A Ajudante
Então Olívia soube que teria uma menina um pouco mais nova que ela como ajudante. Aurosa era uma das alunas da escola. Ela ainda não tinha vinte anos; era alta e magra, muito branca e com os cabelos vermelhos em um tom acaju. Ao lado de Olívia eram opostos – Olívia era mais baixa uns 10 centímetros, pele queimada do sol e de cabelo escuro, e não era magra. Estava até um pouco acima das medidas. Mirus havia instruído Olívia para não usar maquiagem até que visse como era aplicada em Tangen; e ela entendeu isto quando viu que Aurosa usava tons muito diferentes daqueles que ela encontraria à venda na Terra. A menina tangen usava algo que deixava os cílios e os lábios prateados – coisa que Olívia nunca pensaria em usar no dia a dia.
Assim como a maioria dos tangens que Olívia iria conhecer nos dias seguintes, Aurosa era extremamente discreta, mas fixava muito o olhar, prestando atenção em tudo que Olívia fazia e dizia, o que lhe denunciava o desejo de fazer mil perguntas e a dificuldade de conter a curiosidade em saber mais coisas sobre aquela humana. Aos poucos, esta discrição iria se quebrar, permanecendo apenas o respeito de Aurosa por sua superiora e chefe. Mirus explicou esta hierarquia para as duas naquele momento.
– Aurosa será sua assistente enquanto você estiver se adaptando na escola. Ela é extremamente hábil em biologia e estudos da natureza animal e vegetal. Ela se inscreveu para o programa e gostaria de ser uma das escolhidas para os estudos humanos, mas obviamente você terá total autonomia para escolher sua equipe de pesquisa. Por enquanto, ela será apenas sua ajudante em Tangen. Além de mim e dos Conselheiros, ela é a única que sabe que você é humana e o que está fazendo aqui. – Disse Mirus falando diretamente a Olívia.
Olívia sabia que ainda teria uns dias de adaptação, mas estava vendo muitas diferenças e prevendo muitas dificuldades em disfarçar sua origem. Somente conseguiria isto se não interagisse com os alunos. Porém não era assim que ela se imaginava como professora. Ela ainda não havia perguntado a Mirus como seria sua apresentação, quando ele começou a explicar:
– Daqui a três dias, você aparecerá na sala de aula como "a-lu-na" – disse ele bem pausado. – Como uma aluna vinda da mesma escola de Aurosa, o que não irá despertar suspeita quanto a vocês serem conhecidas.
– Eu fui aluna do Mestre da Natureza – explicou Aurosa, e virando-se para Mirus perguntou: – ela sabe sobre o Mestre?
– Ainda não tive oportunidade para falar sobre Mestres com ela e nem sobre os Conselhos. Falaremos sobre isto depois. Agora é importante que Olívia saiba que irá passar um tempo, o que achar necessário, como uma aluna visitante na escola. Neste período, ela irá para a sua turma, Aurosa. Assim ela conhecerá todos os alunos da turma, que irão pensar tratar-se de mais uma colega. – Disse Mirus um pouco envergonhado por estar propondo que as duas moças mentissem. – Você, Aurosa, irá apontar cada aluno, dar informações e tudo o mais que ela precisar saber sobre eles. Assim que você, Olívia, tenha conhecido todos, você deverá ser capaz de apontar-nos, a nós do Conselho, aqueles alunos que tem potencial para o Programa... Só então avisaremos os candidatos e formaremos a sua turma de alunos.
– Isto significa que terei que indicar aqueles que têm mais a ver com os humanos e que eu gostaria que fossem meus alunos, que fizessem parte de uma equipe de pesquisa na Terra?
– Exatamente! – confirmou Mirus com um sorriso de incentivo. – Todos os alunos nesta turma são voluntários para o Programa de Estudos Humanos, porém poucos irão fazer parte desta equipe de pesquisa na Terra.
– E toda esta escola... funciona como?
– Esta nossa escola é para especializações. Temos alunos nos mais variados cursos, vindos de diversas escolas e Mestres. Os alunos desta turma foram escolhidos pelo alto nível de inteligência e foram incentivados por seus Mestres a participarem do Programa pelos tipos de pesquisas que eles gostariam de desenvolver na Terra – eram muitos outros, que já foram eliminados. Temos um número de 17 alunos agora.
Olívia teria que escolher o número reduzido de cinco alunos, pois mais adiante o Programa previa que ela e mais cinco fossem morar na terra. O número de seis pessoas tinha sido pensado por questões lógicas que Olívia não entendeu quando Mirus explicou. Mas não questionou.
Quando saíram do refeitório, Mirus despediu-se das duas moças. Aurosa explicou que iriam até um lugar onde Olívia poderia escolher objetos, roupas e muitas coisas que quisesse para seus primeiros dias em Tangen.
– Vamos às compras! – Aurosa disse para Olívia, querendo que a professora percebesse que ela havia lido sobre economia terrestre. Porém aquilo soou tão normal para Olívia, que ela acabou decepcionando a assistente. Somente mais tarde, ela iria entender que o sistema econômico na Terra era algo muito difícil de ser compreendido e que poucos sabiam como funcionava.
Em Tangen, todas as coisas eram dadas ao povo, o que deixou Olívia muito feliz. O que ela escolhia, ela podia pegar. Por sorte, ela não era consumista e tinha consciência de que tudo aquilo era dividido entre o povo – e que não era para ela abusar da generosidade de quem estava distribuindo. A cada coisa que escolhia, Olívia perguntava a Aurosa se ela achava ser necessário ter em casa. Tudo precisava de uma explicação, do creme de proteção bucal – que era aplicado de maneira totalmente diferente de um creme dental, até cobertas, roupas adequadas, sapato, maquiagem e, claro, coisas decorativas para a casa e acessórios para ela mesma. Porém, como Mirus já havia alertado, os tangens eram minimalistas, simétricos, usavam mais as cores claras, sem muitas misturas; prezavam o conforto e o bem estar, a limpeza, a higiene e, principalmente a saúde. Ela compreendeu algo muito importante: mesmo com toda a evolução, eles não eram fisiologicamente tão diferentes dos humanos, mas chegaram num nível perfeito de prevenção das doenças com várias práticas, hábitos e técnicas. Uma simples cárie era vista como uma doença de alto risco. Além disso, eles alcançaram imunidade a várias doenças banais, mas ainda perigosas para os humanos. Sendo Aurosa, entre outras coisas, bióloga, ela mesma explicou e orientou Olívia em uma série de procedimentos, vacinas etc, que tornariam a futura professora muito mais saudável.
Aquele primeiro dia em Tangen foi encantador e muito cansativo para Olívia. Elas foram para casa esperar que tudo o que haviam escolhido fosse entregue. Exatamente na hora combinada, o entregador parou em frente à porta de entrada, e do lado de dentro da casa, uma voz anunciou:
– Entrega do depósito central para Olívia.
Depois disso, a cada dia Olívia iria ouvir a voz eletrônica várias vezes anunciando os que se aproximassem das câmeras de identificação na parte exterior da casa.
Aurosa ajudou Olívia a arrumar e guardar as coisas. Também ajudou nas coisas simples, como usar o banheiro, tomar banho, lavar roupas e outras coisas. A humana parecia uma criança aprendendo as coisas básicas, mas a assistente a tratava com respeito e paciência; sabendo o quanto deveria estar sendo difícil para Olívia conhecer outro mundo. A aluna tangen antes mesmo de conhecer já admirava a professora humana por sua coragem.
Antes de ir embora, Olívia achou melhor conversar mais intimamente com a menina e saber também um pouco sobre ela.
–Eu quero te agradecer, Aurosa!
– Está sendo uma honra trabalhar para você. Para o que você precisar, eu estarei pronta a ajudar. – Disse isto tirando da última caixa um objeto pequeno e fino, retangular e de material maleável. – Isto é o que vocês na Terra chamariam de computador. Porém, ele faz muitas coisas. Ele é aderente ao corpo e você não precisa tirá-lo nem para dormir ou tomar banho. Para usá-lo como comunicador, é muito simples, você aperta aqui e diz "ligue com Aurosa" ou "ligue com Mirus" e você conseguirá falar conosco.
O aparelho era imperceptível no contato com a pele. Após mexer em alguns dados do aparelho, Aurosa o colocou no braço de Olívia para que ela o sentisse. Ela imediatamente fez a experiência:
– "Ligue com Aurosa" – e Aurosa sentiu a vibração do seu aparelho, sem que Olívia soubesse onde a moça o carregava. Ela ordenou:
– Fala! – e dois segundos depois: – Aceito! Olá, Olívia!
Olívia ouviu a saudação duplicada pelo aparelho e presencialmente, e entendeu que na aderência do aparelho ao corpo, ele transmitia o som apenas para ela, sem precisar de fone de ouvidos. Ela nem perguntou sobre aquela tecnologia, assim como havia feito durante todo o dia, com outros diversos aparelhos.
– Parecemos duas loucas! – disse Olívia a Aurosa. E pela primeira vez, ela viu a assistente sorrir.
– "Desliga" – Ordenou Aurosa. Olívia fez o mesmo comando e depois disse: – Venha sentar aqui! – Apontando para uma das duas cadeiras na mesa.
Foi só então que elas iniciaram uma conversa mais amigável e que Olívia quis conhecer um pouco a vida de Aurosa.
– Nós em Tangen somos encaminhados ainda bebês para casas-escolas, onde professores muito bem preparados estimulam nossa inteligência e nos introduzem em conhecimentos básicos. Tudo isto é feito com a delicadeza, o cuidado e o carinho que se deve ter com crianças. Aprendemos com brincadeiras e incentivo à curiosidade, a gostar mesmo de aprender e conhecer. Só depois o aprendizado começa como uma responsabilidade – quando já temos um pouco mais definidas nossas aptidões. Comigo, aos 9 anos, me foi definido o perfil para estudos da natureza. Só então eu fui encaminhada para Campos Belos – lugar onde mora o Mestre da Natureza – e onde fica a sua escola. Por tudo o que li sobre a Terra, Campos Belos parece ser o lugar mais semelhante às descrições de paisagens dos livros humanos.
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