Os trilhos da vida
Íris
—Sr. Ruffles...— Eu miei fracamente.
Eu estava totalmente prostrada, deitada de bruços no concreto frio e cinza do metrô.
Nghh... Cada pequeno osso do meu corpo deve ter sido quebrado.
Estremeci com a dor se espalhando por toda a minha mandíbula.
Meus dedos roçaram meu queixo, o que doeu como o inferno. Eles voltaram manchados com gotas de sangue vermelho-vivo se acumulando em suas pontas.
Owww.
E eu ainda segurava desesperadamente um dos meus sapatos.
Onde diabos estava o outro?
Ninguém tinha notado que eu caí. A colméia humana cuidava de seus próprios negócios diários.
Todos os olhos dos passageiros do trem para o sul estavam agora fixos nas portas escancaradas.
Talvez fosse o melhor. Eu não queria que o mundo me visse assim.
Eu não conseguia me mexer. E ele se foi.
Um som maligno de um alto-falante, por favor, afaste-se obscureceu meu grito.
Meu apelo não poderia preencher a lacuna entre nós.
—Sr. Ruffles!— Eu gritei fracamente mais uma vez.
Sr. Ruffles?
—Seu boba, idiota estúpida.— Eu não pude evitar a maldição. Perseguindo um sonho, eu tinha feito papel de boba.
Baixei a cabeça, as lágrimas embaçando minha visão.
Piscando para longe, tentei me levantar. Choques de dor percorreram meu joelho esquerdo. Eu assobiei em frustração e me sentei no primeiro degrau da escada quando seu trem deixou a estação.
As faixas estúpidas zombavam de mim. Elas eram tão vazias quanto minha vida sem o Sr. Ruffles.
Que dia de merda.
Um par de sapatos polidos e calças cinza entraram no meu campo de visão.
Pronta para atacar o intruso, olhei para cima e engasguei. O cabelo despenteado, os óculos quadrados – eu reconheceria aquele rosto em qualquer lugar.
O Sr. Ruffles estava bem ali na minha frente.
Abri a boca para dizer alguma coisa, qualquer coisa, mas um nó do tamanho de uma batata se formou na minha garganta, bloqueando qualquer palavra.
Ele se agachou.
Tão perto.
Sua mão cruzou o pequeno espaço que ainda nos separava e tocou a minha.
Sua palma estava quente contra meus dedos. A magia de seus cachos me fez sorrir.
Pequenas rugas sorridentes marcavam os cantos de seus olhos.
Eu poderia me afogar lá. Por uma eternidade.
Nunca senti tanta paz. Nunca estive tão perto de alguém.
—Ortodôntica?— ele disse.
O meu aparelho? Eu escondi meus dentes, pronta para bater nele. Mas sua carranca preocupada me parou.
—Você está bem?— ele perguntou.
Ainda sem palavras, o melhor que consegui foi um aceno silencioso.
Sua testa franziu, e um sorriso tímido apareceu em seus lábios. Ele ergueu um sapato familiar.
Meu sapato!
Como ele conseguiu?
—Eu acredito que isso podia ser seu.— Seus dedos quentes agarraram meu pé, gentilmente, e colocaram o sapato nele. —Eu pensei que sim. Um ajuste perfeito.
Ele tinha um sorriso que Henry Cavill teria inveja. E ele estava corando.
—Coelhinho?— Eu soltei.
Essa palavra desencadeou novas lágrimas. Uma barragem havia sido rompida em algum lugar dentro de mim.
E o prêmio por agir normalmente quando você sente uma porcaria de dor vai para...
Eu não!
—Ei, ei, ei. Está tudo bem. Eu estou com você. Você pode andar?— Sua voz terna e calmante com traços agradáveis de rouquidão e cuidado me envolveu como um cobertor quente.
Dei de ombros enquanto observava seus olhares preocupados e desgrenhados.
Debaixo de sua camisa xadrez azul-clara descuidadamente desfeita, ele usava uma camiseta com um símbolo em forma de "S" vermelho e azul descansando orgulhosamente em um escudo amarelo.
Meu Super-Homem.
—Vamos tentar, então.— Ele apertou minhas duas mãos e me puxou para cima.
Nosso toque fez meus joelhos balançarem.
O Sr. Ruffles me envolveu em seu paletó. Então ele me puxou direto para seus braços quentes.
Meus dedos agarraram seu cabelo mágico, esperando que o pó de fada me garantisse o riso em vez de lágrimas.
Ele enfiou a mão no bolso e tirou um pacote de lenços de papel.
—Aprendi da maneira mais difícil a sempre manter alguns desses comigo.— Ele sorriu, lentamente limpando o sangue do meu queixo.
Eu empurrei minha cabeça para trás, mas não deixei a segurança de seu abraço.
—Ai! Isso dói como um filho da puta da... Desculpe.— Olhei para cima, horrorizada.
Íris! Sua idiota! O que ele vai pensar de você?
—Desculpe. Eu deveria ter sido mais cuidadoso.— Seus olhos castanhos escuros estavam cheios de preocupação, ignorando minha linguagem desbocada.
Seu abraço firme diminuiu meu tremor.
Funguei mais uma ou duas vezes, finalmente me acalmando. Então eu descansei minha cabeça no canto entre seu pescoço e ombro.
Meu novo covil confortável acabou por me dar uma visão perfeita daquele nariz élfico de pinóquio-águia-sexy que eu conhecia pelas minhas ilustrações.
—Boop!— Eu disse, e sem nem pensar, dei-lhe uma cutucada afetuosa.
Ele puxou a cabeça para trás, uma pequena carranca enrugando o membro sondado.
—Você gostaria de vir comigo?— ele sussurrou.
Ir com ele?
Por quê?
Ou ele quer dizer "dar comigo"?
Íris!
Ok, "vir comigo".
Eu iria? Eu iria a qualquer lugar com ele!
—Então, vamos levá-la a um médico. O Mass General fica a apenas alguns quarteirões daqui. Uma caminhada leve. Eu te carrego, se for preciso.— A última frase foi proferida com um rubor e um sorriso de menino no trem ao lado.
Um sorriso que parecia em casa.
Evan
A estação de metrô sem metrô era um lugar lúgubre e o banco sob minhas nádegas era frio e duro.
Duas trilhas, uma levava ao norte, a outra ao sul. Uma era dela, a outra minha. Eles não cruzaram.
O meu me levaria ao centro da cidade, naquele trem da Linha Vermelha entrando na Charles/MGH agora mesmo.
Quando o veículo parou, suas portas se abriram e me convidaram a entrar.
Dei de ombros e me levantei do meu banco. Ir para outro lugar era muito mais do que ficar preso aqui.
Eu falaria com Liam. Ele me perdoaria por ter me atrasado. Se não, foi sua perda. Eu ouviria o que ele tinha a me dizer. Mas não esqueceria que minha trilha fazia parte de uma vasta rede. Mesmo que não cruzasse com a Ortodôntica, poderia me levar a qualquer lugar.
O varredor de cabelos compridos de colete amarelo atrapalhou seu caminho pela plataforma, empurrando um carrinho carregado com sua vassoura e uma lixeira. Virei para a esquerda para evitá-lo.
Algo pontudo bateu nas minhas costas.
Eu me virei, pronto para dar ao ofensor minha melhor carranca. Mas o espaço atrás de mim estava vazio.
Exceto por um sapato de mulher caído no concreto aos meus pés.
Perplexo, eu o peguei. Seu salto alto afilado a um ponto afiado o suficiente para matar.
Alguém tentou me espetar com aquela coisa? Examinei a multidão cada vez menor em busca de sua dona.
Uma senhora com peles marrons falsas entrou no trem, mas ela ainda tinha os dois saltos. A porta se fechou atrás dela.
Um pequeno rebanho de New England Patriots congestionou a base da escada, rindo e cantando. Eles jogariam sapatos?
O zumbido dos motores elétricos me disse que eu tinha perdido mais um trem.
Não importava, minha trilha ainda estava lá, pronta para me levar junto quando eu estivesse pronto.
Os Patriotas tinham chegado ao topo da escada e se acotovelavam em direção à saída como se houvesse cerveja grátis do outro lado. Seu canto bêbado desapareceu quando o trem partiu.
O silêncio desceu em uma estação deserta, apenas perturbado pelo som regular de varrer em algum lugar atrás de mim.
E um gemido.
Vinha de uma mulher prostrada no chão, ao pé da escada.
Ela empurrou-se sobre os joelhos, seu rosto nos trilhos vazios. Seu cabelo vermelho brilhou como um farol.
Ela apertou um sapato — um único salto alto.
Seu rosto parecia familiar.
Hesitante, dei alguns passos em direção a ela, me perguntando se minha mente estava me pregando peças.
—Waffles—, disse ela. As duas sílabas foram seguidas por uma colorida sequência de palavrões.
A mulher baixou a cabeça. Então ela tentou se levantar, mostrou os dentes e sentou-se no degrau mais baixo da escada, com os olhos ainda nos trilhos.
Dentes alinhados!
Parei a apenas um passo dela, com nada além de ar rarefeito entre nós. Ela se virou para mim, franzindo a testa. Quando cruzamos os olhos, a carranca desapareceu, e seus olhos se arregalaram.
Eu caí de cócoras, meus joelhos a poucos centímetros dos dela.
Um pequeno sorriso cresceu em seus lábios.
Ainda segurando o sapato com uma mão, estendi lentamente a outra, esperando que ela desaparecesse a qualquer momento. Quando ela não o fez, eu coloquei meus dedos nos dela.
Fechando a lacuna.
Fazendo nossas trilhas se encontrarem.
Minha visão se turvou com as lágrimas de um coração transbordante – um coração cuja batida marcou os momentos.
Momentos que duraram uma eternidade.
Finalmente, eu engoli.
—Ortodôntica!
Seu sorriso desapareceu. Um corte em seu queixo estava sangrando.
Ela estava ferida. Por que eu não tinha registrado isso antes?
—Você está bem?— Eu perguntei.
Ela assentiu.
Qual o próximo?
Eu ainda segurava aquele sapato dela, e isso me deu uma ideia.
O tipo de ideia maravilhosamente tola demais para ser ignorada.
Segurei o salto alto.
—Eu acredito que isso pode ser seu.— Seu pé estava frio quando o toquei. Com cuidado, coloquei o sapato nele. —Eu pensei que sim. Um ajuste perfeito.
Seus olhos escuros me estudaram. Ela provavelmente pensou que eu era louco.
Acho que eu era. E era bom.
Ainda assim, o calor subiu em minhas bochechas.
—Coelhinho?— ela disse.
Coelhinho? Ela estava confusa.
Concussão? Assim como eu?
Eu coloquei uma mão em seu braço. —Ei, ei, ei. Está tudo bem. Eu estou com você. Você pode andar?
Ela deu de ombros.
—Vamos tentar então.— Peguei suas duas mãos e a puxei para cima.
Ela estava tremendo. O choque a estava alcançando.
Tirei minha jaqueta e a envolvi em seus ombros.
Com isso, ela se inclinou para mim, direto em meus braços. O cheiro de ervas de seu cabelo invadiu minhas narinas.
Pequenos tremores sacudiram seu corpo, acompanhados por um staccato de soluços. Ela olhou para mim, lágrimas escorrendo de seus olhos. Sua mão foi para o meu cabelo, e seus dedos enviaram um monte de arrepios pelas minhas costas.
Eu nunca tinha visto olhos tão grandes quanto os dela.
Lágrimas misturadas com sangue escorriam de seu queixo.
Tirei um lenço do bolso.
Lenços — foi o que ela me mostrou, na primeira vez que a vi.
—Aprendi da maneira mais difícil a sempre manter um pacote desses comigo.— Limpei seu queixo e enxuguei o corte.
—Ai!— Ela evitou minhas atenções. —Isso dói como um filho da puta de um... Desculpe.
Que idiota eu fui! Eu a machuquei.
—Desculpe. Eu deveria ter sido mais cuidadoso.
Ela tinha uma linguagem forte. Devia ser por causa do choque e da concussão.
Sua cabeça se moveu para frente, e ela descansou contra meu pescoço.
Fiquei tentado a acariciar seu cabelo brilhante, mas o medo de machucá-la novamente me parou.
Ela olhou para mim novamente, sua expressão enigmática e ilegível.
—Boop—, ela disse e colocou um dedo no meu nariz.
Definitivamente era hora de levá-la a um médico.
—Você gostaria de vir comigo?— Eu sussurrei. Eu quis dizer vir comigo para o hospital, mas não só isso.
O que ela diria?
Ela assentiu.
—Então, vamos levá-la a um médico. O Mass General fica a apenas alguns quarteirões daqui. Uma caminhada leve.
Uma onda de felicidade tomou conta de mim. —Eu te carrego se for preciso.
Aonde quer que os rastros de nossas vidas nos levassem.
O FIM
Esta história foi trazida a você por EvelynHail e RainerSalt
Nota dos autores: canção temática: Elvis Costello: "She."
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