A Escolha I


Eu não lembro muito bem do início da manhã. Sei que comi o café da manhã que me trouxeram, sei que tomei banho em uma banheira extremamente cheirosa, sei que tive meu cabelo cuidado e arrumado em um belo penteado, sei que fui maquiada e sei que fui enfiada em um vestido branco de mangas longas com uma delicada e fina fita preta ao redor da cintura. Sei que fui calçada nos sapatos que Viktor me dera – que agora estavam adaptados à minha falta de dedos – e sei que fui guiada através dos corredores do palácio por Thomas até o salão onde aconteceria o baile. Sei disso tudo, mas apenas porque agora estava maquiada, cheirando a rosas, com um penteado perfeito, usando um belo vestido e os sapatos que eu conhecia bem. Não conseguia lembrar de participar desses momentos.

Quando cheguei ao salão – e a partir desse ponto eu me recordo de todos os detalhes –, Arthur conversava com seus pais, que estavam fora da cena principal, já que hoje os holofotes focavam no príncipe e em sua futura esposa. Layla estava conversando com Marjorie, que, junto com todas as outras 33 selecionadas, estava ali para prestigiar a cerimônia de escolha. O púlpito, acessado por escadas de ambos os lados, estava ricamente decorado. Seria para lá que o príncipe subiria durante o ponto principal do baile e então anunciaria a escolhida para ser sua esposa. Imaginei Layla em seu vestido branco quase idêntico ao meu – a diferença era a cor da fita e dos sapatos: eram verde-escuros – subindo as escadas e indo em direção à Arthur. Então imaginei ele ajoelhando-se diante dela sob os olhares de toda Illéa e pedindo sua mão em casamento. Então pensei no casamento – que seria logo em seguida, após um restrito almoço de noivado com família da selecionada escolhida. Pisquei com força para afastar a imagem, ela me dava náuseas. Eu precisaria ser muito forte para enfrentar aquele momento. Suspirei. Lembre-se de que está fazendo isso para salvar quem você ama, falei para mim mesma.

Aguentaria aquela cerimônia até o fim. Por Arthur.

Por Illéa.

Movi-me junto com Thomas até ficar em um ponto discreto. Não queria ser vista por Arthur. Não ainda. Quando estava escondida o suficiente do príncipe, outra figura me encontrou. Era Alex, que pulou em mim com um abraço apertado.

"Lily! Ah, eu estou tão feliz! Miriam e eu recebemos nossas casas ontem à noite! Nós conseguimos! Muito obrigada por tudo!"

Abracei minha amiga e sorri, feliz por sua conquista. Eu mal podia esperar para vê-las juntas e livres, como todo amor deveria ser. E elas morariam perto de mim, o que...

Espera.

Eu também receberia uma casa?!

"E você, amiga?!", Alex continuou, animada. "A próxima rainha de Illéa..."

Nova pontada em meu peito. A noite seria longa.

"Na verdade...", comecei, franzindo os lábios e piscando com força para manter a aparência inabalada, mas ainda um tanto distraída com a ideia de receber uma casa. "Não."

"OI?", Alex praticamente gritou, recebendo olhares enviesados das pessoas ao redor. Desesperadamente, fiz "shhh", para que ela baixasse o tom de voz – o que ela fez, mas sem diminuir a indignação. "Como assim 'não'? Esse príncipe tem merda na cabeça?"

"Shhh! Tá louca? Não fala assim, alguém pode te ouvir!", pedi, olhando para os lados temendo que alguém tivesse escutado. O lugar estava cheio de câmeras e de guardas, além dos nossos guardas especiais – mas estes estavam um tanto afastados agora, nos dando espaço para conversar enquanto fingiam não ouvir nada. "Fui eu quem terminou tudo!"

"Você o quê? Ficou louca?!", Alex agarrou meus ombros e me chacoalhou. "Você não pode..."

"Senhoras e senhores, Alteza e Vossas Majestades!" Gavril começou a falar do meio da escada à esquerda do púlpito, fazendo uma reverência para a família real e interrompendo Alex, que bufou, descontente, e voltou o olhar para o púlpito. "Que bela manhã! Uma manhã magnífica que entrará para a história como um dos dias mais felizes para o nosso reino, especialmente para Sua Alteza, o príncipe Arthur!"

Palmas ressoaram quando Arthur se voltou para a multidão acenando.

"Você precisa consertar isso!", Alex cochichou em meu ouvido.

"Eu não posso!", respondi entredentes, forçando um sorriso para as câmeras que vez ou outra gravavam nossos rostos. "E pare de falar! Tem câmeras por todo lado!"

"Lillian, você está destruindo sua vida! Eu vejo o jeito que você olha para ele! Lily..."

Ao fundo, Gavril continuava falando, mas eu já não podia compreender o que ele dizia. Uma avalanche de memórias com o príncipe, que eu tentava conter desde o dia anterior, se abateu sobre mim me deixou surda e fraca repentinamente. Todos os sorrisos e o modo como ele conseguia me irritar a cada respiração... Eu não sabia que corações partidos podiam doer tanto assim. Lembrei-me de quando, sem saber que era Arthur, brinquei com um garotinho na Noruécia. Eu me sentia como naquele dia novamente, brincando com um garotinho que logo fugiria para longe de mim sem me dizer seu nome. Mas sgora era o caso contrário. Era eu quem fugia.

E não podia olhar para trás para dizer adeus. Não podia mostrar que me importava. E eu me importava. Demais.

Como se me tirasse do fundo do oceano, uma melodia solene tomou o salão. Em silêncio, todos se curvaram na direção do príncipe, que fazia seu caminho para o púlpito. Era agora? Mas já? Obriguei-me a fazer uma reverência, mas discretamente olhei para os lados, confusa, buscando alguma coisa que me dissesse que aquilo era apenas o início da cerimônia e que eu estava enganada.

A tensão no ar me dizia o oposto.

Arthur terminou de subir os degraus e caminhou para a frente do púlpito, parando logo atrás da mureta de mármore claro. Ele sorria, mas, ainda que daquela distância, eu sabia que não era um sorriso verdadeiro. Era um sorriso treinado para ser agradável e polido. Eu sentiria falta de vê-lo gargalhando descontroladamente.

A música parou. Arthur olhou para os pais, que sorriam amplamente, as mãos unidas sobre o encontro dos braços de seus tronos, e depois voltou o olhar para as convidadas e para as inúmeras câmeras.

"Bom dia, Illéa!", Arthur falou com um sorriso. "Hoje tenho a honra de compartilhar com todo o reino um dos dias mais felizes da minha vida! Peço a compreensão de todos pela brevidade da cerimônia, o que é uma pequena quebra em nossas tradições, mas os acontecimentos recentes nos obrigam a tomar ainda mais medidas de precaução. No entanto, hoje não é dia para tais assuntos! Como vocês podem imaginar, tal qual qualquer noivo, estou ansiosíssimo pelo meu casamento!"

Risadas educadas de diversão tomaram o salão após a declaração em tom de confissão do príncipe. Não consegui rir. Estava sendo difícil o bastante manter sequer um sorriso no rosto. Arthur estava tão lindo... Seu uniforme branco com detalhes vermelhos, azuis-claros e dourados faziam com que seu cabelo e seus olhos se destacassem. Lembrei-me que ele usava maquiagem para cobrir as sardas. Como seria seu rosto verdadeiro, sem disfarces?

Eu jamais saberia.

"Eu gostaria agora de convocar para este púlpito as duas selecionadas remanescentes. Senhorita Layla Allison e senhorita V- Lillian Donnely!" Arthur passou o olhar pela multidão nos procurando. Baixei o olhar. Thomas veio para o meu lado e praticamente me arrastou até as escadas, já que eu não conseguia fazer meu corpo responder. Layla veio, também guiada por seu guarda, e parou aos pés da outra escada, lançando-me um sorriso tão doce que só poderia ser falso. Correspondi. Os olhares das câmeras praticamente penetravam em meu corpo agora.

Começamos a subir, deixando para trás nossos acompanhantes. Degrau a degrau, eu precisava de cada vez mais força para chegar até o final. Eu não estava preparada para estar tão perto de cena que me quebraria ainda mais o coração. Quando caminhei para o lado do príncipe, meu corpo pesava mais que o mundo. Obriguei-me a olhar para a multidão, ignorando a fragrância que Arthur exalava e o magnetismo irresistível que havia ao redor dele.

Era agora.

O príncipe recomeçou a falar, mas eu me sentia surda. Foquei o olhar nas janelas do salão. O dia estava realmente magnífico lá fora, o céu acima das copas das árvores que formavam o bosque na lateral do castelo cintilava de tão azul, e eu achei aquilo uma injustiça. Como o dia podia parecer tão bonito mesmo que tudo o que eu podia sentir era dor? Não era a primeira vez que aquilo acontecia em minha vida, eu já devia ter aprendido. Mesmo quando tudo dentro de nós está desmoronando, ela segue seu curso. O sol sempre nasce outra vez após se pôr, não há noite que seja eterna. Na verdade, nada na vida é eterno, e isso é uma bênção e uma maldição ao mesmo tempo.

Eu olhava distraidamente para o céu quando notei algo vindo. Muito. Rapidamente. Em. Direção. Às... janelas do palácio!

Atirei-me na direção de Arthur, derrubando-nos no chão. Um milésimo de segundo depois, ouvi o som do vidro da janela sendo quebrado, e logo em seguida uma explosão gerou caos e gritaria entre os presentes. Com olhos ansiosos, escrutinei Arthur, que estava agora deitado sob mim. Sem ferimentos. Nos olhos do príncipe, notei surpresa, confusão e um fraco brilho que eu conhecia bem. Ele sabia. Com aquele ato, eu tinha me entregado e assumido todas as mentiras que dissera no dia anterior.

Não importava mais. O palácio estava sendo atacado novamente.

O palácio. Estava. Sendo. Atacado novamente!

Olhei para os lados com apreensão. Eu estava vagamente ciente dos guardas que nos cercavam em posição de defesa. Layla estava encolhida contra o recuo semicircular da parede, que aumentava a área do púlpito, e abraçava os próprios joelhos enquanto chorava. Senti raiva. Ela deveria sequer estar com medo? Não era parte daquele grupo?

Foi então que começaram os tiros. Não tiros comuns, espaçados: tiros ininterruptos, aterrorizantes. Tiros de uma zona de guerra. Consegui ouvir os guardas gritando ordens ao tentar evacuar os civis que estavam no salão e comecei a me levantar para sair de cima do príncipe. Imediatamente, fui impedida pelos braços dele, que rodearam minha cintura e me apertaram contra o corpo tenso de Arthur.

"Fique abaixada!", ele exigiu, fazendo-se ouvir acima do tiroteio.

Perto demais, uma explosão se sobrepôs aos tiros, e eu senti o corpo do príncipe estremecer profundamente. Nova explosão. Arthur me apertou contra si, estremecendo novamente, e então eu percebi. Não era Arthur quem tremia.

Era o púlpito.

A estrutura oscilou, e Arthur e eu deslizamos até estarmos colados ao parapeito de mármore. Um guarda gritou e começou a fazer o seu caminho até nós cuidadosamente, temendo abalar ainda mais o púlpito instável. Por entre as colunas, consegui ver o chão dois metros e meio abaixo de nós. E... corpos?

Antes que eu tivesse tempo de sentir náusea ao ver o sangue e as pessoas imóveis deitadas no piso, o púlpito chacoalhou e despencou. O soldado escorregou pelo piso inclinado, tentando em vão se agarrar à borda do parapeito, e então caiu enquanto Arthur e eu íamos em direção ao chão junto com a estrutura do púlpito cadente. 

_-*-_


OI, GALERAAAAAA

Eu consegui escrever pra postar hoje!!!

Ignorei as coisas que tinha pra ler? IGNOREI KKKKKK

Mas eu queria muito escrever. Está correndo pra parte da história que eu planejo há meses, e eu mal posso esperar pra colocar tudo no papel! XD

Beijooos *3*

(SEMANA QUE VEM TEM MAIS -- posso prometer, porque já tá escrito KKKKKK)

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