Parte III - Meu QI é alto
A véspera de Natal tinha chegado. Eu já tinha feito todo um plano para o dia... Pois isso é daquelas coisas dos meus feitios, que incluí organização extrema e uma agenda para me direcionar minimamente em todos os detalhes para não se esquecer de nada. Não sou muito confiável quando se expõem a minha memória como teste. Já tinha passado em frente à loja que continha meu (futuro) vestido três vezes.
Não sabia se toda aquela atividade física teria feito sucesso, e não estava tão a vontade de colocá-la à prova. Mas a verdade era que não estava tão paranóica assim com o fato de ter aumentado dois números acima do meu tamanho. Tinha até me permitido devorar uma torta de chocolate naquela manhã. Eu estava me permitindo mudar. Não apenas, notoriamente, no corpo, mas também na cabeça, na forma distorcida de pensar. Tudo bem... Tinha um dedo de uma pessoinha aí... Passei pelo parque duas vezes na esperança de vê-la, por exemplo, mas como previsto, e da mania insuportável de Marcelo de cumprir tudo o que diz — não que isso seja de todo ruim —, ele só me encontraria na ceia de natal, na minha casa. Segundo ele e sua teoria, era para me deixar com saudades de sua companhia... E tem mais, que quando o visse, iria implorá-lo para beijá-lo. Ah, por favor! Como se isso fosse realmente acontecer. Ele era muito é presunçoso; isso sim!
Entreina loja e comprei o vestido. Eu não resistir. Ele era magnífico com sua leveza,cor e modelagem. E eu era uma pecadora-devoradora consumista. Não sabia se iria mesmo servir, então levei um número maior. Por vias das dúvidas, claro; e fuidireto para a casa de minha mãe que morava do outro lado da cidade. Como estavade folga — evidentemente, pois seria quase trabalho escravo trabalhar justamente na véspera natalina — desliguei meu aparelho celular e quaisquer meios tecnológicos que pudessem usar para entrar em contato comigo. Não que eu fosse totalmente a favor da idéia precipitada do momento; pois vai que acontece alguma desgraça e precisam me contatar? Tipo, uma morte? Do meu tio — não que eu o odeie —, mas que gosta de comer arroz cru e engoli sem mastigar? Não quero ser pessimista, mas em época natalinas, feriados, festas comemorativas e afins,pode se esperar de tudo, tudo mesmo, inclusive da minha família que a cada passo é um estrago diferente. E nem digo isso pelo fato de minha querida tiaNice ter morrido engasgada — que Deus à tenha! — fazendo uma competição de quem comia mais cachorro quente. Um desastre só! Imagina? CO-MEN-DO CA-CHOR-ROQUEN-TE?! É muita má sorte...
No final ela até que ganhou o prêmio de"Devoradora", mas bateu as botas logo em seguida... (Pobre tia Nice...Era tão nova! Uma novinha de 50 anos, mas ainda sim nova!) No entanto, digo isso, pois... Eu nem sei por que estava pensando nisso. Acho que estava nervosa. Muito. Liguei novamente o celular. Nunca se sabe quando alguém pode bater as botas após comer exageradamente em uma ceia. Não sei se, bem, pode realmente acontecer... Mas é melhor se manter precavida, já que eu tenho o carro para servir de motorista caso alguém sabe lá, dê uma indigestão.
Assim que cheguei ao meu lar, após uma hora e meia, pude sentir a correria dela de um lado para o outro terminando de organizar enfeites, preparar a ceia e deixar tudo impecável para o Natal. Era tradição. Não podia sair nada errado no dia que toda a família se reunisse. É imperdoável admitir, mas teve uma época da minha vida que não me agradava tanto assim essa tradição... O que fez com que passasse os três natais anteriores fora do país, da minha casa, do meu verdadeiro lar. Tola eu? Nem me fale! Mas esse ano foi diferente. Natal não era natal sem meus irmãos caçula gritando, os desastres naturais da família Perez Avelar ou meus avôs me interrogando sobre meu casório que nunca saía.
"Eu não vou me casar vovó", repetia sempre. Ela não aceitava e dizia que eu estava muito "moderninha para o meu gosto".
Assim que minha mãe me viu parada na soleira da sala, sorrindo enquanto a observava, ela veio até mim correndo e me abraçou. Foi tão rápido que nem tinha percebido que meus irmãos também se juntaram ao abraço.
— Estava com saudades... — admitir. Eles ficaram surpresos, é claro, eu nunca demonstrava sentimentos assim. Diana era forte como rocha, mas logo recuperaram do susto e sorriram.
— Trouxe nossos presentes, né, mana? — Meu irmão, João, foi quem falou.
— E que tal um vestido para sua irmã mais linda do mundo, em? — Minha irmã, que pegou a obsessão de vestido de mim, juntou as mãos frente ao rosto.
Revirei os olhos. Como fui passar tanto tempo longe deles?
— Ah, seus interesseiros, deixem sua irmã em paz! — Minha honrosa mãe brincou e eles sumiram escadas acima gritando e tentando prever o que eu teria trago. Justo. Eu realmente tinha levado presentes.
— É bom te ver, mãe.
— Sim. É sempre bom me ver, Diana dos Vestidos. — Ela e riu me abraçou novamente e me deu uma tapa na bunda. — Agora vai descansar... Temos muito que fazer ainda.
Foi o que fiz: Descansei a tarde inteira e depois fui para a batalha de controlar João e Joana (engraçado, não?), meus irmãos gêmeos de 16 anos que bagunçava mais do quê ajudava.
— Jão, seu peste inútil, ninguém coloca farinha no brigadeiro, não sua mula. Mas é burro, viu! — minha irmã gritava com meu irmão que fazia o possível para irritá-la. Eu ria observando-os.
— Mãeeee! Tira o João daqui!
Minha mãe apenas rolou os olhos ignorando-os.
— Aí mamãe, tira o João daqui! — ele imitou-a, deixando-a ainda mais nervosa.
— Eu vou ralhar sua cara, moleque! Daí eles sumiram da cozinha deixando uma bagunça terrível no balcão. Suspirei. Sobraria para mim.
— Ei, mãe? — chamei.
— Sim? — respondeu do outro lado da cozinha enquanto vigiava algo no forno.
— Um amigo meu vêm passar natal conosco, tem algum problema?
Ela parou o que estava fazendo e riu, me observando, curiosa.
— Namorado?
— Amigo — corrigir.
— Certo. Seu amigo será mais do quê bem recebido. Ele deve ser um amigo muito importante, para trazê-lo até aqui, em? Você sempre odiou "seus amigos" aqui em casa.
Dei de ombros.
— Marcelo é... Legal! Muito legal.
Foi o que respondi antes de subir para meu antigo quarto para me arrumar.
Eram oito horas da noite e boa parte da super família Perez Avelar já estava chegando. Inclusive aquele tio que disse que gostava de arroz meio-cru. Ele chegara cedo o suficiente para mamãe separar seu arroz semi-cru. Familiares são homo sapiens estranhos, digo-lhes.
Tinha chegado o momento da prova... O Vestido Perfeito... A etiqueta... Toda uma cerimônia. Olhei-me no espelho e sorrir. Então parei para pensar: Não era apenas perder peso. Minha saúde também estava em jogo ali. Eu estava muito mais disposta e cheia de energia ultimamente. Não o suficiente para amar acordar mais cedo que o normal, mas o bastante para estar disposta, até mesmo numa daquelas reuniões terríveis que duravam horas. E daí se eu estava, hum, cinco quilos mais cheiinha? Essa coisa de etiquetas, de etiquetar tudo, rotularem vontades e etiquetar pessoas é bem desnecessária. Você aprende a se amar, antes de pensar em perder.
Peguei o número maior e entrei nele. O vestido não ficaria menos esplêndido por isso. Tudo bem, devo admitir que fiquei feliz ao perceber que o tamanho quarenta e dois estava largo em mim, me fazendo parecer uma sacola. Mas fiquei maravilhada ao entender que tinha voltado para o tamanho quarenta. QUARENTA! UFA!
Nove horas Marcelo chegou. Eu dei graças a Deus! Já não aguentava toda a família perguntando do tal namorado meu, que algum mosquitinho (cof, cof, minha mãe) tinha espalhado por ali que apareceria e que era a cópia idêntica do Brad Pitt. Marcelo não é exatamente a cópia idêntica do Pitt, mas é com certeza um estilo (quase) de um galã. Um galã diferente e presunçoso! Eu olhei chocada enquanto ele atravessava a sala rindo e conversando com meu tio, vindo até mim. Seu olhar cruzou com o meu e eu me derreti todinha, fazendo o tempo parar e ignorar minha vó que falava sobre como meu casamento ficaria fantástico se tivesse uma carruagem para me levar até a igreja.
Carruagem? Sério? Fiz um sinal com a mão, concordando. Marcelo era meu foco. Ele estava mais lindo do quê eu conseguia me lembrar. Ele tinha total razão sobre esse negócio de sentir saudades... Eu não conseguia desviar os olhos dele sem ouvir a droga do meu coração bater rápido.
Calma coração... É só Marcelo. Só isso!
— Então esse é o noivo?
— Ééé! — respondi com convicção totalmente alheia a qualquer coisa que não fosse Marcelo bem ali na minha frente totalmente maravilhoso e incrível.
Ele me abraçou e me olhou confuso. Não! Droga! Corrigir-me: — Não, vovó. Ele é apenas meu amigo...
Ela assentiu e bebericou o vinho na sua taça.
— Jovens são tão bobinhos. — Riu e foi fuxicar com minha mãe, não sem antes dizer: — Está aprovado, em?! Um filé!
Vovó já tinha bebido quantas taças de vinho mesmo?
— Noivo, em? Já estamos assim? — provocou assim que ficamos sozinhos.
Dei um soco de brincadeira nele. Seu perfume estava tão aguçado em minhas narinas, atrapalhando tanto meus pensamentos que me vi o puxando para um local que pudéssemos ficar sozinhos.
— Calma Diana... — debochou.
Chegamos ao terraço todo decorado de pisca-pisca. A casa inteira estava do mesmo jeito. Não tinha lugar mais clichê para agarrar-lo.
— Ta legal, Marcelo. Beija-me! — pedi e ele me encarou por segundos, que pareceram horas.
Estava impaciente. Seus olhos tinham um brilho especial. Um sorriso sapeca e contido escapava pelos seus lábios, e ele mantinha uma expressão divertida que me irritava.
— Desculpa, Di. Mas estava falando sério quando disse que nunca beijaria você.
Abrir a boca e fechei, puxei os cabelos do couro cabeludo e o olhei com ódio. Abrir a boca novamente e desistir de fazer um escândalo.
— Você é um idiota — xinguei-o estapeando e sentindo um nó na garganta por ter feito papel de boba. Eu nunca perco o equilíbrio.
Ele segurou meus braços e me forçou olhá-lo. Tentei recuar, porém, Marcelo me segurou mais forte... Forte o suficiente para me trazer o mais perto possível dele, juntando nossos corpos.
— Mas se isso for seu pedido de natal eu posso reconsiderar... — sussurrou próximo à minha boca, fazendo movimentos circulares com os dedos aonde me tocava. Odeio esses seus joguinhos estúpidos!
— Se eu disser que sim... — me peguei dizendo. Eu já nem formulava nada à base de razão com toda aquela aproximação.
— Seu pedido é uma ordem!— Ele me beijou sem ao menos ouvir o que tinha para dizer, me pressionando na parede. Eu não tinha o que dizer mesmo.
Ah, por favor, eu nem queria dizer nada se isso significasse Marcelo me beijando para a vida inteira.
— Devo confessar que estava esperando a muito tempo por isso. Não é todo dia que encontro uma desengonçada no parque... Ele disse me acariciando e brincando com a manga do meu vestido.
— Ah, é? Fala mais...
— E que tem os olhos mais lindos e sinceros que eu poderia ter.
— Isso é verdade! Continua.
Sorri boba beijando seu rosto carinhosamente enquanto seus lábios quentes passavam pela minha pele. Eu estava caidinha.
— E que é tão inteligente, forte e independente que me deixa com medo.
Ele riu e eu franzi a testa, recuando.
— Eu te deixo inseguro? Pensei que fosse meu peso que te deixava assim!
— Lá vêm você de novo. Quantas vezes vou ter que te dizer que você não está gorda?
— Na verdade você nunca disse. Até me obrigava a ir todos os dias correr. Isso tem algum motivo, certo?
Levantei uma sobrancelha.
— Acho que seu QI não é tão evoluído assim, Diana. — Debochou e me olhou cínico. — Você não está gorda. E eu só te mandava mensagem todos os dias te obrigando a ir correr, porque eu gosto da sua companhia.
— Então você não se preocupa se visto quarenta ou quarenta e dois? Ele semicerrou os olhos, sorrindo docemente.
— Deus, Diana. Eu iria querer você mesmo se tivesse cem quilos! — Rir daquela mentira. — Ok, não vamos exagerar, né? Por que vai que você empolga?
— Marcelo!
Rimos.
Incrível como sua gargalhada soava como música para mim.
— Quero que saiba que isso não faz diferença. Só prometa que continuará me acompanhando todas às manhãs?
— Se você pedir com jeitinho eu pode considerar...
Ele concordou e me deu um beijo na testa.
— Agora, dá para parar com essa paranóia e me beijar logo? Eu prometo que nem me importo com suas gordurinhas...
— Bobo!
— O que acha de aproveitar o filé aqui, hum? — revirei os olhos e ele riu enlaçando minha cintura. — Ei gata, você não quer quebrar sua dieta com o filé aqui, não? — Brincou e agarrei-o antes de ser chamada por minha mãe para a mesa.
Eu já nem ligava pelo fato de eu vestir quarenta ou quarenta e dois. Marcelo me fez enxergar a mulher bonita que era mesmo com o tamanho quarenta e dois — que agora é passado. Eu estava adorando aquele natal cada vez mais, e não me limitei em me jogar de cabeça na comida maravilhosa daquela ceia. Chega de etiquetas! E daí se peso dez quilos a mais ou a menos? O vestido ficou perfeito em mim de qualquer jeito... Mesmo com uns quilinhos a mais. Eu estava tão feliz, saudável e tão disposta que nem liguei para o fato de vovó ainda planejando o meu casamento.
— Ei, Di? — Ele entrelaçou seus dedos com o meu, enquanto me estendia um presente. — Feliz Natal!
Peguei e sorrir olhando para nossas mãos.
— Feliz Natal Marcelo! — falei a tempo de ouvir minha vó gritar: — Tem que abrir o presente! — Marcelo corou e minha vó riu dando uma piscadela, espertinha.
— Tradição, querido – Todos nós rimos, e ela ergueu a taça (a décima já) de vinho para Marcelo, que fingiu um sorriso e olhou suplicante para mim.
Rir. Tarde demais, Marcelo...
Abrir o embrulho vermelho dentro de uma caixa delicada e...
— Um lingerie, Marcelo?
Ele corou e todos da minha família riram. Acho que minha campanha publicitária tinha feito sucesso. Era exatamente da mesma marca que direcionei dias atrás para o mercado. Puxei seu rosto e o beijei.
— Pervertido!
****************************
Espero que tenham gostado assim como amei embarcar nessa nova história.
Não deixem de votar e comentar. É importante!
E já que estamos por aqui...
FELIZ NATAL! Para você e sua família... Que esse Natal seja mágico e repleto de alegrias, amor e muita comida rsrs. Te desejo tudo o que é bom, não só nesse Natal... mas por todos os outros dias deste novo ano que se aproxima.
Bjoos de algodão doce! ♥♥♥
Ps: O conto foi reescrito, porém manti a história original, acrescentado, apenas, pequenas coisas. Espero que tenham gostado ♥♡♥
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top