ZUMBI OU VAMPIRO?

Enquanto o som de gemidos parece aumentar, induzindo consigo, forçadamente, a imagem do prazer, os três jovens dentro do cômodo fechado se entreolham com semblantes de notável desprazer por terem de ouvir. O constrangimento se amplia entre eles em consonância ao barulho.

— Estão fazendo sexo no quarto ao lado do nosso! — Mandy exclama um sussurro aos seus amigos com indignação. — Vamos sair daqui antes que esta noite fique pior.

— Não tem como piorar... — Brian e ela se apressam, indo em direção à porta, todavia o terceiro não se move.

— Tem... — A resposta de Howard toma os olhares daqueles que estacionam antes de chegarem à saída. — Os gemidos não estão vindo do quarto..., estão vindo do corredor.

Com a recente parada dramática, usam a falha de reação para ouvir melhor as proximidades. Constatam como verdadeira a alegação do mais novo. Se as sobrancelhas arqueadas representam o mesmo pensamento, então o trio se questiona, internamente, como sairão dali sem presenciar a cena que se desenrola no corredor.

— Tomara que tenham ejaculação precoce. — Enquanto se aproximam do centro do cômodo, o comentário do rapaz de cabelo platinado toma a atenção. — Que foi? Só quero me retirar daqui o quanto antes.

De forma sincronizada, o grupo começa a rir da situação e cobrem as próprias bocas para que não sejam notados. Risos por nervosismo. No entanto os gemidos se intensificam junto com o som de batidas fortes contra a parede, assim, cessam as risadas instantaneamente. É inegável o fato de que o ápice do momento chega de maneira precipitada.

— Agora estou em dúvida se eles estão fazendo sexo ou travando uma luta... — pronuncia a Morrissette quase sem escutar sua própria voz.

Assim que o trio ameaça dar início a mais risadas, os gemidos se tornam berros de modo súbito.

— SOCORRO!

O grito agudo não causa constrangimento algum, todavia age igual gatilho para a visão de seus próprios temores, como se dessem de cara com a morte em centésimos de segundos e retornassem à realidade. Onde gemia o prazer, agora urra a dor.

Um instinto repentino impulsiona a moça, e ela investe contra a porta, quase a arrancando em vez de abri-la. É a primeira a sair do quarto, seguida pelos rapazes que tentam entender a expressão aterrorizada da amiga antes de vistoriar o que a assusta. Os gritos morrem e os jovens finalmente descobrem a origem da inquietação.

Josh Gray, o jogador com um costumeiro topete escuro, apresenta-se com o cabelo inteiramente bagunçado. Ele não percebe o trio logo ali a poucos metros, então continua sobre a jovem deitada que os recém-chegados constatam ser a namorada do Berseker.

O rapaz segura braços e pernas dela enquanto a come, não de forma sexual e prazerosa, mas sim canibal e assombrosa. Sangue. As paredes alaranjadas e o chão estão manchados de escarlate, o sangue da estudante sem sorte.

Nos primeiros segundos, a paralisia impera sobre o corpo dos três observadores espantados. A ânsia de vômito atinge Howard uma vez mais quando o mesmo foca sua atenção nas veias, pedaços de carne e mais partes do pescoço que são dilaceradas pelos dentes do jogador de futebol.

A primeira reação é a de Mandy, ela fecha os punhos e dá um passo à frente, todavia, quando abre a boca com objetivo de intervir na situação, uma mão de Brian envolve seus lábios e a outra segura a moça pelo pulso.

— Ela não está mais viva... — sussurra à sua amiga, cuja atenção se volta para ele. O medo estampa seu rosto pálido. — Temos que sair daqui, agora.

— Este babaca não pode sair impune desta vez — conclui a mais velha.

— Aquele não é mais o mesmo babaca de sempre. — Ao apontar a cena, murmura o Lewis trêmulo.

A senhorita recua um passo enquanto torna seu olhar ao Josh outra vez. Ela se vê novamente entre os colegas, ombro a ombro. Então decide:

— Vamos voltar ao quarto e trancar a porta...

— Não. Precisamos avisar aos outros do que está acontecendo. — O Williams contrapõe sincronizando o passo para trás que os três dão.

“Querido Diário, sinceramente, convivendo com HIV, com os cortes, depois da ponte, das fotos falsas, do meu pai, minha vida e agora isso..., acho que estou me acostumando com o trágico. Não ter medo me torna um humano falho ou um super-humano?”

De modo repentino, a visão do assassino sanguinário se volta ao trio, finalmente percebendo-os ali. Um sobressalto silencioso apresenta o susto que os apreende. Aparentam aguardar algum tipo de explicação e/ou uma demonstração de arrependimento.

Entretanto não constatam nada além de um semblante inexpressivo, uma boca cheia de sangue e a mudança na coloração das íris do rapaz. Antes eram castanhas, agora, porém, a vida não se mostra mais nos olhos azuis.

— Corram... — Howard cochicha perdendo a voz, mas também não sai do lugar. Josh emite sons estranhos, rosnando como um cachorro raivoso e arfando alto. — Corram!

A adrenalina toma conta do momento. Os Zumbis não demoram em se voltar na direção contrária do perigo e iniciar uma corrida frenética pelo corredor dos quartos estudantis. Não olhariam para trás nem que suas vidas dependessem disto, e talvez dependam.

O som de passos rápidos e pesados os encalça, confirmando a perseguição. Josh aparenta correr tão rápido quanto eles, ou até mais veloz, o que não é surpresa alguma considerando seu porte atlético.

— Que merda aconteceu com ele? — A Morrissette questiona quando tomam outro corredor. Fisicamente falando, ela é, sem dúvidas, a mais preparada defronte a tanto esforço.

— A namorada deve ter... dito algo inteligente demais... para o cérebro dele raciocinar. — O humor de Brian não gera risos, somente mais preocupação por parte dos colegas que percebem sua respiração descompassada, a qual interrompe o comentário.

— Você está bem, Bri? — O mais novo interroga, notando o avanço da moça e a pouca velocidade do amigo que começa ficar para trás. — Você consegue!

— Não é hora de moleza, Brian Lewis! — Mandy exclama com imponência quando já conseguem ouvir a música alta reverberando. Não falta muito a ser percorrido no destino ao centro da escola, onde estarão no meio do caminho em direção ao ginásio esportivo.

A hipoglicemia do rapaz sempre dificultou, de certa maneira, seu empenho físico, principalmente por causa da fadiga constante. É o que o faz ficar atrasado na perseguição.

Howard se assusta ao ver a senhorita olhar para trás com semblante de assombrada e empacar ali mesmo à sua frente.

— Temos que ajudá-lo! — grita ela, referindo-se ao último que aparenta constatar a proximidade do Berseker logo às suas costas.

O rapaz de cabelo platinado expressa desistência e um automático arrependimento por isto. Vira-se subitamente e encara Josh, o qual não cessa a velocidade, apenas emite um rosnado rouco ameaçador enquanto avança em sua direção. Brian não conseguiria correr mais.

— Fujam desta merda de escola! — Ele costumava pedir a Deus uma boa vida e uma morte melhor ainda. Assassinato não era bem o que tinha em mente, todavia o jovem talvez veja como um ato de bravura ao se pôr entre o perigo e seus amigos. Abre os braços e fecha os olhos após ver o jogador a menos de dois metros.

— Não desta vez! — O homicida Gray mantém o foco voraz em sua vítima e não percebe a aproximação de Mandy, a qual brada ao passar por baixo do braço aberto de Bri, colocando-se na frente do mesmo.

Ela surpreende a todos quando golpeia a face do moço descontrolado com o punho direito fechado. Sua ofensiva o lança para trás, e, antes que ele tenha tempo de entender o ocorrido, a Morrissette disfere um soco de gancho em seu queixo, o qual aparenta o desnortear.

O Zumbi de corpo volumoso abre os olhos verdes a tempo de ver Howard ao seu lado direito, este tentando segurar corretamente um extintor de incêndio encontrado na parede daquele mesmo corredor.

— Engole isto! — exclama o adolescente de cabelo preto bagunçado. Pressiona o acionador e mira a pequena mangueira, da qual é lançada uma rajada branca que acerta Josh em cheio.

O Berseker mostra-se cada vez mais desorientado ao ser atingido pelo gás resfriador, no entanto a cólera toma o lugar da confusão, e seus orbes azuis focam no pequeno Williams. Os dois rapazes recuam um passo quando o outro marcha com cansaço para frente. Em meio à propagação gasosa que inunda o corredor, Josh urra ameaçador, da mesma forma grita o trio assustado.

Mandy toma o extintor das mãos trêmulas do mais novo; o empunha com raiva e firmeza. Então alavanca seus braços como uma catapulta, induzindo o equipamento pesado em direção ao rosto do moço intimidante, o qual geme baixo, expressando não ter sentido a dor que o ataque deveria proporcionar. Em seguida, ela gira seu corpo a fim de tomar impulso e acerta o cilindro metálico com precisão na cara do que cai para trás. A face ensanguentada, mas agora com o sangue dele mesmo junto ao de sua falecida namorada.

— Hoje descobrimos uma nova utilidade do extintor de incêndio — comenta a senhorita com peruca, antes de soprar a mangueira e colocar o equipamento no chão. Imponente, porém cansada.

— Zumbis, um; Músculos Ambulantes sob efeito de drogas, zero. — Arfando de cansaço e alívio, humoriza Howard ao indicar os números com os dedos, entretanto logo pousa as mãos nos joelhos. — Isso valeu por todas as vezes que ele nos humilhou.

“Ignorar o medo para seguir sem covardia pode resultar num futuro gatilho para esse mesmo receio. É necessário encarar seus temores e derrotá-los de uma vez... Gostaria de ter entendido isso antes.”

— Obrigado, gente. — O hesitante Brian toma a atenção por instantes, mas logo tornam a observar o jogador desacordado. — Achei que eu fosse morrer...

De repente, Josh fecha os punhos e apresenta seus olhos azuis. Automaticamente, o trio interrompe a respiração e enfim constata que pode não ser uma simples droga ou entorpecente que tira o controle do rapaz. Sincronizam um passo em cautela quando ele mostra vontade de levantar.

— Vamos correr com as mãos dadas, o Bri vai no meio — comanda o Williams, já girando no calcanhar e direcionando sua palma ao amigo, o qual a segura com firmeza dentre o suor excessivo. — Sem olhar pra trás desta vez.

Dão alguns passos rápidos somente, e a Morrissette apanha sua bolsinha que anteriormente jogou ao chão no impulso súbito de defender o amigo. Assim, seguem sem ousar contemplar a retaguarda. O rapaz que corre no meio dos outros aparenta sentir menos fadiga, uma vez que pode contar com o apoio deles.

— Desde quando o Josh é um vampiro? — A moça indaga ironizando seu perceptível medo. Na máxima velocidade que conseguem, os três percorrem em direção à origem do maior barulho, a festa.

— Zumbi — corrigem os outros dois em uníssono oscilante.

— Quê?! — interroga como quem não acredita no que ouve.

— Vampiros bebem sangue, mas não comem suas vítimas. Josh se tornou um zumbi. — Howard explica a diferença igual um perito desvenda o assassinato. — Só não sei o que fez ele se transformar...

— Pode ser efeito de alguma droga, ou um descontrole emocional que o fez matar sua namorada. Agora quer nos pegar por sermos testemunhas. Mas... — A Morrissette tenta achar sentido e elucidar a situação enquanto ainda correm. — Depois dos meus golpes, ele reagiu bem demais pra um humano.

— Se sabemos da existência de um zumbi à solta... — Brian respira fundo antes de continuar —, deveríamos detê-lo pra que isso não se torne um apocalipse.

— Não sabemos se isso é como nos filmes. A namorada dele não ressurgiu dos mortos — contrapõem o rapaz de cabelo e olhos pretos, virando em um corredor já próximo às salas de aula. — E precisaríamos de ajuda...

O trio assustado estaciona de súbito quando todas as luzes começam a piscar. A energia apresenta alguma interferência oscilatória. Em meio ao terror que é ver o corredor sendo iluminado e escurecido repetidas vezes, eles escutam o som que antes era abafado pela música eletrônica alta. Gritos intensos e arrepiantes, como os berros da primeira vítima há poucos instantes.

O alvoroço estridente soa da exata direção mirada pelos Zumbis, o salão festivo. É tarde demais. Consideram tarde até para fugir quando constatam uma figura correndo até eles, contudo, é impossível distingui-la já que as luzes ainda falham euforicamente. Uma ameaça ou alguém que precisa de ajuda?... A incerteza os mantém emperrados à mercê do destino.

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