LUZ NO FIM DO CORREDOR
“[...] Quando a luz é finalmente acesa, fugimos ou seguimos em frente?”
Em certo instante, caminhar por aquele corredor obscuro parece ser mais fácil que fazer o mesmo em um dia normal de estudo. No primeiro caso: vidas sob perigo constante. No outro: alunos apressados, porém com tempo suficiente para repreender uns aos outros por suas diferenças. Talvez os dois casos não sejam tão distintos.
É o que permeia pela mente do pequeno Williams, até que todas as luzes se acendem.
De imediato, o clarão atordoa, substituindo os vultos escuros por flashes claros que logo tomam foco. Chão, paredes e teto pintados de vermelho pelo sangue. Alguns corpos jazem caídos, uns aqui, outros ali, espalhados pelo cenário aterrorizante. Zublyes por todos os lados; o grupo de sobreviventes mais junto do que imaginava; e, logo à frente, uma encruzilhada.
Em segundos, o cérebro decide que, em tal situação, o corpo necessita pulsar mais sangue para braços e pernas, assim, pode correr e se defender melhor. Por causa disso, a barriga sofre com o frio acarretado pela pouca circulação sanguínea. Enquanto o corpo reage por conta própria, os jovens parecem ponderar, em seu interior, qual decisão tomar.
Curiosamente, os adolescentes infectados que os cercam mostram confusão. Talvez se perguntem se devem atacar aqueles que, a pouco, lhes eram como iguais na escuridão. Ou ainda estejam averiguando se são mesmo semelhantes. Sem íris azuladas; nem manchas de sangue em seus corpos (não tanto quanto o esperado); um olhar assustado em vez de um semblante indiscreto.
Howard finalmente decide tornar a rosnar e andar como os zublyes. Sua encenação, no entanto, não engana mais os olhos azuis. A adrenalina invade a cena. Os três rapazes atléticos tomam a frente e correm enquanto empurram os jovens sanguinários contra as paredes. Os dois Zumbis e as duas moças marcham atrás e tentam não ser pegos pelos outros que correm em seu encalço.
— Saiam, seus desgraçados! — brada o Berseker entre outras exclamações que se juntam ao tumulto.
Em meio à ameaça que os cerca, o moço de cabelo e orbes pretos desafia seu destino ao verificar o celular. Ainda precisa seguir a indicação do rastreamento que, na teoria, lhe levará ao Stephan Golding. Sua atenção deixa o telefone quando uma das líderes de torcida é capturada pelo grupo que os persegue.
— Vamos juntos pra esquerda! — O Olímpico declara o que já havia sido combinado. O corredor recomendado leva diretamente a entrada principal. A escadaria à direita induz ao primeiro andar. O caminho em frente revela algumas salas de aula e também o refeitório.
Assim que se encontram na encruzilhada de três escolhas (ignorando a opção de retornar), meia dúzia de zublyes surgem descendo as escadas, e mais outros pela passagem da esquerda.
Um dos atletas não consegue escapar daqueles que apareceram do lado direito, todavia obtém mais tempo para os outros. Os dois à frente tentam abrir caminho entre os adolescentes contaminados que se agrupam no corredor da saída. Entretanto, Howard cursa em frente, correndo na direção do refeitório sem intervenção de nenhuma ameaça, uma vez que aquele seguimento jaz vazio.
— Por aí não, idiota! — Ouve o grito da Patroa restante.
— Fujam daqui! — A voz de Brian Lewis segue seu amigo, o qual percebe ser acompanhado pelo platinado de pele pálida. — O que ele veio fazer pra este lado?
— Eu não sei. — O jovem franzino debate, em sua mente, a confiança no programa rastreador que sugere o final do corredor. Ao almejar o que pode haver à frente, não deixa de perceber a ameaça que os persegue. — Só espero que ele esteja mesmo por aqui.
Os dois Zumbis dão as mãos suadas e trêmulas, assim garantem certo apoio mútuo. Uma ajuda emocional e física. Quantos estudantes os encalçam? Impossível ter certeza. Não ousam olhar para trás, contudo é fácil intuir que são mais de seis, no mínimo.
“Metaforicamente falando: a sombra oferece certa segurança, mas também causa medo. Já a claridade, ela é a certeza da liberdade, todavia tem como consequência a total exposição.”
— Bem que as luzes... poderiam apagar... agora. — O moço com sobrepeso declara sendo interrompido, periodicamente, pelo seu arfar.
— Depender da sorte é o mesmo que esperar a morte. Precisamos é de... — Para surpresa de Howard, todas as lâmpadas apagam instantaneamente, inundando o ambiente na escuridão outra vez. Continuam correndo em linha reta, sem enxergar nada com nitidez. — Temos que despistá-los.
— Vamos entrar numa destas salas... — Voltam a falar baixo a fim de atrair menos atenção, o que não faz diferença, uma vez que seus passos apressados emitem mais barulho que os rosnados dos zublyes cada vez mais próximos.
— Olha. — Dentre o blecaute absoluto, uma luz no final do corredor requisita seus olhares. — É ele.
A tela de um celular, ilusoriamente flutuante, ilumina o rosto lindo, o cabelo loiro bagunçado e os encantadores olhos azuis. Stephan Golding surge no fim do caminho, na passagem ao refeitório.
— Rápido! — convoca alarmado o capitão dos jogadores. Cada instante cronometra o metro que diminui na extensão que os afasta. Pouco tempo após, não há mais nenhuma distância entre os dois jovens amantes, a ocasião, no entanto, não permite cortesia ou ternura. — Pra cozinha, rápido!
Os dois Zumbis esperançosos cursam na frente, entre as grandes mesas do recinto mal iluminado. O Berseker corre na retaguarda, assegurando que não sejam atacados. Não demora muito para que a ameaça já se encontre bem ali, invadindo o ambiente com vandalismo e ferocidade.
Howard e Brian são os primeiros que alcançam a área onde os lanches são entregues, esperam somente a entrada do loiro, então fecham o ambiente poluído por aromas culinários. O trio empurra uma estante sobre a porta, impedindo que ela se abra ao ser forçada pelos zublyes, os quais tentam ultrapassá-la.
— Vamos sair logo. — O Lewis instiga com precaução e segue até a passagem no final do cômodo.
Uma grande vidraça reforçada por grades metálicas os separa do refeitório. Quando aberta, é por ali que a comida é distribuída aos alunos. Por ela, constatam-se os estudantes infectados tentando derrubar a porta ao seu lado. Ignorando tal fato, o casal se abraça calorosamente, como se fosse a última vez, ou tivessem passado anos sem isso.
— E-eu, eu achei que nunca mais iria te... — A fala chorosa do menor é interrompida pelo beijo selado com fervor.
— Eu sempre vou lutar por você. — Esbanjando conforto, Stephan declara o que parece substituir um “eu te amo”.
— Eu sempre vou lutar por você. — O Williams repete com o mesmo sentimento, então usam todo o desejo mútuo para forçar seus corpos, um contra o outro. O aperto do abraço serve como confirmação do fato de estarem finalmente juntos. — Agora precisamos sair daqui antes que eles queiram quebrar este vidro.
— Gente — o moço de íris verdes toma a atenção ao reaproximar do casal que se separa —, a entrada está trancada. Estamos presos...
— Não pode ser. Não desta vez. — O Golding anda na direção da saída. Envolvidos pelo embalo dele, seguem-no até o impasse. — Precisamos derrubar isto antes que eles derrubem a porta — professa ao juntar-se com o moço rechonchudo, o qual, provavelmente, tem mais força que seu amigo magro.
— No três — pronuncia Brian. Contam apressados e, em seguida, lançam seus ombros contra a resistente madeira maciça.
Assim que o som da ofensiva rompe, os jovens fora dali notam tal movimento através da vidraça e tornam real o receio que os acuados mantinham. Os rosnados misturados ao barulho das inéditas investidas contra as grades de ferro são assustadores.
— Mais uma vez! — exclama o loiro.
Uma nova cronometragem mortal furta o pensamento de Howard. Quanto tempo resta para que cada passagem seja ultrapassada? Segundos? Minutos? Não, não há horas, pois as barras metálicas começam ranger histericamente, mostrando que não aguentarão muito mais.
— Meu ombro já está doendo — reclama o moço com sobrepeso, ao pousar suas mãos nos joelhos. Antes que resolva dar continuidade usando o outro ombro, sua função é furtada.
— Me deixa ajudar. — O pequeno Williams toma o lado de seu namorado, então esbarram na porta grossa que parece ser feita de concreto.
— Vamos conseguir, força!
“Qual o poder do otimismo? Bem, eu até poderia dissertar sobre isto, todavia não faço a mínima ideia... O que posso dizer com certeza é que Stephan não foi escolhido atoa como capitão do time.”
Enquanto a porta de saída mostra que logo cederá, a energia que possuem se esvai gradativamente. Entretanto, o cronometro mental para. Na verdade, seus corpos também cessam. Descontinuam ao ouvir o som da grade desabando no chão, e contemplam a vidraça que os aparta do perigo iminente. Não há mais tempo.
— Fujam daqui. — Por milésimos de eternos segundos, o Berseker sela seus lábios aos daquele que ama. Então corre na direção da porta de acesso ao refeitório.
Howard sequer pensa em pará-lo, o fato é que não consegue sequer pensar. Somente assiste a cena (ou o que pode ver dela, uma vez que o cenário ainda jaz na escuridão). Dois barulhos o despertam: o som da estante sendo arrastada, liberando a passagem da entrada; e o estalo de uma grande rachadura no vidro causada pelos impactos.
— Stephan, não! — grita exasperado, contudo é muito tarde.
— Venham me pegar!
Escuta o brado de seu namorado, então se aproxima da vidraça fendida. Silhuetas vão em direção ao centro do refeitório, onde se aglomeram euforicamente. Entre tantos rosnados e um grito de dor e raiva, as palavras “tarde demais” ecoam na mente do jovem.
Não obtém decisão assertiva ao interrogar-se: agradecer ou lastimar? Com certeza, lamentar. Deve sua vida à presença de Stephan quando mais precisou. O jogador é um dos motivos para que o pequeno Williams lute pela própria existência. Sem ele, quase toda sua motivação seria apenas uma ilusão. Ainda assim, gratificar. Vê-se grato ao blecaute por não permitir que testemunhe a morte da pessoa que mais ama no mundo.
Sadicamente, a sina gargalha, e sua risada tem o som do tumulto causado pelos adolescentes agitados que derrubam mesas, rosnam e caçam sua vítima. No entanto, a audição que a ouve é obstruída pela visão que finalmente pode avistá-la. Isto graças às luzes que se acendem como uma maldição.
— Stephan! — Não se importa em chamar atenção, mas isto não acontece por não ser tão chamativo quanto a presa mais próxima aos jovens sanguinários. As lágrimas tornam turva a vista, todavia vê bem o que provavelmente se tornará seu pior pesadelo.
O Berseker rodeado por zublyes, os quais persistem em tentativas de ataques e mordidas. O loiro sangra por alguns ferimentos enquanto força o corpo a lutar pela sobrevivência. Entretanto, o cronometro já não cronometra mais, não há mais tempo. Uma mordida é suficiente para mostrar que seus esforços não foram.
— Stephan! — O grito parece talhar a garganta, ou, quem sabe, isso seja efeito do pranto que não mais prende. Percebe seu reflexo no vidro em frente: cabelo bagunçado; maquiagem completamente retirada pelas lágrimas, as quais deixam visíveis as olheiras tenebrosas adornando seus orbes pretos.
HW: Provável leitor, como explicar as sensações? Não há nada que possamos fazer para transmitir aos outros, com perfeição, aquilo que sentimos. Somente quem sente sabe exatamente pelo que passa e ninguém mais. Por isso não espero ser compreendido, pois, mesmo que eu quisesse, não saberia esclarecer o que senti... Como o vazio pode doer tanto? Eu, sinceramente, não sei.
Ter ciência que nenhuma pessoa no mundo consegue te entender por completo pode ser assustador; dá a triste ilusão de solidão. No entanto, é daí que surge a empatia do amor, a busca impossível e infindável por compreender o próximo.
Na verdade, se quer saber, acho que acabo de descobrir a resposta para minha primeira pergunta: O amor. Não há maneira melhor de explicar as sensações do que por meio do maior vínculo possível entre humanos, o amor. Isto esclarece a minha dor, a qual buscou imitar e, assim, entender pelo que Stephan Golding passava.
“Eu sinto muito... E, se sinto muito, é por que te amo... Mas sinto ainda mais por nunca ter te dito isto.”
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