Capítulo Quatro

Otávio Miller

Continuo parado no corredor da casa dos meus tios e sinto uma súbita vontade de chorar, mas me controlo. Respiro fundo e apresso meus passos até à saída, implorando a Deus para não encontrar ninguém, mas como nada na minha vida é do jeito que eu quero, eu quase esbarro com meu tio Apolo ao chegar na sala de estar.

- Otávio? Surpresa te encontrar aqui tão cedo. - Ele diz e abre um sorriso, pois tenho certeza que já encaixou as peças em sua cabeça.

- É... Eu vou indo, tio. Tchau! - Me despeço de forma rápida e saio quase correndo porta à fora.

Encontro meu carro estacionado no pátio em frente à casa e entro no mesmo, agradecendo mentalmente o fato de tio Apolo ter aberto o portão sem nem eu mesmo pedir. Dou partida no veículo e saio da propriedade dos meus tios, seguindo apenas mais dois quarteirões para chegar a minha própria casa, já que moramos no mesmo condomínio.

Minutos depois estou estacionando na garagem de casa e saio do carro, ansiando apenas tomar um bom banho e me jogar em minha cama. As palavras ditas por Héktor ainda ecoam em minha cabeça e solto longos suspiros enquanto entro em casa, encontrando tudo no mais completo silêncio. Dou alguns passos em direção às escadas, mas paro assim que ouço um pigarreio atrás de mim.

Fecho meus olhos e respiro fundo, antes de me virar e encontrar meu pai Enzo sentado no sofá. Ele tem um jornal nas mãos, mas seus olhos estão fixos em mim como o de uma águia. Ok, Otávio, é só o seu pai.

- Oi papai! Cadê papai Angie? - Pergunto com um sorriso, querendo mudar o foco, mas eu sei que não vai funcionar.

- Ele teve uma emergência no hospital. E não venha com essa, Otávio, você sabe do combinado. Olha, eu não ligo que você vá para festas e tudo mais, mas avise quando for dormir fora. Você pode ser adulto e ter sua independência, mas eu ainda sou seu pai e me preocupo quando não está em casa. - Ele diz de forma séria e eu sei que vacilei.

- Desculpa, não foi minha intenção preocupar ninguém. - Peço, pois é a verdade.

- Você precisa pedir perdão a si mesmo, filho... Espero que perceba o rumo que está fazendo sua vida tomar. Eu te amo muito e ver o que está acontecendo há anos me mata, mas a vida é sua e eu não vou interferir. - Ouço suas palavras e um nó se forma em minha garganta.

Abro minha boca para o responder, mas desisto e subo às escadas com pressa, só querendo me afundar em meio aos meus travesseiros. Chego ao meu quarto segundos depois e entro no cômodo, fechando a porta atrás de mim. Corro até o banheiro e tiro minhas roupas com pressa, querendo me livrar do que aconteceu noite passada, mas sei que isso não vai acontecer.

Sinto a água quente cair sobre meu corpo e junto dela também caem as minhas lágrimas. Fecho meus olhos e me lembro do olhar magoado de Héktor para mim e isso acaba comigo. Nunca foi minha intenção o machucar, mas ele tem razão em dizer que perdi o bom senso. Eu realmente não me lembro do que houve na noite passada, é tudo como um borrão por causa da bebedeira. E é exatamente por isso que eu deixo a bebida falar mais alto, pois eu sei que depois não vou me lembrar para me arrepender.

Eu sei, isso é triste e até nojento da minha parte, mas eu não sei ser diferente. Eu posso transar com os caras mais bonitos, ter a carreira dos meus sonhos, ter uma vida boa, mas eu não sou feliz e sinto que nunca mais vou ser. Minha vida começou a desmoronar há mais de cinco anos atrás e desde então nunca mais voltou a ser como antes, até porquê isso seria impossível.

Termino meu banho após alguns minutos, ainda remoendo minhas atitudes. Me enrolo em um roupão macio de banho e saio do banheiro com uma toalha em mãos, enxugando meus cabelos. Ando alguns passos em direção à minha cama, mas paro ao levar um susto, vendo Giovani deitado ali. Eu nem percebi que havia alguém dormindo em minha cama, mas eu já devia imaginar. Até hoje, já tendo vinte e quatro anos, nós temos a mania de às vezes dormir juntos, como sempre fazíamos quando crianças.

Abro um sorriso pequeno e sigo até minha penteadeira, ligando meu secador na tomada, começando a secar meus cachos em seguida. Termino alguns minutos depois, me sentindo cansado pela noite de ontem e vou até minha cama, me deitando ao lado do meu irmão, que automaticamente me puxa para seus braços.

- O que aconteceu? - Ele pergunta em um sussurro e eu já deveria imaginar que ele acordou com o barulho do secador.

Solto um suspiro e abraço Gio mais forte, afundando meu rosto em seu peito. Suas mãos passam de forma carinhosa por minhas costas e seu cuidado comigo faz às lágrimas retornarem aos meus olhos.

- Eu transei com Arthur e quando estava saindo do quarto dele Héktor me viu. - Conto de uma vez, pois eu não tenho segredos com meu irmão.

- Oh não, Otávio... Você sabe que Hék é apaixonado por ele há anos. - Ele diz, mas não há julgamentos em sua voz.

- Eu sei e jamais quis o machucar. Depois de alguns copos de bebida eu não sou mais a mesma pessoa. - Falo com a voz embargada e ouço ele suspirar.

- Me desculpa não ter cuidado de você ontem, posso até ter te incentivado a beber e eu não quero isso. Você sabe que tem que parar, maninho... Isso não faz bem a você, nunca fez. - Gio fala em um tom preocupado e isso me dói ainda mais.

- Eu quero, mas...

- Você é forte, Otávio... Não precisa da bebida para fugir da realidade. Só pense que Luz jamais gostaria de te ver assim. - Ele diz e então eu não consigo mais segurar minhas lágrimas.

Comecei a me apegar à bebida alguns meses depois da morte de Luz. Eu sabia que minha família estava ao meu lado, mas precisava de algo a mais para tapar o vazio deixado em meu peito e a bebida foi a ilusão perfeita. Não é como se eu fosse viciado, eu acho que não sou, mas há momentos em que apenas me afundo nela para esquecer. Assim como os vários caras com quem já fui para à cama, apenas para tentar criar a ilusão de que eu não preciso mais dele.

Não faço ideia de quanto tempo fico abraçado ao meu irmão, chorando em seu peito, mas em algum momento eu me entrego ao sono.

[...]

Ouço risadas infantis e isso faz com que eu abra meus olhos mais que depressa, para procurar a fonte de onde vem. O sol está alto no céu, mas sinto uma brisa boa passando por meu corpo. Meus olhos percorrem o campo aberto e sinto meu coração parar em meu peito ao encontrar o que procuro. Em um balanço, a poucos metros de mim, há uma pequena garotinha, que ri enquanto é empurrada pelo vento.

Perco totalmente às forças em minhas pernas e caio de joelhos na grama, sabendo quem ela é. Seus olhos castanhos claro, os cachos ruivos e o sorriso encantador não me deixam enganar... Eu sei que é ela, minha Luz.

- Filha? - Chamo em um sussurro, pois as lágrimas me impedem de gritar por ela, mas ela me ouve.

Observo o pequeno balanço ir parando aos poucos e então ela desce, vindo até mim. Seu tamanho é tão pequeno e minha vontade é abraça-la e protegê-la, mas eu sei que ela está mais segura do que eu.

- Oi papai! - Ela sorri com seus dentinhos pequenos e eu não aguento, apenas a puxo para meus braços, apertando seu corpo pequeno contra o meu. - Está tudo bem, papai... Eu te amo, a culpa não foi sua.

Ouço suas palavras e meu choro se intensifica ainda mais. Eu sei que isso é um sonho, pode ser um, mas para mim é tão real estar abraçando-a e sentindo seu cheiro doce.

- Por que eu nunca sonhei com você antes? - Acabo perguntando ao me afastar e ela sorri, trazendo suas pequenas mãos ao meu rosto, secando minhas lágrimas.

- Não era a hora, mas agora estou aqui. Eu sei que está muito triste desde a minha partida, papai, mas você não pode desistir. Sua oportunidade de recomeçar está chegando e eu quero muito que vocês sejam felizes. - Ela diz e eu fico confuso.

- Vocês quem, amor? - Pergunto e ela apenas ri.

- O senhor sabe... Só precisa dar uma chance, perdoar e pedir perdão. - Ela diz e isso me deixa estático. Não é como se eu estivesse falando com uma criança de quatro anos, é totalmente diferente. - Vem, me balança! - Luz pega em minha mão, me fazendo levantar e me puxa com ela até o balanço pendurado na grande árvore.

E então eu me esqueço de tudo e aproveito o tempo com minha filha, mesmo que apenas em meu sonho.

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゚・*:.。*:゚・♡

Evan D'Ávila

Meus olhos continuam presos em minha foto, de quando eu ainda era uma criança. Já faz alguns dias desde meu sonho, mas eu simplesmente não consigo esquecer daquela menina. Toda vez que fecho meus olhos eu vejo sua fisionomia perfeitamente e me convenço ainda mais de que a conheço de alguma forma. Eu acabei até ligando para os meus pais, perguntando se eles conheciam alguma criança chamada Luz, mas nada.

- Ei, já estou indo... Preciso arrumar minhas malas também. - Ouço a voz de John e levanto meus olhos, vendo ele parado na porta do meu quarto. - Ainda nisso, Evan? - Ele pergunta em um suspiro.

- Eu só não consigo esquecer, existe algo por trás desse sonho. - Falo e vejo preocupação em seus olhos.

- Ou é apenas um sonho. - Ele diz pela milésima vez e se senta na beirada da cama, onde estou. - Olha, acima de tudo somos amigos e eu não quero que você crie uma obsessão por causa desse sonho, isso pode te fazer mal.

Solto um suspiro, deixando o álbum de fotos de lado e eu sei que ele tem razão, mas é muito mais forte do que eu.

- Tudo bem, eu vou esquecer. - Falo e levanto minhas mãos, como em rendição.

- Vou fingir que acredito. - Ele diz rindo. - E então, já contou aos seus pais que está indo passar um tempo por lá? - Ele questiona e eu nego com um aceno.

- Não, quero fazer uma surpresa. E você, já avisou seu pai? - Pergunto e vejo sua expressão mudar.

- Ele não se importa mesmo. - Dá de ombros e isso me deixa triste por ele.

- Você sempre tem a mim. - Sorrio para ele e abro meus braços, em um convite mudo para um abraço.

- Eu sei, por isso você é minha única família... A que me dá valor. - Ele diz, me abraçando apertado.

Deixo um beijo em sua cabeça, pois ele não está errado. Também tenho John como parte da minha família, posso não o amar como homem, o que eu sei que ele também não faz, mas o amo como meu melhor amigo. Sabemos das dores um do outro e nos fortalecemos juntos.

Ele se despede de mim alguns minutos depois e eu me jogo na cama de qualquer jeito, fazendo o álbum de fotos cair no chão. Me debruço sobre à cama e estico a mão para pegar o álbum e algumas fotos que acabaram saindo das repartições. E ao pegar uma em especial, eu sinto meu coração quase parar em meu peito.

Trago a fotografia mais para perto e respiro fundo ao ver Otávio e eu na mesma foto, ainda crianças. Viro o verso e leio a caligrafia escrita "Tatá aos três anos e foguinho com seis". Mas não é isso que chama minha atenção e sim os nossos traços. Automaticamente me vem à imagem de Luz e então me dou conta de que ela é uma verdadeira fusão de nós dois.

- Não, é só coisa da minha cabeça. - Falo comigo mesmo, ainda com os olhos fixos na foto.

Otávio não faria isso comigo, faria?

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Eita... Será????

O que acharam, jujubas???

Ps: Me desculpem os erros, meu dedos estavam congelando enquanto escrevia. Está frio na cidade de vocês?

Bjus da Juh, até a próxima 😘😘

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