Capítulo 16
CAPÍTULO 16
– Você tem certeza de que o caminho para a vila dos silfos é esse mesmo? – perguntou Kyle, intrigado com a nova troca de direção de Noran.
– Para falar a verdade, não.
– Como assim, não? Há pouco você disse que ainda chegaríamos para o almoço!
– Sim.
– Então, como pode ser?
– Na verdade, eu não sei a localização da vila dos silfos.
Kyle parou de andar e perguntou, irritado:
– E como você espera que cheguemos lá?
– Bem, é fácil, ficaremos andando até que os sentinelas sílficos nos encontrem.
– O quê? Mas é absurdo!
– Calma, meu caro, isso funciona, pode confiar em mim! – disse Noran e voltou a andar, sem destino.
Kyle ficou parado, de braços cruzados, balançando a cabeça negativamente, enquanto os outros seguiram Noran. Quando a distância foi aumentando, Kiorina virou-se e disse:
– Vamos!
Ele resmungou, mas se pôs a andar na direção deles. Depois de uma boa caminhada, Kiorina pediu a todos que parassem para descansar. Ela se acomodou na raiz de uma árvore muito grande e suspirou.
Archibald secou o suor da testa com as costas das mãos e as limpou em seu traje. Finalmente disse:
– Puxa, como está quente! Pelo visto, o inverno vai custar a chegar.
– É... – disse Kyle e fez uma pausa. – Tomara que seja ameno como o inverno passado e sem muita neve.
– Estou acostumado com o frio. O inverno é sempre muito rigoroso nas montanhas... – disse Noran, que olhava adiante, como se procurasse algo.
– Está vendo alguma coisa? – perguntou Kiorina.
– Acredito que... – foi subitamente interrompido por uma flecha que veio em sua direção, da qual não poderia desviar-se. No entanto, ela passou direto por ele, atingindo o tronco de uma árvore.
– Procurem cobertura! – gritou Kyle, jogando-se no chão.
Noran olhou rapidamente a flecha, antes de tomar qualquer atitude; permaneceu de pé. Nesse meio tempo, os outros se esconderam atrás das árvores.
– Ei! O que há como você? – gritou Kyle.
– Calma, essa foi apenas uma flecha de advertência. Se nos desejassem algum mal, eu já estaria morto. – disse calmamente.
– O quê?
– Vichi inus baeli. – disse o tisamirense em voz alta.
– Kami ori eoê? – veio uma voz do meio da floresta.
– Ore fomet nus Kivion, eoi aot hadebin. – replicou Noran.
– O que ele está falando? – Kyle murmurou para a Kiorina.
– É sílfico; não sei muita coisa, mas acho que ele está se identificando.
Quando terminaram de falar, puderam ver dois silfos saindo detrás dos arbustos. Eles eram muito parecidos com homens, possuíam uma pele clara e limpa, cabelos também claros, lisos e longos e feições adolescentes. A estatura não impressionava, pois, apesar de ambos estarem abaixo da média humana, não chegavam a ser muito baixos. Carregavam arcos longos e vestiam-se com roupas de couro reforçado, muito bonitas.
– Está tudo bem. Vocês podem sair. – informou Noran.
Levantaram-se para ver os silfos que se aproximavam. Eles andavam de uma forma diferente, portando-se com muita elegância, como alguns nobres humanos costumam caminhar. Um deles, que usava uma tira de couro prendendo os cabelos, a qual passava no meio de sua testa, possibilitando ver suas orelhas eram levemente pontiagudas na parte superior, disse, ao chegar perto:
– Queiram nos perdoar a rudeza, mas é que as coisas andam agitadas por aqui. – ele sorriu e continuou: – Meu nome é Tash e esse é Nathanael. Sejam bem-vindos a Shind. – estendeu a mão, cumprimentando-os à maneira dos humanos.
– Por favor, venham conosco. – disse o outro, indicando o caminho.
Caminharam pouco tempo até chegar à vila dos silfos. Durante o percurso, conversaram um pouco com Tash e Nathanael, que explicaram estar trabalhando como sentinelas, já que todos os membros do que eles chamavam clã tinham tarefas específicas a cumprir para a comunidade, além de seus ofícios comuns. Nathanael, muito jovem ainda, não se havia decidido por um ofício, mas tinha interesse na magia e já havia aprendido seus princípios básicos. Tash, o mais velho, fazia trabalhos em couro. Contou, com muito orgulho, que as roupas que vestiam tinham sido feitas por ele próprio.
Kiorina foi quem terminou por conversar mais com ambos, pois, além de estudar magia, seu pai possuía uma tecelagem e uma confecção.
Ambos disseram a Noran não saber muito sobre as circunstâncias da morte de mestre Kivion, cujos detalhes apenas os anciãos sabiam.
Uma clareira revelava o lar do último clã dos silfos das florestas. Rapidamente, as atenções se concentraram nos visitantes recém-chegados. Havia um número maior de crianças e silfas na vila. As incursões dos bestiais na porção oeste de Shind forçaram a maioria dos silfos a sair em ronda nos últimos dias. Havia casas construídas no solo, junto às árvores, assim como sobre plataformas, nas copas delas.
Logo um dos anciãos chegou para recebê-los. Era um silfo alto como Kyle. Seus cabelos, longos e completamente brancos, movimentavam-se com leveza enquanto caminhava, ainda que seus pés parecessem não tocar o chão. Tinha no olho esquerdo um tapa-olho. Parecia uma miragem. Aproximou-se de Noran, olhando apenas dentro de seus olhos, sem reparar nos outros. Pôs sua mão sobre um dos ombros do rapaz e disse que sentia muito por Kivion. Depois virou-se para os outros e disse:
– Sou Rodevarsh. Sejam bem-vindos a Shind. – sua voz era grave e rouca. Falava serena e envolventemente.
Após as devidas apresentações, Rodevarsh dispensou Tash e Nathanael. Pediu aos convidados que o acompanhassem. Foram até uma cabana, cuja entrada era protegida apenas por uma grossa cortina. Havia uma mesa redonda de madeira avermelhada e lustrosa, com finos detalhes esculpidos. As cadeiras também possuíam a mesma característica, trabalhadas com delicadas folhas e flores em alto relevo. Era uma mesa para dez pessoas. Pinturas cobriam as paredes, retratos em sua maioria, que demonstravam ter os seus autores rara habilidade, pois os detalhes eram finos e perfeitos.
Rodevarsh sentou-se em uma das cadeiras, de forma que suas costas e cabeça ficassem plenamente recostadas. Portava-se com muita elegância, mantendo uma postura impecável. Suas leves rugas lembravam as de um humano por volta dos cinqüenta anos.
– Então vocês vieram aqui para investigar a infeliz passagem de Kivion?
– Sim, senhor, urge-me tal conhecimento. – disse Noran.
– Você está acompanhado desses três jovens interessantes, vindos de Kamanesh. Suponho que estiveram em Tisamir.
Kiorina olhava o silfo, fascinada por sua maneira de se portar e respondeu que sim.
– A senhorita disse ser aluna na Alta Escola dos Magos, não é mesmo?
– Sim, mas ainda tenho muito a aprender.
– Tenho certeza de que sim, mas algo me diz que já possui uma boa instrução. Consigo ver que tem domínio do elemento ígneo, assim como da arte da movimentação.
– Puxa, como o senhor sabe somente olhando? – indagou Kiorina, surpresa.
– Ah, é algo que aprendemos depois de muitos e muitos anos... – disse, orgulhoso. – E quanto a você, meu caro jovem monge Naomir? O que me diz do treinamento?
Archibald, que observava tudo atenciosamente, disse:
– No início, foi muito difícil, mas acabei me adaptando.
– Sei como é. Acredito que, no futuro, ainda nos veremos.
– Por que diz isso?
– Trata-se da voz da experiência, meu jovem. Vejo que temos também aqui ninguém menos que o filho do próprio legendário cavaleiro Blackwing.
Kyle ficou meio desconcertado e apenas concordou com a cabeça. O silfo, após uma pausa, disse:
– Entendo. Eu soube quando o vi; você se parece muito com seu pai.
– Então o senhor o conheceu?
– Naturalmente. Ele era um homem muito determinado. – dirigiu-se novamente a Noran e disse: – Vejo que você conseguiu companhia muito interessante.
– Com certeza. Rodevarsh, minha vinda até aqui tem outra razão, além de buscar notícias de meu mestre.
– É verdade?
– Sim, preciso que um dentre os seus me acompanhe.
– De volta a Tisamir para estudos, imagino.
– Disso ainda não sei.
– E que outro destino poderia tomar, meu jovem?
– Mestre Kivion disse-me que estamos para atravessar uma nova fase.
– É. Nós discutimos sobre o assunto quando ele esteve aqui.
Archibald estava intrigado com aquela conversa e com a maneira como Rodevarsh olhava para ele; sentiu-se desconfortável.
Antes que Noran continuasse, foi interrompido por um jovem silfo que adentrou a cabana num pulo. Rodevarsh irritou-se com a impertinência do jovem e pediu a ele que se desculpasse com os convidados.
– Perdão... Perdão... – dizia o jovem, completamente sem fôlego e muito transtornado.
– Vamos, diga o que tem a dizer de uma vez, de forma que nossos convidados possam entender. – exigiu duramente o ancião.
– Um dos batedores avistou um grande número de bestiais reunidos a oeste, na base do planalto.
– Defina o grande número.
– Entre três e cinco mil.
– O quê? – Kyle quase gritou.
– Diga aos outros que devemos nos retirar para Kadebuir e traga-me Roubert.
– Yo, gondin! – disse o jovem, que conseguiu sair ainda mais rapidamente que entrara.
– Queiram me perdoar, mas parece que isso é mais sério do que eu imaginava. – e também saiu.
Kyle estava nervoso e disse:
– Isso não é possível! Como pode haver tantos bestiais tão perto daqui? Como podem ter passado despercebidos pelo Condado de MontGrey?
Archibald acenou com a cabeça:
– Concordo, mas... e se eles não passaram despercebidos?
– O que você está sugerindo? Uma aliança dos bestiais com o Condado? – perguntou Kyle, indignado.
– Não, Kyle, acho que o que Archibald está tentando dizer é que eles podem ter conquistado MontGrey. – disse Kiorina.
– Não seja ridícula! – gritou Kyle.
Kiorina assustou-se com a reação de Kyle; olhou para baixo e encolheu-se.
– Acalme-se, Kyle. – disse Noran.
– Calma? Como você pode esperar calma? Você é surdo? Ele disse que são mais de três mil bestiais e a poucas horas daqui!!!
– Sinto muito precisar fazer isso com você, mas sua exaltação me preocupa.
– Fazer o queeeeeaahhhh... – a voz de Kyle foi ficando pesada, até que ele adormeceu mesmo de pé. Foi amparado por Archibald e Noran.
– Puxa! Será que isso é realmente necessário? – disse Archibald.
– Talvez você ainda não entenda completamente o que está para acontecer. A última coisa de que precisamos é que nosso amigo perca a cabeça e faça alguma bobagem. Vamos! Temos de achar alguém e sair daqui o quanto antes...
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