Dominic
P.O.V.: Viktor
A perda de memória de Arthur causou comoção no palácio. A princípio, o rei e a rainha debateram sobre manter segredo, mas logo desistiram. Expor Arthur ao estresse de fingir lembrar-se de tudo simplesmente não poderia ser bom para ele, que precisava descansar para que suas lembranças pudessem, aos poucos, retornar. Não se sabia se todas elas voltariam, mas era uma esperança, já que, após acordar, Arthur se queixava de dores de cabeças e de coisas que pareciam ser lapsos de um sonho lhe apunhalando a mente.
Pronunciamentos foram feitos em rede nacional para explicar a situação, deixando de fora a chantagem e as selecionadas raptadas. Silenciosamente, a ameaça rebelde pairava sobre as cabeças da Família Real como uma nuvem de tensão. Os funcionários do palácio foram reunidos para ouvirem pessoalmente as explicações do rei sobre as recentes prisões e o ataque, e novamente a situação no palácio ficou tensa. Os criados se entreolharam com suspeita, como se qualquer um pudesse ser um rebelde infiltrado, e eu lamentei em silêncio pela confiança quebrada entre todos eles.
Com Dominic preso e o antigo chefe da guarda aposentado precocemente, um dos guardas pessoais do rei passou a ocupar o cargo, e eu me tornei "guarda especial" de Arthur. Peterson, o novo chefe, e o rei marcaram uma reunião de emergência com os líderes do exército logo depois dos comunicados feitos aos funcionários do palácio. Finalmente um plano de ação seria montado, embora eu não conseguisse sequer começar a imaginá-lo. Eles não tinham praticamente dado nenhum além dos já usados para prender todos os guardas identificados como rebeldes. O que poderiam fazer?
Na hora do almoço, troquei de posto com outro guarda escolhido a dedo pelo rei e fui comer. Quando estava chegando ao refeitório, Greenwood me parou.
"Alceu! Eu estava mesmo precisando de alguém. Está em seu horário de almoço?"
"Sim, senhor", respondi – mais por respeito que por diferença de patente.
"O almoço de Dominic precisa ser levado até a cela dele, e eu acabei de ser chamado pelo rei. Será que você poderia fazer isso por mim?"
Hesitei, meu peito se contraindo enquanto eu recebia em minhas mãos a marmita morna.
"Desculpe", Greenwood recomeçou a falar. "Se não puder, encontre outra pessoa por mim, por favor. Eu realmente preciso ir agora!"
Ele apressou-se em direção ao palácio enquanto eu olhava para o recipiente em minhas mãos. Com um suspiro, decidi. Caminhei até a comida e montei uma marmita para mim mesmo, depois peguei os talheres, uma garrafa de suco e uma de água e fui para o calabouço do palácio.
Desci as escadas sentindo o ar mudar. Era frio e úmido, e o vento uivava vez ou outra. Nas celas mais afastadas da saída, estavam presos os guardas rebeldes. Dominic estava numa das primeiras celas mais próximas da saída. Cumprimentei o vigia carrancudo e caminhei poucos passos pelo corredor iluminado, passando por celas vazias, até chegar a dele. Quando o vi, senti uma súbita vontade de chorar. Culpa. Tinha sido eu que o colocara ali.
Dominic estava sentado no chão de azulejos azuis com a cabeça encostada na parede, as mãos unidas sobre seu colo e as pernas esticadas. Seus olhos estavam fechados, como se dormisse, mas eu sabia que não. Ele meditava.
Engoli em seco para afastar o nó que se formara em minha garganta e então pigarreei.
"Eu trouxe seu almoço, Dominic."
Sobressaltado, ele contraiu levemente o corpo e olhou para mim com incredulidade e surpresa.
"V-Viktor?"
O vigia se aproximou sem que eu pedisse e abriu a cela, puxando a porta de barras de aço para que eu entrasse. Eu não estava esperando aquilo. Automaticamente, entrei e ouvi a cela ser fechada atrás de mim.
"Meu nome é Mattew, senhor, pode me chamar quando terminar."
"Certo. Obrigado", respondi.
Dominic ainda me olhava com certa incredulidade enquanto eu puxava a cadeira de metal que estava na parede em frente a ele e me sentava, entregando-lhe sua marmita e os talheres.
"Não vai comer?", perguntei estoicamente. Meu Deus, como eu era dissimilado. A verdade é que eu planejara comer fora da cela, com barras de metal nos separando e deixando aquilo mais fácil.
"Ah... eu... vou", ele se enrolou, olhando para a marmita como se acordasse. Lentamente, ele a abriu sobre o colo e tirou a colher do envelope de papel.
Coloquei seguidas colheradas em minha boca, tentando me distrair, mas sem sentir sequer sentir o gosto da comida. Dominic começou a comer, distraído, evitando olhar para mim.
Decidi evitar olhar para ele também.
Minutos de silêncio tenso se instalaram enquanto nós comíamos. Quando terminei, peguei o suco e tomei alguns goles, depois estendi a garrafa para Dominic. Tinha o suficiente para nós dois.
Quando ela a recebeu, roçou os dedos sobre os meus, e eu estremeci, soltando-a em reflexo.
"Viktor...", ele murmurou suplicante.
"Bem, agora eu vou voltar ao meu posto, o castelo está uma loucura desde que o príncipe acordou", tentei me esquivar, tagarelando e ainda evitando seu rosto, e comecei a me levantar da cadeira.
"O príncipe acordou?!", Dominic exclamou em um tom quase animado.
Olhei para ele. Não tinha sido informado de nada?
"Você não soube?"
"Não acho que alguém estivesse preocupado de vir dar as notícias para um possível traidor." Ele deu de ombros.
Ah não... eu não queria ser aquele a dar aquela notícia...
Suspirei, consternado, e passei as mãos pelo rosto, jogando o corpo de volta na cadeira.
"Arthur acordou... e não se lembra de nada da Seleção. Para ele, hoje seria a noite do primeiro baile", murmurei. Agora era por outro motivo que eu evitava os olhos de Dominic. Não queria ver a desesperança tomar suas expressões.
Eu sabia muito bem o que aquilo significava para ele. Sua única defesa tinha ido pelo ralo.
Dominic soltou uma risada curta e sem humor. Pelo canto o olho, vi que tinha voltado a encostar a cabeça na parede.
"Arthur foi o único a acreditar em mim logo de início", Dominic falou, e foi como se cravasse uma faca em meu peito. "Ele não duvidou nem por um segundo da minha história, por mais que ela parecesse completamente sem sentido. Acho que depois ele fez as próprias investigações e averiguou o que eu falava."
Ele parou por um segundo, pensativo, então continuou.
"Eu não sou parte do grupo rebelde. Pelo menos não como você pensa, Viktor. Você lembra do meu irmão?"
Acenei afirmativamente em resposta.
"Ele tinha uns dezesseis anos quando começou a se envolver com um grupo de jovens um pouco mais velhos. Eu não gostava deles. Eram filhos de gente rica que se achavam senhores da verdade e desprezavam qualquer um que considerassem inferior. Eles tinham feito parte de castas superiores, um dia. Oliver não entendia que eles o tratavam como um cachorrinho. Conforme ficávamos mais velhos, meu irmão ficava mais estranho. Um dia, quando tínhamos dezoito anos, ele esperou todos da casa estarem dormindo para me chamar no meio da noite e me confessar que fazia parte do grupo rebelde, contando todos os detalhes sobre sua participação nele. Isso foi quatro anos atrás. A princípio, eu não entendi. Achei que... achei que ele só quisesse desabafar..."
Dominic parou novamente, perdendo-se em lembranças.
"Ele tinha conhecido essa moça, Caroline, e ela era contra os ideias rebeldes. Ele estava tão apaixonado... Ele desistiria daquela loucura por ela, só que... só que ele não podia sair do grupo rebelde. A menos que tivesse um substituto perfeito."
De algum modo, eu já conseguia desenhar uma imagem do que viria a seguir.
"Obviamente, eu recusei. Eu não faria parte daquela loucura. Oliver se enraiveceu e parou de falar comigo por dias a fio. Então em um sábado, quando eu ia sair para mais um passeio solitário de final de semana, ele pediu que eu passasse em uma certa loja e lhe comprasse alguma coisa, não lembro bem o quê. Eu não entendi o motivo, mas fui. Quando cheguei lá, dois homens me cumprimentaram como se já me conhecessem – chamavam-me de "Nick" – e me levaram praticamente à força para os fundos do local. Quando cheguei lá, entendi imediatamente o que estava se passando: era uma reunião do grupo rebelde. Meu irmão tinha me feito cair em uma armadilha."
Fiquei pasmo, imaginando o quão traído Dominic havia se sentido.
"Eu tinha duas opções: contar a verdade a eles e colocar a mim mesmo e ao meu irmão em maus lençóis, arriscando nossas vidas, ou seguir o plano de Oliver e me passar por ele, salvando-nos. Obviamente, escolhi a segunda. Obviamente, não deu certo."
"Dominic!", não contive a exclamação sussurrada.
"No mesmo dia, fui descoberto. Marid Illea, o suposto líder, percebeu. Mas, ao contrário do que eu pensei, ele não me expôs. Me chamou para uma reunião em particular, contou que havia percebido minha atuação e me fez uma ameaça simples: eu deveria obedecê-lo cegamente, caso contrário ele mataria meu irmão. E, se eu fosse descoberto, teria que fazer o mesmo – com nós dois."
"Eu virei uma espécie de 'faz-tudo', só não fazia nenhum trabalho sujo, porque Marid não queria me dar nenhum tipo de informação sobre os rebeldes além do necessário – eu era um infiltrado no grupo, de qualquer jeito. Quando Marid decidiu que iria tentar colocar guardas rebeldes no palácio, eu fui um dos escolhidos, por ter uma ficha limpíssima e não ter um passado suspeito, além de parecer ter chances de ser selecionado. Foi assim que entrei para a guarda."
"Este ano, novos rebeldes se alistaram, confiando no sucesso da primeira tentativa. Eu fui o único dentre os dez guardas rebeldes já no palácio a ser escalado para fazer parte da equipe de alistamento. Então recebi uma carta com ordens de deixar passar um certo número de homens, identificados por nome na mensagem. Temendo por minha vida, mas sem querer continuar traindo a coroa, pedi uma audiência com o príncipe e fui surpreendido pela sua imediata aceitação, mesmo com a Seleção já acontecendo. Foi então que contei tudo a ele, que me contou sobre Layla – algo que eu não sabia – e foi assim que começamos a organizar nossos planos de ação. Eu precisei deixar entrarem os novos guardas rebeldes, agora era um agente duplo, e ele, com a faca de Layla constantemente em seu pescoço, precisou esconder tudo do rei. Mas com o tempo eu desconfiei de que não tivesse sido informado de todos os rebeldes pleiteando vagas no castelo, e então comecei a investigar a toda a guarda. Foi assim que, quando vi que você tinha uma ficha perfeitamente limpa e era confiável, decidi pedir sua ajuda nas investigações. Eu e o príncipe não daríamos conta de tudo."
"E o seu irmão?"
"Casou, começou a trabalhar como professor de inglês em uma escola da periferia, ele e sua esposa estão esperando o primeiro filho..." Suspirou. "Ele me agradeceu depois. No dia do casamento, ele estava tão feliz que eu não consegui continuar a cultivar raiva por ele."
Fiquei em silêncio absorvendo aquilo tudo. Entendi o que ele quis dizer com sua história ser absurda. Ele teria dificuldade para provar aquilo diante de um tribunal.
"Se eu tivesse te contado tudo antes, você não teria reagido como reagiu ao ver aquele bilhete de Layla", Dominic voltou a falar após alguns instantes. "Eu não permiti que ela fugisse, Viktor. Na verdade, quando te encontrei, tinha acabado de checar se os guardas estavam todos em suas devidas posições. Eu não pude, é claro, dizer a todos que ela planejava fugir e que deveriam ter atenção dobrada naquela noite, mas fiz o que pude, conferindo as defesas. Layla sabia sobre mim, também. Como 'noiva' de Marid e filha do real líder – o que fiquei sabendo através de Arthur – ela tinha boas informações, e como ela notou meu envolvimento com Arthur, deve ter percebido que eu trabalhava para ele em um sentido além do usual."
Assenti. Pensei sobre toda a confusão que aquela história de verdades-meio-contadas tinha causado no palácio. A falta de confiança mútua era o que tinha feito tudo ruir.
"Por que você não me contou nada antes?", indaguei após um tempo.
"Eu não queria que você me julgasse e fiquei com medo de que não acreditasse em mim. Sinto muito. Eu não espero que você me perdoe por não ter confiado em você totalmente, Viktor."
Algum tempo depois, quando eu saí do calabouço levando as marmitas vazias e os talheres sujos, lamentei em silêncio, meu coração batendo mais dolorosamente do que já fazia.
Eu não espero que você me perdoe por não ter confiado em você totalmente também, Dominic.
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Good afternoon, guys!
Turupom?
O que acharam, hein? To curiosaaaa
E sim, tensão pra saber sobre Lily e Mim. Será que vão conseguir fugir? Próximo capítulo teremos as respostas!
Nessa reta final, vou pouco a pouco me despedindo da fanfic, mas não sem sofrer um pouquinho. Foram anos da minha vida escrevendo. Sei que muita gente que me acompanhava desde o começo, na verdade acho que quase todos, desistiram nesse meio tempo entre 2016 e 2019. Eu entendo, gente, eu ficava meses sem postar durante meus bloqueios e minhas crises de ansiedade. Mas estou decidida a não perder vocês que me acompanham agora, e é por isso que estou sempre me esforçando para continuar, mesmo tendo um MONTE de coisas "mais importantes" (pra sociedade) pra fazer KKKKKKK
UM BEIJÃO NO CORE <3
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