Capítulo 5 - O Programa de Estudos Humanos: Diante do Conselho
Mirus pediu que ela esperasse no corredor, do lado de fora da sala do Conselho; ele logo viria chamá-la. Assim que ele entrou, a Conselheira Miti saiu de outra sala, passou por Olívia e disse:
– Finalmente todos irão te conhecer! – Disse isso, sorrindo e entrando na sala do Conselho.
Olívia lembrou dela, do teste para o emprego ainda na Terra. Naquele dia, ela parecera tão simpática quanto Mirus; e Aurosa falou muito bem sobre o tempo em que fora tutorada pela Conselheira junto à escola do Mestre da Natureza. Então Olívia sentiu-se um pouco mais confiante por ter ali, naquela sala tão misteriosa, pelo menos dois conhecidos.
Ela ainda não estivera apreensiva com este encontro, porém a cerimônia feita por Mirus ao dirigi-la até a sala e todos os "você não deve" que Aurosa falara pouco antes de ela sair, deixaram-na nervosa. Aquela meia hora de espera piorou a situação. O fato de esperar em pé estava cansando a humana, e aquele tipo de cansaço, num misto de expectativa e medo, acabou trazendo uma lembrança triste do seu passado: o dia em que ela, ainda muito pequena, e sua mãe ficaram por horas num corredor do hospital esperando por notícias sobre seu pai. Naquele dia ela perderia o pai e passaria a ter uma vida bastante complicada: sozinha com a mãe, sem dinheiro, num mundo complicado.
Agora, enquanto esperava ali, em pé, ela chegou a pensar que se tivesse nascido em Tangen isto não teria sido problema: a mãe não teria se submetido a trabalhos ruins para conseguir dinheiro, e ela não teria passado a experiência da morte do pai. Entretanto, ela não teria conhecido os pais e passado por momentos carinhosos e cheios de ternura com eles. Foi a primeira vez que Olívia comparou os dois mundos, sem saber se Tangen era assim um mundo tão bom quanto todos queriam que ela acreditasse. Ela gostava de ser quem era. E foi assim que ela entrou na sala quando a chamaram: como a humana que era.
A sala era bem menor do que ela imaginara: uma sala sem nenhum outro móvel, objeto ou quadro, apenas uma longa mesa com seis cadeiras de frente para uma poltrona grande, que foi indicada como sendo o seu lugar. Mirus, que havia aberto a porta e sinalizado para que ela entrasse e sentasse, foi quem apresentou a jovem professora aos Conselheiros. "A professora humana, Olívia". Depois disso, ele foi sentar-se em seu lugar, bem à ponta da mesa. Todos os membros do Conselho já estavam ali sentados. Olívia sentou timidamente e, ao olhar para todos, perdeu a voz – não sabia por onde começar a falar. Sentada na ponta da poltrona, largou a bolsa no espaço que sobrava no assento e cruzou uma perna sobre a outra, de um modo despojado. O gesto causou olhares negativos – então ela voltou a posição inicial.
Existia uma energia opressiva vinda deles: uma cobrança sem sentido, por algo que ela não entendia muito bem. Afinal eles não estavam ali para julgá-la, e nem ela para defender nada. A ideia do Programa em ter uma humana como professora era deles mesmos. Se não de todos, pelo menos de alguns deles. Sem querer, ela quebrou o silêncio e acabou cobrando um mínimo de educação daqueles seres tão inteligentes e superiores:
– Posso conhecer os senhores antes de falar?
Aquelas palavras causaram certo desconforto, visto que quase todos se mexeram nas cadeiras. No fundo, os Conselheiros eram figuras públicas muito conhecidas por todos.
– Ah, perdoe-nos, Olívia! Não estamos acostumados a receber convidados que não nos conhecem. Na ansiedade por te conhecer, esquecemos que você sabe tão pouco de nós... – Disse a Conselheira Olita, que estava sentada na segunda cadeira à direita da mesa.
Olívia olhou para ela e, sem dúvida alguma, percebeu que estava diante da figura mais bonita que já havia visto em toda a sua vida. Vinda da escola do Mestre do Sublime, a Conselheira Olita transformou sua imagem numa obra de arte. Porém não era apenas uma beleza exterior, ela era delicada ao falar, usava as palavras de maneira poética, e o jeito como falava condizia com o que Olívia entendia como belo.
– Eu sou Olita. Ao meu lado Niela e Líneo. Mirus, você já teve o prazer de conhecer... – ao dizer isto, Mirus deu um sorriso discreto de satisfação pelo elogio do "prazer" que a linda Conselheira falara. – Ao seu lado, Miti, que você conheceu na excelente interpretação de entrevistadora da agência de empregos... – as duas conselheiras trocaram olhares e Miti fez uma reverência com a mão, como que agradecendo o reconhecimento artístico, – e por último... – fazendo uma pausa intencional na sua fala, – Renus... Que dispensa apresentação. – Ela disse isto, dando ênfase a palavra "dispensa" e causando risos contidos em todos; menos nele mesmo.
O Conselheiro Renus havia ficado até aquele momento afundado na cadeira, de cabeça baixa e com a mão tapando parte de seu rosto. O que fez Olívia pensar que ele não gostava mesmo de aparecer ou de ser reparado. Porém, neste momento, ele arrumou-se na cadeira e, mostrando o rosto, respondeu a provocação da colega com o olhar atravessado e a boca contorcida. Só então olhou para Olívia, com a mesma expressão de reprovação que ela já havia visto em Tangen: o Conselheiro Renus era o desconhecido desagradável que a mandara ficar longe do Templo dos Anjos. Ele deixou a humana reconhecê-lo e voltou a baixar a cabeça e os olhos, dando a entender que não queria contato, nem mesmo visual, com ela. Assim ele não percebeu que ela ficara ruborizada pela lembrança do outro dia.
A mesa estava composta, da esquerda para a direita, por Mirus, Miti, Renus, Líneo, Olita e Niela. Eles sempre sentavam nesta ordem. Olívia ficou surpresa, pois esperava que os Conselheiros fossem bem mais velhos: Miti, Líneo e Olita aparentavam ter mais de cinquenta anos. Renus era o mais jovem dos Conselheiros, isto ela já sabia. Mais jovem e mais recente nesta posição. Mirus e Niela estavam na casa dos quarenta, embora Olívia soubesse que Mirus entrara para o conselho bastante jovem. Niela vinha da escola do Mestre das Formas e era excelente arquiteta. Segundo Aurosa, Niela e Líneo gostavam de dados exatos, por isto a assistente ajudou Olívia a pensar numa apresentação bastante formal e com comprovações de que cada aluno havia sido milimetricamente estudado e avaliado para enfim ser escolhido objetivamente. Porém foi Miti que pediu objetividade na apresentação:
– Olívia, recebemos os nomes de cinco alunos como sendo os que você julgou mais aptos para o programa: Aurosa, Noro, Naitan, Turio e Lália. Confere? Para sermos diretos, você poderia explicar como chegou nestes cinco?
Mirus já havia se antecipado e passado, naqueles trinta minutos que Olívia ficara esperando no corredor, o nome dos cinco escolhidos. A revelação gerou debate entre eles; o que justificou a demora em chamarem a nova professora.
Ela então falou da teoria da eliminação dos candidatos: os com motivos muito fracos para entrarem no Programa e os que demonstraram intolerância ou arrogância com algo ou algum colega. Fez parecer que eram muitos, mas na verdade estava se referindo a Meira, aos alunos mimados e a outro aluno que olhava com desdém e saía de perto de Lália quando ela começava a falar de estatísticas.
– Arrogância? Arrogância não é assim tão grave, para que um bom aluno seja rejeitado. – Disse a Conselheira Niela, claramente com certa arrogância.
Olívia sabiamente não quis discordar, mas esclareceu:
– Também não considero grave... em Tangen. Porém eu devo pensar nos alunos na Terra. E uma coisa que os humanos não gostam é de conviver com pessoas arrogantes. Isto poderá gerar problemas futuros... de adaptação e de convívio.
Mirus concordou com a cabeça, demonstrando orgulho pela resposta. Olívia não sabia, mas Mirus havia sido o grande responsável por sua escolha como professora do Programa. Ele havia apostado em seu perfil, enquanto outros conselheiros preferiram outros humanos para o cargo. Por este motivo, ele torcia muito para que Olívia se desse bem. Vendo que a ideia de convívio agradara Mirus, Olívia resolveu improvisar um pouco:
– Bem, alguns dos alunos, eu escolhi justamente por perceber simpatia, facilidade para interagir e abertura para aprender coisas novas, sem preconceitos contra os humanos.
Dito isto, houve um murmurinho entre Líneo e Olita. Foi Líneo que falou:
– Se estamos entendendo bem, você optou por alunos simpáticos e não por alunos com melhores notas em avaliações concretas? Isto explica, por exemplo, o nome de um aluno como este Noro que reparei ter as piores notas da turma em algumas disciplinas. Ou este aluno Naitan, que nem teve recomendação de um Mestre...
[ A sequência no Conselho continua no próximo capítulo]
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