28 de junho, 20:00 - Iris
—Que cheiro horrível é este?— Jayden levantou o seu olhar da gigantesca tela de plasma de 54 polegadas na qual as letras Call of Duty acenavam com a sua exibição de armamento e derramamento de sangue.
O ladrão de namorados atacava novamente!
Jayden estava no modo eu adoraria sair e socializar, mas prefiro ficar em casa e jogar 12 horas de modo de jogos de vídeo.
—Algo...— ele grunhia enquanto as suas narinas alargadas lhe davam características de macaco divertido. —Alguma coisa desanda!
—Ei, talvez sejas tu, Jay-Jay—. Adorava gozar com ele, e não estava programada para me chatear. —Esqueceu de tomar banho hoje. Não mudou o teu calçado desde ontem. A tua chamada de serviço não parecia te mandar para o banho—. Apontei para as pontas pretas das suas meias desportivas, anteriormente brancas.
Cheerios pastosos e passas secas faziam amor quente e doce no chão da nossa sala, deixando um rasto duvidoso até ao seu pé fedorento.
Este lugar não era apenas uma confusão — era uma maldita zona de desastre.
Se alguém o visse como um percurso de obstáculos concebido para nos manter a ambos em forma...
Ou para fazer alguém que tentou matar-nos tropeçar em algo e morrer...
Aquilo era normal?
—Não, não são as minhas meias. Desta vez não—...— Jayden farejou por aí como um cão de caça. —Está vindo da cozinha!
A realidade me atingiu com o seu punho atarracado.
—Oh não! O nosso jantar!
Coloquei as duas mãos no rosto, saltando e atirando o tablet com os esboços de lado.
Quando cheguei ao lugar de um desastre gastronômico, uma visão e tanto me saltou na cara, depois da espera.
Restos carbonizados da minha maravilha culinária, as minhas cenouras com cobertura de mel, deitados murchos e queimados na forma, emanando fumo preto encaracolado e um fedor indutor de vômito.
—O nosso jantar sofreu uma combustão não tão espontânea!— Gritei a informação, mantendo uma distância segura das leguminosas incineradas.
—Não se preocupe. Podemos sempre pedir a comida. Estou de bom humor para uma pizza, se também estiver, querida!— Jayden gritou de volta da sala de estar.
Pizza?
Longe da comida da minha alma, mas comestível.
Ele estava a lutar pelo atalho. Como sempre.
Enquanto eu desejava realmente tentar criar algo. Uma opção mais saudável?
A memória de um vegetal laranja, era uma vez, num certo vagão, apontou em algum canto mais afastado da minha mente.
As cenouras queimadas não me parecem ser uma opção mais saudável.
Além disso, vá lá, Iris? Tu? Cozinhar? Não me faças rir.
Eu disparei o pensamento de Jayden interior e bati com a forma da cenoura até a sala de estar, arando os meus pés através da onda de objetos espalhados no chão.
O apartamento inteiro assemelhava-se a uma versão mais moderna, mais expansiva e mais cara de um...
Chiqueiro.
Nem sequer um centímetro quadrado do tapete vermelho da sala de estar, outrora brilhante, espreitado por baixo dos detritos domésticos.
Ao percorrer o chão cheio de coisas, ultrapassei várias cuecas Nike, camisetas Lacoste suadas e um par de jeans Lewis malcheirosos.
Que nojo! Mas eu não queria fazer parte do esquema Jayden faz bagunça, eu limpo, e lá vamos nós de novo.
Foi por isso que tinha feito um test drive. Queria ver quanto tempo ele iria aguentar sem eu arrumar as coisas atrás dele, e finalmente as apanhar sozinho.
Até agora, não tinha funcionado.
O Jayden ficou de braços cruzados com o meu tablet de desenho e congelou quando me viu voltar.
Os seus dedos passaram a tela tão depressa como tinham apertado os botões do seu controle PS4 há pouco.
Os elementos desfocados e familiares das minhas ilustrações que se sobrepunham na tela.
O penteado encaracolado.
O penteado ondulado.
Cinquenta tonalidades de penteado castanho.
Nariz aquilino.
Nariz de pinóquio.
Nariz greco-romano.
Orelhas humanas.
Orelhas de Elfo.
Orelhas de coelhinho.
Apenas o sorriso permaneceu sempre o mesmo.
Doce, gentil e admirador.
—Jay-Jay...— Agarrei a lamentável forma com tanta força que os meus dedos doíam pelo esforço.
—O que é isto?— Ele acenou-me com o tablet e nem sequer pareceu registar as cenouras.
—São apenas alguns esboços para o meu protagonista elfo. Para o projeto Rabos de Fada. Aquele que tentou lançar em Janeiro? Sabe como adoro rabiscar no vagão.— Depositei com cuidado a forma da cenoura na mesa de café que costumava ser amarela.
Por que é que a minha voz soou estranha?
Quase... defensiva?
Teria eu medo da sua reação?
Jayden franziu o sobrolho ao coelhinho, com uma vinheta desenhada apressadamente.
—Ei, espera um segundo... Não conheço este cara? Ele não é aquele teu casinho do vagão?
—Oh, um...— Eu mexi com o meu colar de chaves TARDIS. —Sim... É ele. Vi-o muitas vezes, sabe. Ele parecia ser a escolha mais fácil. No desenho, é importante ter o tema do seu esboço diante dos seus olhos. Nenhum outro passageiro...
—Aquele cara? Não pode estar a falar a sério. Estás obcecada por ele ou algo assim?— Jayden grunhou, atirando o tablet de volta para o sofá.
—Cuidado!— Apressei-me para o dispositivo, tomando-o entre as palmas das minhas mãos e o alisando com cuidado. —Tenho aqui tantos projetos-modelo!
—Olha, Iris...— Jayden respirou fundo. —Alguma vez se interrogou se talvez esteja a perder tempo e energia com estes... desenhos?
A questão levantou um machado e atingiu-me no meio do meu coração.
—Por...O quê?— Eu gaguejei.
—Bem, sabes, é... Passaram-se tantos anos, e ainda não conseguiu... fazer um avanço. Puxei alguns cordelinhos, mas não foi suficiente. Passas cada vez mais tempo nesse teu mundo de fantasia. Quase nunca te vejo. E quando estás em casa, a desenhar, é como se não estivesses... não estivesses realmente aqui.
Aquele meu mundo de fantasia?
O machado esculpiu o seu caminho um pouco mais fundo.
Como poderia ele dizer isso?
Teria ele deixado de acreditar em mim?
Eu sempre acreditei nele, e nos seus sonhos!
Aquela e muitas outras frases furiosas que iniciariam o conflito pairavam nos meus lábios.
Eles não me atravessaram a língua.
Em vez disso, o meu olhar perdurou num dos esboços do Sr. Ruffles.
Será que ele acreditaria em mim se eu lhe mostrasse o meu trabalho?
Ele poderia gostar deles.
Poderia sorrir para a ideia.
E o seu sorriso mágico seria uma boa magia de sentir.
Eu abanava a cabeça. O Sr. Ruffles era um estranho que eu nunca conheceria.
O meu homem estava mesmo ao meu lado, a brilhar no sofá, o seu lábio inferior empurrado para a frente.
*Ele* devia ser a minha magia de sentir bem.
—Jayden, eu quase nunca te vejo, também. E nós vivemos debaixo do mesmo teto. Não seria bom se fizéssemos algo juntos? Mesmo que estivéssemos a cozinhar, ou a limpar o nosso apartamento?— Coloquei um acento especial no nosso.
—Isso é para cozinheiros e funcionárias da limpeza, Iris. Ela vai limpá-lo quando vier.
Tempo é dinheiro. Jayden sempre dizia. Aqueles que têm dinheiro, convertem-no em tempo.
— Eu não preciso de fazer esses trabalhos. Eu vou a restaurantes. Limpam o meu apartamento. Sabe que sempre fui assim—. A sua voz suavizou-se ao colocar a sua mão no meu ombro.
Ele estava certo. Ele sempre tinha sido assim.
Talvez fosse eu que estava errada, esperando que ele mudasse. Esperava-o, mesmo.
—Você... você tem—. Sussurrei-lhe de volta. —E eu sempre fui assim—, gesticulava para mim mesma.
—E eu te amo por isso, querida—. Jayden pareceu hesitar por um momento. Depois veio me dar um abraço.
Eu endureci dentro dele.
—Tem certeza?— Eu não queria parecer acusadora, mas precisava de saber. —Talvez o que lhe agradava fosse apenas uma flor exótica? Uma vez colhida, aprisionou-a no jardim, colocou-lhe uma cerca à volta?
—O que é que estás a dizer, Iris? Juro que não te compreendo quando age assim. Sim. Nós somos diferentes. E então? Faz parte do encanto da nossa relação—. Jayden arranhou a sua nuca.
—E se a nossa diferença o cativou no início...— Engoli e acariciei a sua bochecha suada. —E com o passar do tempo, tentou moldar-me de acordo com as suas expectativas? Iris, fazes isto? Iris, não faças isso? Pensei que te agradava a ideia de eu ser como sou.
—Já falamos sobre isto antes, querida. Quando faço ou digo essas coisas, estou apenas a te dar conselhos. Só estou a cuidar de ti.
—Talvez estejamos ambos errados, Jayden. Talvez estejas à espera que eu mude, e eu estou à espera que tu mudes. Mas será que podemos? Devemos? Tentar mudar um ao outro? Talvez isto não seja...
O final não dito da frase pairava sobre nós como uma nuvem venenosa.
—Não fique assim, querida— Ele levantou-me o queixo. —É apenas um monte de cenouras estúpidas queimadas de qualquer maneira. Eu sei o que fazer para que a minha menina se sinta bem novamente—. A sua mão esquerda esgueirou-se para debaixo da minha blusa, procurando o derradeiro prêmio, já que a sua direita já apalpava minhas nádegas.
—Não estou com disposição—, sussurrei de volta, empurrando-o para longe.
—Tanto faz—, Jayden escarneceu, e caiu de volta no sofá. Ele pegou o seu telefone manchado. —Que tipo de pizza queres?
—O de costume. Quatro Queijos—. Murmurei em piloto automático, a olhar para o nosso antigo jantar.
Jayden tinha dito que eles eram apenas um monte de cenouras estúpidas.
Mas eram?
As cenouras olhavam-me de volta da forma sem dizerem uma palavra.
Tão carbonizadas como a nossa relação.
Queimadas, no final da sua viagem.
Sobrecozidas. Já não são comestíveis.
Nenhuma faísca de vida ou energia nelas, qualquer que seja a sua natureza.
Os olhos de Jayden, que outrora me adoravam tanto, estavam agora vidrados.
A sua cabeça hipnotizada virou-se mais uma vez na direção da tela.
Os jogos de vídeo representavam um desafio constante e prometiam a vitória.
Talvez tenha sido por isso que tantos caras gostavam deles.
Uma vez concluído um nível, havia sempre outro e outro para aprofundar.
Para explorar todos os seus recantos. Para sair como vencedor. O portador de um troféu.
Era eu apenas um troféu para Jayden?
Um jogo de vídeo para completar, para colocar um tique ao lado do seu nome, para depositar na prateleira depois de o ter feito?
Olhei para o anel de diamantes de Prisco.
Era um símbolo de GAME OVER?
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