Capítulo 10

A floresta de Shind era um lugar sem igual em todo o reino de Lacoresh. As árvores que cresciam lá não existiam em nenhuma outra floresta de toda a região. Eram árvores muito bonitas, fortes e antigas. Algumas vivem mais de duas mil primaveras. Eram verdadeiramente majestosas e alcançavam a altura de mais de cem homens. Dizem que os silfos constróem suas casas nas copas dessas árvores. Kyle, Archibald e Kiorina caminhavam na floresta havia horas, sem terem-se acostumado à sua grandeza.

- Kyle, você não sente algo estranho neste lugar? - disse Kiorina.

- Como assim?

- Não sei, mas estou com uma sensação estranha...

Archibald chutou uma pedra e disse:

- Não há de ser nada! Você só está impressionada com o tamanho da floresta.

- É, deve ser isso... - disse Kyle, sem dar muita importância àquela conversa.

Andaram por mais algum tempo. Archibald pensava: "Estranho, depois do que Kiorina falou, comecei a sentir uma coisa incomum. O que estará acontecendo?"

Um instante depois, uma forte luz azulada, vinda de longe, tomou o lugar. Houve um zumbido, que logo passou. Todos se assustaram muito, a mula ficou inquieta.

- O que foi isso? - disse Kyle, retirando a espada da bainha.

- Não sei, nunca vi nada igual! Kiorina? - disse Archibald, nervoso.

- Talvez... - disse ela, tirando seu colar, uma corrente dourada com um cristal na ponta, e apertando-o fortemente com sua mão direita.

- O quê? - Kyle quis saber.

- Ainda não sei!

Archibald foi até a mula e pegou seu bastão de batalha. Girou uma ou duas vezes, enquanto andava na direção de Kyle. Disse:

- Vamos verificar!

Antes que dessem dois passos, viram, pulando por cima dos arbustos, seis criaturas que corriam em sua direção. Eram humanóides muito estranhos, que gritavam muito. Possuíam corpos peludos, uns cinzentos, outros amarelados. Suas grandes bocas abertas babavam e mostravam dentes pontiagudos. Vestiam peitorais de couro e usavam muitos colares de ossos, que balançavam intensamente enquanto corriam. Os olhos eram vermelhos. Só podiam ser bestiais.

- Bestiais! - gritou Kiorina.

Kyle fez uma base com as pernas e apoiou-se no solo, deixando seu lado direito na direção das criaturas. Segurava sua espada com a mão esquerda virada para o lado e o punho contra a parte lateral de seu corpo. Com o braço direito, que estava revestido com placas de metal de sua armadura, procurava proteger-se. Mantinha a calma, enquanto observava com os olhos cerrados os bestiais avançarem freneticamente em sua direção.

Kiorina segurava com mais força o cristal de seu colar, o qual começou a emitir um brilho amarelado, que escapava por entre seus dedos. Olhava fixamente para um dos bestiais, que estava a poucos passos de distância deles. Murmurava palavras incompreensíveis.

Archibald, com ambas as mãos, segurava com tanta força seu bastão, que ele tremia. Pronunciou então as palavras:

- Rochus Carvus Oném!

Kyle estava mais à frente, e um dos bestiais, a apenas dois passos dele, carregava uma maça muito rústica com espinhos de metal. Segurava-a com ambas as mãos sobre a cabeça. Num instante, já estava golpeando na direção de Kyle, com muita violência. Ao golpear, soltou um urro de força. Kyle observou o movimento e empurrou a parte superior de seu braço contra o cabo da maça, que vinha de cima para baixo. Recebeu parte do impacto, mas se desviou do golpe, que atingiu o chão com muita força. Ao mesmo tempo que a maça atingiu o chão, a espada de Kyle já havia penetrado o corpo do bestial, que arregalou os olhos e soltou a respiração de uma só vez. Kyle torceu a espada e retirou-a de dentro do corpo de seu oponente, que caiu no chão, largando a maça, tentando apoiar-se em seus braços.

Kyle sentiu o braço doer, mas, naquele momento, não havia tempo para dores. Era só o primeiro bestial a cair, e outro já estava a caminho. Tinha grandes orelhas de abano e carregava uma espada de metal muito suja, que segurava com as duas mãos. O golpe veio rápido, mas Kyle conseguiu desviá-lo com a espada. Sentiu a força dele, maior que a sua. Segurou a lâmina da espada com a mão direita, protegida por uma luva de couro grossa. Aparou o segundo golpe, segurando a espada com as duas mãos, horizontalmente. Apesar de estar usando uma luva, o impacto do golpe abriu um corte na palma de sua mão direita. O bestial não retirou a espada, e os dois começaram uma disputa de força. Olharam-se dentro dos olhos, e o bestial gritou:

- Egror orto Morr!

Kyle olhou para o rosto daquele monstro peludo e disforme, que, além de tudo, tinha um hálito terrível. Sentiu seu sangue escorrendo pelo braço e muita dor na mão cortada.

Não se haviam passado mais que alguns instantes desde que avistaram as criaturas. Nesse momento, enquanto Kyle disputava força com uma delas, outras duas passavam por ele na direção de Kiorina e Archibald.

Kiorina finalmente terminara seu encantamento, com um grito muito alto. As roupas do bestial que corria em sua direção incendiaram-se imediatamente. A criatura ainda demorou uns instantes para perceber o que estava acontecendo; as chamas então já consumiam seu corpo. Caiu de joelhos, largou sua arma e começou a gritar. Kiorina assustou-se com o efeito de sua mágica. Ela nunca havia usado magia para machucar alguém.

O bestial que corria na direção de Archibald era o maior deles e não carregava nenhuma arma. Parecia ser muito forte, o que provocou grande apreensão no monge. Ao aproximar-se, foi golpeado por Archibald, com o bastão, no ombro esquerdo. Ele torceu um pouco o corpo e pegou o bastão com a mão direita. O monge olhou assustado para a mão do bestial, enorme e com grandes unhas negras, que, em um só puxão, arrancou o bastão e o jogou para trás. Deu uma gargalhada, olhando Archibald, que era muito mais baixo. Archibald deu um passo para trás, sem saber o que fazer. O bestial golpeou o abdome do jovem monge Naomir com seu punho cerrado, deixando-o atordoado. Seguiram-se mais dois golpes tão fortes, que o arremessaram para trás.

Kiorina viu Archibald caindo, mas havia mais um bestial chegando perto dela, que, então, apenas gritou:

- Archie!

Kyle continuava segurando sua espada, já dera dois passos para trás e a expressão em seu rosto mostrava que sentia uma dor enorme. O bestial começava a rir e a dizer alguma coisa que ele não entendia. Kyle então fez muita força para levantar a espada acima do nível de sua cabeça e disse:

- Tome isso!

Acertou um chute na virilha do bestial, que parou de pressionar imediatamente. Antes que o monstro pudesse perceber, já estava com a espada de Kyle atravessada em seu peito. Sussurrou palavras de maldição e caiu para trás, como uma rocha.

Havia um último bestial a meia distância, que vestia uma armadura de placas e segurava um machado. Kyle respirou por alguns momentos e avançou com muita raiva na direção dele.

Kiorina concentrava-se bastante e chegava a suar, muito cansada, enquanto terminava de queimar outro bestial.

Archibald estava tonto e caído no chão. Tentava levantar-se, sem sucesso. O bestial que o derrubara havia erguido uma rocha maior que sua própria cabeça. Levantou-a sobre si e andava na direção de Archibald, dando gargalhadas. Chegou ao lado dele e riu, vendo seu rosto coberto de sangue. Preparou-se para soltar a rocha, quando sentiu uma forte pontada no seu peito. Olhou e viu que havia uma flecha onde seu coração batia. Sem ação, caiu rígido, feito uma árvore derrubada.

Archibald, deitado no chão, olhou para trás, tentando ver quem havia disparado a flecha que lhe salvara a pele. Viu uma silhueta, escondendo-se atrás dos arbustos; com sua visão embaçada, não conseguiu identificar a fisionomia, mas viu que se tratava de uma mulher.

A essa altura, Kyle já havia alcançado o último bestial, que parecia ser o líder. Parou de correr um instante, antes de alcançar seu oponente, e ambos se estudaram. Kyle avançou golpeando o bestial com um movimento em arco. O golpe atingiu o peito, porém não o penetrou, apenas resvalou na armadura. Após esse golpe, o cavaleiro ficou numa posição desfavorável, da qual seu oponente se aproveitou para dar-lhe um soco no rosto, que o deixou atordoado. O nariz de Kyle começou a sangrar. Vendo que o bestial preparava seu machado para um golpe, Kyle deu um passo para trás e colocou sua espada em posição de defesa. O machado atingiu a espada, lançando-a longe. O bestial abaixou o machado e agarrou a garganta de Kyle com a mão livre. O monstro, incrivelmente forte, levantou-o no ar, virando-o e batendo-o contra o tronco de uma árvore.

Kiorina, exausta pelo esforço necessário para deter os bestiais, via seu companheiro naquela situação, mas era incapaz de ajudá-lo, conseguindo apenas sussurrar: "Não, Kyle, não..."

Archibald mal conseguia levantar-se e também não podia oferecer-lhe ajuda.

Finalmente, o bestial soltou o pescoço de Kyle, que caiu sentado no chão, recostado no tronco da árvore. O bestial ergueu o machado, segurando-o alto com ambas as mãos. Golpeou com violência na direção da cabeça de Kyle, que, no último instante, esquivou-se. O golpe atingiu o tronco da árvore, mas passou tão perto da cabeça de Kyle, que lhe arrancou uma mecha de cabelo. Ele se aproveitou da situação: agarrou os braços do bestial e segurou uma de suas pernas, desequilibrando a criatura, que caiu. Sem perder tempo, Kyle desembainhou sua faca, presa à bota, e investiu contra o bestial. Agarrou-lhe a cabeça com a mão direita e desferiu repetidas facadas no pescoço. Era o fim do monstro.

- Kyle, você está bem? - disse Archibald, enquanto caminhava na direção dele, segurando o colar com a gema que Atir lhe dera em Kamanesh.

Kyle sinalizou positivamente com a cabeça.

Archibald aproximou-se, extraiu energia da pedra e começou a tocar os ferimentos de Kyle, curando-os e, depois, curou os próprios ferimentos.

- De onde vieram aqueles bestiais? - indagou Kiorina, mais descansada.

- Não sei, mas acho que existe alguma relação entre seu surgimento repentino e aquele clarão. - ponderou Archibald.

- Poderia ser algum tipo de mágica, Kiorina? - perguntou Kyle, checando o amassado no braço de sua armadura.

Kiorina olhou para o alto, torceu os lábios e finalmente disse:

- Bem, teoricamente é possível, poderia ser um portal ou teleporte...

Foi interrompida por Archibald:

- Isso implicaria o envolvimento de alguém muito poderoso ou que dispusesse de muita energia. Não importa qual das duas características, apenas que quem apoiou isso estava atrás de nós!

- Estava não, está! - completou Kyle, demonstrando preocupação.

- Pode ser que não, pode ter sido por acaso. - disse Kiorina, tentando acreditar que não havia ninguém envolvido.

- É possível... - refletiu Archibald - mas e se houver alguém querendo nos eliminar?

- Mas por quê? Para quê?

- Kyle, meu amigo, acho que isso é meio óbvio! Nós somos enviados das pessoas mais importantes de Kamanesh. - e pensou: "É claro que pode ser alguém atrás da gema que Atir pediu-me para entregar a um amigo seu, na cidade oculta..."

- E daí? Isso só seria importante se... - Kiorina parou em suspense.

- O quê?

- Nada, Kyle, só uma bobagem que pensei, não faz sentido...

- Por falar em coisas sem sentido, quem salvou minha vida? Quem atirou aquela flecha?

- Talvez tenha sido um silfo! - sugeriu Kiorina.

- É, pode até ser... mas, se foi um silfo, era fêmea.

- Você conseguiu ver alguma coisa, Kiorina?

- Não, Kyle. Nem uma sombra. Não emitiu um som sequer!

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Então, estamos vendo um pouco de ação, certo? Se estiver gostando, lembre-se de votar para ajudar a divulgar o livro. Obrigado!

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