueleto gargalhou.

Kyle pediu a Gorum – Me ajude aqui – Ambos pegaram as correntes de deram fortes puxões até que o local onde estavam presas à parede cedeu. O esqueleto veio ao chão. Seus pulsos estavam presos à corrente por uma espécie de boca espinhosa.

O crânio era proeminente e os braços bem compridos. Kyle e Gorum ergueram-no. Ele estava todo desengonçado e xingava manifestando sua insatisfação sobre o modo como estava sendo manipulado.

– Agora sim – anunciou Kyle – Estamos em condições de confrontar Grisma – Gorum, leve-o, por favor, eu mostrarei o caminho.

Quando chegaram lá fora, a tempestade já havia acabado. Gorum sentiu-se estranho carregando aquela coisa. Sob a luz do dia, puderam ver a tonalidade amarelada dos ossos. Ele falava ocasionalmente, mas Gorum não compreendia.

– Ele pediu para virá-lo em direção ao sol – traduziu Kyle.

A criatura passou a entoar um cântico numa tonalidade grave e sombria.

– Aí está! Sim, mais uma vez, posso evocar poderes ao meu favor – Gorum pode compreendê-lo como se falasse lacorês. Zorena, por sua vez, compreendeu como se falasse sua língua natal.

Kyle disse – Teris, estes são Gorum e Zorena.

O esqueleto curvou-se para Zorena e disse – Teris'Ful Garth, encantado por sua rara beleza.

A espiã recuou e disse – É o primeiro meio-esqueleto falante que conheci, mas pelo menos é educado.

A caveira deu uma boa gargalhada – Já não me resta muita coisa mesmo. Há há há rê rei! E obrigado ao cavaleiro por me fazer o papel das pernas que me faltam – disse girando o crânio para falar face a face com o gigante.

– Por nada.

– E então, meu salvador, em que posso servi-lo? – indagou girando a cabeça e voltando-se para Kyle.

– Nós vamos subir – indicou a torre, agora mais escura depois de absorver a água da chuva. Subiram a escadaria até chegar na entrada. A torre era oca e a subida foi longa e cansativa. No ponto mais alto encontraram um beco sem saída. No alto, viram a alça de um alçapão a mais de dez metros acima.

– Você esteve aqui antes, não é, Zorena?

– Sim. Havia uma escada vertical que descia, mas esteve sempre aberta. – Zorena falou sendo compreendida com clareza pelos lacoreses.

– Teris, poderia fazer algo? – pediu Kyle.

– Vejamos – o esqueleto estalou os dedos e iniciou um cântico. Devido à magia de tradução, todos puderam entender o sentido.

"Vento carregue meu sussurro.

Para além da pedra, acima deste muro.

Nossa subida não foi em vão,

destravemos o alçapão"

Escutaram um estalo e a porta desceu rangendo suavemente. Teris gesticulava com os dedos esqueléticos para o alto, como se estivesse tocando uma harpa, ou coisa semelhante. A escada de metal deslizou pouco a pouco para baixo.

– Não foi nada, nada mesmo! Nem precisam agradecer.

Kyle assumiu a dianteira.

Gorum instruiu – Segure-se em mim – e tocou a escada, mas antes de subir, Teris objetou.

– Mas, ora, primeiro as damas – gesticulou para Zorena.

A mulher seguiu e Teris foi veloz em cutucar Gorum apontando para o traseiro dela. Ainda que desprovido de expressão facial, o queixo totalmente caído do esqueleto passou o recado. O gigante sussurrou sorrindo – Depravado... – e observou com interesse as formas da moça evidenciadas pelas calças de couro.

Teris sussurou de volta – Agora sim, estou apaixonado. Pena que não tenha mais um corpo para aproveitar as coisas boas da vida. Se eu pudesse, abdicaria de minha imortalidade para isso.

Gorum riu-se – Mais uma coisa para riscar da minha lista de desejos: imortalidade.

Gorum e Teris subiam a rir ruidosamente e Kyle, lá de cima, chiou pedindo silêncio.

No alto, havia um extenso jardim de proporções que só podiam ser explicadas por efeito de magia. O local era belíssimo com arbustos repletos de flores brancas, pequenas árvores frutíferas, canteiros com flores variadas, caminhos de pedra e pontes que passavam por uma rede de riachos de águas límpidas e cheios de cardumes de peixes. Alguns monólitos e outras estranhas estátuas de pedra cinzenta podiam ser vistos aqui e ali. Adiante, após uma espécie de avenida, havia uma construção metálica e de vidro semelhante a uma estufa, mas de grandes proporções. Seu interior era habitado por aves coloridas e outras espécies de plantas exóticas. Era um lugar paradisíaco que rivalizava em beleza até mesmo com Banzanac.

Zorena sentiu emoção ao pisar novamente naquele local. Tinha apenas memórias remotas de sua presença ali, pois haviam sido eclipsadas inexplicavelmente.

Kyle seguiu pela avenida de cascalho fino e esbranquiçado que ralhava suavemente a cada passo.

Zorena o seguiu, mas quase sem produzir ruído e Gorum, produzindo o alto rache-rache com seus pés pesados.

À frente do palacete de vidro havia uma pracinha circular com cinco estátuas de pedra de desenho similar ao guardião do portão. As estátuas estavam limpas e perfeitamente polidas. Havia símbolos desenhados e uma sugestão de mãos, pés e rosto desenhados em relevo sobre os blocos rochosos. Gorum ficou apreensivo e Kyle seguiu ignorando-as.

Duas se precipitaram sobre Kyle com agilidade maior que o construto anterior. Kyle saltou para escapar do primeiro e rolou escapando de uma forte pancada do segundo.

Teris indicou e ordenou – vire-se para lá!

Gorum obedeceu e escutou um breve cântico em que palavras pareciam se sobrepor. "Vento-girou-faísca-cresceu-relâmpago-saiu!"

As mãos dos esqueleto foram envolvidas por eletricidade que circulava em arcos que produziam zumbido característico. Recitou a canção até que no final um raio voou certeiro contra a cabeça de uma das estátuas. O olho de vidro negro se estilhaçou e a estátua mais próxima da dupla ruiu.

Zorena sacou uma adaga e atirou-a contra o olho do construto que vinha, veloz. Foi um tiro certeiro e ela precisou de uma acrobacia para escapar da massa de pedras que tombou em sua direção.

– Para lá – Ordenou Teris – Gorum teve a sensação que empunhava uma poderosa balista. "ZAZZ! ZAPT". Mais raios elétricos zuniram das mãos do imortal contra as estátuas.

Kyle recebia uma marretada que afundou a terra ao seu lado. Agarrou-se ao braço frio da criatura, tomou um impulso e ficou de ponta cabeça. Pousou com ambos calcanhares sobre o olho de vidro que se quebrou. Seu movimento continuou. Girou no ar e caiu no chão como um gato. Seus olhos fechados ignoravam as imagens ao seu redor, mas o sentido da terceira visão que aprendera a manipular, permitia que visse a realidade de uma nova maneira. Mesmo estando de costas, percebeu que as portas do palácio se abriram e que alguém saiu.

Gorum e Teris ficaram atordoados pela visão da mulher lindíssima que surgiu. Tinha o rosto maquiado, olhos contornados por tinta azulada, lábios bem vermelhos e cabelos prateados penteados como uma cascata ascendente erguendo-se por uns dois palmos acima da testa. Usava véus brancos com muita transparência que revelavam os contornos sensuais de seu corpo nu. Ambos ficaram boquiabertos numa espécie de transe de pura admiração.

Kyle virou-se para a bruxa, mas não foi afetado, pois de olhos fechados, enxergava-a de outro modo.

– Grisma, guardiã desta terra, não desejo combatê-la. Escute minha proposta e façamos as pazes.

– E quem és tu para invadires meu lar com quaisquer proposições?

– Sou Kyle Blackwing e sou um dos abençoados por Asimi.

– O que tu desejas, abençoado.

– Dê-nos uma das Gemas de Tarquis e nos deixe partir.

Grisma gargalhou – Tu achas mesmo que darei uma das relíquias que jurei guardar?

– Será usada para uma boa causa. O mundo poderá se perder nas trevas, mais uma vez. Marlituk, o corruptor, está prestes a ser liberto.

– Ladrão mentiroso! Vens até mim para proferir absurdos e profanar meu jardim sagrado. Não te perdoarei!

Ela ergueu uma das mãos e Gorum largou Teris no chão. O gigante sacou sua espada e avançou contra Kyle que desviou-se do ataque com facilidade.

– Zoe, me deves a tua vida. Abate este profanador.

Zorena sacou seu par de espadas e veio confrontar Kyle.

Kyle ampliou sua concentração para prever o próximo ataque de Gorum. Esquivou-se e avançou simultaneamente para aplicar um possante golpe contra o peito de Gorum que tirou seu fôlego.

Zorena atacou Kyle, mas hesitava. Não tinha a mesma convicção de seu primeiro confronto. Kyle encontrou uma brecha e golpeou-a num ponto vital fazendo-a tombar a ponto de desmaiar.

Enquanto isso, Grisma tentou comandar Teris, mas falhou. Desistindo desta tática, atirou-se contra Kyle numa velocidade incrível. Suas unhas se revelaram como garras afiadas que cortaram o tecido da roupa em três rasgos em paralelo dos ombros até o peitoral. A velocidade sobre-humana de Grisma superava a capacidade de Kyle de antever os movimentos, mas não o impedia de contra-atacar. Seu chute atingiu-a na lateral, fazendo-a arquejar. Ela estava confiante demais e não esperava por isso. Mesmo sendo um ferimento leve, doeu e prejudicou sua respiração. Assustada, ela correu de volta para seu esconderijo.

Kyle sentiu seu ferimento latejado, mas ignorou-o colocando-se em perseguição. No interior da estufa teve que parar para defender-se de um ataque de um bando de aves. Nenhuma tinha porte para apresentar real perigo, mas arrancaram de Kyle alguns arranhões antes que ele as derrubasse. Depois disso, percebeu que não sabia para onde a bruxa havia ido.

Observou que no interior havia cadeiras, poltronas, espelhos, mesas repletas de belos objetos finamente decorados, mas a terceira visão de Kyle não era capaz de captar sua verdadeira beleza artística. Via em todas as direções, mas não podia enxergar certos detalhes e tão pouco, as cores.

Na sala seguinte, havia um esquife de vidro. Em seu interior jazia uma pessoa. Uma forte energia emanava dali. Seria Grisma?

– Por favor – veio uma voz, mas Kyle não conseguiu perceber de qual direção – estava errada sobre ti. Vejo que tens um bom coração e nobre propósito.

Kyle seguiu até o esquife. Um arbusto próximo transformou-se na bruxa que avançou contra Kyle veloz como um bote de serpente. Tinha uma adaga nas mãos e cravou-a nas costas dele. Ele girou agarrando o braço dela puxando-o com toda força. A mulher gritou de dor. Teve o braço deslocado e foi atirada no chão. Kyle caiu sobre ela e envolveu as mãos em seu pescoço apertando com toda força. Ela se debateu e finalmente morreu asfixiada.

Kyle teve dificuldade para erguer-se. Para sua surpresa, o esquife se abriu e dele ergueu-se uma figura sinistra que gritou com uma voz assombrosa.

– Maldito sejas! Mataste meu precioso e belo corpo! – Uma explosão de vento partiu de seus braços atirando Kyle através de uma das paredes de vidro. A criatura volitou para além do caixão seguindo-o.

Kyle perdeu sua concentração, abriu os olhos e viu tudo girando. Viu-se no primeiro cômodo e tinha deslizado sobre a mesa que continha dúzias de pequenos objetos, frascos e instrumentos de jardinagem.

A bruxa voou por sobre a mesa para alcançar Kyle, que estava caído de lado cheio de ferimentos por corte. Ele viu com horror a aproximação da bruxa que tinha o corpo seco e escuro como um tronco de árvore morta. Os olhos eram alaranjados, brilhantes, a boca enorme, cheia de dentes pequenos e afiados, as feições eram horripilantes e seus longos cabelos brancos esvoaçavam.

– Maldito! Maldito! – sua voz era irritante e aguda.

Seria o fim de Kyle se não fosse a chegada de Teris'Ful Garth, que entrou ali se arrastando. Disparou de imediato um possante relâmpago que incendiou as vestes antigas e rotas da bruxa. Seus gritos apavorados eram quase ensurdecedores.

Teris gargalhava e disparava repetidos relâmpagos contra ela cujo efeito acumulado culminou com a explosão de seu corpo em pleno ar. Gorum entrou seguido de Zorena. Foram prestar auxílio a  Kyle.

– Ei, vocês dois! Olha o preconceito... Eu também preciso de ajuda para me levantar. – resmungou o esqueleto.

Zorena foi acudir Teris, enquanto Gorum perguntava – Garoto, você está bem?

– Não imaginava que... ai! Me machucaria tanto... Mas ao menos estava certo, vencemos.

Gorum conduziu Kyle que mancava e sangrava muito. Olhou para o rosto da bruxa queimado no chão e disse – Que coisa feia dos infernos!

– Há – zombou o esqueleto – mas você ficou caidinho por ela!

Retornaram para a câmara do esquife e dentro dele encontraram um colchão roto. Teris levitou-o para longe com um de seus cânticos rimados. Abaixo dele havia uma caixa de madeira finamente esculpida com detalhes em metal e pedras preciosas. Teris se atirou dos braços de Zorena, apoiou-se no esquife e abriu a caixa com avidez. Um brilho azulado emanou de seu interior. Teris deu uma gargalhada triunfal. Havia nove pedras ovais descansando em espaços esculpidos no interior da caixa.

– Nove pedras de almas! Nove! Há há há!

– Não soou como se você fosse fazer algo de bom com elas – disse Gorum.

– Usarei uma destas para satisfazer seu desejo, Blackwing. Depois disso, seguiremos nossos caminhos. O que me diz?

Kyle estendeu a mão ensanguentada para selar o acordo com um aperto de mãos.

– De volta ao navio, a noite se aproxima. – disse Kyle.


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