Único: parte final [🌾]
Quando a Sra. Min passou por mim nos deixando a sós naquele quarto em que eu já estava tão familiarizado pude finalmente soltar a respiração que prendia a algum tempo.
Ele estava logo ali a minha frente, embora escondido sob algumas camadas de tecido e talvez rancor por me ter mais uma vez se intrometendo em sua vida mesmo após aquela sua pequena explosão a duas semanas atrás. Semanas estas em que havia me afastado, como ele desejava. Havia tirado todo aquele tempo para clarear meus pensamentos. Me questionar se seria certo abandonar algo que já não considerava apenas um trabalho de meio período, mas sim, uma parte de mim. E uma coisa que aprendi naquele meio tempo era que abandonar algo que eu fazia parte era doloroso e jamais saberia lidar.
Eu engoli a seco algumas vezes antes de caminhar um passo a mais para dentro do quarto. Nesta vida já havia engolindo muito a repreensão, desaforos, insultos e principalmente sentimentos. E acabei entendendo que não era o único a fazer aquilo.
Yoongi era igual. Reprimindo sentimentos e palavras. E expressando em aversão o que realmente queria dizer.
— Acho que precisamos conversar.
— Não tenho nada pra conversar.
— É claro que tem – rebati ainda com o olhar fixo naquele volume encolhido sob a cama — Pode sair daí, por favor?
— Não – disse com firmeza — Eu já disse que não queria que voltasse, que fosse embora e me deixasse em paz.
— E quem disse que eu não fui? – sorri me apoiando contra uma estante-cabide onde havia alguns enfeites nas prateleiras e algumas camisas penduradas, todas com o cheiro suave que o anunciava.
Me mantive ali por um breve segundo antes que o visse empurrar as cobertas para longe finalmente se revelando. Me endireitei quando ele levantou, seus movimentos eram bruscos o que me deixou em alerta.
— Mas você voltou! – esbravejou, sua feição demonstrando o que seria uma mistura de raiva, chateação e tristeza — Não devia ter voltado. Quando disse para ir não queria que voltasse. Não ficou claro o que eu disse naquele dia?
— É claro que ficou – assegurei levantando um pouco a voz — Tão claro quanto o dia. Me disse isso várias vezes durante esses dois anos. É bem óbvio qual sua intenção, eu entendo.
— Mas não parece.
— Yoongi...
— Você fica insistindo.
— ...eu...
— Por que apenas não some? Não me deixa em paz? – suas palavras eram carregadas de algo que nem eu mesmo entendia. Talvez fosse pelo fato de estarem pesadas pela necessidade de chorar, ou talvez de me calar já que não me dava espaço — Se fosse outro já teria dado meia volta agora mesmo, ou melhor, não teria tido a cara de pau de voltar...
— Será que pelo menos uma única vez na vida poderia calar a boca e me ouvir? Se não tem elogios para mim pelos menos me ouve! – gritei furioso sentindo uma energia circular por dentro de mim. Yoongi se calou no mesmo instante recuando um pouco, possivelmente porque não esperava minha reação. Na verdade, nem eu mesmo imaginava aquilo — Não é o único que tem algo a dizer, Min Yoongi – suspirei andando inquieto pelo quarto — Acha que estou aqui todo esse tempo te suportando porque sua mãe quer?
— É claro que não. Está aqui pelo dinheiro... – comentou sorrindo a contra gosto de suas próprias palavras.
— Está errado – assegurei com frieza — Você sabe que eu preciso de dinheiro, mas eu jamais ficaria em um lugar onde tenho que suportar ser chutado todos os dias por conta de dinheiro. Eu sei o meu limite. Mas ainda assim estou aqui hoje, e estarei aqui amanhã e depois de amanhã também, quer você queira ou não.
Yoongi pareceu engoliu a seco diversas vezes dando um passo para trás e se chocando contra algum móvel estúpido de seu quarto quando dei um passo vacilante em sua direção.
Ele estava agitado ao mover os dedos de suas mãos que pendiam ao lado de seu corpo. Seu rosto, naquele meio tempo, havia ganhado uma paleta de tonalidades indo do rosado ao velho. Imaginei que ele gritaria algo a mim, seus lábios vacilavam sutis, ou talvez fosse apenas coisa da minha cabeça.
— Se estou aqui é por você, Yoongi – disse pausadamente me certificando que seria entendido.
— Não... Cala a boca. Para de mentir.
— Mas não é mentira – murmurei dando mais alguns passos em direção ao menor — Eu me importo com você.
— Cala a boca – Yoongi pediu finalmente deixando algumas lágrimas rolarem por deu rosto enquanto seu corpo tremia pelo que seria minha invasão contra ele.
— É tão difícil assim? – o olhei com dor finalmente estando frente a frente ao pálido que passou a deixar seu corpo escorregar até o chão — É tão difícil aceitar que eu gosto de voclê?
— P-para de mentir...
Inspirei fundo agachando para segurar seus braços enquanto ele insistia em tentar não me ouvir. Fui cuidadoso ao agarrar seus pulsos finos e os puxar em direção ao seu peito.
— Você tem medo de não ser recíproco, não é mesmo? Eu sei que você também sente o mesmo, e esconde isso atrás de toda essa sua aversão – fiz aspas entonando minha voz – por mim. Mas, Yoongi, eu tenho uma notícia pra você – afirmei com um sorriso vacilando em seus lábios ao perceber que o menor cessava suas lágrimas — É recíproco! Eu gosto de você. Eu te amo.
Assegurei, sentindo as palavras escaparem macias por meus lábios. Por um momento acreditei que Yoongi ergueria a cabeça em minha direção, mas ele apenas suspirou ainda trêmulo, baixando ainda mais a cabeça.
— É tudo mentira... – ele murmurou — Disse que se sente maltratado, esculachado e outras mil coisas... – desatou engolindo a seco várias vezes — Não tem como alguém se importar e amar alguém que faz esse tipo de coisa.
— Mas Yoongi... – chamei levando com cuidado minha mão até o rosto do pálido, erguendo-o para mim ao senti-lo resfolegar diante meu toque, quase assustado — Sei que não faz isso por que quer. Você quer apenas me afastar por medo. E devo admitir que conseguiu por um tempo mas...
— Mas você está aqui agora – completou em voz baixa, e embora ele não pudesse me ver assenti com a cabeça.
— Mas, ainda assim não entendo porque faz isso. Do que tem medo? – o observei com curiosidade notando-o recolher os ombros e mordiscar os lábios quase imperceptível — Por acaso tem haver com sua deficiência? – Yoongi vacilou ao tentar projetar uma desculpa o que deixou mais claro qual seria sua resposta — Precisa entender, Yoongi, que se eu estou aqui, se digo que me importo e que eu te amo é por quem você é – asseguei com firmeza — Não é por interesse no que você ou sua família tem, muito menos por dó devido sua condição. Eu te amo porque você é lindo, Yoongi. Amo seu beicinho zangado, como proteger seu ursinho – falei entre uma breve risada ao desviar minha atenção para a pelúcia quase escondida sobre os lençóis da cama — e claro, amo suas birras embora isso as vezes me estresse e...
— V-você...
— E eu não estou mentindo! – reafirmei ouvindo uma risadinha escapar por entre seus lábios.
Me mantive em silêncio ao olhá-lo, ele parecia pensar no que dizer, ou processar o que eu havia dito. Me mantive assim por tempo estudando o que se passava em sua mente, mas acabei me perdendo em um desejo que carregava comigo a algum tempo. E não resistindo levei minha mão novamente ao rosto do pálido o fazendo estremecer.
Imaginei que fosse recusar meu toque, mas ele se manteve. E eu pude acariciar seu rosto macio descendo meu polegar em direção aos seus lábios, sentindo-os enquanto meu coração palpitava tão forte que sentia que a qualquer momento poderia parar. Mas eu jamais permitiria que isso acontecesse antes de poder descobrir qual era a sensação de beijá-lo. E assim me aproximei, sentindo sua respiração ainda leve contra meu rosto embora fosse possível perceber o quão rígido estava.
— Será que eu posso... – pedi olhando com atenção e expectativa, e quando finalmente ele balançou a cabeça para cima e para baixo me arrancando um breve sorriso, cortei o que ainda existia de espaço entre nós.
Juntei meus lábios aos dele em um beijo simples e leve. Sentindo apenas um leve resquício do que seria o hidratante que ele usava para não deixar os lábios ressecarem pela frio.
Ele foi o primeiro a se afastar me fazendo questionar se eu havia feito algo de errado em dar aquele passo. Yoongi parecia sem fôlego, o que me deixou preocupado. Levantei agarrando seus braços para ajudá-lo a ficar de pé antes de guiá-lo até sua cama onde poderia ficar mais confortável.
— Está tudo bem, Yoongi?
— Você... – suspirou baixinho — Hoseok, pode fazer isso de novo – pediu com a voz vacilando.
Um sorriso torto surgiu em meus lábios. Quase não acreditando em suas palavras.
— Fazer o que? Beijar você?
— É – assentiu, uma lágrima rolando por sua face.
— Ei, mas porque está chorando?
— Eu só preciso que me beije, por favor.
Sua súplica era como um desejo proibido intermitente de se negar. Sentei ao seu lado segurando seu rosto antes de voltar a beija-lo, agora com um pouco mais de intensidade e sendo acompanhado pelos movimentos sutis do Min.
Sentir seus lábios roçando contra os meus, retribuindo aquele afeto era como um sonho no qual eu jamais gostaria de acordar. Era bom e acolhedor me fazendo sentir em casa, me permitindo morar ali naquele momento. Mas quando fomos obrigados a se afastar pela busca de ar, senti como se uma parte de mim houvesse perdido o sentido de existência.
Eu o observei com atenção, suas mãos estavam ociosas e trêmulas. Sua língua passeou lentamente por seus lábios, os molhando uma ou duas vezes, me fazendo focar em sua ação e quase não perceber o momento em que levantou uma de suas mãos a guiando em direção meu rosto, tocando com sutileza.
A maciez de sua pele me fez estremecer quando seus dedos passearam lentamente por meu rosto, explorando minhas feições. Senti suas unhas arranhar de leve sobre minha sobrancelha descendo em direção ao meu nariz, o que me fez cócegas, em seguida tocou meus lábios e ele parou o toque ali por um breve momento antes de levar sua mão até a lateral de meu rosto subindo-a até minha orelha, raspando seus dedos contra os fios de cabelos que já não cortava a alguns tempo e que cresciam ali. E nesse processo, ele deixou escapar uma risada fraca.
— Do que está rindo? – perguntei sorrindo confuso.
— Meu irmão estava certo sobre você...
— Que eu sou feio? Bem, nem todo mundo tem o sangue da família Min, devo admitir.
— Não! – ele riu afastando sua mão — Sua orelha... tem formato de coração. Meu irmão dizia e eu me recusava a acreditar.
— As pessoas falam isso do meu sorriso também... – comentei incerto, vendo-o se recolher para próximo da cabeceira.
— Me desculpa – murmurou após um breve silêncio. Suas mãos tatearam o colchão em busca de algo que pudesse segurar, e quando encontrou sua pelúcia do kumamon o arrastou para o colo, afundando seus dedos na textura macia — Eu... Eu...
— Não precisa falar nada, Yoongi. Pelo menos, não agora.
O assegurei notando o nervosismo presente, mas talvez eu tenha apenas o deixado ainda mais em alerta quando ele moveu seu corpo ainda mais para si mesmo ao se encolher, e erguer a cabeça minimamente em minha direção.
— Preciso sim – falou arrastado, torcendo o canto dos lábios. — Fui péssimo com você todo esse tempo. Por medo, como você mesmo disse.
— Yoongi...
— Eu não queria te prender aqui. Tenho noção do quão difícil de lidar eu posso ser às vezes – disse encolhendo os ombros — Mas você é mais teimoso do que eu.
— É, eu posso ser às vezes – dei de ombros entre uma risada, apreciando o pequeno sorriso que surgia nos lábios do pálido.
— Talvez eu tivesse parado de insistir em querer que você fosse embora, sabe, em algum momento eu me acostumei com sua presença embora não demonstrasse – elucidou inspirando em silêncio — Mas foi aí que eu percebi que não se tratava apenas de ter me acostumado, mas sim que era outra coisa... Que eu estava sentindo algo por você. E eu fiquei com medo.
— Sentimentos novos às vezes assusta mesmo – comentei e ele assentiu — Ficou com medo que eu descobrisse?
— Sim. O que você iria pensar? Sério – riu a contragosto — um cego se apaixonando por alguém que nunca viu e nunca iria ver. Que ridículo.
— Era essa sua impressão. Mas eu jamais faria isso, seja com você ou qualquer outra pessoa.
— Agora eu sei – suspirou — Acontece que, acabei exagerando demais. Sei que magoei você várias vezes. Eu sempre tive noção disso. Me desculpa.
— Claro – murmurei de volta — É claro, eu desculpo você se desculpar por ter gritado com você mais cedo. E pela que vez que joguei seu kumamon porque fiquei com raiva.
— Mas você ficou com raiva porque eu estava com raiva – assegurou franzindo o cenho.
— Sim, também. Mas aí você saiu correndo e chorando e gritando...
Ele deu de ombros: — Ninguém mexe com o Mon.
— É sério que chama ele de Mon? – perguntei incrédulo entre uma risada.
Yoongi voltou a dar de ombros apertando o urso contra si e eu lutei para não revirar os olhos ainda desacreditado.
Nós permanecemos ali por mais algum tempo em volta do silêncio até que alguém chegou e abriu a porta. Era seu irmão que afirmava ter voltado mais cedo para lhe fazer companhia, o que significava que minha presença no momento já não era mais tão requisitada.
— Bem, já vou então. E, seria melhor vocês descer para comer algo, não pense que não ouvi sua mãe dizer que passou o dia sem comer – alertei levantando de sua cama um pouco apreensivo ao caminhar em direção a saída.
Não sabia o que fazer com as mãos que incrivelmente estavam suadas. Yoongi assentiu com a cabeça, me deixando ainda mais inquieto. Eu passei a observá-lo antes de sair, algo nele estava diferente, como se distante e achei melhor esperar um pouco mais. Mas então percebi que na verdade o que havia de diferente não era nele, e sim em mim.
Era uma mistura de leveza e bem-estar. Toda aquela pressão que guardava havia sumido. Talvez fosse por finalmente cair a fixa que havia dito tudo o que queria, por saber que ele sentia o mesmo, pelo beijo... Aquele beijo que agora me fazia ansiar ainda mais por querer voltar lá no dia seguinte para me encontrar com ele.
— Não esqueça que eu volto amanhã – avisei entre uma risadinha.
— E depois de amanhã também?
Um sorriso ladino e talvez travesso transparecia em seus lábios. Eu concordei em silêncio e quando menos esperei estava de volta à sua frente, segurei seu rosto e o beijei novamente apenas para ter a certeza que tudo era real e reafirmar que amanhã eu estaria ali mais uma vez, não por mim, não por ele, mas por nós.
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