CAPÍTULO 44

Um mês havia se passado desde que Örion escapou com os outros da emboscada nas ruínas de Ilm'taak. A floresta de Adrastinn, lar do clã sílfico de Örion Erendon, Irscha e Keledrel, ardia em chamas. O exército de Saubics avançava causando destruição. Ao longe, Örion montava Zitrehidel e observava, impassível, sem demonstrar seus sentimentos, enquanto a floresta que foi seu lar era consumida pelas chamas e loucura.

Um cavaleiro galopava vindo da direção oposta sem que o rapaz percebesse. Örion estava absorto num transe de tristeza observando seu lar ruir. Mas, felizmente, o cavaleiro que se aproximava não era um inimigo. Foi o instinto do cavalo, Ferro-em-brasa, irmão de Zitrehidel, que trazia Rílkare diretamente àquele local.

- Örion! - gritou Rílkare, galopando velozmente.

Örion virou-se, quebrando o transe - Rilks? É você? Você está vivo!

O nobre humano aproximou-se até que e ambos desmontaram e se abraçaram. Rílkare chorava - Que bom que cheguei a tempo! Pensei que...

- Eu também! Mas como?

- Eu devia ter ouvido a você e ao Con, - lamentou Rílkare - quando me advertiram sobre o rei Kel...

- Era ele a face do mal!

- Sim Örion! - admitiu Rílkare desconsolado - Foi ele quem planejou tudo. A guerra e até mesmo os desaparecimentos.

- Tudo tinha seu propósito... As mulheres e crianças libertadas na fronteira de Adrastinn, foi assim que o maldito convenceu seu povo de que nós silfos éramos culpados pelos raptos, que nós estávamos utilizando-as para rituais macabros.

- Algo que convenceu rapidamente pessoas como Eskallurè. Agora todo seu povo está condenado!

- Maldito seja seu Rei! - Örion estava indignado.

- Não posso considerar uma pessoa assim como meu Rei. Nós precisamos impedi-lo!

- Impedi-lo? Mas como?

- Talvez, se provarmos ao povo, que ele esteve por detrás de tudo isso. Se pudermos libertar as outras mulheres raptadas... - Rílkare puxou os cabelos, num gesto nervoso.

- Örion, eu acho que sei onde estão sendo mantidas.

- Verdade?

- Há uma cidadela, uma fortaleza ao redor de uma torre negra, numa clareira profundamente escondida na Floresta Proibida.

- Na Velha Floresta... É claro!

- Precisaremos de ajuda. Onde está Irscha? E os demais?

- Irscha está com a expedição para o refúgio. Não poderíamos chamá-la agora, é muito arriscado para alguém na condição dela.

- Condição?

- Sim, ela espera um filho meu.

- Filho? Deveria lhe felicitar, mas numa situação como estas... Mas afinal, por que você está aqui sozinho?

- Para mim, foi determinado outro destino. Confiaram a mim, o antigo espírito Aznevendor e a missão de navegar para a terra esquecida dos ancestrais. O mal que se espalha em nossas terras é antigo e poderá ameaçar todo o mundo. Meu dever é avisá-los desta ameaça.

- Avisar a quem? Isto não faz sentido.

- Meu povo guarda um segredo, o da existência do reino invisível de Nelfária.

- Nelfária? O que é isso? Contos de fada?

- É o antigo reino de nossos ancestrais, os elfos.

- Elfos? Todos sabem que estes foram extintos há muitos mil anos.

- Não! Isso é o que eles querem que todos pensem. Veja - o rapaz retirou da bolsa um livro de aparência incomum, e que parecia ser antiquíssimo. - aqui está o livro de Aznevendor.

Rílkare abriu o livro e surpreendeu-se - Ué? Mas não tem nada escrito nele!

- Trata-se de um livro encantado. Respostas aparecem na forma de texto ou imagens, conforme fazemos perguntas.

- E ele sabe responder qualquer coisa?

- Não, mas possui vastos conhecimentos. Como dizia, Aznevendor foi um feiticeiro élfico que lutou na antiga guerra contra hordas demoníacas, há mais de quatro mil anos atrás. Em momentos de desespero, ele se ofereceu para que seus companheiros, pesquisadores de magia, testassem nele um tipo de magia poderosa e que transportava a alma para fora do corpo. Seu corpo era mantido protegido, mas foi perdido. Tomou o corpo de outros seres vivos, mas sob grande instabilidade. Os novos corpos se deterioravam e sucumbiam após um ano ou dois. Ele sofreu muito, morreu diversas vezes, cumprindo missões suicidas. Muitas informações importantes foram obtidas através de seus sacrifícios. Com o fim da guerra, Aznevendor sentiu vontade de repousar e realizou ele próprio o ritual de transferência de sua alma para este livro, onde poderia descansar e ser útil como fonte de informação às gerações futuras.

- Ótimo! Com este livro, nossas chances de obter sucesso certamente serão ampliadas!

- Eu não vou me envolver, tenho uma importante missão a cumprir. Preciso avisar os antigos...

Rílkare estourou de raiva e acertou um tapa no rosto do amigo. Em seguida esbravejou - Seu egoísta! É assim então? Vai simplesmente abandonar seus companheiros? Poul e Keledrel estão cativos! Além deles dezenas de mulheres e crianças inocentes...

Uma lágrima escorreu no rosto do silfo que se encolheu assuntado - Rilks...

Rílkare sentiu o rosto inflamar com vergonha - Perdoe-me Örion, eu perdi a cabeça, aliás, perdi tudo...

- Perdeu tudo? Do que está falando?

- Meu pai, Örion, ele foi assassinado.

- Mas como? Por quê?

- Não sei de detalhes, sei apenas que isto foi obra do maldito rei Kel. De certo, meu pai descobriu sobre atrocidades cometidas pelo rei, incluindo o assassínio que cometeu dos dois irmãos, e intencionava revelar isto ao povo. Con viajou até Balish para investigar este fato, nos separamos há poucos dias.

- Então, Con está bem?

- Nem tanto, recaiu sobre ele uma terrível maldição. Aquele pequeno pirilampo negro, Cretàh, lançou-lhe um feitiço e que rouba, por vezes, sua força de vontade, transformando-o em seu serviçal.

- Mas se é assim, como pode ser que esteja trabalhando junto consigo?

- Consegui enganar Cretàh e alcançamos, por hora, um ponto de equilíbrio.

- Como assim?

- Encontrei sua toca, numa árvore oca, na Floresta Proibida. De lá, subtraí um amuleto, muito especial para o Cretàh. Com isso, consegui barganhar com o maldito e libertar, ao menos parcialmente, o pobre Con.

- Compreendo. Olha, Rilks, sinto muito pelo seu pai... E não é por isso que o perdoarei pelo que fez... - o silfo tocou a face, ainda vermelha e latejando do golpe recebido. - Agora entendo... Você carrega o amuleto do pirilampo corrompido, certo?

- Sim.

- Sabia! Senti um choque ao abraçá-lo, agora a pouco. Há energia maligna em você. Este amuleto está lhe fazendo mal. Precisamos reverter esta situação, o quanto antes. Deixe-me ver...

Rílkare mostrou o amuleto que estava preso a uma corrente em seu pescoço.

- Sim, é um nexo canalizador de poder.

- O que?

- Trata-se de um objeto mágico muito poderoso que canaliza poderes para seus usuários, alguns destes foram feitos no passado e dados como presente a criaturas ambiciosas. Com o tempo, lhes confere poderes e capacidades além de seus próprios, mas também corrompe o corpo e a alma, fazendo-os escravos de um senhor maligno. Isto já está acontecendo com você, foi por isso que chegou me golpear.

Rílkare tomou o amuleto nas mãos e pensou em atirá-lo para longe, porém hesitou. - Mas quanto a Con? Sem o amuleto...

- Não sejamos precipitados, guarde-o, por hora. Já não devemos permanecer aqui.

- E o que vai ser?

- Vou ajudá-los, é claro. Depois, darei um jeito de honrar minha missão e navegar para a antiga Nelfária.

- Muito bem. - Rílkare segurou o amigo pelo ombro - Vamos, temos que ir ao ponto de encontro. Consegui a ajuda de uns poucos homens leais a meu pai. Somos todos agora desertores. A guerra segue intensa e precisamos ser rápidos e agir antes que Kel nos perceba como uma ameaça. Além destes, há também os mercenários que estou tentando contratar. A torre negra não parece ter muitas defesas, mas precisamos aumentar nossas chances de um ataque bem-sucedido.

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