BOAS NOTÍCIAS

— Considerando que não vamos nos jogar pela janela do primeiro andar, precisamos ir para o de baixo. — Mandy declara, tentando não dar tanta atenção aos berros que reverberam.

— Temos a porta da frente, a entrada pelo auditório, a porta da secretaria, a entrada pela cozinha do refeitório e, ignorando a cerca de três metros, podemos fugir pelo campo. — Howard Williams toma os olhares ao citar todas as possíveis saídas da escola. — Tudo isto no térreo...

O barulho produzido por uma garganta os leva a fitar o líder dos Einsteins, ele ajeita os óculos em seu rosto detalhado de sardas quando dá as costas à janela, pela qual olhava a frente da instituição mal iluminada.

— A falta de luz tira minha certeza, mas, pelo que acabei de notar, acho que nenhum zumbi sequer deixou este prédio. — O rapaz alto revela apontando a vidraça atrás dele. — Boa parte dos estudantes correu para o andar de baixo, querendo sair da escola, porém nenhum parece ter conseguido. Ou seja...

— Corredores cheios de mortos-vivos sanguinários — completa o mais novo de cabelo preto próximo aos ombros.

— Eu estava esperando planos bons e só recebi notícias ruins. — Brian usa um tom de voz ligeiramente choroso. — Deve haver alguma coisa que possamos fazer. Usar dutos de ventilação; arranjar alguma arma; ou achar uma saída secreta; subir pro terraço e esperar algum helicóptero; aprender a lutar com a Mandy. Essas coisas de filme...

— É isso! — exclama Victor.

— O quê? Quer que eu os ensine a lutar? — questiona a senhorita ao erguer uma das sobrancelhas.

— Usar os dutos que não é...

Notícias... — pronuncia o Professor Desempregado, interrompendo a fala humorada de Howard. Aproxima-se um pouco mais dos outros e garante a si mesmo que possui a atenção desejada. — A sala do jornal da escola, podemos sair por lá.

— Mas ela fica no segundo andar — contesta o Williams com obviedade.

— Exatamente, por isso quase ninguém correu para lá, então pode estar vazio. — O rapaz logo constata que precisa ser mais claro. — Meses atrás, alguns Bersekers nos coagiram a colocar uma escada de corda na janela do recinto onde fazemos o jornal. Como ninguém fiscalizava a nossa sala, ela se tornou perfeita para ser a “rota de fuga” deles quando queriam escapar das aulas.

— Não era mais fácil fingir estar doente, gente? — Brian interroga em tom de humor, sem negar a surpresa.

— Isso não teria graça nenhuma pra eles.

— Foco, galera — profere aos seus amigos o moço de íris pretas, depois se volta ao ruivo. — Como assim “quase ninguém”? Quantos foram ao andar de cima?

— Eu estava um pouco preocupado em não morrer — Victor inicia com uma sarcástica voz baixa, todavia logo altera gradualmente até um desabafo histérico —, então não consegui dar tanta atenção aos detalhes enquanto os zumbis destroçavam meus colegas!

A situação aparenta alcançar a sua mente de maneira mais agressiva, desbloqueando um medo primitivo. Falta de ar e lassidão corporal o obrigam a sentar. Os Zumbis o acodem com veemência. A moça abana sua bolsinha para que ele respire melhor, e o Lewis o ajeita na cadeira, uma vez que ele sentou de forma súbita.

— Como vocês... — tenta falar ao contemplar cada um do trio dentre a sua fraqueza — parecem não... sentir medo?

“Parecemos não estar sentindo medo? Mas não é o puro pavor que nos mantém nesta sala? Se não fosse este, já estaríamos lá fora ajudando os outros. Covardes...”

— Já estamos acostumados. — Howard mente com convicção. Confessar seus temores não seria de grande ajuda em tal situação. — Agora precisamos que se recomponha para que nós possamos sair daqui o quanto antes.

Alguns minutos passam, e Victor se ergue da cadeira, não confiante ou com coragem, todavia menos desesperado. O quarteto segue até a porta fechada. Com cuidado e receio, desempilham os objetos que amontoaram em frente à entrada. Mandy retira os saltos pretos e pendura cada um deles em seus braços.

— Tentem não fazer barulho e permaneçam atentos a todo o momento. — Ela cochicha ao pousar a mão na maçaneta. Abre a porta com tanta vagareza que parece um movimento infinito, então põe somente o mínimo de sua cabeça para o lado de fora. Seria uma surpresa se conseguisse ver algo em meio ao apagão total; pleno breu.

Os quatro adolescentes saem da sala e aguçam seus ouvidos. Os ecos de gritos distantes são ouvidos algumas vezes, contudo nenhum rosnado próximo.

— Vamos por aqui. — O Einstein indica a esquerda do corredor, por onde o trio de amigos havia chegado ali. Teriam de voltar. — Quanto mais distante do ginásio, melhor.

Assim, põem-se a dar passos cautelosos. Morrissette e Lewis andam na dianteira, os outros dois marcham de costas, na retaguarda. Negando a certeza de que atrairiam ainda mais atenção, não podem resistir em usar as lanternas de seus celulares para iluminar o caminho. O medo torna quase impossível andar por ali sem luz alguma, considerando a possibilidade de ser atacado por qualquer lado, a qualquer momento.

A ânsia de vômito logo se apresenta quando avistam o tom escarlate do sangue que pinta o chão daquele corredor. Gotas aqui, poças ali. Manchas vermelhas nas paredes, mesmo que estas já tivessem esse tom antes, entretanto um pouco mais ameno. Uma história infeliz, uma tragédia e um cenário apavorante, para um filme de terror só resta... o susto.

A luminosidade das lanternas não alcança mais que alguns metros do extenso corredor de salas de aula. Inspiram pelo nariz e expiram pela boca. A respiração duela com o temor em busca da calma. Não falta muito para encontrarem a escadaria que leva ao andar de cima.

Howard sente seu corpo transpirar enquanto o obriga a continuar se locomovendo de costas, confiando em seus amigos, os quais seguem à frente. Inesperadamente, o jovem de íris pretas se sobressalta quando algo empaca o movimento, suas costas encontram as de Brian. Somente ao virar-se, ele compreende o porquê dos dois na dianteira terem estacionado.

Um corpo jaz bem no pé da escada que deverão usar. Mesmo afastados por alguns metros, é perceptível a ausência de certas partes do estudante. Sangue se espalha ao redor dele.

— Isto é uma boa notícia. — A fala de Victor atrai os olhares franzidos. — As pessoas que foram atacadas pelos zumbis não estão se tornando zumbis também. Isso é bom.

Qualquer comentário possível aparenta absurdo demais para ser dito, quando pensado pelo pequeno Williams, por isso permanece em silêncio. Assim, seguem na direção do corpo, rogando ao universo para que aquele aluno não se levante, mesmo que isto pareça ligeiramente egoísta. Contornam o sangue com cuidado e observam o cadáver.

— Se não é como nos filmes, então não temos certeza de nada sobre o que está acontecendo de fato — declara o mais novo.

— E isso é algo bom ou ruim? — Mandy questiona o que todos aparentam se indagar.

— Eu já disse que...

Um rosnado distante interrompe a arenga do líder dos Einsteins. Os sentidos se alertam e não demoram em constatar que o barulho se origina do corredor, o qual segue até os dormitórios. A visão deles ainda não alcança o causador do som, porém não ficam ali para descobrir.

Com passos rápidos e cuidadosos, sobem os degraus da escadaria larga que faz um giro, então chegam ao segundo andar. Nada de iluminação. Deparam-se apenas com mais corredores cheios de portas e a possibilidade de serem atacados. Agora precisam ir em direção à sala do jornal e fugir dali.

— Esperem. — Victor detém o quarteto com um sussurro. Sem mais explicações, ele pousa o celular no chão e toma a frente do grupo, desfazendo-se de seu aparelho. — Vamos, apressem o passo.

— O que tem em mente? — Quando tornam a caminhar, Brian Lewis interroga o mesmo que seus amigos aparentam desejar saber. Iluminam o corredor com os três celulares restantes.

— Distração, caso precisarmos — responde o moço de óculos ao lado de Howard. Os dois na dianteira.

O cômodo que buscam se encontra no extremo lado contrário de onde se localizam, por isso andam o mais veloz que conseguem, sem emitir sons altos. Entretanto, uma mera dúvida parece valer a vida do jovem Williams, por isso tenta esclarecê-la:

— Você viu quem foram as primeiras pessoas a se transformarem e as que foram atacadas? — Direciona tal questão ao Professor Desempregado.

— Quer saber do Stephan Golding, certo? — A fala surpreende o trio de Zumbis, os quais tentam paralisar suas expressões como maneira de não responder a pergunta. — Falta de reação pode indicar omissão e, com isso, a confirmação...

— Achei que devíamos fazer silêncio. — A Morrissette tenta cessar a conversa com ironia, todavia é totalmente ignorada.

— Como você soube? — Howard o conhece em suficiência para saber que não está especulando algo, então não nega.

— Como eu soube a quem se referiu, ou como eu soube do relacionamento de vocês? — A réplica os espanta ainda mais, então o Einstein toma isso como resposta. — Bem, eu faço parte do jornal da escola. Somos os alunos mais informados aqui, pois estamos de olho em tudo.

— Todos do jornal sabiam? — A interrogação murmurada leva apenas a curiosidade em saber o quanto seu segredo já havia deixado de ser secreto.

— Dividimos tudo que sabemos uns com os outros — declara sem rodeios, então apresenta uma necessidade de se explicar. — Há um mês, acabamos tendo ciência da relação de vocês dois. Como vontade da maioria, isso deveria se tornar a mais bombástica das notícias de nosso jornal.

— E por que não noticiaram?

— Por que não permiti. — A atenção, que não se atrevia a deixar o caminho sem supervisão, direciona-se atrevidamente ao adolescente alto e ruivo, o qual caminha ainda mantendo a cautela. — Bem, nem eu e nem a Leta, a diretora do jornal. Agradeça a ela se...

Rosnados e grunhidos empacam a voz dele, assim como os passos do quarteto. Na oscilação entre sensações ruins e péssimas, as estatísticas apontam mais um pico de desespero contido forçadamente. Brian é o primeiro a se pronunciar:

— Estamos perto demais pra voltar...

— Está tudo sob controle. — Quem mostra mais calma desta vez é Victor. — Desliguem as lanternas pra não chamar atenção e venham.

Com as luzes apagadas, seguem seus passos usando o som como guia, então notam estarem adentrando uma das salas de aula daquele corredor escuro.

— Fiquem apostos e não façam barulho. — O Professor Desempregado comanda com liderança, permanecendo com a mão na maçaneta, mesmo após fechar a entrada. — Não vamos demorar aqui.

Os três Zumbis se mostram indecisos entre continuar em silêncio e esclarecer suas dúvidas a respeito do que o adolescente tem em mente. Desta forma, jazem calados, ouvindo o som agonizante dos estudantes transformados.

— Obrigado... — A palavra exclusiva sai da boca de Howard, esperando ser entendido pelo moço com sardas ao mencionar a atitude dele, não permitindo que a relação com Stephan Golding se tornasse pública.

— Tudo certo. E quero pedir perdão... por hoje mais cedo. — O Williams não leva muito tempo em compreender ao que ele faz referência no pedido de desculpas, pois recorda perfeitamente do momento em que foi entregue pelo jovem de óculos aos Bersekers; ao Josh.

Assente com a cabeça somente, com propósito de não acabar intrigando ainda mais a curiosidade de seus amigos. Se eles descobrissem, o quarteto certamente entraria em uma discussão. O som das respirações toma o ambiente, então, algo furta toda a atenção.

Uma sirene ecoa por todo o segundo andar, entretanto o barulho produzido é pouco chamativo. Com isso, o trio de amigos conclui, ao se olhar e contemplar a face convicta de Victor, que o som se origina no celular deixado para trás.

Não custa muito até escutarem passos apressados carregando consigo os rosnados que os fazem estremecer. Usando a audição e a intuição, pode-se alegar que pouco mais de dez zumbis correm na direção da sirene. O rapaz, com a mão ainda na maçaneta, abre a porta com vagareza e acena a cabeça. Passagem livre.

É esperado que os estudantes transformados não escutassem seus pés precipitados, uma vez que os deles próprios abafam sonoramente o corredor. O quarteto acelera confiando que toda a emaça foi atraída pelo telefone.

— Socorro! — Um grito estridente alavanca ainda mais o tormento. O berro feminino parte de algum dos cômodos em frente, obrigando o grupo a estacionar de jeito abrupto.

— Vamos à sala do jornal.

— Mas temos que ajudar.

— Seja o que formos fazer, que seja rápido. Os zumbis também podem ter escutado o grito. — Após Victor e Mandy respectivamente, Howard declara.

— Me ajudem! — A nova exclamação desfaz a dúvida, pois constatam que o pedido de ajuda se origina no recinto que buscam em sua fuga. O que os faz notar isso é a luminosidade trespassando por baixo da porta, distinguindo a sala do jornal no breu do ambiente.

A Morrissette é a primeira a correr, seguida dos outros. Restam menos que quinze passos e uma escada de corda, então estarão do lado de fora. Correm com esperança e fervor para defender a quem clama por auxílio.

“Sentir que está perto de conseguir o desejado é se encontrar na linha mais tênue possível. Anime-se, porém não comemore. Continue esperançoso, mas não crie tanta expectativa.”

Chegando à entrada almejada, a moça de vestido rodado preto põe a mão na maçaneta e olha cada um dos rapazes, confirmando a prontidão deles. Por fim, abre a porta.

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