𝙲𝙰𝙿𝙸𝚃𝚄𝙻𝙾 𝚇𝚇𝙸𝙸𝙸

𝓜𝓲𝓵𝓮𝓼  𝓢𝓶𝓲𝓽𝓱

A MINHA cabeça está fervendo quando eu acordo, observo a tela do meu celular que está brilhando, são cinco e meia da manhã, muito longe do horário que eu preciso me arrumar para ir para o inferno.

Decido ficar na minha cama e tentar me recuperar do surto de ontem à noite em minha casa; eu não consigo entender se aquilo realmente aconteceu ou foi apenas um surto coletivo. Fecho os meus olhos com força e abro de novo. Uma dor insuportável no pulso toma conta de mim; observo o mesmo, que possui a marca dos meus dentes bem fundos na pele, têm algumas manchas de sangue seco.

Chega a ser impossível mexer a minha mão direita, está praticamente dormente; tento controlar a dor. Na hora nunca parece doer, mas depois que a Adrenalina vai embora, a dor chega a ser sobrenatural.

O meu celular começa a vibrar loucamente, é o número do Joshua, ignoro o mesmo, não estou afim de falar com ninguém à essa hora da manhã. Logo a ligação some da tela e um trilhão de mensagens começam a aparecer na tela.

São todas mensagens dele me falando que ele e a gangue dele sabem aonde eu moro e estudo, e sabem todos os passos da minha família. Que ele precisa do dinheiro urgentemente. Não julgo ele, eu o devo há algumas semanas já, porque não achei que o meu pai fosse atrasar o pagamento que ele nos dá. Mas agora eu estou fodido de verdade; já que provavelmente a Amanda vai ficar com todo o dinheiro e não vai me dar um centavo.

Desligo o celular e me viro na cama, tentando achar uma posição confortável. Nada chega a ser necessariamente confortável, mas volto a focar os meus pensamentos autodestrutivos; volto a ter flashes dos meus pesadelos. Parece que agora os meus pesadelos representam o lugar mais confortável da minha mente.

Entro no meu próprio mundo paralelo e, diferente de outras vezes, eu começo a pensar o contrário; normalmente eu imagino como seria a minha vida como eu sendo um adolescente normal, que vai à festas e vive a vida normal com os pais normais que traem um ao outro; mas agora eu só consigo pensar em como seria incrível se eu nunca tivesse existido; como seria o mundo se eu estivesse pestes a pular do vigésimo andar de algum prédio ou de ponte ponte famosa.

Imagino como seria acabar com a minha dor interna com um simples pulo, ou com uma simples bala. Como a vida da Amanda seria incrível se ela recebesse a notícia de que o seu filho-nada-favorito-e-importante acabara de cortar os pulsos dentro da banheira do próprio quarto.

Eu tenho certeza de que essa seria a melhor experiência da minha vida: parar de existir.

Esses pensamentos me trazem uma certa felicidade, sempre me dá várias ideias, mas para ser sincero, eu nunca tentei nenhuma delas, justamente por causa da Hailee. Eu não sei porque aquela pirralha precisa tanto da minha atenção, não é como se eu amasse ela, mas ela não merece viver sozinha no mesmo ambiente que a Amanda.

Se eu estou aqui, certamente é porque a Amanda precisa descontar todas as magoas e ódios dela em mim; se eu estou aqui é porque a Hailee precisa de mim. E só por isso. Não há nada mais que me prende nesse lugar; eu já desisti várias vezes e fiquei à beira do desespero, mas eu soube voltar. Mesmo ultimamente estando muito difícil voltar ao que eu era uns três anos atrás, antes do vício tomar conta do meu ser.

— Miles, saímos em vinte minutos — a voz da Amanda invade o quarto do nada.

Observo ela na porta, apenas assinto e ela sai, fechando a porta. Reviro os olhos com força, mas eu preciso fazer isso. Saio da cama sem vontade nenhuma e vou para o banheiro.

Deixo a água extremamente gelada tomar conta de cada parte do meu corpo, fico cinco minutos pensando sobre o inferno que vai ser daqui a pouco. Saio do box e me seco, coloco a mesma roupa de sempre; um jeans escuro e uma camiseta preta.

Deixo o cabelo molhado e seco as gostas que descem pelo pescoço. Como ainda estamos na metade de agosto, as temperaturas ainda estão quentes durante o dia, então não levo nada de casaco.

Observo a marca dos meus dentes no pulso, vou até o banheiro de novo e pego um kit de primeiros socorros que a Amanda insiste em deixar por todas as partes da casa, pego uma faixa branca e enrolo no pulso, prendo com uma fita e coloco uma munhequeira e coloco por cima. Se eu aparecer só com a fita provavelmente vão achar que foi uma tentativa real de suicídio e a minha vida só vai ser pior. Com a munhequeira é uma simples torção no pulso.

Saio do quarto e desço as escadas, passo pela Amanda e pela Hailee que estão à mesa, tomando café. A Felicity não aparece aqui desde ontem, acho que ela e a Amanda provavelmente vão se separar.

Passo pela porta de entrada e vou para o carro da Amanda, espero até que elas venham para o mesmo. Demora certa de três minutos. Observo o meu celular, são oito e meia da manhã.

Elas saem de casa, Amanda tranca a porta e ambas vem para o carro. Hailee entra no banco de trás com a mochila e a Amanda entra no banco do motorista. O caminho é agradavelmente silencioso.

— Tchau, meu amor. Tenha um bom dia! — Amanda diz, assim que deixa Hailee na escola.

Desde os meus onze anos Amanda não me diz mais isso, não que eu ligue.

Mais dez minutos e estamos na escola. Ela estaciona o carro na frente e nós descemos, é péssimo ter que chegar assim na escola.

Faltam dez minutos para a primeira aula, provavelmente eu vou me atrasar. Quem liga?

Andamos direto para a sala da senhora Cooper, a diretora. Provavelmente a Amanda já conversou com ela, porque passa direto pela secretária, apenas bate à porta dela e logo entra.

— Bom dia, senhora Smith — a senhora Cooper diz e ambas apertam as mãos. — Podem se sentar. — Ela aponta para as cadeiras à sua frente. — Bom dia, Miles. — Ela me olha.

— Bom dia — respondo, sem vontade.

— Conversei com a sua mãe há algumas horas, creio que saiba porque estamos aqui — ela continua, assinto, com muita ironia. — Bom, para conhecimento de ambos, vou falar as medidas que iremos tomar: você terá duas sessões de terapia com a doutora Jensey, às segundas e sextas; você fará parte de algumas atividades extracurriculares, sendo elas: ajudar o Grêmio Estudantil com algumas ações tanto para o baile de agora quanto para o resto do ano letivo; também vai auxiliar o pessoal do Clube de Música nos ensaios; também temos algumas vagas no nosso Clube de Debate e no Clube de Idiomas. A escola também oferece a nossa Olimpíada de Conhecimento. — Ela une vários panfletos nas pastas. — Aqui estão todas informações das suas atividades obrigatórias e das que você pode escolher.

Ela falou tanto que eu me perdi, apenas pego a parta com a mão sem a munhequeira e coloco na minha mochila.

— Mais alguma coisa? — indago, cansado.

— Temos o seu problema mais grave, Miles. Vício em qualquer tipo de droga é um problema muito sério, que afeta muitos adolescentes da sua idade. Assim que as suas sessões com a doutora Jensey começarem, ela irá te indicar alguns Grupos de Apoio para adolescentes no seu estado.

Ela tem um sorriso gentil, mas não passa nada de tranquilidade, para mim soa até bem falso. Apenas concordo com a cabeça.

— Há algo que queira me perguntar?

Balanço a cabeça negativamente.

— Bom, a sua primeira atividade hoje é auxiliar a Kristen na sala de Música; às quatro horas — ela avisa. — Amanhã você tem que participar da reunião do Grêmio, o baile é em dois dias e você pode ajudar eles na organização.

Eu quero vomitar com tudo isso que ela está falando.

— Em caso de dúvida, é só me ligar de novo, senhora Smith — a senhora Cooper diz para a Amanda.

Apenas me levanto e saio da sala dela, já se passaram dez minutos da primeira aula, não vou participar dela. Espero a Amanda sair da escola e caminho para as mesas no fundo da escola; eu preciso pensar um pouco antes de entrar na segunda aula.

Que merda você fez com a sua vida, Miles!

Os meus pensamentos chegam a ser tão altos que parece que eu realmente estou falando. Fecho o pulso e dou um soco na mesa com a minha mão machucada. Tiro a munhequeira e vejo que está sangrando, a mesma dor volta e eu apenas coloco a munhequeira de novo. Deito a cabeça na mesa e espero até o horário da segunda aula.

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