PARTE X - 31/10/2014

Um grito de puro medo...

Girei a maçaneta e fechei os olhos. Não que fizesse alguma diferença, estava tão escuro... Ao menos o piano e o violino cessaram. Mais um segundo daquela música, naquele volume, e minha cabeça iria estourar de dor.

Um silêncio aterrorizante pesou na sala. Eu podia ouvir a respiração delas. A centímetros de mim.

Não entendi o que aquilo significava. Em um minuto tentavam arrombar a porta e agora, que conseguiram o que queriam, não faziam nada?

Foi ainda mais assustador ficar parada ali, sem nenhuma saída, ouvindo aquele silêncio. Como se quisessem me pegar de surpresa.

Recuei alguns passos e ouvi o som inconfundível de pés se arrastando. Elas estavam seguindo meu movimento. Meu coração bateu de um jeito doloroso.

Lucian, me ajuda! Cadê você?

Bati as costas em alguma coisa. Um toque quente em cada ombro meu, me fez congelar. Alguma coisa me segurava. Era agora. Elas iriam me pegar.

Gritei, elevei minha voz ao máximo que consegui. Usei todo o ar dos meus pulmões:

-       Socoooooo......

Uma mão grande cobriu minha boca:

-       Calma, noivinha. Estou aqui. Elas não vão te machucar.

-       Du..ki..an... Me sol...ta... – murmurei com a voz embolada

-       Gostei de ficar colado assim em você, sabia? – ele cochichou no meu ouvido. Fiquei com raiva de mim, quando todos os meus poros se arrepiaram, ele destapou minha boca. – Escuta, Hannah. Elas, são convidadas da minha mãe, e estão aqui para recolher um item necessário para finalizar a primeira parte do ritual. Você precisa ficar calma, ou elas vão conseguir, exatamente o que vieram buscar.

-       O que elas querem?

-       O medo. O seu medo.

Inspirei com força. Eu costumava me considerar uma garota corajosa, até botar os pés dentro da maldita mansão. Infelizmente, o medo exalava de mim a cada respirar. Ouvi passos se arrastando e estremeci. Dukian me envolveu com seus braços fortes e insistiu:

-       Concentre-se Hannah. Você não pode sentir medo. Lembre que eu estou aqui.

Desci as pálpebras e tentei me lembrar de momentos felizes da minha vida. De festas de aniversário, de passeios, de viagens, mas só enxerguei desgraças. Mortes, coisas macabras, pessoas que eu gostava feridas. Quase tive uma crise de pânico. Abri os olhos e regulei a respiração acelerada. Aquilo não estava adiantando. Era impossível encontrar a calma naquela situação.

Será que elas estão manipulando minha mente?

Um toque semelhante a uma navalha alisou a maçã do meu rosto. Como uma unha comprida afiada. Soltei um gemido abafado. Dukian apertou mais minha cintura:

-       Shhhh, eu estou aqui.

Tentei me controlar. A unha afiada desceu por meu pescoço e continuou o trajeto por meu braço. Um odor fétido chegou ao meu nariz.

-       Nós vamos te pegar menininha. E não vai demorar muito, pois Acássia, prefere os olhos quando estão frescos.

A unha subiu de novo até o meu rosto e ameaçou encostar em meu olho. Foi quando eu surtei:

-       Fique longe de mim!!! – berrei enquanto me desvencilhava do abraço de Dukian.

Por que ele ficou parado olhando aquilo em vez de impedir? Em vez de fazer alguma coisa?

Andei para o lado e a unha me cortou na altura do quadril.

Uma outra pessoa, ou outra coisa tenebrosa como aquela, rasgou o outro lado do meu vestido. Fui cercada por elas. Procurei por um olhar de fogo amarelado brilhando na escuridão, mas não o encontrei.

-       Dukian! – gemi.

Agachei no chão e cobri a cabeça. Podia sentir um círculo se fechando em volta de mim. Os pés delas se apertavam ao meu redor. As mulheres começaram a entoar algo que eu não conseguia compreender:

“Timor est verum

Timor est verum

Timor est verum

Disseram repetidamente até meus pensamentos ficarem confusos. Quando abri os olhos, não estava mais no salão escuro. A luz daquele espaço, era tão branca que chegou a me ofuscar. O brilho machucou minha vista.

Andei hesitante até um espelho com aspecto antigo, sob uma penteadeira. O clarão de luz desapareceu e consegui enxergar o aposento com detalhes. Era uma espécie de quarto antigo. Com uma enorme cama de dossel de madeira, quadros espalhados pelas paredes, uma banheiro perto de uma janela e cortinas  floridas.

Onde eu estou? Como saio daqui?

Segurei o espelho de mão e gritei ao ver o reflexo. Era uma outra versão de mim. Eu usava um vestido rendado de mangas compridas, um espartilho me apertava por baixo da roupa. Meus cabelos, presos em um coque perfeito, brincos e um colar de pérola completavam o visual do século passado.

Não, não não!

-       Me tirem daqui! Alguém! Me tira daqui!!!

Gritei para o quarto vazio. Derrubei o espelho de mão no chão e quando os estilhaços se espalharam, uma chave saiu de dentro dele. Chutei o objeto para longe.

Apoiei as mãos na penteadeira e tomei fôlego.

Calma Hannah. Deve ser um pesadelo. Daqui a pouco você acorda e isso acaba.

Fitei os itens pessoas sobre o móvel e achei um livro estranhamente familiar. Um exemplar de Jane Austen. Sem saber o motivo, abri a capa e li a primeira folha:

 “Um presente de aniversário para Cordélia Winslet, com amor, Hugo.

 12 de fevereiro, 1815.” 

Cobri a boca. Aquele, era o nome de minha mãe. E Hugo, o do meu pai, que nos abandonou quando eu tinha quatro anos.

Caí sentada no chão e lutei para desamarrar o espartilho. Sentia que ia sufocar a qualquer segundo.

Eu estou em uma vida passada? Mas como meus pais, poderiam ter o mesmo nome?

Eles estão vivos desde 1815?

Não, não, não. Não pode ser.

O mundo girou em um caleidoscópio de cores. Deitei no chão de tábua corrida e levei as mãos ao peito. Tudo rodava.  

Após algum tempo, ouvi alguém me chamar insistentemente. A voz era difícil de distinguir, como se falassem debaixo d’água:

-       Hannah? Por favor, acorda Hannah.

Meu corpo foi puxado. Meus ombros sacudiram bruscamente. Tentei pedir para que parassem com o que quer que estivessem fazendo, mas sofri um espasmo. Tremi alguns segundos e ao abrir os olhos, fitei dois pares de olhos de fogo. Um vermelho e outro amarelo.

Eu me sentia como se tivesse acabado de ser salva de um afogamento.

-       Lucian? – Eu estava no colo dele.

-       Banana. Eu fiquei tão preocupado com você. – Ele me abraçou e fui dominada por uma paz absurda. Uma calma, um certo tipo de cura.

-       Cara, deixa ela respirar. – ouvi a voz mais grave de Dukian.

Dukian se abaixou e virou meu rosto. Em seguida, me beijou sem aviso na boca, mesmo com Lucian me segurando no colo. Suspirei. Os lábios carnudos e macios de Dukian levavam minha razão para longe. Ele descolou a boca da minha e abriu o sorriso de cafajeste:

-       Noivinha, que susto você me deu.

-       É assim que você quer que ela respire? Seu imbecil! - Lucian rosnou.

-       Parem com isso, vocês dois.

Ergui o tronco saindo do colo de Lucian e sentei sentindo o corpo molenga. Só então olhei ao redor. Parecia o meio de uma floresta. As árvores eram tão altas, que não fui capaz de enxergar o céu.

-       Como cheguei aqui? O que aconteceu?

-       Calma banana.

-       Elas conseguiram Hannah, através do seu medo, concluíram a 1a parte do ritual.

-       Não é a hora de contar isso a ela, Dukian.

-       Ela precisa saber! – Dukian sentou ao meu lado no chão e continuou – O seu medo, te deixa vulnerável Hannah. Quando você se agachou no meio do salão e se entregou ao pânico, elas entraram na sua cabeça, e pegaram o que precisavam para a parte um. Timor est verum. No medo, jaz a verdade.

-       Como assim? Pegaram o que?!

-       Não há como saber o que, mas relaxe, você está bem agora. – Lucian tentou me acalmar.

-       Mas e agora? – Eu quis saber, aflita. – E como nós escapamos?

Lucian e Dukian trocaram um sorriso.

-       Nós colocamos fogo na mansão. Era o único jeito de fugir. – Dukian parecia orgulhoso.

-       Acássia não vai gostar nada disso. – Lucian completou com um sorriso torto.

-       Posso ir pra casa? – perguntei com um fio restante de esperança, mesmo sabendo qual seria a resposta.

Os dois me olharam com uma expressão torturada no rosto. Lucian fitou os próprios pés, foi Dukian quem respondeu:

-       Ainda não. O Halloween ainda não acabou, mas agora vem a parte 2. O Dia de Todos os Santos.

-       E o que nós vamos fazer? – Arranhei meus braços. Não queria nem imaginar o que viria a seguir. Minha intuição dizia que seria ainda pior.

-       Precisamos encontrar o Sacerdote, antes da meia noite. Ou nosso amigo aqui...

-       Quem garante a você que ele ainda existe, Dukian?! – Lucian cortou o irmão, furioso. Ele se levantou e andou para dentro da mata fechada. A reação dele aumentou minha preocupação.

-       Ninguém me garante. Mas é a nossa única esperança!

Dukian gritou para as costas dele e se levantou me oferecendo a mão.

-       Vamos Hannah. Quando ficar cansada, me avise que terei o maior prazer em carregar você. – Ele sorriu malicioso. Aceitei a mão dele e seguimos para a mata fechada no meio da floresta.

Fui porque não tinha nenhuma outra escolha. O medo fazia meu sangue pulsar com força.

E se não chegarmos a tempo? O que vai acontecer à meia noite?

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beijossssssss

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