Encurralados
Mesmo com o aviso daquele estranho homem, que até hoje nunca soube de quem era, nós entramos no território do inimigo. Na verdade eu até que não tinha medo, mas a minha maior preocupação era a integridade física da nossa pequena Judy, ela era apenas uma criança e isso poderia ser visto como um alvo fácil aos canibais.
Nós três estávamos fortemente armados ao redor dela, até que avistamos algo simplesmente terrível. Logo na entrada da tribo, havia um crânio espetado numa lança, onde um corvo devorava o olho direito do cadáver, aproximei um pouco mais e pude perceber que já estava em avançado estado de decomposição, vermes se alimentavam da carne apodrecida, o cheiro era forte e repleto de moscas em volta.
Inesperadamente o tenente sacou seu revólver, uma pistola 380 da Taurus e atirou contra a ave, matando ela na hora e disse:
- Odeio corvos!
- Você ficou maluco?! - Perguntou Gabriel aborrecido
- Por que?
- Você está chamando atenção, assim eles vão nos localizar facilmente graças ao seu disparo!
- Eu não me importo, estou carregado até os dentes rapaz, podem vir a vontade!
Nesse instante eu joguei o militar contra uma enorme árvore e olhando nos olhos dele, falei:
- Escute aqui Travis, não sei se você notou, mas estamos com uma criança inocente e ela precisa da gente para ficar viva! Eu prometi para essa menina que tudo ia ficar bem e não vou deixar que um canalha como você estrague minha missão!
O tenente me empurrou também com raiva e dando uma olhadinha para Judy, viu que ela estava atenta olhando pra ele, onde ele retorna sua visão pra mim e disse:
- Eu não me esqueci senhor Ryan Smith! Me desculpe se fiz algo que vocês não gostaram, mas eu também não sou babá dessa pirralha!
- Foi você que implorou para nos acompanhar, se quiser ir embora vá agora! - Comentou o Arcanjo
Ele olhou ao redor e vendo que não tinha saída, disse:
- Está tudo bem ok? Perdi a cabeça matando esse pássaro! Só de lembrar que perdi meus homens por causa do bandido do Jason, me deixa revoltado!
- Isso não é desculpas para você tomar decisões erradas, que isso não se repita mais! - Alertei o tenente
- Pode deixar senhor Ryan, e também me perdoe pirral... Judy! Não foi minha intenção te assustar!
A pobre menina apenas se escondia atrás de Gabriel, tremendo de medo do Travis, também não era de menos, já que a todo momento ele demonstrava quem realmente era. Eu não havia esquecido das palavras de Darak.
Apesar do clima tenso, a gente ainda éramos unidos, afinal Judy dependia de nós para sobreviver.
O caminho estava cada vez mais difícil, onde Gabriel usava sua espada para cortar as folhagens que atrapalhavam nossa visão. Só mesmo loucos como nós para adentrar naquela mata fechada, repleta de canibais famintos e lendas macabras. A pequena criança não desgrudava de mim, enquanto o Arcanjo abria uma passagem com a sua arma. Nem imaginava o que íamos encontrar logo adiante.
Inesperadamente, ouvimos a voz de um homem pedindo socorro, implorando por ajuda na verdade.
- Vocês estão ouvindo isso?!
- Sim, estou Gabriel! Vamos ver o que está acontecendo! - Afirmei para todos
Quando andamos um pouco mais, me deparei com algo que jamais imaginei ver em minha vida. Achamos um rapaz sentado no chão da floresta, com a perna esquerda presa em uma armadilha de pegar ursos, os seus ossos estavam quase se partindo ao meio, mas o mais chocante foi ver o estado que ele se encontrava. Esse cara estava sem os olhos e o braço direto arrancado, onde a carne ficava pendurada pelo ligamento do ombro. Parecia que um leão havia atacado aquela alma, que apenas agonizava lentamente, esperando pela morte.
Ao ouvir nossos passos, ele tentava se afastar, morrendo de medo, onde eu me abaixei e disse:
- Tenha calma meu jovem, eu não vou te machucar!
- Quem é você?!
- Meu nome é Ryan Smith, eu estou aqui com minha equipe e nos deparamos com você nessa situação! Pode nos dizer o que houve?
- Saiam desse inferno... Antes que seja tarde! Vocês vão morrer se continuarem aqui!
- Eu não vou a lugar algum! Me diz quem fez essa atrocidade!
- Eles vão voltar... Corram por favor... Salvem suas vidas...
- Eles quem?! Os canibais?!
- Sim! Eles são terríveis... E escondem aquela coisa bizarra...
- Que coisa?!
Antes que ele dissesse mais alguma coisa, surgiu uma lança do nada em alta velocidade e atravessou a cabeça do jovem e a árvore, fazendo o sangue escorrer pelas folhas.
Na mesma hora começamos a correr e atirar para trás em todas as direções, mas não adiantava muita coisa, pois os nativos conheciam aquele lugar como a palma da mão. Os verdadeiros invasores eram eu e meus amigos, ou seja, estávamos mais perdidos do que nunca.
Eu atirava mas sem saber ao certo onde eles estavam, avistava somente vultos atrás das árvores numa velocidade impressionante. Gabriel carregava Judy no colo, enquanto eu e Travis dávamos cobertura, cobrindo sua retaguarda. Até que por um momento eles pararam de nos perseguir, então nós também paramos de atirar e ficamos ali parados, olhando ao redor daquela floresta escura e sombria, esperando eles surgirem e nós metermos bala.
Misteriosamente, ninguém apareceu, então resolvemos continuar andando dentro da mata.
Mesmo sabendo que era arriscado, resolvemos prosseguir, mas agora o cuidado era maior, afinal tínhamos uma criança conosco.
- Alguém aqui conseguiu ver a cara deles? - Perguntou Gabriel assustado
- Eu vi somente vultos e só pensava em atirar! - Respondi
O Arcanjo olhou para o tenente e perguntou:
- Você nos disse que já foi perseguido por esses canibais, como eles são Travis?
- Eu não me recordo muito bem, eu apenas corria para fugir deles, estava escuro , mas sei que são altos!
- Espero que não esteja mentindo! - Indagou Gabriel
- Acha mesmo que eu ia mentir sobre uma coisa dessas?! Eu quase morri por esses lunáticos!
- Esperem, escutem isso! - Interrompi os dois
Ouvimos algo estralando no meio da floresta e cheiro de carne queimada, quando abaixei uma enorme folha de uma planta, descobrimos a pequena tribo dos canibais, e o barulho de uma fogueira, que ficava bem ao meio.
Aparentemente o local estava vazio, até que algo realmente inesperado aconteceu...
... A ingênua da Judy avistou uma borboleta colorida e correu atrás dela, indo até a aldeia dos nativos.
- Volta pra cá menina! Saia já daí! - Tentei chamar a atenção dela
- Que garota burra! - Exclamou Travis aborrecido
- Por que você não segurou ela?! - Perguntou Gabriel
- Achei que você já tivesse fazendo isso!
- Parem com isso vocês dois, estão piores que a Judy! - Recriminei ambos
Sem alternativas, nós invadimos a tribo e apontavamos nossas armas para todos os lados, se um deles aparecesse, seriam mortos na hora.
Abracei a menina e disse:
- Não faça mais isso! Você não deve correr desse jeito sem um de nós por perto!
- Tá bom tio Ryan, me desculpe! - Disse Judy com uma carinha de quem queria chorar
- E sem lágrimas por favor! Lembre-se do que eu te disse no laboratório!
- Preciso ser forte!
- Exatamente! Boa menina!
Comecei a observar melhor o local e apesar de simples, era bem estruturado, se tratando de um bando de índios comedores de carne humana.
- Pessoal, fiquem de olho na Judy, eu vou explorar um pouco mais essa tribo!
- Pode deixar Ryan, mas tome cuidado! - Avisou o Arcanjo
Saquei minha 9mm e iniciei minha investigação naquele vale sombrio, cada passo que eu dava, tinha a impressão de que algo ruim fosse me acontecer.
Entrei em uma das Ocas e avistei objetos bizarros pendurados nas paredes de palha, como cabeças de boneca e crucifixos feitos de graveto, molhados com sangue. Não conseguia entender o que aquilo significava e para ser honesto, não estava disposto a descobrir.
Ao olhar para o outro lado, percebi que outra Oca da tribo emanava luz do seu interior. Fui até lá cautelosamente com a arma automática engatilhada e invadi rapidamente, apontando para os dois lados, mas felizmente estava vazia.
No entanto, o que havia chamado minha atenção, foi o fato de me deparar com um olho humano sobre o chão, rodeado por velas negras, aquilo chocou minha alma. Realmente eu não sabia o que se tratava, mas de uma coisa eu tinha certeza, talvez o maldito Bill estivesse por trás dessas aberrações e envolvido com os canibais.
Quando eu saí lá fora com a intenção de resolver essa parada de uma vez por todas, notei que havia uma espécie de pequeno templo no alto da tribo. Lembrava uma capela, mas não havia nada além de um corpo sem cabeça logo na entrada, isso mesmo que eu disse, o corpo estava na escada, como se fosse um aviso aos visitantes para não entrar lá dentro.
Mas como eu estava preparado para qualquer coisa, não obedeci ao sinal macabro e comecei a caminhar em direção ao local maldito. Se Bill estivesse escondido seria minha chance de acabar com ele, ou quem sabe o próprio Lúcifer. Eles podiam ser assombrosos quando queriam, mas jamais conseguiriam me deter com esses truques do inferno.
Ao me aproximar do corpo, descubro que além de estar decapitado, também tinham arrancado o seu coração, havia um buraco enorme no lado esquerdo do tórax.
Na mesma hora, me recordei daquele crânio que achamos no meio da floresta, espetado numa lança afiada, provavelmente era a mesma vítima. Sem pensar duas vezes, tentei adentrar ao local escuro, mas fui surpreendido por um corvo que pousa no topo do templo e crucitava alto olhando para mim, como se quisesse me impedir.
Fiquei olhando bem para aquela ave sinistra e ela não saía do lugar, como se realmente estivesse protegendo o local. Apontei minha 9mm para o corvo e pensei em atirar, mas lembrei que até poucas horas havia dado uma bronca no tenente Travis por causa disso, eu tinha que pensar na segurança daquela criança.
Mesmo assim resolvi entrar novamente, afinal era só um corvo, que mal ele poderia fazer? Ao dar dois passos para frente, ouço batidas de asas no alto da minha cabeça. Quando olhei pra cima, avistei outros sete corvos pousados no templo, e observavam atentamente os meus movimentos, qualquer sinal de alerta, eu estava ferrado.
Eles crucitavam bem alto, tentavam me expulsar de alguma forma. Foi nessa hora que olhando bem para o cadáver decapitado sobre as escadas, pude deduzir que este homem também tentou acessar esse templo sozinho, e por isso morreu daquela maneira tão brutal.
Seja lá o que for que havia lá dentro, era muito poderoso e maligno ao mesmo tempo, confesso que senti arrepios ao olhar aquela escuridão misteriosa, tentando imaginar o que estaria escondido lá dentro e por que aquelas aves malditas guardavam o local com tamanha precisão.
Mesmo com medo, eu ainda tinha coragem de encarar aqueles corvos demoníacos, mas não era ingênuo o suficiente para entrar no templo naquele instante. Eles faziam muito barulho e isso podia denunciar minha presença aos canibais, se eles aparecessem naquela hora eu estava morto.
O meu dedo coçava no gatilho para atirar neles, mas um único disparo provavelmente causaria uma fúria coletiva do bando e me atacariam violentamente, fora a possibilidade dos nativos descobrir nosso paradeiro.
Fui andando cautelosamente para trás, apontando minha arma para o alto, infelizmente eu não tinha escolha a não ser me retirar. Porém, quando estava prestes a descer o último degrau, ouço disparos ao longe e gritos de Judy em desespero.
Os corvos começaram a voar no céu, espantados com os tiros, onde aproveitei para fugir daquelas aves sinistras.
Comecei a correr apavorado de volta aos meus amigos para saber o que estava realmente acontecendo.
O que eu mais temia estava diante dos meus olhos, ao ver logo de cara, Gabriel e o tenente caídos no chão, acertados com uma flecha nas costas e a pequena Judy correndo até mim, chorando desesperada...
- Socorro tio Ryan...
No momento em que eu ia segura-la, uma nuvem negra de corvos surge entre nós dois, nos separando.
As aves malignas criaram uma espécie de barreira coletiva, deixando a pobre criança a mercê dos canibais.
Inesperadamente senti uma picada forte em meu pescoço, ao colocar a mão, percebo que fui atingido por um dardo, me causando um sono repentino, mas antes que eu apagasse completamente, ainda consegui ver as pernas dos nativos agarrando a indefesa menina, que se debatia, mas nada poderia ser feito.
...Nessa hora meu coração percebeu que o mais grave ainda estaria por vir...
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top